O autor ajuizou ação de nulidade do Auto de Infração Ambiental lavrado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA por suposto desmatamento, mas o juízo de primeiro grau julgou improcedentes os pedidos para anular o auto de infração.
Insatisfeito com a sentença de improcedência, o autor interpôs recurso de apelação, pretendendo que o Tribunal reformasse a decisão de primeiro grau para julgar procedentes os pedidos e reconhecer a nulidade do auto de infração.
Para tanto, sustentou ser atípica a conduta de desmatamento que lhe foi imputada, porque a área onde ocorreu o dano não se insere na qualificação de “área de especial proteção”, haja vista não ter sido assim declarada por qualquer ato normativo, consoante expresso no art. 225,§ 1º, III, da Constituição Federal.
Aduziu que a norma disposta no § 4º do art. 225 da CF é de eficácia contida, dependendo, portanto, de regulamentação para ser eficaz. Ressaltou, ainda, que a circunstância mais importante e não considerada pelo magistrado de primeiro grau é a pertinente à autoria da infração, que foi relevada por se tratar de dano ambiental em que se aplica a responsabilidade objetiva.
O autor alegou também, que a multa que lhe foi imposta era ilegal, porquanto não comprovada a sua autoria, e trouxe relatos sobre os fatos ocorridos e atribuiu os danos ambientais a supressão de madeira criminosa ocorrida em sua propriedade, objeto do Boletim de Ocorrência lavrado dois anos antes da autuação do IBAMA, reforçado por declarações das testemunhas ouvidas em juízo. Reclamou alternativamente, pela redução do valor da multa, a incidência de circunstâncias atenuantes, a conversão da multa em serviços de melhoria, o desembaraço da área; postulando, por fim, pela redução da verba honorária fixada.
Ao julgar o recurso de apelação, o TRF1 acolheu as alegações do autor e reformou a sentença de primeiro grau e julgar procedente o pedido de anulação do auto de infração e o termo de embargo, por entender que o autor comprovou não ter sido o responsável pelo desmatamento, o qual foi decorrente de ação criminosa de terceiros, caracterizando-se como situação de força maior e justifica a desconstituição da multa lavrada.
EMENTA
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. AMAZÔNIA LEGAL. DESMATAMENTO EM ÁREA DE RESERVA LEGAL. ÁREA DE ESPECIAL PROTEÇÃO. DISTINÇÃO DE CONCEITOS. DECRETO 3.179/1999. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. FRAGILIZAÇÃO. ERRO DE TIPIFICAÇÃO. NÃO RETIFICADO. NEGATIVA DE AUTORIA. BOLETIM DE OCORRÊNCIA. SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO POR AÇÃO CRIMINOSA DE TERCEIROS. FORÇA MAIOR. PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA DAS PENAS APLICÁVEL À ESFERA ADMINISTRATIVA. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA.
1. A observância do devido processo legal não se encerra ao se oportunizar ao infrator a contradita ao ato infracional que lhe é imputado, sendo mister a análise adequada acerca de suas alegações e provas, de modo a permitir que exerçam influência na formação do convencimento acaso sejam plausíveis.
2. Embora seja plenamente admitida a lavratura de auto de infração pela observância das imagens de satélite do local, que demonstram a ocorrência de danificação de mata nativa sem o correspondente licenciamento ambiental por parte do órgão competente, e sem diligências in loco, a indicação do infrator como sendo o proprietário se dá por presunção, que implica na necessidade de apreciação cuidadosa de eventual negativa da autoria pelo autuado.
3. O preceito contido no art. 225, § 1º, III, da CF condiciona a delimitação de “espaços territoriais especialmente protegidos”a ato do Poder Público que assim os definam, preceito que veio a ser regulamentado pela Lei nº 9.985, de 1º de julho de 2000, a qual institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC e disciplina sobre a criação de Unidades de Conservação, a serem legalmente instituídas pelo Poder Público – consoante redação do art. 2º, I, da referida Lei.
4. A própria Lei reguladora em referência estabelece em seu artigo 22 que “As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.”, cuja criação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública “que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade…”.
5. A área inserida na Amazônia Legal não se reveste automaticamente das características dos espaços especialmente protegidos, diante do termo técnico utilizado pelo legislador constituinte para áreas assim definidas por ato formal do Poder Público, interpretação ratificada por José Afonso da Silva ao conceituar os espaços territoriais especialmente protegidos como “áreas geográficas públicas ou privadas (porcão do território nacional) dotadas de atributos ambientais que requeiram sua sujeição, pela lei, a um regime jurídico de interesse público que implique sua relativa imodificabilidade e sua utilização sustentada (…)” (sublinhamos).
6. A Amazônia Legal se insere no conceito de Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE, disciplinado pela Lei nº 6.938/1981 (que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e dá outras providências) e regulamentado pelo Decreto nº 4.297/2002, o qual traz expressa menção ao ZEE da Amazônia Legal no art. 6-C e parágrafo único.
7. Não fosse adequada a interpretação acerca do termo técnico de “área de especial proteção”, utilizado pelo legislador constituinte, não contaríamos, já no ano de 2015 e segundo dados fornecidos pelo Ministério do Meio Ambiente, com 315 Unidades de Conservação (UCs), cobrindo 112,6 milhões de hectares ou 22% da região, dentro da área delimitada como Amazônia Legal.
8. O legislador ordinário fornece instrumentos próprios de preservação da Amazônia Legal ao instituir a reserva legal de 80% (oitenta por cento) da área total em imóveis que se situem dentro da sua delimitação – art. 16, inciso I, da Lei nº 4.771/1965 ( Código Florestal vigente na data dos fatos), regra mantida pelo atual Código Florestal (Lei nº 12.651/2012, inciso I, a).
9. A discussão sobre o termo técnico “área de especial proteção” se mostra necessária para a adequada subsunção da conduta imputada ao autuado à correspondente infração administrativa tipificada pelo Decreto nº 3.179/1999, então em vigor, embora hoje essa diferenciação não tenha sido prestigiada pelo Decreto nº 6.514/2008, que engloba num mesmo tipo os danos a florestas nativas inseridas em espaços especialmente protegidos e em reservas legais.
10. O contexto da lide permite a conclusão de que a suposta conduta do autuado se enquadra no art. 38 do Decreto nº 3.179/99 (que prevê sanção para os danos em floresta nativa em área de reserva legal), em vigor na data do ato infracional, em contrapartida àquela constante do auto de infração (que prevê especificamente sanção por danos em espaços objeto de especial proteção).
