A Lei Federal 9.873/99, que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, preceitua o seguinte sobre prescrição intercorrente e prescrição propriamente dita, institutos que fulminam a pretensão punitiva estatal:
Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.
§2º Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
Redação similar contém o artigo 21 do Decreto Federal 6.514/08, o qual estabelece que “prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado”.
O § 3º do referido artigo dispõe, igualmente, que nos casos em que a infração também configurar crime, o prazo prescricional será o previsto na lei penal. Senão, veja-se:
Art. 21. Prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado.
§1º Considera-se iniciada a ação de apuração de infração ambiental pela administração com a lavratura do auto de infração.
§2º Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
§3º Quando o fato objeto da infração também constituir crime, a prescrição de que trata o caput reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
§4º A prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a obrigação de reparar o dano ambiental.
Deste modo, quando a conduta capitulada no auto de infração ambiental configurar crime, o prazo de prescrição da pretensão punitiva da Administração Pública será o estabelecido no artigo 109 do Código Penal, de acordo com a pena em abstrato estabelecida para o tipo penal correspondente.
Nesse sentindo, Nicolao Dino Neto[1]:
“Inicialmente, há que se notar que a prescrição da ação punitiva da administração rege-se pelo disposto na Lei 9.873/99. Nesse sentido, o art. 21, caput e § 3º, do Decreto 6.514/2008 reproduz as disposições do art. 1º, caput e § 2º, da Lei 9.873/99, explicitando que prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado.
Tais diplomas normativos também assinalam que a prescrição será regida pelo prazo previsto na lei penal, quanto o fato objeto da infração também constituir crime. Considerando que grande parte das infrações administrativas ambientais coincide, quanto à descrição típica, com os crimes ambientais previstos na Lei 9.605/98, a prescrição da ação punitiva no plano administrativo será regida, em tais casos, pelo prazo previsto no Código Penal (art. 109).
Nesse ponto, vale acentuar, ainda, que a adoção do prazo previsto na lei penal (CP, art. 109), nas hipóteses em que o fato também configurar crime, não se subordina à instauração de processo para a apuração do ilícito criminal, haja vista a independência entre as instâncias administrativa e penal.
Trata-se tão somente de um juízo hipotético de verificação, cotejando o fato que constitui infração administrativa com o tipo legal atinente ao crime com a mesma moldura fática, para constatar a coincidência preconizada na lei e, consequentemente, aplicar-se o prazo prescricional fixado na lei penal.”
Tais diplomas normativos também assinalam que a prescrição será regida pelo prazo previsto na lei penal, quanto o fato objeto da infração também constituir crime ambiental.
Índice
Causas interruptivas da prescrição no processo ambiental
Quanto às causas interruptivas da prescrição, o artigo 2º da Lei 9873/99 preceitua que a prescrição da ação punitiva da Administração Pública interrompe-se:
I – pela notificação ou citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital;
II – por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato;
III – pela decisão condenatória recorrível.
IV – por qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal.
No mesmo sentido o artigo 22 do Decreto Federal 6.514/08, quando estabeleceu que o prazo prescricional em destaque é interrompido:
I – pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por qualquer outro meio, inclusive por edital;
II – por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato; e
III – pela decisão condenatória recorrível.
Atenção especial merece o inciso que diz que a prescrição da ação punitiva da Administração Pública será interrompida por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato.
Veja-se que não é qualquer ato praticado no curso do processo que terá o condão de provocar a dita interrupção.
É diferente, portanto, da interrupção da prescrição intercorrente no processo administrativo de apuração da infração, pois esta se dá até quando proferido despacho nos autos, desde que efetivamente impulsione o procedimento para o seu julgamento final.
Para configurar-se a interrupção da prescrição da ação punitiva estabelecida no caput do artigo 1º da Lei 9.873/99 e no artigo 21 do Decreto Federal 6.514/08, é preciso que o ato levado a efeito nos autos do processo administrativo tenha conteúdo relacionado à apuração do fato, ou seja, o ato processual deve implicar instrução do processo para cessar o prazo prescricional, segundo o artigo 22, inciso II do Decreto Federal 6.514/08.
