A Constituição Federal instituiu um regime de tríplice responsabilização na esfera ambiental, podendo a violação às normas de tutela do meio ambiente gerar, a um só tempo, as responsabilidades penal, administrativa e civil do agente.
Dada a complexidade, é muito comum que se confunda responsabilidade civil com responsabilidade administrativa e penal ambiental, bem como os seus reflexos e consequências para condutas contrárias à legislação ambiental.
Pois bem. A responsabilidade civil possui natureza reparatória, e por isso é objetiva, enquanto a responsabilidade administrativa e penal é sancionatória, razão pela qual é subjetiva, exigindo para a sua configuração uma conduta, um dano, o nexo de causalidade e o elemento subjetivo (culpa ou dolo).
É o que se depreende da jurisprudência do STJ, senão veja-se:
“[…] como regra a responsabilidade administrativa ambiental apresenta caráter subjetivo, exigindo-se dolo ou culpa para sua configuração. Precedentes: REsp 1.640.243 Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 24/4/2017; AgRg no AREsp 62.584/RJ, Rel.Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ acórdão Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 7/10/2015; REsp 1.251.697/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 17/4/2012″.
Logo, a questão acerca da natureza das responsabilidades civil, administrativa e penal no campo ambiental é matéria pacificada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual:
“A aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano”.
A responsabilidade administrativa e penal ambiental é de natureza subjetiva. Não demonstrado o nexo causal entre a conduta e o dano, não há como responsabilizar o indivíduo, até porque, o mero descumprimento de norma sancionadora não configura dano ambiental presumido.
Diferentemente é a responsabilidade civil, que é de natureza objetiva, informada pela teoria do risco integral. Contudo, ainda assim, é necessário observar os requisitos mínimos para sua aplicação, quais sejam: existência de um dano; ação ou omissão; e, ocorrência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão.
Com efeito, a responsabilidade civil objetiva por dano ambiental não exclui a comprovação da efetiva ocorrência de dano e do nexo de causalidade com a conduta do indivíduo, pois estes são elementos essenciais ao reconhecimento do direito de reparação.
Feitas as devidas diferenciações, é de se concluir que uma pessoa que viola a legislação ambiental está sujeita à tríplice responsabilidade, isto é, responder a uma ação civil de reparação do dano ambiental, bem como a um processo administrativo e criminal, ao mesmo tempo e de forma independente.
Índice
Responsabilidade Civil Ambiental
Como salientado, a responsabilidade civil por dano ambiental, embora seja objetiva e informada pelo teoria do risco, não exclui a comprovação da efetiva ocorrência de dano e do nexo de causalidade com a conduta do indivíduo, pois estes são elementos essenciais ao reconhecimento do direito de reparação.
Dito de outra forma, para a configuração da responsabilidade civil em Direito Ambiental se faz necessária a comprovação do dano e do nexo causal com a conduta praticada, não persistindo qualquer pretensão de responsabilização em casos de ausência de um dos elementos.
Assim, ainda que se admita a sistemática da responsabilidade objetiva por danos ambientais, isso não quer dizer que deva essa responsabilidade ser automática e desprovida da demonstração do dano e do nexo de causalidade.
A maioria das ações civis públicas propostas sob a alegação de dano ambiental são deveras desarrozoadas ao fazer crer a ocorrência de um dano ambiental presumido, sem qualquer demonstração dos requisitos necessários, o que impõe ao advogado um olhar atento a cada linha descrita na ação civil pública ambiental.
Cabe ao operador do direito, não só o advogado, mas também ao magistrado, analisar se as alegações do autor da ação civil pública ambiental possuem ou não embasamento fático e probatório que comprovem que o réu tenha efetivamente ocasionado o dano ambiental alegado, bem como se foi demonstrado o nexo de causalidade entre o dano e possível conduta do réu, sem a qual inviável a procedência do pedido.
A obrigação de reparar o dano ambiental acompanha a coisa e pode ser exigida do sucessor, proprietário ou quem detém a posse, a qualquer título, por se tratar de responsabilidade civil ambiental objetiva.
Finalizando este tópico, vale lembrar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 999, fixou a Tese de que “É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental”, ou seja, na esfera cível, não há prazo nem prescrição para ajuizar ação que visa a reparação por dano ambiental.
Responsabilidade Administrativa Ambiental
A responsabilidade por infração ambiental de natureza administrativa é subjetiva, de modo que o auto de infração ambiental somente pode ser lavrado contra a pessoa que cometeu a infração.