11. Ao ser conduzido o processo administrativo, não se preservou a observância do devido processo legal, não tendo sido instruído com os documentos sugeridos pelo próprio Procurador Federal que apresentou manifestação por escrito, postulando por instrução probatória não concretizada, assim como por não terem sido apreciados os pedidos do autuado de produção de provas.
12. A negativa da autoria, substanciada em Boletim de Ocorrência lavrado mais de dois anos antes do auto de infração, além das provas testemunhais assertivas colhidas em juízo sobre a ocorrência da supressão criminosa da vegetação no imóvel do autuado, acrescidas de outras circunstâncias que cercam a lide, caracteriza força maior e autoriza a desconstituição da multa imposta, tendo em vista que a sanção administrativa, diferentemente da responsabilidade civil por dano ambiental, requer que a multa recaia pessoalmente contra a pessoa do infrator, por seu caráter repressivo e por força do princípio da intranscendência da pena, que se aplica tanto na esfera criminal como na administrativa – art. 5º, inc. XLV, da Constituição Federal. Precedente do Superior Tribunal de Justiça (Segunda Turma. REsp 1251697/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, em 12/04/2012, DJe 17/04/2012).
13. Apelação do autor a que se dá provimento para reformar a sentença de primeiro grau e julgar procedentes os pedidos de anulação do auto de infração e correspondentes termos de embargo da área, com inversão dos ônus de sucumbência.
15. Apelação do IBAMA, na qual se postula pela majoração dos honorários advocatícios fixados, prejudicada.
(TRF-1 – AC: 00013165920144013600, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA, Data de Julgamento: 18/09/2019, QUINTA TURMA, Data de Publicação: 01/10/2019)
VOTO
A controvérsia que deu ensejo ao ajuizamento desta ação refere-se à lavratura do Auto de Infração nº 545015/D pelo IBAMA, em 7 de novembro de 2006, mediante a análise, por agentes do réu, de imagens de satélite do local, imputando ao autor a prática da infração administrativa descrita no artigo 37 do Decreto nº 3.179/99, tendo em vista que foi observada a supressão de vegetação em área correspondente a 826,86 hectares de floresta nativa, objeto de especial proteção, inserida na Fazenda Ronuro, localizada no estado de Mato Grosso, de propriedade do autor.
Na oportunidade, além do auto de infração, o agente do IBAMA lavrou dois termos de embargo: um relativo à área degradada de floresta danificada, com 826,86 hectares, e outro mais abrangente relacionado a qualquer atividade de exploração florestal desenvolvida na Fazenda Ronuro e terras vizinhas, também pertencentes a Lineu José Gonçalves, todos entregues ao autor via correio, com A.R.
Após a tramitação do processo administrativo, com oportunidade para o autuado apresentar defesa, o auto de infração foi homologado, arbitrando-se a multa de R$ 1.240.500,00 (um milhão duzentos e quarenta mil e quinhentos reais), além de proceder ao embargo consoante sanção prevista para a infração descrita no art. 37 do Decreto n. 3.179/1999.
O autor, desde o início, quando da tramitação do processo administrativo, se insurge contra o auto de infração sob dois argumentos primordiais, um que diz respeito à atipicidade da conduta que lhe foi imputada, porque não se trata de “área de especial proteção”, à ausência de qualquer ato normativo que assim a declare; além de negar a autoria da infração, tendo sido refutadas suas alegações, tanto no processo administrativo como no processo judicial.
Pontuo que a observância do devido processo legal, com o respeito ao contraditório e à ampla defesa, não se encerra ao se oportunizar ao infrator a contradita do fato infracional que lhe é imputado. Para que o princípio seja coerentemente observado, imprescindível que a defesa apresentada, a tempo e modo devidos, assim como as postulações no curso do processo, sejam analisadas e exerçam influência na tomada da decisão.
Apenas facultar a apresentação de defesa, mas não permitir que os argumentos apresentados influam no convencimento, não prestigia o princípio que assegura ao réu que se defenda, mais significando um cumprimento de uma formalidade legal, que só traria mais um ônus para o autuado. Essa, definitivamente, não é a finalidade da garantia constitucional que prestigia a ampla defesa e o contraditório, tanto no âmbito administrativo quanto no judicial.
Partindo dessa premissa, tenho que as razões do apelo do autor são contundentes e motivam a reforma da sentença.
Primeiramente, mesmo reconhecendo a legitimidade de se proceder à autuação com parâmetro em imagens de satélite do local, entendo que esse proceder fragiliza a aferição da autoria da infração, que recai, presumivelmente, sobre o proprietário do imóvel. Portanto, essa atribuição do ato infracional se dá, naturalmente, por presunção, impondo que eventual negativa de autoria seja devidamente apurada, sob pena de possibilitar seja concretizada injustiça.
No caso em apreço, sem se afastar da necessidade de cuidado com a Amazônia Legal, tem-se que o legislador já estabeleceu instrumentos de preservação próprios para a região, tanto que os imóveis que se inserem dentro de sua área devem observar a reserva legal de 80% (oitenta por cento) – artigo 16, inciso I da Lei nº 4.771/1965, regra mantida no atual Código Florestal:
Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:
I – localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;
b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;
c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;
II – localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).
Assim, a Amazônia Legal já se submete a percentual de reserva legal considerável (80% da área total do imóvel), evidenciando se tratar de regra voltada à sua particular preservação, mas reputo que as ações que visem ao cumprimento desse escopo não podem desviar-se dos princípios que regem os atos administrativos.
Dentro desse contexto, entendo que o agente do IBAMA que lavrou o auto de infração equivocou-se na subsunção do tipo de infração supostamente cometida pelo autor à conduta descrita pelo artigo 37 do Decreto nº 3.179/1999, isso com parâmetro nas próprias definições trazidas pelo texto constitucional.
Sobre a questão em análise, dispõe o art. 225, § 1º. III, da Constituição Federal (com destaques):
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: […]
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
Na sequência, o texto constitucional traz referência à Floresta Amazônica como patrimônio nacional, mas não se utiliza do termo “espaços territoriais especialmente protegidos”: […]
4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
O § 4º foi regulamentado pela Lei nº 13.123/2015, que não refere a área de proteção especial.
