Excelentíssimo Doutor Juiz De Direito Da Vara Da Fazenda Pública da Subseção Judiciária de
Parte autora, brasileiro (a), estado civil, profissão, inscrito (a) no RG sob o n… e CPF…, residente e domiciliado (a) na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, vem, por seus advogados, à presença de Vossa Excelência, propor ação anulatória de auto de infração ambiental com pedido de antecipação de tutela urgência contra Parte ré, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ n…, com sede na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
1. Da síntese dos fatos
O Autor é proprietário e possuidor de lotes de terrenos denominados, respectivamente, n° XXX e n° XXX, na XXX, registrados junto ao 1° Cartório de Registro de Imóveis e Anexos de XXX, Estado de XXX, perante as matriculas XXX e XXX.
No dia XXX, ao proceder à limpeza dos lotes, nos termos da legislação municipal, foi surpreendido pela fiscalização da Policia Militar Ambiental, que lavrou Auto de Infração Ambiental de n° XXX, “por destruir XXX ha de vegetação nativa estágio avançado, mediante desmatamento em área objeto de especial preservação, sem autorização ou licença da autoridade ambiental competente, incorrendo no disposto do art. 49 da Resolução SMA 32/2010”.
O autor promoveu a limpeza nos lotes como havia feito em outras oportunidades, tendo em vista que recebeu, em XXX, notificação da Prefeitura Municipal de XXX nesse sentido, através da Divisão de Fiscalização da Secretaria de Planejamento.
A NOTIFICAÇÃO XXX e XXX, respectivamente, expressa que os terrenos encontravam-se “com mato desprovido de limpeza, desrespeitando a legislação Vigente, infringindo o disposto no artigo 1° da Lei municipal 4458/99”.
A pseudo infração gerou multa de R$ 00.000,00 e a apreensão dos materiais, sob fundamento de aplicação ao disposto no art. 5°, II, IV, VII, cc art. 9° da Resolução SMA 32/2010.
Verifica-se da decisão exarada, que o órgão julgador não apreciou integralmente as alegações do recorrente, notadamente ao que se refere à inaplicabilidade da Lei 13.550/2009, tendo em vista a existência de loteamento urbano, aprovado anteriormente à vigência do citado diploma legal e que os mesmos não se encontram em quaisquer das possibilidades de proteção ambiental a limitar a supressão de vegetação, para o uso da propriedade segundo a destinação urbana, permitindo a edificação imobiliária.
2. Do mérito
A Constituição Federal de 1988 elenca dentre seus princípios a proteção ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito como corolário da segurança jurídica. É o preceito do art. 5°.
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
(…)”
É o princípio pelo qual lei nova não deve abranger as situações jurídicas disciplinadas pela lei antiga. Em outras palavras, é a não- incidência ou a não-aplicabilidade da lei nova a fatos anteriores à sua própria vigência. Parece-nos até mesmo uma questão de lógica.
A lei entrando em vigor em uma determinada data somente deverá aplicar-se daí para o futuro. Atuar para o passado, em tese, seria instabilizar o ordenamento social, em geral, e as relações jurídicas, em particular.
No presente caso, não há que se falar em possibilidade de retroatividade da lei ambiental n° 13.550/09, do Estado de São Paulo, primeiramente porque é mais gravosa, impossibilitando o exercício pleno do direito de propriedade e, não bastasse, porque o loteamento em questão não se encontra em Área de Conservação Ambiental (Área de Preservação Permanente e Área de Proteção Ambiental), a permitir a interpretação dada pela Policia Ambiental.
Assim, não se pode pretender a retroação da norma sob o argumento de preservação de meio ambiente saudável às futuras gerações.
2.1 Do loteamento urbano
Os lotes de terreno objeto da autuação pela Policia Ambiental encontram-se inseridos no loteamento denominado “Vila”, que teve sua inscrição junto ao 1°. Cartório de Registro de Imóveis, no dia XXX, após a devida aprovação pela Prefeitura Municipal de Bauru, na forma da legislação vigente à época.
O registro do referido loteamento, no qual estão contempladas áreas institucionais, inclusive áreas verdes, de acordo às exigências da legislação vigente à época, criou em favor dos adquirentes dos respectivos lotes o direito de lhes dar a destinação legal, qual seja, a construção de edificações, o que, por óbvio, implica na supressão da vegetação existente.
Ainda que assim não o fosse, o loteamento está situado no perímetro urbano do município de Bauru, e, relevante anotar que, em se tratando de região urbana há muito tempo ocupada e não situada em Área de Preservação Permanente – APP, ou em unidade de conservação (APA), nada impede a supressão da vegetação existente, para que seja dada aos lotes a sua destinação originária, que é a ocupação imobiliária.
