APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME AMBIENTAL – ARTIGO 34 LEI 9.605/98 – PESCA EM ÉPOCA PROIBIDA COM A UTILIZAÇÃO DE PETRECHO NÃO PERMITIDO – AUSÊNCIA DE LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO – CONDUTA DE BAGATELA – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – ATIPICIDADE RECONHECIDA – ABSOLVIÇÃO DECRETADA.
Não viola o bem jurídico tutelado pelo artigo 34 da Lei 9.605/98, que vem a ser o equilíbrio ecológico, não constituindo crime ambiental, a conduta consistente na captura de apenas 2,750 kg de peixe, para consumo pessoal, não se podendo conceber como ofensiva ao meio ambiente e passível de causar desequilíbrio ecológico uma ação dessa natureza, ainda que levada a efeito em período interditado para pesca e com o uso de uma tarrafa.
(TJMG – Apelação Criminal 1.0514.19.000636-1/001, Relator(a): Des.(a) Beatriz Pinheiro Caires , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 08/04/0021, publicação da súmula em 16/04/2021)
RESUMO
Após ser condenado como incurso no crime ambiental previsto no artigo 34, II, da Lei 9.605/98, o acusado interpôs recurso de apelação criminal buscando a reforma da sentença e sua consequente absolvição.
Segundo a acusação, fazendo uso de uma tarrafa com malha 02, petrecho não permitido a pescadores amadores, o acusado realizou, no período de defeso (piracema) a pesca de 2,750 kg (dois quilos e setecentos e cinquenta gramas) de peixes diversos.
O crime ambiental em questão está assim descrito na Lei 9.605/98:
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena – detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem: […]
II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
Em seu recurso de apelação, o acusado alegou a atipicidade de sua conduta, com base na aplicação do chamado princípio da insignificância, e, ainda, ter incidido em erro de proibição, já que não tinha conhecimento de ser aquela época do ano período de defeso.
Ao julgar o recurso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais absolveu o acusado do crime ambiental com base no princípio da insignificância, por entender que a pesca de 2,750 kg de peixe, para consumo pessoal, não se pode ser tida como ofensiva ao meio ambiente e passível de causar desequilíbrio ecológico uma ação dessa natureza.
Leia a ementa e o voto que absolveu o acusado por unanimidade.
V O T O
[…] Examinando atentamente os autos, constato não existir a menor dúvida de que o apelante pescava em época de piracema, período em que os peixes sobem os rios para desovar e, por isso, proibida é a pesca com determinados apetrechos, como é o caso da tarrafa, que somente pode ser utilizada por pescadores profissionais e, mesmo assim, fora do referido período (piracema).
O próprio apelante admitiu a utilização de tarrafa para realizar a pesca dos peixes apreendidos, esclarecendo que pescava para se alimentar.
A confissão do apelante encontra apoio na prova testemunhal, que confirma a realização da pesca, utilizando tarrafa, em período de defeso.
Entendo, contudo, que assiste razão à defesa ao pugnar pela aplicação do chamado princípio da insignificância, que permite desconsiderar-se a tipicidade de fatos que, por sua inexpressividade constituem ações de bagatela e, portanto, sem significado penal, por se revestirem de lesividade mínima.
Doutrina
Em valiosa lição doutrinária sobre o tema, ensina o Ministro Francisco de Assis Toledo [TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos do Direito Penal. 5ª ed., São Paulo, Saraiva, 2000, p. 133]:
Segundo o princípio da insignificância, que se revela por inteiro pela própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas.
No caso em discussão, segundo se constata da prova coletada, o apelante, humilde trabalhador rural, foi surpreendido portando uma tarrafa e apenas 2,750 kg de peixes, pescados para consumo próprio.
Tal conduta não violou o bem jurídico tutelado, que vem a ser o equilíbrio ecológico. O meio ambiente não foi afetado e nem houve tal risco.
Houve a captura de apenas 2,750 quilos peixe, para consumo pessoal, não se podendo conceber como ofensiva ao meio ambiente e passível de causar desequilíbrio ecológico uma ação dessa natureza, ainda que levada a efeito em período interditado para pesca com o uso de tarrafa.
Assim, considerando não ter ocorrido qualquer lesão ao bem jurídico tutelado e entendendo que a criminalização de uma conduta somente se justifica se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico, reconheço a atipicidade do fato, diante da incidência do princípio da insignificância.
Julgando caso semelhante, esta Segunda Câmara Criminal assim se pronunciou:
APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 34 DA LEI 9.605/98. CRIME CONTRA A FAUNA. PESCA EM LOCAL INTERDITADO PELO ÓRGÃO AMBIENTAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ABSOLVIÇÃO.
A pesca artesanal de 13 kg de peixe, de espécie não ameaçada de extinção, em área de proibida, é irrelevante do ponto de vista jurídico-penal, impondo-se a absolvição do acusado por força do princípio da insignificância. Precedentes.
(Apelação Criminal nº 1.0499.07.004705-9/001 – Relator Desembargador Renato Martins Jacob – J. 31/03/2011 – P. 08/04/2011)
Conclusão
Com esses fundamentos, dou provimento ao recurso, para, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal, absolver o réu, deixando de determinar a expedição de alvará de soltura em seu favor, por se encontrar ele em liberdade.