O dispositivo constitucional inserto no artigo 225, § 1º, inciso III, foi regulamentado pela Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que disciplina sobre a instituição do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC e dá outras providências, delimitando o seguinte sobre as unidades de conservação, objeto da especial proteção definida pelo artigo 225, § 1º, III, da Constituição Federal (destacamos):
Art. 2o Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I – unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção;
Art. 7o As unidades de conservação integrantes do SNUC dividem-se em dois grupos, com características específicas:
I – Unidades de Proteção Integral;
II – Unidades de Uso Sustentável.
1o O objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos nesta Lei.
2o O objetivo básico das Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais.
Art. 8o O grupo das Unidades de Proteção Integral é composto pelas seguintes categorias de unidade de conservação:
I – Estação Ecológica;
II – Reserva Biológica;
III – Parque Nacional;
IV – Monumento Natural;
V – Refúgio de Vida Silvestre.
Art. 14. Constituem o Grupo das Unidades de Uso Sustentável as seguintes categorias de unidade de conservação:
I – Área de Proteção Ambiental;
II – Área de Relevante Interesse Ecológico;
III – Floresta Nacional;
IV – Reserva Extrativista;
V – Reserva de Fauna;
VI – Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e
VII – Reserva Particular do Patrimônio Natural.
Já no artigo 22 da mesma Lei, estabelece-se que as Unidades de Conservação serão criadas por ato do Poder Público:
Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.
1o (VETADO)
2o A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento.
Por seu turno, o Decreto 4.340, de 22 de agosto de 2002, regulamenta artigos da Lei nº 9.985/2000 e estabelece quanto à criação de uma unidade de conservação o seguinte:
Art. 2o O ato de criação de uma unidade de conservação deve indicar:
I – a denominação, a categoria de manejo, os objetivos, os limites, a área da unidade e o órgão responsável por sua administração;
II – a população tradicional beneficiária, no caso das Reservas Extrativistas e das Reservas de Desenvolvimento Sustentável;
III – a população tradicional residente, quando couber, no caso das Florestas Nacionais, Florestas Estaduais ou Florestas Municipais; e
IV – as atividades econômicas, de segurança e de defesa nacional envolvidas.
Art. 3o A denominação de cada unidade de conservação deverá basear-se, preferencialmente, na sua característica natural mais significativa, ou na sua denominação mais antiga, dando-se prioridade, neste último caso, às designações indígenas ancestrais.
Art. 4o Compete ao órgão executor proponente de nova unidade de conservação elaborar os estudos técnicos preliminares e realizar, quando for o caso, a consulta pública e os demais procedimentos administrativos necessários à criação da unidade.
Art. 5o A consulta pública para a criação de unidade de conservação tem a finalidade de subsidiar a definição da localização, da dimensão e dos limites mais adequados para a unidade.
1o A consulta consiste em reuniões públicas ou, a critério do órgão ambiental competente, outras formas de oitiva da população local e de outras partes interessadas.
2o No processo de consulta pública, o órgão executor competente deve indicar, de modo claro e em linguagem acessível, as implicações para a população residente no interior e no entorno da unidade proposta.
Contextualizando a Constituição Federal e a legislação transcrita, tem-se que as “áreas especialmente protegidas” devem ser assim definidas por ato do poder público, não bastando que o imóvel esteja inserido na Amazônia Legal para que autorize o enquadramento do infrator no art. 37 do Decreto nº 3.179/1999.
Em amparo a essa convicção, trago doutrina de Luís Paulo Sirvinskas, ao comentar o disposto no art. 225, § 1º, III, da Constituição Federal, que bem esclarece a particularidade[1]:
Assim, para dar efetividade ao princípio matriz, compete ao Poder Público definir e proteger os espaços territoriais e seus componentes. Os espaços territoriais especialmente protegidos abrangem as áreas de preservação permanente, as reservas florestais legais e as unidades de conservação. Para Édis Milaré, esses espaços abrangem: as áreas de proteção especial, as áreas de preservação permanente, as reservas legais e as unidades de conservação. Preferimos denominá-lo microecossistemas. Procura-se proteger todos os atributos ao mesmo tempo e em conjunto e não parte deles.
Esses espaços territoriais ou microessistemas são denominados unidades de conservação. Estas, por sua vez, são espaços territoriais e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (ar.t 1º, I, da Lei n. 9.985/2000).
O que se protege nesses espaços são os ecossistemas, os quais, por sua vez, são áreas representativas da região e constituídas de recursos naturais relevantes. Tais espaços territoriais ambientais são protegidos e sua exploração depende de lei. É importante ressaltar que esses espaços territoriais podem ser instituídos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. São as denominadas unidades de conservação criadas pela Lei n. 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.
As unidades de conservação dividem-se em proteção integral (estação ecológica, reserva biológica, parque nacional, monumento natural e refúgio de vida silvestre) e de uso sustentável (área de proteção ambiental, área de relevante interesse ecológico, floresta nacional, reserva extrativista reserva da fauna, reserva de desenvolvimento sustentável e reserva particular do patrimônio natural).
José Afonso da Silva conceitua os espaços territoriais especialmente protegidos como “áreas geográficas públicas ou privadas (porção do território nacional) dotadas de atributos ambientais que requeiram sua sujeição, pela lei, a um regime jurídico de interesse público que implique sua relativa imodificabilidade e sua utilização sustentada, tendo em vista a preservação e proteção da integridade de amostras de toda a diversidade de ecossistemas, a proteção da integridade de amostras de toda a diversidade de ecossistemas, a proteção do processo evolutivo das espécies, a preservação e proteção dos recursos naturais”.
O zoneamento ambiental, por sua vez, tem por finalidade regular o adequado ordenamento do uso e ocupação do solo. Foi com esse objetivo que se criou o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil (ZEE), para proteger o bioma de interesse nacional, como, por exemplo, a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira, por meio do Decreto n. 4.297, de 10 de julho de 2002.
Ressalte-se que esse dispositivo é autoaplicável, no dizer do ministro Francisco Resek, na decisão da “farra do boi”, “não demandando legislação suplementar para ser implementado, sublinhando-se que nele não está inserida a expressão na forma da lei. Ainda que contivesse tal expressão, nem por isso retiraria sua força abrangente”.
Definir é encontrar área a ser especialmente protegida e seus componentes, não se admitindo, a partir daí, a sua ocupação com a construção de casa para o guarda ou outros equipamentos, tais como cerca etc. Qualquer alteração, mesmo que pequena, precisa de lei.