Cumpre ressaltar, ainda, que apenas parte das disposições do Código Florestal, que entrou em vigor muito depois da aprovação e registro do loteamento denominado “Vila”, é aplicável às áreas urbanas, as designadas como “áreas de preservação permanente”, localizadas às margens dos rios, lagos, nascentes, curso d’águas, e outras especificadas no art. 2°, “caput”, da Lei n°. 4.771/65, com a redação dada pela Lei n° 7.803/89.
E, mais. Flagrante é o interesse municipal, tendo em vista que no dia XXX a Prefeitura Municipal de XXX notificou o autor, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento, procedesse a limpeza dos lotes em discussão, pois os mesmos encontravam-se “com mato desprovido de limpeza”, desrespeitando a legislação vigente, infringindo o disposto na lei municipal 4.458/99.
A retirada de resíduos da limpeza de mato e entulhos dos lotes é ordem completamente antagônica à de proibição de supressão a vegetação emanada da autoridade, que ora se pretende anular.
Neste contexto, como ao tempo da instituição, aprovação e registro do loteamento denominado Vila foi observada a legislação vigente (Decreto-lei n°. 58/37), o qual não impunha limites legais de reserva florestal, a exigência do autuante, ainda que sustentada em legislação superveniente, não autoriza a imposição de novas regras, quer ao loteador, quer aos adquirentes dos lotes, e viola o direito adquirido e o ato jurídico perfeito e acabado, insculpido no art. 5°, XXXVI, da Constituição Federal de 1988.
Convém esclarecer que em se tratando de loteamento em área urbana, deverão ser observadas a legislação de parcelamento do solo urbano e os planos diretos de cada município à época de sua implantação, não sendo de se aplicar a legislação invocada pela autoridade recorrida, incluindo o próprio Código Florestal, mesmo porque, dispõe a Constituição Federal em seu artigo 30, inciso VIII, que compete aos Municípios, “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”.
Nesse passo, no que tange à alegação de ausência de autorização para a supressão da vegetação nativa dos lotes, constata-se que essa autorização, no presente caso é descabida, haja vista o fato de se tratar de loteamento urbano já aberto, devidamente aprovado pela Prefeitura Municipal de XXX e registrado no competente Oficial de Registro de Imóveis, e que foram reservadas as áreas verdes e institucionais que se mostravam necessárias à época da instituição do empreendimento, não sendo crível exigir-se, por consequência, a manutenção da vegetação nativa de cerrado, sob pena de flagrante violação ao direito adquirido e certo dos proprietários, o que não se admite por força do disposto no artigo 5°, inciso XXXVI da Constituição Federal.
No que concerne à norma arguida, salienta-se que a mesma deve ser relativizada, uma vez que não há como negar que o loteamento foi instituído, aprovado e registrado, bem como que passou a integrar a zona urbana de XXX, ainda sob a égide do Decreto Lei n°. 58/37, anterior à promulgação da Lei Estadual n° 13.550/2009 e da Resolução da SMA 32/2010, que estabeleceram a necessidade de preservação de vegetação nativa em áreas urbanas, incluindo o bioma do cerrado.
Nessa senda, estando devidamente registrado o referido loteamento, e tendo obedecido aos ditames legais vigentes à época, segundo os quais não havia qualquer imposição de limites legais de reserva de mata nativa, incluindo o cerrado, vislumbra-se devidamente configurado o direito adquirido do proprietário e o ato jurídico perfeito, que não podem ser atingidos ou modificados por legislador posterior, sob pena de infringência da vedação constitucional preceituada no dispositivo acima citado.
No que tange à necessidade de preservação ambiental, cumpre salientar que só pode o interesse público se sobrepor ao particular se houver essencial, indispensável e necessária comprovação da ocorrência de ato prejudicial ao meio ambiente, o que não se vislumbra no presente caso, haja vista que não consta do procedimento administrativo prova de real prejuízo ambiental, o qual resulta apenas presumido, mormente porque a área não se encontra em “APP” ou “APA”.
Além disso, a exemplo do que ocorre com as chamadas reservas legais cuja finalidade, nos imóveis (não loteados) em que há floresta nativa preservada, é garantir a inalterabilidade de parte desse maciço florestal, como um banco genético, e nos imóveis em que não há vegetação natural significativa, a finalidade é criar um espaço imune de atividade rural ou qualquer outra forma de exploração comercial, para que ocorra a regeneração natural ou provocada de um maciço florestal, inclusive para fins de formação ou preservação de corredor de fauna silvestre, a preservação do bioma do cerrado deve ter a mesma finalidade, o que não se verifica plausível na esfera do meio ambiente urbano, haja vista as barreiras artificiais inerentes ao modelo urbanístico adotado pela legislação de regência.
