ILUSTRÍSSIMA SENHORA DIRETORA GERAL DO INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS – INEMA DA BAHIA
RECORRENTE, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ, com sede na Rodovia, Estado da Bahia, CEP, vem, por seu advogado, à presença de Vossa Senhoria, com fundamento no art. 147, XVI, e art. 192, II da Lei 10.431/06 e art. 259, II do Decreto 14.024/12, interpor
RECURSO ADMINISTRATIVO DE AUTO DE INFRAÇÃO INEMA BAHIA
contra decisão administrativa proferida nos autos em epígrafe que julgou improcedente a defesa e homologou o auto de infração ambiental de multa ambiental lavrado em face da Recorrente, requerendo seja concedido o efeito suspensivo, e, após as formalidades legais, seja encaminhado à unidade responsável para julgamento, cujas razões seguem acostadas.
Pede deferimento.
LOCAL E DATA.
ADVOGADO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE PRESIDENTE DO CONSELHO ESTADUAL DE MEIO AMBIENTE – CEPRAM
Recorrente
Advogado
Processo administrativo de auto de infração ambiental
ILUSTRE RELATOR (A)
NOTÁVEIS MEMBROS DO CEPRAM
RAZÕES DO RECURSO ADMINISTRATIVO
1. DA TEMPESTIVIDADE
A Recorrente recebeu no dia, a notificação referente ao Processo Administrativo em epígrafe que homologou a multa ambiental, cientificando-a do prazo de 20 dias para interposição de recurso ao CEPRAM, nos termos do art. 192, II da Lei 10.431/06 e art. 259, II do Decreto 14.024/12, de modo que, flagrante a tempestividade do presente do recurso.
2. BREVE SÍNTESE DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL E DA DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A DEFESA
A Recorrente foi autuada por agente do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), por suposto lançamento de efluentes diretamente no solo sem tratamento prévio que teria sido constatado durante fiscalização para averiguar supostas infrações ambientais.
Segundo a agente que lavrou o auto de infração ambiental, durante a aludida fiscalização na sede da Recorrente, constatou-se dois galpões, sendo um utilizado como garagem e armazenamento de materiais diversos, e outro, destinado a abrigar as estações de tratamento para água e esgoto no qual há tanques que para a agente, não estariam observando a legislação em vigor, sem sequer mencionar qual seria essa legislação ou que tipo de dano sua mera existência teria provocado, e muito menos, se estariam em funcionamento ou não.
Em continuidade a fiscalização, a agente narra no Relatório de Fiscalização Ambiental – RFA que próximo aos tanques foram encontrados locais cobertos com chapa de aglomerado, “local este que pode ter sido utilizado para disposição de resíduos diretamente sobre o solo” (grifo nosso), onde teria sido identificado canos e mangueiras com abertura para a superfície, não identificando, porém, qualquer lançamento de efluentes, sequer pretérito.
Em seguida, narra que teria encontrado tampas de concreto com estruturas semelhantes a caixas de armazenamento, supondo que “esse local pode ter sido utilizado para descarte de resíduos sem tratamento prévio adequado” (grifo nosso), e vai além, descrevendo que teria identificado uma saída “abaixo da superfície de concreto que comporta os tanques de armazenamento de efluentes”, repise-se, sem sequer constar se tais tanques estavam ou não em funcionamento ou então, se houve/havia efetivo lançamento de efluentes.
E assim, foi lavrado o auto de infração ambiental que originou os autos do processo administrativo em epígrafe, indicando-se multa ambiental exorbitante, cuja disposição normativa supostamente infringida foi assim lançada:
Art. 254[1], inciso III[2] do regulamento da Lei 10.431/06, de 20/12/2006, aprovado pelo Decreto Estadual 14.024 de 06/06/2.012.
A Recorrente foi notificada e apresentou defesa administrativa tempestivamente, mas após parecer técnico da Diretoria de Fiscalização do INEMA e manifestação da Procuradoria Jurídica, sobreveio decisão da autoridade julgadora de primeira instância, que homologou a penalidade de multa ambiental aplicada à Recorrente.
Ocorre que o auto de infração ambiental é manifestamente nulo, sobretudo porque não há qualquer laudo de constatação. Além do mais, o processo administrativo é eivado de vícios que reclamam sua anulação, conforme será demonstrado adiante, de modo que a reforma da decisão da autoridade julgadora é medida que se impõe.
