O acusado, engenheiro agrônomo, foi denunciado pelo Ministério Público de prestar serviço emitindo receituários agronômicos para aplicação de agrotóxicos, sem o devido acompanhamento em campo.
Mas ao sentenciar, o juiz entendeu que as provas eram insuficientes para ensejar comprovação de condutas em desconformidade com a legislação especial e a consequente condenação do acusado.
Segundo o juiz que absolveu o réu, para o cometimento do delito imputado, é necessário que o agente atue com dolo, não sendo punido na modalidade culposa.
Para tal, deve haver provas contundentes da sua conduta consistente em prestar serviços para a aplicação do agrotóxico na área proibida, ou emissão de receituário agronômico sem a visita prévia à propriedade rural, o que a acusação não logrou em êxito em comprovar.
O Ministério Público, inconformado com a sentença que absolveu o réu, interpôs recurso de apelação alegando que ao contrário do entendimento da sentença a prova dos autos é suficiente para condenação, mas o TJPR manteve a absolvição.
1. ACÓRDÃO
APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME AMBIENTAL ( 13, E 15 DA LEI FEDERAL 7.802/89, ART. 66, II E IV DO DECRETO 4.074/2002 C/C LEI MUNICIPAL Nº 894/2017 – IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO, COM A ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO, NOS TERMOS DO ART. 386, II DO CPP.APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO –
PLEITO DE CONDENAÇÃO SOB A TESE DE SUFICIÊNCIA DE PROVAS ACERCA DA AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO – IMPOSSIBILIDADE – INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DE QUE TENHA HAVIDO A PRESCRIÇÃO DE AGROTÓXICO EM DESCONFORMIDADE DA LEI – ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE – RECURSO DESPROVIDO.
1. Para haver condenação, é imprescindível que a conduta se enquadre na descrição do tipo penal e que haja prova plena da autoria e materialidade delitiva, e no presente caso, estas não restaram suficientemente comprovadas, devendo ser mantida a sentença absolutória. (TJPR – 2ª C.Criminal – 0012493-81.2018.8.16.0058 – Campo Mourão – Rel.: Desembargador Luís Carlos Xavier – J. 28.08.2020)
(TJ-PR – APL: 00124938120188160058 PR 0012493-81.2018.8.16.0058 (Acórdão), Relator: Desembargador Luís Carlos Xavier, Data de Julgamento: 28/08/2020, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 01/09/2020)
2. VOTO
Alega que ao contrário do entendimento da sentença a prova dos autos é suficiente para condenação, eis que comprovada a autoria e materialidade dos delitos. Narra a denúncia:
Na data de 22 de março de 2018, em horário e local não precisado nos autos, o denunciado, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, prestou serviço emitindo Receituários Agronômicos para a Fazenda de responsabilidade dos arrendatários, sem o devido acompanhamento em campo, orientando aplicação de agrotóxicos em área de cultura de milho com pulverizador tratorizado de barras, a uma distância inferior a 100 (cem) metros das concentrações urbanas, em descumprimento com as exigências estabelecidas na Lei Municipal 1106/1998, Lei 1417/2001, o artigo 13, da Lei de Agrotóxicos (Lei Federal 7.802/89) c/c artigo 66, II (diagnóstico) e V (recomendações técnicas) do Decreto 4.074/2002.
No presente caso, consoante descrito na Portaria, verifica-se a narrativa de ocorrência de dano ao meio ambiente que motivou a instauração de Procedimento Investigatório Criminal para investigação dos fatos.
Nos autos, foram juntados o relatório de vistoria, receituário agronômico, fotografias, contrato particular de arrendamento, notificação extrajudicial, registro do imóvel, termo de fiscalização de uso do solo, termo de fiscalização de uso de agrotóxico, mapa ambiental, relatório, além dos depoimentos colhidos em juízo.
Ocorre que ao contrário do alegado pelo recorrente a prova dos autos não é suficiente para a condenação, visto que existem dúvidas razoáveis quanto a prática do crime previsto no artigo 15 da Lei de Agrotóxicos (Lei Federal no 7.802/89) c/c artigo 13 do mesmo diploma, artigo 66, incisos II e IV, do Decreto Federal sob nº 4.074/2002 e Lei Municipal sob nº 1106/1998 e Lei sob no 1417/2001, devendo ser mantida a absolvição, senão vejamos. […]
2.1. LEGISLAÇÃO
O artigo 13 da Lei 7.8092/89, estabelece que a venda de agrotóxicos aos usuários será feita através de receituário próprio, prescrito por profissionais legalmente habilitados e o artigo 15 que aquele que presta serviço em desconformidade às exigências legais estará sujeito a pena, senão vejamos:
Art. 13. A venda de agrotóxicos e afins aos usuários será feita através de receituário próprio, prescrito por profissionais legalmente habilitados, salvo casos excepcionais que forem previstos na regulamentação desta Lei.
Art. 15. Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa.
