Índice
1. Infração ambiental
A Lei Federal 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, embora conhecida popular e imprecisamente por Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente, trata de maneira simultânea e em partes diferentes do seu texto, de infrações penais e infrações administrativas.
E dizera a lei de crimes ambientais não é exclusivamente penal, aplicando-se, sobretudo, os Capítulos I, II e III à responsabilização administrativa, no que for compatível.
No campo das infrações administrativas, o legislador apenas estabeleceu condutas genéricas consideradas ilegais, bem como o rol e limites das sanções previstas, de modo que, a especificação de cada infração administrativa foi regulamentada pelo Decreto 6.514 de 22 de julho de 2008.
De forma legalmente adequada, embora genérica, o art. 70 da Lei 9.605/98 prevê, como infração administrativa ambiental:
“toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”.
É o que basta para, com a complementação do Decreto 6.514/08 cumprir o princípio da legalidade, que, no Direito Administrativo, não pode ser interpretado mais rigorosamente que no Direito Penal, campo em que se admitem tipos abertos e até em branco.
As infrações ambientais podem resultar em sanções administrativas, que como a própria expressão já indica, devem ser impostas pela Administração Pública.
Essas sanções são autônomas e distintas das sanções criminais cominadas à mesma conduta, estando respaldada no poder de polícia ambiental.
2. Poder de Polícia Ambiental
A Constituição Federal de 1988 prevê que as condutas e as atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
E ainda, impõe ao Poder Público a obrigação de defender e preservar o meio ambiente, por meio de ações preventivas ou por ações repressivas (multa administrativa, embargos, apreensão, etc.).
Desse modo, o poder de polícia ambiental pode e deve ser exercido por todos os entes da Federação, pois se trata de competência comum, prevista na Constituição Federal.
Em outras palavras, a fiscalização das atividades nocivas ao meio ambiente concede aos agentes ambientais federal, estadual ou municipal designados para essa atividade, interesse jurídico suficiente para exercer seu poder de polícia administrativa.
O poder de polícia pode ser exercido por agentes ambientais ainda que o bem esteja situado em área cuja competência seja de um município, estado ou da União.
No entanto, cumpre destacar que a Lei Complementar 140/2011 ─ onde definidas legalmente a atuação supletiva e subsidiária dos entes federativos ─, legitimou o exercício do poder de polícia ambiental por qualquer dos entes federativos com atribuição comum de fiscalização.
No entanto, forneceu solução para eventual sobreposição de autuações, ou seja, a prevalência do auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização.
É preciso lembrar que os autos de infração lavrados por fiscais competentes para o exercício da função gozam da presunção de veracidade e legitimidade.
Isso significa que, a desconstituição do auto de infração ambiental exige, do suposto infrator, a apresentação de substanciosos elementos de prova capazes de afastar a presunção gerada pelo documento público.
Contudo, o poder de polícia não subtrai ao agente autuante, a atribuição, o dever correlato de cumprimento, em sua plenitude, da legislação de regência, sobretudo, no preenchimento dos requisitos para lavrar o auto de infração, como veremos detalhadamente mais adiante.
3. O que é auto de infração ambiental
O auto de infração ambiental está previsto nos artigos 70 a 76 da Lei Federal 9.605/98.
Pode ser lavrado por agentes ambientais designados para atividades de fiscalização, contra pessoas físicas ou jurídicas, que, por meio de uma ação ou omissão, violem as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
Trata-se de um documento público formal, atualmente lavrado por meio eletrônico, e devem constar no auto de infração ambiental os seguintes pontos:
- identificação do autuado;
- descrição da infração administrativa constatada;
- indicação dos dispositivos legais e regulamentares infringidos;
- imposição de sanções e a aplicação de medidas administrativas cautelares, tais como advertência, multa simples, multa diária, apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora e demais produtos e subprodutos objeto da infração, instrumentos, petrechos, equipamentos, veículos e embarcações de qualquer natureza utilizados na infração; destruição ou inutilização do produto ou bem;
- suspensão de venda e fabricação do produto; embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas;
- demolição de obra;
- suspensão parcial ou total das atividades, e,
- restritiva de direitos.
É o auto de infração que inaugura o processo administrativo destinado à apuração da infração ambiental, assegurado o direito ao contraditório e ampla defesa.
Nesse momento, o autuado pode pagar a multa, oferecer defesa ou, requerer a conversão da multa em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, esta, quando cabível, pois nem todas as infrações administrativas são passíveis de conversão.
Dois pontos merecem destaque:
- A ocorrência de dano ambiental não é exigida para a lavratura do auto de infração ambiental, bastando que o infrator, por ação ou omissão infrinja a legislação ambiental.
- Uma cópia do auto de infração, acompanhado de toda documentação pertinente, inclusive, com o histórico de infrações do autuado é encaminhada para o Ministério Público apurar eventual crime ambiental e/ou ilícito civil.
4. Requisitos do auto de infração ambiental
O auto de infração ambiental deve conter os requisitos mínimos de validade, tais como:
- ser lavrado em formulário próprio;
- com a identificação do autuado;
- a descrição clara e objetiva das infrações administrativas constatadas;
- a indicação dos dispositivos legais e regulamentares infringidos; e
- não deve conter emendas ou rasuras que comprometam sua validade.