3. DO MÉRITO
A Constituição Federal de 1988 assegura em seu art. 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, e ainda:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Partindo desse princípio, sabe-se que a imposição de multa administrativa ambiental possui caráter penalizador, e, afigurando-se como medida rigorosa e privativa de uma liberdade pública constitucionalmente assegurada, exige-se a demonstração cabal da autoria e materialidade, que são pressupostos autorizadores da imposição de sanção.
Nesse sentido, na hipótese de constarem nos autos elementos que conduzam à dúvida acerca da materialidade e autoria delitiva ─ in casu, se houver dúvida sobre a existência de danos ambientais, ou seja, se houve lançamento de efluentes líquidos em desacordo com os padrões estabelecidos, e/ou que tornem ou possam tornar ultrapassados os padrões de qualidade ambiental ─, o cancelamento do auto de infração ambiental é medida que se impõe, em observância ao princípio do in dubio pro reo, princípio clássico aplicável não apenas no Direito Penal, mas em todo Poder Estatal de punir, de modo se afastar a tipicidade material da conduta.
Isso porque, o ius puniendi do Estado é único, de modo que, a aplicação dos princípios penais e processuais penais garantistas e limitadores devem ser estendidos também, ao Direito Administrativo Sancionador, porque as infrações administrativas se diferenciam das penais tão somente em relação à autoridade que às aplica.
Desse modo, o Direito Administrativo Sancionador não pode constituir instância mais prejudicial ao administrado, revestido de ilegalidades e arbitrariedades, até porque, assim como no Direito Penal, são necessários elementos seguros que apontem para a existência de norma violada, tais como, tipicidade, lesividade, antijuridicidade e culpabilidade.
De igual forma, também cabe a aplicação do princípio da insignificância no Direito Administrativo Sancionador, a indicar a inaplicação da sanção administrativa quando houver mínima ofensividade da conduta, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica causada, como é caso em questão.
Aliás, o fundamento do princípio da insignificância é a inexpressividade da ofensa ao bem jurídico, ou seja, a tipicidade exige que o bem jurídico protegido pela norma que prevê a infração administrativa, cause efetivo dano. Infrações minimamente ofensivas ao meio ambiente não podem ser consideradas infrações à ordem administrativa, mas sim, meras irregularidades que não autorizam a aplicação de penas.
Não se desconhece a inexistência expressa de previsão legal para aplicação de tais princípios na esfera administrativa. Entretanto, em homenagem aos princípios e direitos do autuado, constitucionalmente assegurados, e até por força do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, é que se impõe estender o princípio do in dubio pro reo ou o da insignificância ao caso concreto, até porque, trata-se de infração administrativa aberta, que exige da autoridade julgadora cautela na aplicação da sanção.
3.1. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL– VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
Quando lavrou o auto de infração ambiental, a agente se limitou a indicar como norma infringida, o art. 254, III do Decreto 14.024/12, assim redigidos:
Art. 254. Constitui infração administrativa ambiental toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, que, resulte: […]
III – emissão, lançamento ou liberação de efluentes líquidos, gasosos ou resíduos sólidos, em desacordo com os padrões estabelecidos, e/ou que tornem ou possam tornar ultrapassados os padrões de qualidade ambiental.
Conforme redação do art. 254, basta que haja lançamento de efluentes em desacordo com os padrões estabelecidos, e/ou que tornem ou possam tornar ultrapassados os padrões de qualidade ambiental para incidir na sanção.
Todavia, para caracterizar a referida infração administrativa, é imprescindível a comprovação da elementar do tipo “em desacordo”, e/ou que “tornem ou possam” tornar ultrapassados os padrões de qualidade ambiental, ou seja, o dano precisa estar em desacordo com aquilo que é tolerável pela norma, o que somente pode ser aferido mediante elaboração de laudo de constatação, conforme determina o Anexo VI do Decreto 14.024/12.
Significa dizer que, apesar de a agente não ter classificado a gravidade da infração em leve, grave ou gravíssima – conforme determina o art. 258 do mencionado Decreto, que em seu § 1º impõe observância estrita ao Anexo VI -, constata-se que pelo valor da multa ambiental aplicada, a suposta infração ambiental se enquadraria, em tese, em “infração gravíssima”, e para tanto, é obrigatória a elaboração de laudo de constatação, conforme dispõe o próprio Anexo VI.