Análise de prescrição em caso concreto
Analisando um processo administrativo que aportou no Escritório, constatamos a inexistência de marcos interruptivos e, portanto, a ocorrência da prescrição que resultou no arquivamento dos autos.
No caso, o auto de infração ambiental, por meio do qual também foi aplicado o embargo, foi lavrado em 30.06.2010, sendo este o primeiro marco interruptivo da prescrição.
Com efeito, se o ato que importa apuração do fato serve à interrupção da pretensão punitiva, quanto mais da prescrição intercorrente, para a qual basta apenas despachos que impulsionem o feito.
A pessoa autuada, à época dos fatos, peticionou no processo administrativo em 11.07.2010.
Em 30.08.2010, foi proferido despacho interno de encaminhamento do processo para instrução, tratando-se de ato que não é capaz de interromper a prescrição intercorrente, uma vez que é mero impulsionamento do processo.
A defesa foi protocolada em 24.10.2010. Depois disso, foi elaborada certidão positiva de agravamento em 04.07.2013, sendo, na sequência, elaborado parecer instrutório com dilação probatória em 05.07.2013, no qual o analista ambiental se limitou a sugerir o indeferimento do pedido de produção de prova.
Já no dia 06.08.2013, foi elaborado um parecer complementar, no qual houve enfrentamento dos fatos, de sorte que tal parecer foi capaz de interromper a prescrição da pretensão punitiva e também a prescrição intercorrente.
Em 25.06.2014, foi proferido novo despacho encaminhando o processo para o órgão competente para julgamento, considerando o elevado valor da multa à época, atualmente não mais aplicável.
Aportados os autos na instância competente, foi elaborada nova certidão em 24.06.2017, atestando a inexistência de antecedentes que permitissem o agravamento da pena.
Esses atos foram capazes de interromper a prescrição intercorrente, mas não serviram à interrupção da prescrição de cinco anos, conclusão que se pauta nas premissas já fixadas acima.
Nova manifestação instrutória foi proferida em 25.06.2017, sugerindo-se o encaminhamento do processo para a fase de alegações finais.
Nesse novo parecer, não houve aprofundamento das provas ou da análise dos fatos, tendo o agente ambiental se limitado a fazer relatório do processo, com sugestão sobre procedimentos relacionados o embargo e à apresentação de alegações finais, de sorte que, embora tenha sido interrompida a prescrição intercorrente, não foi interrompida a prescrição da pretensão punitiva.
Com efeito, nenhuma das circunstâncias previstas no artigo 2º da Lei 9.873/99 ocorreu nesse interregno. Na sequência, foi expedido o edital de notificação para alegações finais em 26.06.2017.
O ato seguinte consistiu num despacho proferido em 28.02.2019 de encaminhamento do processo para julgamento em primeira instância, atos que impulsionaram o processo, mas não se enquadram em nenhuma das hipóteses de interrupção da prescrição de cinco anos prevista no caput do artigo 1º da Lei 9.873/99.
Entre os marcos interruptivos acima observa-se o transcurso de mais de cinco anos entre parecer complementar proferido em 04.08.2013 e o último despacho proferido em 28.02.2019, não se observando a presença de qualquer ato interruptivo da prescrição da pretensão punitiva, previsto no artigo 2º da Lei 9.873/99.
Assim, foi alcançada pela prescrição a pretensão da administração de sancionar a infração descrita no auto de infração ambiental analisado, o que inclui o embargo.
Isso porque, o embargo administrativo é uma medida acessória à autuação, que é o ato administrativo principal. Dessa forma, a anulação do ato principal leva à insubsistência dos atos acessórios, estando justificado o levantamento dos termos de embargo.
Especialmente no que toca ao termo de embargo, cabe sublinhar que a demora injustificada na conclusão do processo administrativo acarreta na prescrição e, portanto, permite o levantamento do termo de embargo incidente sobre a atividade do autuado, o qual não pode ficar indeterminadamente à mercê da administração, sem definição de sua situação em prazo razoável.