Também deve conter a descrição das circunstâncias que levaram à constatação da infração ambiental e à identificação da autoria, que se baseia na demonstração da relação da infração administrativa com a conduta do autuado, comissiva ou omissiva, e o seu elemento subjetivo.
Além disso, deve conter o registro da situação por fotografias, vídeos, mapas, termos de declaração ou outros meios de prova, os critérios utilizados para fixação da multa, a identificação do dano ambiental e dos responsáveis pela reparação.
Também deve constar quaisquer outras informações consideradas relevantes para a caracterização da responsabilidade administrativa, a qual veremos adiante, é subjetiva.
Especificamente no caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente ambiental autuante deve colher todas as provas possíveis de autoria e materialidade no ato da fiscalização.
Deve ainda, especificar a extensão do dano, podendo se apoiar em documentos, fotos e dados de localização, incluindo as coordenadas geográficas da área para posterior georreferenciamento.
Mas nem sempre é possível ao agente ambiental colher todos os dados necessários à lavratura do auto de infração em campo.
Desse modo, o auto pode ser complementado a posteriori, desde que não implique modificação do fato descrito no documento de autuação.
O preenchimento dos requisitos para lavrar o auto de infração é fundamental, porquanto deve ser assegurado ao infrator ambiental o devido processo legal, com direito ao contraditório e à ampla defesa.
A defesa pode e deve ser exercida com todos os meios e recursos a ela inerentes, conforme expressamente previsto na Constituição Federal, na Lei 9.605/98 (artigo 70, parágrafo 4º) e Lei 9.784/99 (artigo 2º).
Cumpre destacar que, a descrição que omite informações importantes para o pleno exercício do direito de defesa é considerada vício formal e insanável que conduz à nulidade do auto.
5. Competência para lavrar o auto de infração ambiental
As autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo são os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA.
Contudo, referidas autoridades devem ser designadas para as atividades de fiscalização por ato normativo ou portaria.
É o caso dos analistas e técnicos ambientais de que trata a Lei 10.410/02, norma especial que cria e disciplina a carreira de especialista em meio ambiente, dos quadros do Ministério do Meio Ambiente, do IBAMA e do ICMBio.
Referida norma atribuiu especialmente ao cargo de analista ambiental a prática da fiscalização, no exercício do poder de polícia ambiental.
Tal prática também foi atribuída aos técnicos ambientais, porém, para estes, sob a condição de ser precedida por ato de designação próprio da autoridade ambiental à qual esteja vinculado, o que normalmente é feito através de portaria.
Importante destacar que o IBAMA pode celebrar convênios com os Estados, Municípios e o Distrito Federal, para que estes possam exercer atividade de fiscalização ambiental, através de suas policias e demais servidores, desde que designados para esse fim.
5.1. Corpo de Bombeiros podem lavrar auto de infração ambiental?
Recentemente um autuado procurou nosso escritório indagando sobre a (im)possibilidade de o Corpo de Bombeiros Militar lavrar autos de infração ambiental no Estado do Mato Grosso.
A resposta foi de que os bombeiros estão autorizados a lavrar autos em circunstâncias que envolvam queimadas ilegais, incêndios florestais e transporte de produtos perigosos, tóxicos ou nocivos à saúde humana.
Isso porque, em 30 de outubro de 2019, o Estado do Mato Grosso alterou o seu Código Florestal para incluir o Corpo de Bombeiros Militar como autoridade competente para aqueles atos.
Na prática, ao atender ocorrências de incêndio em zonas rurais e verificando indícios de incêndio criminoso, os bombeiros têm lavrado autos de infração ambiental.
Em suma, qualquer funcionário de órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, desde que designados para as atividades de fiscalização, mesmo que por portaria, são competentes para lavrar auto de infração e instaurar processo administrativo.
6. Competência para julgar o auto de infração
Em âmbito federal, uma equipe de instrução, composta por servidores do órgão ambiental autuante, é a responsável por instruir, preparar e relatar processos de apuração de infrações ambientais, inclusive pedidos de revisão de sanções, para serem submetidos a julgamento pelas autoridades de primeira e segunda instâncias administrativas.
À equipe de instrução não é competente para emitir a decisão final, mas tão somente elabora um relatório indicando o pedido inicial, o conteúdo das fases do procedimento e formula uma proposta de decisão, objetivamente justificada, encaminhando o processo à autoridade julgadora competente de primeira instância.
Essa autoridade julgadora é o Coordenador Regional, no âmbito do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, e, o Superintendente Estadual, no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA.
Já o julgamento do recurso hierárquico compete ao Presidente do órgão ambiental federal autuante, ou seja, Presidente do IBAMA ou do ICMBIo.
Importante destacar que há somente duas instâncias no processo administrativo ambiental federal após a revogação do inciso III do artigo 8º da Lei 6.938/81, de modo que, o CONAMA não detém mais competência para decidir, como terceira e última instância administrativa em grau de recurso, ou seja, o artigo 130 do Decreto 6.514/08 foi tacitamente revogado.