É dizer, a simples lavratura de auto de infração ambiental ou relatório de fiscalização ambiental não é suficiente para embasar a aplicação da sanção prevista no inciso III do art. 254 acima reproduzido. Isso porque, o motivo do auto de infração ambiental foi apenas “por lançar efluentes diretamente no solo sem tratamento prévio,” enquanto o Relatório de Fiscalização Ambiental – RFA é ainda mais genérico.
No caso dos autos, sequer foram constatados qualquer lançamento efetivo de efluentes, limitando-se a agente de fiscalização, a anexar fotos que não demonstram a existência da conduta imputada, ou inferir em relatório e até no próprio auto de infração ambiental que o local “pode ter sido utilizado” para descarte de resíduos. Ora.
Isso fica evidente na conclusão do Relatório de Fiscalização Ambiental – RFA, no qual a própria agente que lavrou o auto de infração ambiental apenas faz constar que “há indícios” de lançamento de efluentes, senão vejamos:
Durante a inspeção, foi possível constatar que o empreendimento não realiza a correta destinação dos efluentes provenientes da sua atividade. Pois há indícios de que os mesmos continuam sendo lançados diretamente sobre o solo. Sem prévia análise físico – química a fim de avaliar a necessidade de um tratamento mais eficaz antes da destinação final.
Ocorre que, para o Direito Administrativo Sancionador, não basta a mera ocorrência de indícios. Além do mais, o auto de infração ambiental não declinou a motivação e, principalmente, não foi lavrado com base em laudo técnico ou de constatação, sendo requisito necessário para a idoneidade do ato administrativo, conforme preceitua a caracterização da infração prevista no Anexo VI do Decreto 14.024/12.
Não obstante a ausência de descrição clara e objetiva da conduta imputada à Recorrente, inexiste qualquer informação sobre qual e que quantidade de efluente supostamente fora lançado, e muito menos se essa conduta seria capaz de ocasionar danos que ultrapassassem os “padrões de qualidade ambiental”. Desse modo, não há se falar em infração administrativa apta a ensejar sanção.
Importante destacar, que a inspeção, o laudo de constatação e o relatório devem ser elaborados no momento do lançamento de efluentes, não sendo possível presumir que suas proporções tenham atingido níveis em desacordo com os padrões estabelecidos ou que violem os padrões de qualidade ambiental.
Sendo assim, inexistindo prova efetiva de danos ao meio ambiente, mas sim, meras presunções, não se pode falar em fixação de multa ambiental por lançar efluentes diretamente no solo sem tratamento prévio, até porque, o direito administrativo sancionador invariavelmente exige a fundamentação e motivação das penalidades, sobretudo para evitar eventual desvio ou abuso.
À propósito, percebe-se claramente que o direito ao contraditório e à ampla defesa restaram prejudicados, porquanto ausente a indicação conclusiva de que tipo de efluente e em que níveis tais padrões foram desobedecidos, e assim, não há como exercer o pleno direito à defesa se o Recorrente não sabe qual era o padrão que ultrapassou.
Com efeito, a produção de documento técnica que demonstre de forma efetiva que o lançamento de efluentes provocou danos, bem como qual sua dimensão, tem a finalidade de garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa à parte autuada. Isso porque, sem elementos técnicos que demonstrem a ocorrência dos danos e sua dimensão, é inviável a impugnação racional dos fatos que determinam a materialidade da infração e o valor da multa ambiental.
A autuação não produziu nenhum elemento técnico capaz de demonstrar a quantidade de efluente que supostamente foi lançada, nem mesmo por estimativa. Sem informação a respeito da quantidade, não é possível aferir se a conduta imputada está em desacordo com os padrões estabelecidos, e/ou que tornem ou possam tornar ultrapassados os padrões de qualidade ambiental.
Ademais, a ausência de elementos quantitativos inviabiliza o dimensionamento de eventual multa ambiental. Assim, ao deixar de demonstrar os resultados da conduta e de quantificar os danos a partir de elementos técnicos, o auto de infração ambiental violou os princípios do contraditório e da ampla defesa no processo administrativo (art. 5º, LV, CF).