Por sua vez o artigo 66, II e IV, ambos do Decreto 4.074/2002 estabelece que:
Art. 66. A receita, específica para cada cultura ou problema, deverá conter, necessariamente: (…) II – diagnóstico; (…) IV – recomendação técnica com as seguintes informações: nome do(s) produto(s) comercial(ais) que deverá(ão) ser utilizado(s) e de eventual(ais) produto(s) equivalente(s); cultura e áreas onde serão aplicados; doses de aplicação e quantidades totais a serem adquiridas; modalidade de aplicação, com anotação de instruções específicas, quando necessário, e, obrigatoriamente, nos casos de aplicação aérea; época de aplicação; intervalo de segurança; orientações quanto ao manejo integrado de pragas e de resistência; precauções de uso; e orientação quanto à obrigatoriedade da utilização de EPI;
Ocorre que no tocante aos fatos descritos na denúncia não se verifica a existência de prova efetiva acerca da ocorrência dos mesmos, eis que se constata não ter restado comprovado que se tratasse de emissão de receituário agronômico em desacordo com as exigências legais, pois conforme se extrai dos receituários, nota-se que consta a advertência e orientação sobre a distância mínima do perímetro urbano que o produtor rural deve respeitar quando da aplicação do agrotóxico, haja vista ser um texto padrão, conforme relatado em juízo.
2.2. SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO
Isto posto, tendo em vista o conjunto probatório acostado aos autos, não se verifica a comprovação de que o apelado não visitou área de cultivo, para realizar o diagnóstico e prescrever o agrotóxico, não havendo prova concreta da prática do crime de prescrição irregular de agrotóxicos tal como narrado na denúncia. A sentença bem esclarece a questão:
No caso, a conduta do réu supostamente enquadra-se no núcleo do tipo prestar serviço em desacordo com a determinação legal e regulamentar, por ter, em tese, emitido receituário agrônomo sem o devido acompanhamento em campo e de não respeitar as determinações constantes nas Leis Federal (cinquenta metros) e Municipal (cem metros) do perímetro urbano. (…)
No caso em exame, as provas produzidas, todavia, são insuficientes para ensejar comprovação de condutas em desconformidade com a legislação especial e a consequente condenação do acusado.
Para o cometimento do delito em tela, necessariamente o agente deve agir com dolo, não sendo punido na modalidade culposa, devendo haver provas contundentes da sua conduta consistente em prestar serviços para a aplicação do agrotóxico na área proibida, ou emissão de receituário agronômico sem a visita prévia à propriedade rural, o que a acusação não logrou em êxito em comprovar.
Conforme denota-se dos receituários, o autuado prescreveu a utilização de agrotóxico, que até então é permitido por se tratar de área rural, na localidade descrita como Fazenda.
Ainda no referido documento, o fiscal de defesa agropecuária, informou: “(…) não há como inferir a localização exata da aplicação,” O fiscal ainda afirma no documento que não há informação específica de que os receituários agronômicos foram destinados para aplicação no lote, afirmando ainda que não existem receituários emitidos regularmente pelo réu destinado à aplicação de agrotóxicos na área informada na peça acusatória.
Diante disso, observa-se que os proprietários da referida localidade rural provavelmente utilizavam o nome Fazenda para unificar as compras de insumos agrícolas e assim realizar a aplicação em outras localidades.
Contudo, nessa linha de raciocínio, não há qualquer elemento de prova que indique a participação do agrônomo acusado nesse procedimento, ou seja, de que ele receitava (e sem a devida visita prévia) agrotóxicos em nome da Fazenda, mas que em verdade seriam utilizada na propriedade, com aplicação em área urbana dos agrotóxicos.
As provas orais corroboram as conclusões até aqui exaradas. […].
Portanto, pela prova oral produzida na instrução, igualmente não é possível afirmar que o acusado simplesmente emitiu receituário ao produtor para utilização em área urbana, em descumprimento com as exigências estabelecidas, e ainda sem o devido acompanhamento em campo da real necessidade do uso dos produtos prescritos.
Ainda, em análise aos referidos receituários, não se constatou qualquer inobservância da legislação, notadamente o disposto no artigo 66, do Decreto 4.074/2002.
Outrossim, como afirmado pela testemunha, que é engenheiro agrônomo e fiscal agropecuário, o receituário é emitido pelo engenheiro agrônomo e a aplicação do produto é de responsabilidade do proprietário do imóvel rural.
Os fatos denunciados devem ser realmente esclarecidos, em todos os seus detalhes e circunstâncias, nada pode ser presumido.
Dessa forma, em face de todo o conjunto probatório presente nos autos, não há conclusão diversa senão a de que não existem provas dos fatos criminosos descritos na exordial acusatória.
2.3. CONCLUSÃO
Dessa forma, uma vez que não há nos autos prova efetiva de que o acusado tenha cometido os crimes descritos na denúncia, é de se manter a sua absolvição da prática das condutas descritas nos artigos 15 da Federal nº 7.802/89 c/c artigos 13 da supracitada lei, os artigos 66, II e IV, do Decreto nº 4.074/2002 e Lei Municipal n. 1106/1998, Lei n. 1417/2001, nos termos do artigo 386, VII do Código de Processo Penal.
Nestas condições, nega-se provimento ao recurso, tudo nos termos da fundamentação.
ANTE O EXPOSTO, acordam os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso.