Modelo de Contestação. Ação Civil Pública. Loteamento Clandestino Irregular Ilega. Parcelamento Ilegal do Solo. Advogado. Escritório de Advocacia. Direito Ambiental.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE…
Ação Civil Pública…
REQUERIDO, já qualificado nos autos em epígrafe movidos por Ministério Público de Santa Catarina, vem, por seu advogado, à honrada presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 335 e seguintes do Código de Processo Civil, apresentar CONTESTAÇÃO pelas razões de fato e de direito que passa a expor.
1. DA AÇÃO PROPOSTA
O Ministério Público, após instauração de inquérito civil para apurar irregularidades de suposto loteamento clandestino, ajuizou Tutela Cautelar em Caráter Antecedente em face de (1) Município, (2) Fundação Municipal do Meio Ambiente, e (3) REQUERIDO, requerendo o deferimento de decisão judicial que tivesse o condão de impedir ações que viabilizassem a instalação do referido loteamento, bem como a continuidade de construções totalmente irregulares naquele local.
Alegou que a partir de documentos angariados no Inquérito Civil (IC) e outros apreendidos durante operação realizada pela Polícia Militar Ambiental no local do suposto loteamento, identificou-se a comercialização de frações de terra, detectando-se toda a rede de negociação formada pelos réus particulares, tecendo considerações e juntando aos autos os referidos documentos, inclusive, um Contrato de Compra e Venda de Terreno à Vista em que figuram como Vendedor, o Requerido, e como Comprador.
Ao final, postulou em relação ao Requerido, a fixação de obrigação de não fazer no sentido de estar impedido de praticar quaisquer atos jurídicos que envolvam a área objeto da presente ação sob pena de multa por cada unidade, e ainda, visando a reparação do dano, requereu o bloqueio ou indisponibilidade dos bens móveis, imóveis e ativos financeiros, sendo tais pedidos deferidos parcialmente por este Juízo em sede liminar.
2. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Em que pese o brilhantismo da decisão proferida por Vossa Excelência, que atendeu parcialmente aos pleitos deduzidos na exordial, insta salientar a interposição de Agravo de Instrumento com Pedido de Efeito Suspensivo ante o perigo de dano irreparável e probabilidade do direito, em razão da flagrante ilegitimidade passiva do Requerido, o que será incontestavelmente demonstrado a seguir.
3. PRELIMINARES
3.1. ILEGITIMIDADE PASSIVA
A petição inicial merece preliminarmente ser indeferida em relação ao Requerido, ante sua ilegitimidade passiva, tendo em vista que não causou qualquer dano ao meio ambiente e sequer participa ou participou do suposto loteamento.
É que não há nos autos, qualquer expressão ou prova de que o Requerido tenha concorrido para o suposto loteamento. Ao contrário, há nos autos prova inequívoca de que o Requerido já não era mais o dono da área quando da primeira fiscalização da polícia ambiental, conforme relatório da própria ambiental, que originou o inquérito civil, que, aliás, também não possui qualquer referência ao Requerido.
O Requerido por sua vez, realizou um negócio jurídico válido: a venda de uma área aos fundos do suposto loteamento para terceiro, o qual reconheceu a PMA ser o legítimo proprietário da área.
Outrossim, durante toda a narrativa inicial, o Requerido apenas é citado como mero “lindeiro” do imóvel, sem qualquer outra referência durante toda a exordial ou qualquer outro documento juntado. Nem mesmo é qualificado no preâmbulo da ação, e inexplicavelmente é tido como Requerido ao final.
Com a devida vênia Excelência, até o momento da venda, o imóvel estava preservado. Se houve cometimento de infração, decerto que foi a posteriori da venda, como faz prova as próprias imagens colacionadas à exordial pelo Requerente, restando o Requerido parte ilegítima para responder à presente ação.