A área em questão é densamente urbanizada com restaurantes, posto de gasolina, academia, Cursos de Especialização e Preparatórios para concursos públicos “Nome”, prédios de apartamentos e residências horizontais.
Logo, essa restrição administrativa, em termos de propriedade urbana já loteada, salvo em casos especiais, não tem como atender a finalidade para a qual foi criada, servindo de banco genético e corredor de fauna silvestre, além de outras particularidades de caráter científico, restando, portanto, arbitrária.
3. Da nulidade do ato administrativo
Segundo o ordenamento jurídico brasileiro, um ato administrativo deve ser estruturado em observância aos seguintes requisitos: competência, finalidade, forma, motivo e objeto, sob pena de ter sua validade afetada e de ser declarado nulo.
Seguindo mesma linha de raciocínio, faz-se necessário lembrar que as sanções administrativas, originadas do poder de polícia e do seu caráter de auto-executoriedade, como são as sanções administrativas ambientais devem estar expressamente previstas em lei, uma vez que ao administrador só é possível realizar o que estiver estritamente expresso no instrumento legislativo, sob pena de recair em desvio do poder e desde que, obviamente a subsunção da norma ao fato esteja correta.
Concluindo, torna-se cristalino que o auto de infração combatido é nulo por estar contaminado por vício insanável, vez que a descrição dos fatos não correspondem com aquilo que expressamente dispõe a lei, que deve ser desfeito inaudita altera pars por esse R. juízo.
4. Concessão de tutela antecipada para suspensão do embargo sobre os lotes de terreno e exigibilidade da multa imposta
Notória a valorização econômica de áreas urbanas em função do interesse da população na aquisição da casa própria e de empresários à realização de empreendimentos comerciais. Nesse sentido, necessário se faz aproveitar o momento oportuno à realização de empreendimento que tenha absorção pela comunidade interessada.
O autor pretende a construção de empreendimento habitacional nos terrenos objeto da constrição e se vê impossibilitado ante o embargo promovido pelo auto de infração ambiental n° XXX, que ora se pretende desconstituir.
Dessa forma, a concessão de tutela antecipada ou liminar para a supressão do embargo que recai sobre as áreas objeto do auto de infração, sem se ouvir a parte contrária previamente, é medida que implica imperiosa.
O que se vislumbra no presente caso é a autuação em flagrante arbítrio conforme demonstram os documentos apresentados pelo autor.
O que temos é a adequação da tutela inibitória, não aquela processual, descrita nos art. 461 e 84 do Código de Defesa do Consumidor, mas a que promove uma elaboração dogmática criativa e impulsionada por uma postura crítica diante da necessidade de conferir tutela adequada às novas situações jurídicas, e no presente caso, de relevância do fundamento jurídico invocado e de justificado receio de ineficácia do provimento final, que levando-se em consideração as particularidades do caso não podem ser amparadas pela velha formula do equivalente pecuniário. Frise-se que contra o Estado essa reparação pecuniária decorre de precatório e todos sabem o que acontecem a eles.
Os doutrinadores entendem que para o exame da tutela jurisdicional antecipatória tem-se que analisar a presença da verossimilhança do direito invocado, cumulado com a possibilidade da ocorrência de dano de difícil reparação, a ser analisado em cognição sumária.
KAZUO WATANABE, in RT 1987 “Da Cognição no Processo Civil”, assevera que:
“…. a cognição sumária constitui uma técnica processual relevantíssima para a concepção de um processo que tenha plena e total aderência à realidade sócio-jurídica a que se destina, cumprindo sua primordial vocação que é a de servir de instrumento à efetiva realização dos direitos.”
O Código de Processo Civil, alterado pela Lei Federal 8.952/94, em seu artigo 273, caput , determina:
“O Juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e …”
Assim, referido artigo nos dá elementos do processo cautelar, e exige ainda semelhança com a verdade -“verossimilhança”.
LUIZ GUILHERME MARINONI, sobre o tema antecipação de tutela nos ensina que:
“A antecipação fundada no art. 273, inciso I, pode ser concedida antes de produzidas as provas tendentes à demonstração dos fatos constitutivos do direito, o que não acontece no caso do mandado de segurança. A antecipação é fundada na probabilidade de que o direito afirmado, mas ainda não provado, será demonstrado e declarado.
….” 2
Salta aos olhos que estão presentes, analisando pela doutrina e jurisprudência que os requisitos necessários à tutela antecipada, à admissão do pleito provisório.