O Governo do Estado de São Paulo, mediante decreto, permitiu a possibilidade de modificação de parque estadual somente com estudo prévio de impacto ambiental (EPIA), sem a respectiva lei. Tal questão desaguou no STF, e o ministro Moreira Alves concedeu a liminar para cassar o decreto por entender que o ato poderia causar danos ecológicos de difícil reparação.
Como visto, a Amazônia Legal se insere no conceito de Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE, instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, disciplinado pela Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 (que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e dá outras providências):
Art 9º – São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:
I – o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;
II – o zoneamento ambiental;
Ao regulamentar o artigo de lei transcrito, o Decreto nº 4.297, de 10 de julho de 2002 disciplina o seguinte sobre o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE, regime jurídico no qual se inclui a Amazônia Legal:
Art. 1o O Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE, como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, obedecerá aos critérios mínimos estabelecidos neste Decreto.
Art. 2o O ZEE, instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de planos, obras e atividades públicas e privadas, estabelece medidas e padrões de proteção ambiental destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade, garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da população.
Art. 3o O ZEE tem por objetivo geral organizar, de forma vinculada, as decisões dos agentes públicos e privados quanto a planos, programas, projetos e atividades que, direta ou indiretamente, utilizem recursos naturais, assegurando a plena manutenção do capital e dos serviços ambientais dos ecossistemas.
Parágrafo único. O ZEE, na distribuição espacial das atividades econômicas, levará em conta a importância ecológica, as limitações e as fragilidades dos ecossistemas, estabelecendo vedações, restrições e alternativas de exploração do território e determinando, quando for o caso, inclusive a relocalização de atividades incompatíveis com suas diretrizes gerais.
Art. 4o O processo de elaboração e implementação do ZEE:
I – buscará a sustentabilidade ecológica, econômica e social, com vistas a compatibilizar o crescimento econômico e a proteção dos recursos naturais, em favor das presentes e futuras gerações, em decorrência do reconhecimento de valor intrínseco à biodiversidade e a seus componentes;
II – contará com ampla participação democrática, compartilhando suas ações e responsabilidades entre os diferentes níveis da administração pública e da sociedade civil; e
III – valorizará o conhecimento científico multidisciplinar.
Art. 5o O ZEE orientar-se-á pela Política Nacional do Meio Ambiente, estatuída nos arts. 21, inciso IX, 170, inciso VI, 186, inciso II, e 225 da Constituição, na Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, pelos diplomas legais aplicáveis, e obedecerá aos princípios da função sócio-ambiental da propriedade, da prevenção, da precaução, do poluidor-pagador, do usuário-pagador, da participação informada, do acesso eqüitativo e da integração.
Art. 6º-C. O Poder Público Federal elaborará, sob a coordenação da Comissão Coordenadora do ZEE do Território Nacional, o ZEE da Amazônia Legal, tendo como referência o Mapa Integrado dos ZEE dos Estados, elaborado e atualizado pelo Programa Zoneamento Ecológico-Econômico. (Incluído pelo Decreto nº 6.288, de 2007).
Parágrafo único. O processo de elaboração do ZEE da Amazônia Legal terá a participação de Estados e Municípios, das Comissões Estaduais do ZEE e de representações da sociedade. (Incluído pelo Decreto nº 6.288, de 2007).
Vê-se, pois, que a legislação infraconstitucional versa sobre regime próprio para a Amazônia Legal como Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil.
De se notar da análise do texto constitucional, com a complementação da legislação que regulamentou o artigo 225, acima transcrito, que ao fazer referência a “área de proteção especial” pretendeu trazer termo técnico para designar áreas que o Poder Público viesse assim a definir.
A conclusão que se extrai de tudo quanto foi abordado é de que a Amazônia Legal não se constitui automaticamente em área de proteção especial. Para que seus espaços venham a ser assim caracterizados mister ato do Poder Público que os defina e estabeleça seus limites e regime jurídico a que se sujeitam.
Não fosse essa a interpretação autorizada pela conformação do texto constitucional, não contaríamos, dentro da área de delimitação da Amazônia Legal, com 315 Unidades de Conservação (UCs), cobrindo 112,6 milhões de hectares ou 22% da região (ISA, 2015ª), segundo dados fornecidos para o ano de 2015 pelo Ministério do Meio Ambiente.[2]
Ou seja, se o fato de se inserir determinado imóvel dentro da Amazônia Legal já conduz à interpretação de se tratar de “área de especial proteção”, não haveria razão para que o Poder Público tivesse instituído tantas Unidades de Conservação dentro do território da Amazônia Legal.
Desse modo, tanto pelo teor dos preceitos da Constituição Federal que versam sobre a questão, como pela legislação extravagante (aqui posta no sentido mais amplo do termo), nota-se que o legislador constituinte e/ou ordinário utilizou-se do termo técnico “áreas de especial proteção” para designar espaços territoriais assim definidos pelo Poder Público, em cumprimento ao disposto no art. 225, § 1º, III, da Constituição Federal, regulamentado esse dispositivo pela Lei nº 9.985/2000.
Sob outro aspecto, compõe a Amazônia Legal uma região que engloba 5 milhões de quilômetros quadrados, segundo delimitação também do Ministério do Meio ambiente, [3] o que representa dois terços do país, incluindo os estados do Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará, Amapá, Acre, Tocantins, Mato Grosso e parte significativa do Maranhão (art. 3º, inciso I, da Lei nº 12.651/2012).
A relevância da discussão ao caso concreto é inquestionável, pois o IBAMA, ao adotar o conceito genérico de Amazônia Legal como “área de especial proteção”, fez incorrer o autor nas sanções descritas pelo artigo 37 do então em vigor Decreto nº 3.179/99, que dispunha o seguinte:
Art. 37. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação:
Multa de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), por hectare ou fração.
Ocorre que esse mesmo Decreto, contemporâneo à data dos fatos, trazia outra conduta que, segundo o convencimento que se extraiu do estudo do caso, mais se adéqua à situação narrada no auto de infração, e que prevê a infração de desmatamento em área reserva legal:
Art. 38. Explorar área de reserva legal, florestas e formação sucessoras de origem nativa, tanto de domínio público, quanto de domínio privado, sem aprovação prévia do órgão ambiental competente, bem como da adoção de técnicas de condução, exploração, manejo e reposição florestal:
Multa de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 300,00 (trezentos reais), por hectare ou fração, ou por unidade, estéreo, quilo, mdc ou metro cúbico.
