A Área de Preservação Permanente – APP pode ser incluída no cálculo da de Reserva Legal – RL exigida em imóveis rurais, desde que o proprietário atenda a certas condições do Código Florestal.
O Novo Código Florestal (Lei Federal 12.651/12) trouxe relevantes alterações à lei florestal anterior (Lei 4.771/65), das quais se destacam o tratamento da Reserva Legal e a admissibilidade do cômputo das Áreas de Preservação Permanente – APPs no cálculo do percentual da Reserva Legal do imóvel rural.
A Reserva Legal é uma área no imóvel rural que deve ser mantida com cobertura vegetal e pode corresponder a 20% a 80% da área do imóvel, dependendo da região do país.
Por sua vez, as Áreas de Preservação Permanente – APPs são áreas de preservação que exigem a manutenção da vegetação e têm funções específicas, como proteger os recursos hídricos, regular o uso do solo, bem como abrigar e proteger a fauna e flora nativas.
Embora ambas as áreas tenham importância para a conservação da biodiversidade, o Código Florestal de 2012 autoriza que as APPs sejam utilizadas no cômputo da Reserva Legal.
Índice
Diferença entre APP e Reserva Legal
Segundo o art. 3º, inciso II, do Código Florestal (Lei Federal 12.651/2012), a Área de Preservação Permanente – conhecida como “APP” – é aquela:
II – Área de Preservação Permanente – APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
As APPs não podem ser exploradas economicamente, sendo permitido apenas o acesso de pessoas e animais para obtenção de água e atividades de baixo impacto ambiental, utilidade pública ou interesse social.
Já o conceito de Reserva Legal está previsto no inciso III da mesma Lei, podendo ela, ao contrário das APPs, ser objeto de compensação, regeneração, recomposição, servidão ambiental, entre outras modalidades para cumprimento da legislação:
III – Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;
A Reserva Legal nada mais é que uma área em imóvel rural que deve ser conservada com cobertura de vegetação devendo respeitar percentuais mínimos em relação à área do imóvel, que variam de acordo com a localização do imóvel, sendo 80% na Amazônia Legal, 35% no cerrado e 20% em áreas de campos gerais, e 20% nas demais regiões do país.
Tanto a APP como a Reserva Legal decorrem de imposição legal que restringem o exercício do direito de propriedade para o interesse da coletividade e obrigam o proprietário do imóvel rural a manter esses espaços protegidos e declarados no Cadastro Rural Ambiental – CAR.
Imóvel rural é obrigado a manter área de Reserva Legal
No que tange à obrigatoriedade de registro da área de reserva legal, vale rememorar o que dispunha o revogado Código Florestal de 1965 (Lei Federal 4.771/65):
Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo:
I – oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal;
II – trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7º deste artigo;
III – vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País;
IV – vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País. […]
Por sua vez, o Código Florestal de 2012 que revogou o acima mencionado (Lei 12.651/12) manteve a obrigação de preservação da área de reserva legal:
Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:
I – localizado na Amazônia Legal:
- 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;
- 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;
- 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;
II – localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento). […]
Portanto, de acordo com o Código Florestal de 2012, a manutenção da área de Reserva Legal em imóveis rurais é obrigatória. Isso significa que o proprietário ou possuidor do imóvel rural, seja pessoa física ou jurídica, deve conservar a cobertura vegetal nativa em uma determinada área, que é estabelecida com base nas dimensões do imóvel.
Previsão legal para computar APP como Reserva Legal
Com visto, as Áreas de Preservação Permanente – APPs são zonas específicas nas quais se exige a manutenção da vegetação, como restingas, manguezais e margens de cursos d’água, não sendo permitida sua exploração, exceto em hipóteses específicas como visto anteriormente.
Por sua vez, a Reserva Legal é um percentual de vegetação nativa a ser mantido no imóvel rural que pode chegar a 80% a depender da sua localização, sendo permitida o seu manejo sustentável desde que adotadas práticas de exploração seletiva de manejo sustentável.
Contudo, o Código Florestal de 2012 autoriza expressamente o uso das APPs para regularizar o passivo de Reserva Legal, conforme previsto no artigo 15:
Art. 15. Será admitido o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da Reserva Legal do imóvel, desde que:
I – o benefício previsto neste artigo não implique a conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo;
II – a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação, conforme comprovação do proprietário ao órgão estadual integrante do Sisnama; e
III – o proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro Ambiental Rural – CAR, nos termos desta Lei.
Em outras palavras, o proprietário de um imóvel rural pode usar a Área de Preservação Permanente – APP existente no seu imóvel para complementar a área de Reserva Legal e assim atingir os percentuais exigidos pela legislação.
Constitucionalidade da inclusão da APP na Reserva Legal
Embora a fixação da Reserva Legal deva ser realizada sem prejuízo das áreas de preservação permanente – APP, o Código Florestal de 2012 autoriza que estas sejam usadas no computo daquelas, porque a incidência cumulativa de ambos os institutos em uma mesma propriedade poderia aniquilar substancialmente a sua utilização produtiva.
O cômputo das Áreas de Preservação Permanente – APPs no percentual de Reserva Legal conforme prevê o artigo 15 acima mencionado é legalmente autorizado pelo Código Florestal que, inclusive, teve a sua constitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal – STF quando do julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADI 4901, 4902, e 4903.
De acordo com o STF, o art. 225, § 1º, III, da Constituição, dispõe que cabe ao Poder Público fixar os percentuais de proteção que atendem da melhor forma os valores constitucionais atingidos, inclusive o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB) e o direito de propriedade (art. 5º, XXII, da CRFB).
Sendo assim, impedir o cômputo das áreas de preservação permanente no cálculo da extensão da Reserva Legal equivale, no entendimento correto do STF, a tolher a prerrogativa da lei de fixar os percentuais de proteção que atendem da melhor forma os valores constitucionais atingidos, razão pela qual o artigo 15 do Código Florestal foi declarado constitucional durante o julgamento das ADIs 4901, 4902, e 4903.
Conclusão
Assim, conclui-se que o cômputo de área de preservação permanente – APP para complementar área de Reserva Legal de imóveis rurais é possível e legalmente permitido pelo artigo 15 do Código Florestal de 2012, desde que atendidos os requisitos legais.
Entre tais requisitos, é necessário que o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da Reserva Legal do imóvel não implique na conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo.
Também é requisito que a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação, conforme comprovação do proprietário ao órgão estadual integrante do Sisnama e que o proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro Ambiental Rural – CAR.
A inclusão das áreas de preservação permanente no cômputo da reserva legal traz aspectos positivos ao produtor rural, dentre eles a possibilidade de utilizar o imóvel de forma produtiva sem tolher o seu direito à propriedade (art. 5º, XXII, da CRFB).
Portanto, o art. 15 da Lei Federal 12.651/12, mais conhecido como Código Florestal de 2012, autoriza o cômputo de área de preservação permanente no percentual da área de reserva legal, desde que preenchidos os requisitos legais.
2 Comentários. Deixe novo
Caríssimos, parabéns pelo excelente artigo, sempre muito assertivo e esclarecedor.
Apenas um questionamento, qual o seu entendimento referente a inclusão da APP para regularização de Reserva Legal, em imóveis que sofreram corte raso posterior ao marco temporal do código florestal?
É possível, desde que preenchidos os requisitos do artigo 15 do Código Florestal de 2012.