Dessa forma, a tramitação do processo sem impulsionamento dos autos administrativos para efetivo julgamento, configura demora excessiva e injustificada por parte da administração, implicando no reconhecimento da prescrição, ainda mais porque há ofensa ao princípio da duração razoável do processo e da eficiência.
[1] NETO, Nicolao Dino. Crimes e Infrações Administrativas Ambientais. 3a edição rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2011, p.447.
9 Comentários. Deixe novo
Boa tarde, encontro-me na seguinte situação:
– a infração ambiental foi praticada em 11/08/2019
– o auto de infração foi elaborado em 20/04/2024.
– ainda não fui notificado pelo órgão ambiental ( sei da origem do respeito processo administrativo por meios diversos).
A dúvida é : caso eu não seja notificado, por nenhuma das modalidades expressas em lei, até a data de 11/08/2024, ou após essa data, o respectivo auto de infração estará prescrito?
Depende. Para dar uma resposta concreta, eu teria que analisar o processo administrativo e o auto de infração ambiental para saber se existem marcos interruptivos, bem como qual é o tipo administrativo indicado no auto de infração, principalmente para saber se a infração administrativa também configura crime ambiental e a partir disso aferir o prazo prescricional da pretensão punitiva propriamente dita, a qual pode variar de 3 a 12 anos, de acordo com a infração ambiental praticada.
Foram 2 autos de infração.
Um foi intitulado o artigo 58 do Dec. 6514
O outro foi intitulado o artigo 49 c/c 60, I, também do Dec. 6514.
Em relação ao último, ele não se enquadra no artigo 38, visto que não é floresta e nem app , mas, sim, área de regeneração em área atropizada em 2004.
Então você tem bons argumentos de defesa. No AdvLabs você encontra modelos prontos de defesa contra auto de infração ambiental.
Outra dúvida, lavratura do auto de infração ambiental interrompe a prescrição?
Sim, a lavratura do auto de infração ambiental interrompe a prescrição porque é um ato inequívoco que importa na apuração do fato.
Boa abordagem sobre a Prescrição da Ação Punitiva do Estado e Prescrição Intercorrente em Processos Administrativos Ambientais. Embora muito didático, senti falta da Citação ou Notificação do Autuado no Caso concreto narrado (Inciso I do art. 2º da Lei 9873/99). Senti falta também da informação que a interrupção da prescrição ocorre apenas uma única vez, ou seja, não pode a Administração praticar atos sucessivos perpetuamente para manter o prazo de sua pretensão punitiva.
Boa noite Juliano. Temos vários outros artigos aqui no site tratando de prescrição no processo administrativo ambiental. E sobre a interrupção da prescrição ocorrer apenas uma vez, é questão complexa, porque a própria Lei 9.873/99 dispõe que interrompe-se a prescrição por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato. Já o Decreto 6.514/08 diz que considera-se ato inequívoco da administração aqueles que impliquem instrução do processo. Então é questão complexa. Mas está na minha lista escrever sobre um artigo sobre interrupção da prescrição uma única vez. Também está na minha lista escrever um artigo que embora o Executivo/Legislador tenha usado o termo “prescrição”, o corrreto seria decadência.
Em alguns processos administrativos que iniciaram sua tramitação anteriormente ao Decreto 6.514/08, o IBAMA, de ofício, por inexistir intimação para alegações finais, ANULOU A DECISÃO HOMOLOGATÓRIA E DEMAIS ATOS SUBSEQUENTES praticados nos autos. Na grande maioria dos casos a intimação para alegações finais ocorreu após o interregno temporal de 3 anos. Em meus processos alego que houve prescrição intercorrente, pois criou-se um “vácuo processual” no qual inexistem atos válidos capazes de interromper o curso do prazo prescricional intercorrente. Há ainda casos que o vácuo se estende por mais tempo, haja vista a intimação ter ocorrido por edital. O que vocês acham da tese?