É bem verdade que o próprio Decreto já previa que o erro de enquadramento na infração não se constitui vício insanável, nos termos do que estabelece o § 3º do seu art. 100, podendo a autoridade administrativa retificar o auto de infração para suprir a falha, mas essa retificação não foi levada a efeito.
Sobreleva notar que a falha do processo administrativo não se restringe ao erro da tipificação, mas também porque não foram adequadamente apreciadas as alegações de negativa da autoria, limitando-se a afirmar que o Boletim de Ocorrência lavrado pelo autor mais de 2 (dois) anos antes da autuação não seria suficiente para comprovar a ausência de responsabilidade do autuado, notadamente pela responsabilidade objetiva de que se reveste o dano causado ao meio ambiente, em que se autoriza a inversão do ônus da prova.
Não obstante essa discussão atualmente não se mostre relevante, porquanto o Decreto nº 3.179/99 foi revogado pelo Decreto 6.514/2008, que engloba as diversas condutas em um mesmo tipo infracional, com a mesma sanção, a regra que vigia ao tempo da infração não era essa, pois havia uma distinção entre infração ambiental ocorrida em “área de especial proteção” e em “reserva legal”.
Como se evidenciou da transcrição anterior dos artigos 37 e 38, em um e noutro caso a diferença é realmente significativa, considerando que para a infração de danificar área de especial proteção o Decreto 3.179/99 previa a sanção de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) por hectares danificados, enquanto a sanção prevista para a infração de danificar reserva legal era de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 300,00 (trezentos reais) por hectare danificado. Veja-se o que dispõe o art. 48 do Decreto nº 6.514/2008 (que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações), atualmente em vigor, que estabelece:
Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas ou demais formas de vegetação nativa em unidades de conservação ou outras áreas especialmente protegidas, quando couber, área de preservação permanente, reserva legal ou demais locais cuja regeneração tenha sido indicada pela autoridade ambiental competente: (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por hectare ou fração. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica para o uso permitido das áreas de preservação permanente. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Ou seja, de acordo com a legislação hoje em vigor, é desinfluente se a danificação se deu em “área de especial proteção” ou em “reserva legal”, tanto um caso como outro estão enquadrados no mesmo tipo infracional (art. 48) e submetem-se à mesma multa, que foi consideravelmente majorada para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare danificado.
Não se olvida que o dano ao meio ambiente possui prerrogativas próprias, diante da necessidade de máxima proteção estabelecida pela Constituição Federal, tais como responsabilidade objetiva, inversão do ônus da prova, in dubio pro natureza, princípio da precaução, princípio da reparação integral, princípio do poluidor-pagador, obrigação propter rem, dentre outros.
Contudo, tais atributos não retiram do autuado o direito de se defender, de produzir as provas em contradita, assim como de ter suas alegações e provas analisadas adequadamente, já que responsabilidade objetiva não representa presunção absoluta de que a autoria recaia sobre o proprietário do imóvel.
Há hipóteses, nas quais se enquadra o caso concreto, que se constituem de força maior, e que essa responsabilidade pela multa administrativa mereça ser afastada.
Dentro desse raciocínio, importante refletir sobre as particularidades do caso em debate. Trata-se de área de grande extensão, denominada Fazenda Ronuro (inserida na Gleba Boa Vista), localizada no Estado de Mato Grosso, com 2.295,9575 hectares, não explorada (ressalvada a parte alegadamente objeto de supressão criminosa), cujo proprietário residia em outro estado da federação, Paraná, nela não mantinha funcionário, e que o auto de infração foi lavrado com parâmetro em imagens de satélite e sem diligência in loco, tendo sido atribuída a responsabilidade ao proprietário por presunção.
Em que pese plenamente viável o modo de proceder do fiscal ao autuar pela detecção de exploração florestal não licenciada, mediante análise de imagens de satélite do local, entendo que as alegações do autor quanto à negativa de autoria mereçam especial atenção, ainda mais quando substanciadas em Boletim de Ocorrência lavrados em torno de 2 (dois) anos antes da autuação.
Quanto ao ponto, eventual ausência de providência da autoridade policial quanto à apuração dos fatos noticiados no BO não pode ser computada na responsabilidade do autor.
Entendo que a providência que lhe competia diante do furto noticiado em sua propriedade seria mesmo informar os fatos à autoridade que detém competência para apurar e punir os delitos, não tendo o autor a prerrogativa de fazer justiça com as próprias mãos, sob pena de incorrer em uso arbitrário das próprias razões.
De outro modo, mesmo que as assertivas relacionadas à insuficiência da lavratura de Boletim de Ocorrência para comprovar a negativa da autoria sejam verdadeiras, não se pode negar que o documento é um início de prova fortíssimo, inclusive porque precedeu em dois anos a lavratura do auto de infração.
Acrescentam-se as falhas de instrução no procedimento administrativo. A fl. 175, consta dos autos Ofício/DIJUR/MT nº 111/2007 (fl. 175), devidamente entregue, solicitando à Delegacia Regional de Paranatinga – MT, informações sobre o desfecho dado ao Boletim de Ocorrência lavrado pelo autor, mas não consta resposta nos autos e nem reiteração. Essa informação seria imprescindível como documento de instrução.
Além disso, segundo manifestação do Procurador Federal responsável pelo caso, André de Souza Melo Teixeira, haveria necessidade de diligências, as quais não foram adotadas, embora se reconheça a sua imprescindibilidade. Confira-se de alguns trechos da manifestação, acostada aos autos a fls. 177/181:
Seria, no entanto, conveniente e oportuno que os documentos todos referidos no relatório de fiscalização, inclusive aqueles referidos como integrantes do tal Anexo I, fossem juntados aos autos, para sua melhor instrução, salvo impossibilidade, que deverá ser devidamente justificada.
Alegou também o autuado que o desmate de cerca de 700 hectares, supostamente realizados por terceiros em sua propriedade rural, teria ocorrido antes da aquisição da fazenda, e que a aquisição dessa somente teria se dado m 23 de setembro de 2002, solicito a essa DIJUR que confirme, através de consulta a banco de imagens de satélite, precisamente em que ano e mês o desmatamento ocorreu.
Para isso me parece necessário que se consultem imagens do período imediatamente anterior à suposta data de aquisição da fazenda pelo autuado. Se forem encontradas imagens de antes de 23 de setembro de 2002, que é a alegada data de aquisição da fazenda, e se essas imagens já revelarem, desde antes dessa data, o desmate que motivou a autuação, nesse caso terá que se apreciar a possível procedência da tese de defesa do autuado.