Ademais, não consta o nome do Requerido em nenhum auto de infração, investigação (IC) ou até mesmo nos relatórios da polícia ambiental. Resta claro e cristalino que o Requerido não causou qualquer dano ao meio ambiente e muito menos fez parte do aludido.
Nesse diapasão, o art. 3º, IV da Lei 6.938/81[1] aponta que o poluidor, poderá ser a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental, instituindo assim, o princípio do poluidor-pagador, que define de quem é a responsabilidade por reparar os danos causados ao meio ambiente (art. 14, § 1º da Lei 6.938/81[2]), in casu, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.
Ocorre que o Requerido não é e nem nunca foi o poluidor, pois à época da constatação dos fatos, já não era mais o dono do terreno, e por isso, não pode responder pelos danos causados por terceiros ou pelo novo proprietário após a alienação de um bem que um dia foi seu. Assim, não cabe ao Requerido responder pela presente ação, devendo ser declarado parte ilegítima para figurar no presente feito, nos termos do art. 330, II, 337, XI e 485, VI, todos do CPC/2015.
3.2. INÉPCIA DA INICIAL
Não obstante a ilegitimidade passiva do Requerido, cumpre ressaltar antes de discutir o mérito, que a petição inicial é inepta e nesse ponto, também merece ser indeferida, nos termos do art. 330 do CPC, in verbis:
Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:
I – for inepta;
[…]
III – o autor carecer de interesse processual;
§ 1o Considera-se inepta a petição inicial quando:
I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico;
III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.
No caso em tela, a exposição dos fatos não traz em momento nenhum, quais são os supostos danos ou então, qual foi a conduta praticada pelo Requerido no suposto loteamento. Como dito, seu nome aparece uma única vez em toda a inicial, apenas como “lindeiro” do imóvel de… sem ao menos estabelecer sua relação com os demais envolvidos.
Não há qualquer prova ou fato que associe direta ou indiretamente o Requerido ao alegado e demais requeridos, furtando-se da causa de pedir, elemento este essencial da petição inicial, e que deveria constituir os fatos que deram origem a lide, juntamente com os fundamentos jurídicos que demostrassem a violação do direito, justificando a pretensão perante o juízo quanto ao Requerido.
Por derradeiro, não há fatos que fundamentem os pedidos declinados na inicial, em relação ao Requerido, portanto, requer a extinção do feito sem julgamento de mérito, quer por inépcia, quer pela falta de interesse.
4. MÉRITO
4.1. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO REQUERIDO
Cediço que além de objetiva, a responsabilidade pela reparação de danos ambientais adere à propriedade como obrigação propter rem. Tal fato, todavia, não atrai a responsabilidade solidária nem subsidiária do vendedor por infração cometida pelo novo proprietário após a alienação do imóvel.
Pois bem. Como dito, o Requerido não faz e nem nunca fez parte do aludido loteamento, tão pouco se beneficiou com sua implantação ou se beneficiará. Ademais, nunca cometeu nenhuma infração ambiental ou constou como causador de dano ambiental a fim de ser compelido a reparar um dano que não dera causa.
A Constituição Federal de 1988 em seu art. 225, § 3º, é específica quanto a responsabilização do infrator por dano ambiental:
Art. 225. […] § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Note que a Constituição é enfática: “sujeitarão os infratores”. Acontece que o Requerido não é o infrator, aliás, nem dono da área, nem comprador de lotes, tão pouco concorreu para o ensejo da narrativa.
Nesse sentido, a responsabilidade no caso em tela é prevista nos artigos 3º, IV e 14, § 1º da Lei nº 6.938 /81, e determinam quem é o poluidor e a quem cabe a reparação por danos causados ao meio ambiente, in verbis:
Art. 3º – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: […] IV – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;
Art. 14 – Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: […]
§ 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Ocorre que o Requerido não se enquadra em nenhum termo da disposição legal supra. Ademais, vendeu um terreno do qual era possuidor, e a partir daí, cessou totalmente sua responsabilidade sobre o imóvel, passando esta a ser do novo proprietário.
