A Lei 12.305, conhecida como a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, foi promulgada em 2 de agosto de 2010, após muitos anos de debates e discussões (porque estava em andamento desde 1991), e representa um avanço significativo na abordagem brasileira em relação aos resíduos sólidos, buscando promover a gestão sustentável e a redução dos impactos ambientais negativos.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, em seu art. 3º, XVI, conceitua o que são os resíduos sólidos.
XVI – resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível.
A gestão eficiente dos resíduos sólidos tornou-se uma preocupação global devido aos crescentes impactos ambientais e sociais. Por isso, a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS previu sujeitos obrigados a estruturar e implementar sistemas de coletar esses resíduos sólidos após o uso pelo consumidor.
No contexto brasileiro, a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS trouxe importantes diretrizes para a gestão responsável dos resíduos, promovendo a sustentabilidade e a economia circular.
Um componente crucial dessa política é a logística reversa, um conceito que visa otimizar o retorno de produtos e materiais ao ciclo produtivo, reduzindo assim os impactos ambientais e fomentando a responsabilidade compartilhada.
Índice
Logística reversa
A Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS é um marco regulatório que estabelece diretrizes para a gestão e o gerenciamento de resíduos sólidos, sendo a logística reversa um instrumento fundamental para alcançar os seus objetivos.
O conceito de logística reversa está contido no inciso XII, do art. 3º da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS:
XII – logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada;
A lei prevê a responsabilidade compartilhada entre fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes e consumidores na destinação adequada dos produtos e resíduos.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS estabelece acordos setoriais e termos de compromisso como instrumentos para implementar a logística reversa em diferentes cadeias produtivas. Esses acordos visam definir metas, prazos e responsabilidades para o retorno dos produtos pós-consumo aos seus ciclos produtivos.
Mas afinal, o que é logística reversa
A logística reversa nada mais do que um processo logístico que abrange o retorno de produtos, embalagens e materiais ao ciclo produtivo ou sua destinação ambientalmente adequada após uso pelo consumidor.
Este conceito vai além da simples gestão de resíduos, incorporando práticas que visam a minimização do desperdício e a maximização da eficiência nos processos produtivos.
Ao reintegrar materiais recicláveis à cadeia produtiva, a logística reversa contribui para a economia circular, onde o conceito de “lixo” é substituído pelo de “recursos”, além de reduzir o consumo de recursos naturais, diminuir a geração de resíduos e promover a sustentabilidade.
Em consonância com entendimento de Canotilho[1] “os comportamentos ecológicos e ambientalmente relevantes da geração atual condicionam e comprometem as condições de vida das gerações futuras”, torna-se evidente a importância de compreender o princípio da sustentabilidade.
Nessa linha de raciocínio, é imperativo desenvolver a consciência de que condutas atuais podem, no futuro, impactar negativamente as nossas vidas, considerando-se os aspectos sociais, econômicos, éticos e jurídico-políticos.
Quais empresas devem implementar a Logística Reversa?
A Logística Reversa deve ser implementada por empresas que atuam nos setores de fabricação, importação, distribuição e comercialização de produtos que geram resíduos sólidos e que estejam sujeitas à regulamentação ambiental, conforme estabelece o artigo 33 da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS:
Art. 33. São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:
I – agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas;
II – pilhas e baterias;
III – pneus;
IV – óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens;
V – lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;
VI – produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
Conforme previsto no artigo 33 da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, as empresas que devem implementar a Logística Reversa são os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos como agrotóxicos, pilhas, baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, e produtos eletroeletrônicos, bem como outros produtos e embalagens sujeitos a acordos setoriais ou termos de compromisso firmados pelo poder público e o setor empresarial.
Empresas que comercializam em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e outros produtos, também podem ser abrangidas, considerando o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados.
Além disso, as responsabilidades da logística reversa também se estendem aos consumidores, que devem efetuar a devolução dos produtos e embalagens conforme determinado no § 4º do art. 33 da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.
O que diz a jurisprudência sobre empresas que devem implementar a logística reversa
A logística reversa constitui um tema amplamente discutido nos Tribunais brasileiros, exercendo impacto significativo em diversas empresas pertencentes a setores industriais diversos.
Observa-se os tribunais têm adotado posicionamento pela procedência de ações civis públicas propostas contra empresas que se recusam a implementar a logística reversa, fundamentando tal decisão na compreensão de que o Direito Ambiental é um direito fundamental.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, reconheceu a procedência de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público contra uma loja de pneus que deixou de implementar o descarte apropriado de pneus usados, o que teria configurado o descumprimento do artigo 33 da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.
RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. LOGÍSTICA REVERSA DE PNEUS USADOS. Incontroversa a omissão do particular em implantar logística reversa de pneus usados. Obrigação de fazer que se revela adequada a assegurar a efetiva obediência aos ditames da Lei 12.305/12. Obrigação de preservação do meio ambiente é também do comerciante de pneus. Sentença de procedência mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP – AC: 10018981020178260366 SP 1001898-10.2017.8.26.0366, Relator: Marcelo Berthe, Data de Julgamento: 09/05/2019, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Publicação: 10/05/2019).
No caso, entendeu o TJSP que a empresa que comercializa pneus estaria coobrigada a estruturar e implementar sistema de logística reversa, com a devolução dos pneus usados aos fabricantes ou importadores.
Assim, a omissão na gestão do ciclo de vida dos produtos poderia contribuir para o descarte irregular de pneus inservíveis, a impactar a saúde humana e a qualidade ambiental.