É que, embora se possa admitir e sustentar, sem problemas o dever de recompor a área de reserva legal desmatada pelo vendedor do imóvel ou mesmo por terceiros, depois da aquisição, já não me parece possível responsabilizar pessoalmente o autuado pelo desmatamento com multa administrativa e auto de infração.
A multa e o auto de infração devem ser infligidos ao autor do dano, e se o autuado adquiriu a fazenda já desmatada de fato não terá sido o autor do dano, e de fato não poderá ele ser autuado pelo desmatamento.
Peço, por isso mesmo, a essa DICOF, a confirmação da data provável de realização do desmatamento, de preferência com a segurança de imagens realizadas por satélites. […]
Mais ainda, analisando a defesa apresentada pelo autuado, verifico que o mesmo alegou que, em 10 de janeiro de 2004 teria registrado em boletim de ocorrência policial, perante a Delegacia de Polícia Civil de Paranatinga, queixa de invasão de suas terras e de promoção de desmate não autorizado por terceiros em invasão de suas terras e de promoção de desmate não autorizado por terceiros em área de aproximadamente 700 hectares. Juntou inclusive, às fls. 32, fotocópia de referido boletim de ocorrência policial, devidamente autenticado pelo escrivão de polícia Edemil Pereira Saldanha.
Com vistas a explicar o fato de não ter impedido a suposta ação desses terceiros invasores, que teriam supostamente realizado o desmate denunciado no termo de ocorrência, sustentou o autuado, em sua defesa, que reside no Paraná, distante da fazenda, alegação essa aparentemente coerente com aquela registrada no boletim de ocorrência, no qual registrou “não ia na fazenda a mais de 1 ano, pois não tem nenhuma atividade de pecuária na fazenda e de difícil acesso.”
É bem verdade que o boletim de ocorrência policial, lavrado há mais de dois anos antes do auto de infração aqui examinado, poderia ser considerado se não como uma prova contundente, mas pelo menos como um início de prova de negativa de autoria e de responsabilidade pelo desmatamento pelo autuado.
Contudo, isso que poderia ser um início de prova em favor do autuado parece estar enfraquecido ou até mesmo completamente prejudicado pelo trecho do relatório de fiscalização a seguir transcrito:
“O proprietário, através de responsável técnico, também declara não existir área já explorada (AEX=0,00 há)
Na sequência, sem adoção das medidas instrutórias pertinentes, após manifestação do Agente responsável pela autuação, sem qualquer diligência ou acréscimo documental, o auto de infração foi homologado pela decisão juntada a fl. 196, embora o próprio Procurador Federal tenha reconhecido a deficiência documental relativa ao processo administrativo.
Daí sucedeu o recurso administrativo interposto pelo autuado e outras insurgências direcionadas a desconstituir a decisão administrativa, sem sucesso, após o que o autor ajuizou esta ação.
Não obteve melhor sorte na incursão em juízo, pois suas alegações foram afastadas sob o fundamento de responsabilidade objetiva, inversão do ônus da prova e imprestabilidade do Boletim de Ocorrência para demonstrar a suposta supressão criminosa.
Embora as testemunhas que prestaram depoimento em juízo tenham confirmado os fatos relatados no Boletim de Ocorrência, mediante afirmações contundentes, não houve qualquer referência na sentença sobre as oitivas, limitando-se o juízo a quo a afastar a suficiência do BO para se viabilizar o acolhimento dos argumentos quanto à negativa da autoria.
Apesar da assertividade dos depoimentos, o magistrado de origem não considerou a prova testemunhal colhida, já que não teceu qualquer referência aos seus termos na sentença, e nem justificou a razão por ter assim procedido.
Desde o início do processo administrativo, postura mantida pelo juízo condutor do processo, apega-se às informações contraditórias prestadas no boletim de ocorrência comparativamente àquelas inseridas quando da solicitação da licença ambiental referente ao imóvel perante a Secretaria de Estado do Meio Ambiente – SEMA em 2004, mas também não são consideradas as justificativas apresentadas para a divergência das informações, o que foi confirmado no depoimento prestado em juízo pelo engenheiro agrônomo responsável pelo licenciamento postulado em 2006.
Entendo convincentes os esclarecimentos, os quais informam que na primeira versão do sistema informatizado de licenciamento do SEMA não se distinguia exploração seletiva (situação concretizada na fazenda do autor) de desmatamento por corte raso (que o SEMA descreve como área explorada, aberta), sendo que somente se declarava no requerimento de licença o desmatamento por corte raso, que, de fato, não há na propriedade. São transcritos a seguir os trechos do recurso administrativo que versa sobre a particularidade para melhor delineamento da questão:
3.1- DA IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA DE CONTROLE AMBIENTAL EM PROPRIEDADES RURAIS DE MATO GROSSO
No ano de 2001 a antiga Fundação Estadual do Meio Ambiente de Mato Grosso desenvolveu um novo modelo de controle ambiental, com a implementação do Sistema de Controle Ambiental em Propriedades Rurais de Mato Grosso, que teve como objetivo, normatizar a forma da implantação dos instrumentos tradicionais de controle ambiental com a fiscalização, licenciamento, monitoramento apoiados no uso de tecnologia de informação, acessível, com diferenciação metodológica, incluindo a denominação e a nomenclatura a ser utilizada no processo de expedição das licenças ambientais.
Até o ano de 2006 a FEMA/SEMA utilizava a nomenclatura de ÁREA EXPLORADA tão somente para àquelas áreas já abertas, ou seja, derrubadas à core raso, não utilizando a NOMENCLATURA – AEX – nas áreas consideradas de exploração seletiva.
Sendo assim, a SEMA, ao expedir a Licença Ambiental Única do recorrente não considerou como ÁREA EXPLORADA àquela existente na ARL com exploração seletiva, motivo pelo qual, não constou da LAU – AEX da área que houve a exploração seletiva.
Diante dos problemas fundiários no sistema de licenciamento ambiental, apresentando grandes problemas em definir os vários tipos de área explorada e desmatada existente em uma propriedade, a SEMA buscou definir a Nomenclatura específica para cada caso.
Em 10 de maio de 2007, foi criado na SEMA o Roteiro de Normas e Padrões dos Mapas Digitais e Impressos a serem entregues pelo responsável técnico, onde definiu nova Metodologia de Interpretação dos Mapas, mas, ainda, não previa a existência da SIGLA/NOMENCLATURA da área de exploração seletiva (doc. anexo).