Em que pese a responsabilidade por dano ambiental ser objetiva, solidária e propter rem, faz-se imprescindível, para a configuração do dever de reparar o meio ambiente, a demonstração da existência de nexo de causalidade apto a vincular o resultado lesivo efetivamente verificado ao comportamento daquele a quem se repute a condição de agente causador.
In casu, não há na exordial, nem em qualquer outra folha dos autos, prova qualquer de que o Requerido corroborou para o episódio. Pelo contrário, há nos autos, prova cabal que à época dos fatos já não era mais o possuidor da área.
Em caso análogo, julgado recentemente pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região que discutia a responsabilidade ambiental dos proprietários, que após a alienação do imóvel foram citados em ação civil pública para responder por danos causados pela nova proprietária adquirente, assim ficou decidido:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DOS ANTIGOS PROPRIETÁRIOS. ALIENAÇÃO COMPROVADA. REFORMA DA EDIFICAÇÃO. DEMOLIÇÃO. INDENIZAÇÃO.
A ação foi inicialmente proposta em face de Demivaldo dos Santos e Maria Aparecida Clarindo dos Santos sendo que, após a concessão da liminar em 03/04/2012, o MPF peticionou juntando documentação comprovando que Priscila Ribeiro dos Santos, atual ocupante do lote realizou nova construção no local, impedindo e dificultando a regeneração natural da vegetação nativa do imóvel.
Em face da notícia da alienação do lote à Priscila Ribeiro dos Santos e Luciano Olímpio da Silva, o MPF aditou à inicial para a inclusão destes no polo passivo da ação, o que foi deferido, sendo os novos réus devidamente citados em 25/06/2014, quedando-se inertes, com decreto de revelia.
Foi juntado o contrato de compra e venda do imóvel em questão firmado entre Maria Aparecida Clarindo dos Santos e Luciano Olímpio da Silva, em 08/08/2012 (f. 166), comprovando que à época da citação dos réus Demivaldo dos Santos e Maria Aparecida Clarindo dos Santos, em 2014, os mesmos já não residiam no imóvel não possuindo, portanto, legitimidade passiva ad causam, uma vez que a obrigação de reparar o dano ambiental é propter rem, transmitindo-se ao atual proprietário ou possuidor do imóvel, motivo pelo qual a presente ação em relação à Demivaldo dos Santos e Maria Aparecida Clarindo dos Santos, merecer ser extinta sem exame do mérito, nos termos do art. 485, VI, CPC/2015, sem condenação em honorários advocatícios.
Provimento da apelação de Demivaldo dos Santos e Maria Aparecida Clarindo dos Santos. Provimento parcial da apelação do Ministério Público Federal, da apelação da União e da remessa oficial, tida por submetida.
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC – APELAÇÃO CÍVEL – 2195415 – 0001988-14.2012.4.03.6112, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, julgado em 19/04/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 03/05/2017)
A jurisprudência pátria é pacífica em reconhecer que a responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade, como obrigação propter rem, sendo possível cobrar também do atual proprietário condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos. MAS NÃO O CONTRÁRIO!
Excelência, não pode o antigo proprietário vendedor de imóvel, ser responsabilizado após a alienação do bem, por eventuais danos ao meio ambiente cometidos unicamente pelo comprador e atual proprietário, ainda mais quando esse reconhece perante a autoridade fiscalizadora ser o legítimo proprietário da área, e que a adquiriu com intuito de vê-la valorizar.
4.2. DA ERRÔNEA IDENTIFICAÇÃO DO REQUERIDO
O Requerente alega na exordial, que durante fiscalização da Polícia Militar Ambiental no local, foram apreendidos em posse de terceiro, diversos documentos e contratos originais que possuem por objeto a negociação daquela área. Dentre os referidos documentos, estava o contrato de compra e venda de terreno à vista, em que figuram como Vendedor o Requerido, e como Comprador um terceiro.