Contudo, não basta atribuir ao autuado a responsabilidade pela imputação da infração lavrada, sem sequer investigar se houve por parte dele o cometimento de alguma conduta contrária à ordem jurídica.
Aliás, são comuns autos de infração ambiental lavrados “às cegas”, apenas com base em presunções de autoria e materialidade, o que torna insubsistente o auto de infração por ausência de preenchimento dos requisitos da responsabilidade administrativa ambiental.
Portanto, a responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva, ou seja, a condenação administrativa por infração ambiental exige demonstração de que a conduta tenha sido cometida pelo transgressor, além da prova do nexo causal entre a conduta e o dano.
Vale lembrar que, ao contrário da responsabilidade civil ambiental, a pretensão punitiva administrativa, além de ser subjetiva, está sujeita a prazo prescricional, já que se trata da aplicação de penalidade em face do cometimento de uma conduta.
Embora o auto de infração seja ato administrativo que goza de presunção de veracidade e legitimidade, certo é que tal presunção é relativa e admite prova em sentido contrário.
Na responsabilidade administrativa, o ônus da prova do nexo de causalidade incumbe ao Estado, na pessoa da autoridade competente para fiscalização e autuação.
Assim, para que haja responsabilização administrativa em matéria ambiental, necessário que se façam presentes: conduta, dano, nexo de causalidade e elemento subjetivo (culpa ou dolo).
Responsabilidade Penal ou Criminal Ambiental
O ordenamento jurídico brasileiro veda a responsabilização penal objetiva, bem como a responsabilização penal por fato de terceiro.
Assim, para que uma pessoa seja condenada e lhe seja aplicada uma pena por crime ambiental (responsabilidade penal ambiental), deve restar comprovado que ela agiu dolosamente ou ao menos culposamente.
Significa dizer que uma pessoa só poderá ser responsabilizado por um crime, diferente da responsabilidade civil, quando ficar comprovado o seu agir de forma dolosa, isto é, consciente e voluntariamente, ou ao menos com culpa, se o tipo penal atribuído se amoldar à modalidade culposa.
Contudo, a omissão, segundo dispõe o art. 13, § 2º, do Código Penal, só é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado.
Assim, os crimes comissivos só poderão ser praticados via omissão imprópria quando presente o binômio poder-dever, ou seja, somente quando o agente for garantidor e podia agir para evitar o resultado penalmente relevante.
Ainda de acordo com o art. 13, do Código Penal, o dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; ou c) com o seu comportamento anterior, criou o risco de ocorrência do resultado.
Da mesma forma que a responsabilidade administrativa ambiental, a responsabilidade penal ou criminal está sujeita aos prazos prescricionais elencados no art. 109 do Código Penal, ou seja, crime ambiental prescreve.
Conclusão
A responsabilidade pelo dano ambiental, na seara cível, é de natureza objetiva (teoria do risco integral), solidária (obrigação propter rem) e ilimitada, sendo regida pelos princípios poluidor-pagador, da reparação integral, da prioridade da reparação in natura e do favor debilis.
Já a responsabilidade administrativa que enseja a imposição de sanção ao infrator (e não a obrigação de recuperação ambiental) é de cunho subjetivo, sendo necessária a aferição da autoria da degradação ambiental e existência de culpa ou dolo.
Da mesma forma é a responsabilidade ambiental penal ou criminal, que é subjetiva e exige que a conduta se amolde ao tipo penal bem como que a ação ou omissão seja penalmente relevante para infringir o tipo penal e causar a dano ambiental, conforme prevê o art. 13 do Código Penal.
Não é demais repetir que a lógica da responsabilidade civil (objetiva) por dano ao meio ambiente não pode ser aplicada quando a questão versar sobre responsabilidade administrativa (subjetiva) por infração ambiental, tampouco à responsabilidade penal ambiental.
Deriva disso que é possível ter, ao mesmo tempo, uma responsabilidade penal, uma responsabilidade administrativa e uma responsabilidade civil em decorrência da violação de obrigações ligadas à tutela do meio ambiente.
Portanto, na esfera civil o causador do dano pode responder a uma ação de reparação se da conduta resultou um dano a ser reparado; na esfera administrativa responderá a um processo administrativo, se a conduta estiver descrita como uma infração ambiental; e, uma ação penal se a conduta configurar crime ambiental.
Isso é a tríplice responsabilização ambiental que advém da Constituição Federal de 1988, prevendo expressamente a possibilidade de o causador do dano ambiental responder cível, administrativa e penalmente (art. 225, § 3º), porém cada uma delas possui seus próprios pressupostos e requisitos.