A Coordenadoria de Geotecnologia, no atendimento a evolução dos procedimentos efetuados no dia a dia, finalmente criou a SIGLA específica para as áreas exploradas seletivamente, somente em maio de 2008, que assim definiu (doc. Anexo):
EXP_SELETIVA – Elemento que deve ser usado somente para elaboração de mapa de dinâmica de desmate. Correspondente à área onde houve a retirada e/ou exploração de determinadas espécies de árvore de valor comercial.
Nesse enredo, não houve a omissão ou má-fé do autuado, pois o próprio órgão licenciador não utilizava a nomenclatura ou definição de área explorada, àquela que apresentada exploração seletiva, já que na SEMA/FEMA, repita-se: não existia a nomenclatura específica para definir aquele tipo de exploração.
Demais disso, a própria SEMA, ao expedir a LAU não considerou àquela área como sendo de – Área Explorável, salientando que o pedido de LAU foi devidamente analisado e aprovado pelo órgão ambiental estadual, responsável pelo licenciamento ambiental, inclusive sendo analisado o meio digital e carta imagem da época dos fatos.
Se existisse qualquer tipo de irregularidade no projeto apresentado pelo autuado, os técnicos da SEMA teriam detectado e solicitado a retificação do projeto, e consequentemente, não teriam emitido a LAU. Veja que na carta imagem impressa na própria LAU, mostra a área explorada seletivamente (canto esquerdo) estendendo-se nas áreas vizinhas.
Portanto, o recorrente não agiu de má-fé, apenas seguiu o roteiro da SEMA, que na época não considerava a área com exploração seletiva como sendo área aberta. Somente em 21 de maio de 2008 que foi introduzido na SEMA a Sigla EXP_SELETIVA, definindo o licenciamento ambiental as áreas de exploração seletiva existentes nas propriedades.
Repisa, mais uma vez, o fato de que não foram carreados aos autos os documentos apontados no relatório técnico de fiscalização, mesmo sendo solicitado pelo Procurador nas fls. 56. Sendo assim, não há como o recorrente se defender de algo que desconhece e/ou que não se encontra nos autos, ferindo os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Consta dos autos, o relatório técnico de vistoria do engenheiro florestal contratado pelo recorrente, descrevendo a seguinte informação quanto aos fatores da degradação:
“Os danos causados nas áreas ocorreram pela ação do homem através de retirada seletiva de madeira, que segundo informações do proprietário, a exploração foi realizada sem o consentimento conforme Boletim de Ocorrência lavrado na Polícia Judiciária Civil de Paranatinga/MT”.
No caso, o recorrente, através de seu engenheiro responsável, detectou na propriedade a degradação de tão somente 465,00 hectares, e não de 826,86 hectares, motivo pelo qual, solicitou a realização de vistoria no imóvel e análise do PRAD, o que sequer foi analisado pelo parecerista, ferindo os princípios do contraditório e ampla defesa.
Demais disso, não existem informações conflitantes com o Boletim de Ocorrência resgistrado na Polícia Civil, não havendo qualquer insinceridade do autuado, cujas informações e alegações prestadas na defesa e no recurso merecem toda credibilidade, devendo ser cancelado o auto de infração lavrado.
Não há que se falar em declarações conflitantes e contraditórias já que o projeto da LAU seguiu o roteiro exigido pela SEMA, inclusive sendo analisado o projeto e expedida a LAU pelo órgão ambiental.
Mais uma vez, equivoca-se o parecerista ao afirmar que o autuado declarou ter o desmate ocorrido antes da aquisição do imóvel, visto que, conforme consta da defesa, o recorrente afirmou que somente tomou conhecimento do fato ocorrido, ou seja, de exploração existente na propriedade, quando analisou as cartas imagens na solicitação do projeto de licenciamento ambiental, já que é uma área de difícil acesso, motivo pelo qual, compareceu na Delegacia e prestou as declarações necessárias.
Nas folhas 54 dos autos, o próprio técnico ambiental que lavrou o auto de infração, informou que não houve fiscalização in loco devido às dificuldades de acesso.
Não existindo contradições e insinceridade que abalem a credibilidade das alegações da defesa, cai por terra a fundamentação do parecer jurídico que sustentou a manutenção do auto de infração, devendo ser cancelado, analisando as provas apresentadas pelo recorrente no presente feito.
Instruindo o recurso administrativo interposto, o autor juntou documento, que se refere ao Sistema de Controle Ambiental em Propriedades Rurais de Mato Grosso, no qual se identifica a sigla AEX como sendo área aberta (já explorada).
Consta dos autos, também, que o autuado formulou pedido para instruir o processo administrativo (fls. 169/172), postulando pela oitiva de testemunhas, juntada de novos documentos, realização de vistoria técnica e diligências in loco na propriedade, análise do PRAD, o que não foi sequer analisado pela autoridade administrativa.
Nesse contexto, evidente a violação aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal, nos termos do art. 5º, LIV e LV da CF e dos arts. 2º, 29 e 38, todos da Lei n. 9.748/1999.
Embora em questões ambientais a regra seja a inversão do ônus da prova, entendo que o autor logrou demonstrar não haver elementos suficientes para comprovar que a autoria da infração deva recair sobre a sua pessoa.
A infração administrativa, por seu caráter repressivo e em face do princípio da intranscendência das penas, preconizado no art. 5º, inc. XLV, da Constituição Federal, aplicável tanto no âmbito penal e como na esfera administrativa, deve recair sobre a pessoa do infrator, não tendo o menor fundamento pretender que pessoa distinta daquele que praticou a infração responda pela sanção, conforme admite o Procurador Federal que apresentou parecer no processo administrativo ao solicitar diligências para melhor instrução do feito administrativo. Confira-se (fl. 179):
É que, embora se possa admitir e sustentar, sem problemas o dever de recompor a área de reserva legal desmatada pelo vendedor do imóvel ou mesmo por terceiros, depois da aquisição, já não me parece possível responsabilizar pessoalmente o autuado pelo desmatamento com multa administrativa e auto de infração.
A multa e o auto de infração devem ser infligidos ao autor do dano, e se o autuado adquiriu a fazenda já desmatada de fato não terá sido ele o autor do dano, e de fato não poderá ele ser autuado pelo desmatamento.