Portanto, é possível inferir que a adoção da logística reversa, para além de representar um benefício ambiental e econômico, configura-se como uma obrigação legal para as empresas mencionadas no rol do artigo 33 da Lei 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS).
Multa ambiental por descumprir a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS
No Escritório Farenzena & Franco Advocacia Ambiental, temos atendido com frequência clientes que foram alvos de fiscalização ambiental e recebem um auto de infração ambiental por descumprir a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.
As infrações ambientais relacionadas à Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS estão previstas nos incisos VI, XII, XIII e XV e § 2º, do artigo 62 do Decreto 6.514/08, cuja redação é a seguinte:
Art. 62. Incorre nas mesmas multas do art. 61 quem: […]
VI – deixar, aquele que tem obrigação, de dar destinação ambientalmente adequada a produtos, subprodutos, embalagens, resíduos ou substâncias quando assim determinar a lei ou ato normativo;
XII - descumprir obrigação prevista no sistema de logística reversa implementado nos termos do disposto na Lei nº 12.305, de 2010, em conformidade com as responsabilidades específicas estabelecidas para o referido sistema;
XIII - deixar de segregar resíduos sólidos na forma estabelecida para a coleta seletiva, quando a referida coleta for instituída pelo titular do serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos;
XIV - destinar resíduos sólidos urbanos à recuperação energética em desconformidade com o disposto no § 1º do art. 9º da Lei nº 12.305, de 2010, e no seu regulamento;
XV - deixar de atualizar e disponibilizar ao órgão municipal competente e a outras autoridades informações completas sobre a execução das ações do sistema de logística reversa sobre sua responsabilidade
§2º Os consumidores que descumprirem as obrigações previstas nos sistemas de logística reversa e de coleta seletiva ficarão sujeitos à penalidade de advertência.
As infrações ambientais acima destacadas podem ser cometidas tanto por empresas como por pessoas físicas que não cumprirem as obrigações de logística reversa.
Assim, a não implementação de um sistema de logística reversa resulta em infração, sujeitando as empresas a penalidades. Logo, o não cumprimento das obrigações de logística reversa pode acarretar sérias consequências tanto para as empresas como para as pessoas físicas.
Quem pode cometer as infrações da PNRS
Sujeitam-se à infração do inciso VI do art. 62 do Decreto 6.514/08, as pessoas físicas ou jurídicas que deixam de dar a correta destinação final aos resíduos sólidos, cujo conceito está previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS:
VII – destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos;
A infração do inciso XII do art. 62 do Decreto 6.514/08 se aplica aos importadores, fabricantes, distribuidores e comerciantes elencados no art. 33 da Lei 12.305/2010, bem como em decretos federais e atos normativos expedidos por órgãos federais integrantes do SISNAMA que não estejam registrados ou que cumprem todas as obrigações inerentes ao sistema.
Já a infração do inciso XIII do art. 62 do Decreto 6.514/08 é direcionada para pessoa física ou jurídica que não cumprir com a obrigação de separar corretamente os resíduos sólidos de acordo com as regras estabelecidas para a coleta seletiva, quando essa coleta é implementada pelo serviço público de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos.
Isso significa que tanto empresas quanto indivíduos que não segregarem os resíduos de maneira adequada, quando a coleta seletiva estiver disponível, estarão sujeitos a essa infração
A infração do inciso XIV do Decreto 6.514/08 pode ser cometida por qualquer agente que realize a destinação incorreta dos resíduos sólidos urbanos para recuperação energética, em desacordo com as regras estabelecidas no § 1º do art. 9º da referida Lei e em seu regulamento
§1º Poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental.
Por seu turno, a infração do inciso XV do Decreto 6.514/08 pode ser cometida pelas empresas aderentes a um sistema de logística reversa que deixam de prestar informações precisas aos órgãos de fiscalização federal, estaduais ou municipais.
Por fim, a infração do § 2º do Decreto 6.514/08 pode ser cometida pelos consumidores que descumprirem as obrigações previstas nos sistemas de logística reversa e de coleta seletiva, o que é muito comum nos casos de embalagens envolvendo agrotóxicos.
Assim, consumidores que não efetuarem a devolução após o uso, aos comerciantes ou distribuidores, dos produtos e das embalagens a que se referem os incisos I a VI do artigo 33 da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, e de outros produtos ou embalagens objeto de logística reversa, estarão sujeitos a sanções.
Conclusão
A integração da logística reversa à gestão de resíduos, conforme prevê a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, é essencial para enfrentar os desafios ambientais, tanto em relação à poluição que ocorre com a correta destinação dos resíduos, como para evitar o consumo de recursos naturais a partir do reaproveitamento desses resíduos sólidos.
A implementação da logística reversa é obrigatória para fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos como agrotóxicos, pilhas, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas e produtos eletroeletrônicos, além de outros produtos e embalagens determinados por acordos setoriais ou termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial.
Além disso, os consumidores também são obrigados a efetuar a devolução dos produtos e embalagens após o uso, conforme estabelecido na Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.
Por fim, vale repisar que aqueles que não cumprem a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, inclusive os consumidores, estão sujeitos a sanções previstas no artigo 62 do Decreto 6.514/08.
Conclui-se, portanto, que a responsabilidade pela logística reversa recai sobre todos os participantes do ciclo de vida do produto, seguindo o princípio da responsabilidade compartilhada, que visa minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, além de reduzir os impactos ambientais causados durante o ciclo de vida dos produtos.
[1] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p.178.