Sabe-se que o art. 225 da Constituição da República, em seu §3º, instituiu um regime de tríplice responsabilização na esfera ambiental, ao dispor que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Isso significa que o sistema constitucional brasileiro optou expressamente pela tríplice responsabilidade ambiental, alcançando as esferas civil, administrativa e criminal.
Índice
Responsabilidade civil ambiental é objetiva
No que tange à responsabilidade civil ambiental, destaca-se a previsão legal contida no art. 14, § 1º, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/1981):
Art. 14 – Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:[…]
§1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e terceiros, afetado por sua atividade.
Ao lecionar a respeito do assunto, Carlos Roberto Gonçalves[1] assim dispõe: “A responsabilidade civil independe, pois, da existência de culpa e se funda na ideia de que a pessoa que cria o risco deve reparar os danos advindos de seu empreendimento”.
Em complementação, o doutrinador estabelece que: “Basta, portanto, a prova da ação ou omissão do réu, do dano e da relação de causalidade”[2].
Requisitos da responsabilidade civil ambiental
Sem delongas, os requisitos da responsabilização civil ambiental são: (i) ação ou omissão do réu, (ii) dano e (iii) nexo de causalidade.
Ou seja, sem a relação de causalidade entre conduta comissiva ou omissa da parte ré, não há que se falar em responsabilidade civil ambiental.
Assim sendo, na hipótese de uma situação passível de responsabilização civil ocorrida em um imóvel, o civilmente responsável pelos fatos será aquele que, através de ação ou omissão, tiver dado causa ao dano.
Se, por exemplo, o suposto dano tiver ocorrido em momento anterior à aquisição e posse do terreno pelo atual proprietário, ele não será civilmente responsável (a menos que de alguma maneira tenha concorrido para sua ocorrência).
Obrigações ambientais propter rem
Sabe-se, contudo, que as obrigações ambientais são dotadas de natureza propter rem. No art. 2º, § 2º, do Código Florestal (Lei 12.651/2012), consta que “As obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural”.
Além disso, a Súmula 623 do Superior Tribunal de Justiça refere que “As obrigações ambientais possuem natureza propter tem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor”.
No entanto, isso não significa que a “responsabilidade civil ambiental é propter rem”.
Conclusão
A responsabilidade civil em matéria ambiental tem seus critérios bem definidos, conforme já exposto acima. Entender que tal responsabilização é “transmitida” em uma compra e venda de um imóvel, por exemplo, é um erro jurídico.
Nessa linha, Erika Bechara[3], tomando as lições de Édis Milaré, didaticamente expõe que:
“Os institutos não se confundem pois a obrigação propter rem deriva de um direito real estabelecido sobre determinado bem enquanto que a responsabilidade civil ambiental tem origem na ocorrência de um dano e na constatação do nexo de causalidade entre a atividade desenvolvida por alguém, de forma direta ou indireta, e esse dano. Tudo isso para concluir, com acerto, que “a responsabilidade civil não ‘adere’ a um bem” como o faz a obrigação propter rem.”
Então, o atual proprietário ou posseiro de um imóvel tem sim obrigações ambientais atinentes à propriedade ou à posse (vide manutenção de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente, nos termos da Lei 12.651/2012).
Todavia, não pode o proprietário ou posseiro ser civilmente responsabilizado por fatos aos quais não tenha dado causa. Sem nexo de causalidade, não há responsabilidade civil ambiental.
[1] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. Volume 4. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 87.
[2] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. Volume 4. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 87.
[3] BECHARA, Erika. A responsabilidade civil do poluidor indireto e a obrigação propter rem dos proprietários de imóveis ambientalmente degradados. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 20, n. 48, p. 137- 165, Março-Abril/2019. Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/download/EPM/Publicacoes/CadernosJuridicos/48.07%20bechara.pdf?d=63697073344 8306078>. Acesso em 20 fev 2024.