Nesse sentido, precedente do Superior Tribunal de Justiça (com destaques):
AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. MULTA APLICADA ADMINISTRATIVAMENTE EM RAZÃO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. EXECUÇÃO FISCAL AJUIZADA EM FACE DO ADQUIRENTE DA PROPRIEDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. MULTA COMO PENALIDADE ADMINISTRATIVA, DIFERENTE DA OBRIGAÇÃO CIVIL DE REPARAR O DANO.
1. Trata-se, na origem, de embargos à execução fiscal ajuizado pelo ora recorrente por figurar no polo passivo de feito executivo levado a cabo pelo Ibama para cobrar multa aplicada por infração ambiental.
2. Explica o recorrente – e faz isto desde a inicial do agravo de instrumento e das razões de apelação que resultou no acórdão ora impugnado – que o crédito executado diz respeito à violação dos arts. 37 do Decreto n. 3.179/99, 50 c/c 25 da Lei n. 9.605/98 e 14 da Lei n. 6.938/81, mas que o auto de infração foi lavrado em face de seu pai, que, à época, era o dono da propriedade.
3. A instância ordinária, contudo, entendeu que o caráter propter rem e solidário das obrigações ambientais seria suficiente para justificar que, mesmo a infração tendo sido cometida e lançada em face de seu pai, o ora recorrente arcasse com seu pagamento em execução fiscal.
4. Nas razões do especial, sustenta a parte recorrente ter havido violação aos arts. 3º e 568, inc. I, do Código de Processo Civil (CPC) e 3º, inc. IV, e 14 da Lei n. 6.938/81, ao argumento de que lhe falece legitimidade passiva na execução fiscal levada a cabo pelo Ibama a fim de ver quitada multa aplicada em razão de infração ambiental.
5. Esta Corte Superior possui entendimento pacífico no sentido de que a responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade, como obrigação propter rem, sendo possível cobrar também do atual proprietário condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos. Foi essa a jurisprudência invocada pela origem para manter a decisão agravada.
6. O ponto controverso nestes autos, contudo, é outro. Discute-se, aqui, a possibilidade de que terceiro responda por sanção aplicada por infração ambiental.
7. A questão, portanto, não se cinge ao plano da responsabilidade civil, mas da responsabilidade administrativa por dano ambiental.
8. Pelo princípio da intranscendência das penas (art. 5º, inc. XLV, CR88), aplicável não só ao âmbito penal, mas também a todo o Direito Sancionador, não é possível ajuizar execução fiscal em face do recorrente para cobrar multa aplicada em face de condutas imputáveis a seu pai.
9. Isso porque a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano.
10. A diferença entre os dois âmbitos de punição e suas consequências fica bem estampada da leitura do art. 14, § 1º, da Lei n. 6.938/81, segundo o qual “[s]em obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo [entre elas, frise-se, a multa], é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.
11. O art. 14, caput, também é claro: “[s]em prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: […]”.
12. Em resumo: a aplicação e a execução das penas limitam-se aos transgressores; a reparação ambiental, de cunho civil, a seu turno, pode abranger todos os poluidores, a quem a própria legislação define como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (art. 3º, inc. V, do mesmo diploma normativo).
13. Note-se que nem seria necessária toda a construção doutrinária e jurisprudencial no sentido de que a obrigação civil de reparar o dano ambiental é do tipo propter rem, porque, na verdade, a própria lei já define como poluidor todo aquele que seja responsável pela degradação ambiental – e aquele que, adquirindo a propriedade, não reverte o dano ambiental, ainda que não causado por ele, já seria um responsável indireto por degradação ambiental (poluidor, pois).
14. Mas fato é que o uso do vocábulo “transgressores” no caput do art. 14, comparado à utilização da palavra “poluidor” no § 1º do mesmo dispositivo, deixa a entender aquilo que já se podia inferir da vigência do princípio da intranscendência das penas: a responsabilidade civil por dano ambiental é subjetivamente mais abrangente do que as responsabilidades administrativa e penal, não admitindo estas últimas que terceiros respondam a título objetivo por ofensa ambientais praticadas por outrem. 15. Recurso especial provido.
(STJ, Segunda Turma. REsp 1251697/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, em 12/04/2012, DJe 17/04/2012).
Por outro lado, não obstante a obrigação de regenerar a área degradada seja propter rem, da análise dos autos, observa-se que a área encontra-se reconstituída, situação atestada pelo engenheiro florestal que prestou depoimento, assim como pelas demais testemunhas, inclusive por ação do autor, que isolou o espaço com cerca para melhor protegê-lo e propiciar a regeneração natural, o que efetivamente se observou.
Outro aspecto que merece ressalva é que já houve o registro dos imóveis de propriedade do autor no CAR – Cadastro Rural, constando como Fazenda Boa Vista, na qual se insere a Fazenda Ronuro, matriculada no Cartório sob o nº 14.844 e objeto desta ação.
Observa-se, ainda, da certidão de fl. 1040, que a reserva legal da área já se encontra devidamente averbada na matrícula do imóvel, constando como área de reserva legal no correspondente a 80% (oitenta por cento) do total do imóvel (2.295,9575 ha), que perfaz uma área de 1.836,7660 há de preservação, resultante de Termo de Compromisso Ambiental nº 3268/2016 celebrado com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMA/MT, além da Autorização Provisória de Funcionamento Rural juntada a fl. 1.046. Todos esses documentos evidenciam a regularidade do imóvel do autor e a sua boa-fé em ajustar a sua conduta às exigências legais para preservação do meio ambiente.
Debruçando-se sobre o contexto da lide, além do enquadramento equivocado da infração atribuída ao autor, o que remeteria à nulidade da decisão que homologou o auto de infração; restou configurada a ausência de observância do contraditório e da ampla defesa; e, por fim, detecta-se que o auto de infração também padece de nulidade, porquanto os elementos trazidos aos autos são suficientes para comprovar não ter sido o autor o responsável pela supressão seletiva, decorrente de ação criminosa de terceiros. A situação caracteriza força maior e justifica a desconstituição da multa lavrada contra o autor.
Diante dessa compreensão, que remete a procedência dos pedidos, fica prejudicada a apelação do IBAMA, cujo escopo se restringe a majorar os honorários de sucumbência fixados.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação do autor para reformar a sentença de primeiro grau e julgar procedente o pedido quanto à declaração de nulidade do auto de infração, assim como dos termos de embargo de área a ele correlatos, invertendo-se os ônus de sucumbência.
É como voto.