EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) JUIZ (A) FEDERAL DA 6ª VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTA CATARINA
AUTORA, brasileira, casada, inscrita no RG e CPF, residente e domiciliada na Rua, Florianópolis/SC, CEP, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, propor
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO MULTA AMBIENTAL
em face de INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, com sede na Rua, Centro, Florianópolis – SC, CEP…, pelas razões de fato e de direito que passa a expor.
1. DOS FATOS QUE ENSEJARAM A AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO
No dia 06 de setembro de 2020, o agente fiscal do IBAMA lavrou o auto de infração ambiental e termo de embargo, por entender que a Autora destruiu ou danificou vegetação ao construir em área de preservação permanente, infringindo o art. 43 do Decreto 6.514/08, assim redigido:
Art. 43. Destruir ou danificar florestas ou demais formas de vegetação natural ou utilizá-las com infringência das normas de proteção em área considerada de preservação permanente, sem autorização do órgão competente, quando exigível, ou em desacordo com a obtida:
Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por hectare ou fração.
Segundo o agente fiscal, a Autora estaria construindo uma casa residencial em área circundante a APA/Anhatomirim, danificando florestas consideradas de preservação permanente (próximo à curso d’água e nascente) na Praia de Palmas, Município de Governador Celso Ramos/SC.
Ocorre que, antes mesmo de iniciar a construção, a Autora realizou a consulta de viabilidade e posteriormente teve seu projeto aprovado pela municipalidade, emitindo-se o competente alvará para construção, motivo pelo qual deve ser julgada procedente a ação declaratória de nulidade.
Defesa prévia e recurso indeferidos
A defesa prévia apresentada tempestivamente, foi instruída com documentos suficientes a comprovar a legalidade da obra. No entanto, a autoridade julgadora homologou o auto de infração ambiental, julgando improcedente a defesa prévia.
Interposto recurso administrativo, reiterou-se que a obra foi erigida à luz das normas ambientais e municipais, com aprovação de projeto e expedição do competente alvará de construção.
Entretanto, o recurso administrativo foi improvido, que assim como a decisão de primeira instância, sequer analisou as provas acostadas pela Autora, e a condenou ao pagamento de multa administrativa e à demolição da edificação e recuperação da área supostamente degradada.
Portanto, requer a procedência da ação declaratória de nulidade de ato administrativo, porque o auto de infração ambiental lavrado em face da Autora é eivado de vício, conforme passa a demonstrar.
2. PEDIDO DE ANULAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO E FUNDAMENTAÇÃO
Conforme mencionado anteriormente, a Autora apresentou defesa prévia contra o auto de infração ambiental que foi julgada improcedente em primeira instância. Disso, interpôs recurso administrativo que foi improvido em segunda instância.
Contudo, a autoridade ambiental motivou sua decisão concordando com fundamentos de anterior parecer e informações que sequer analisaram a defesa e recurso da Autora.
Ora. A observância do devido processo legal, com o respeito ao contraditório e à ampla defesa, não se encerra ao se oportunizar ao infrator a contradita do fato infracional que lhe é imputado.
Para que o princípio seja coerentemente observado, imprescindível que a defesa apresentada e todos os seus documentos, a tempo e modo devidos, assim como as postulações no curso do processo, sejam analisadas e exerçam influência na tomada da decisão, o que não aconteceu no caso em comento.
Apenas facultar a apresentação de defesa, mas não permitir que os argumentos e documentos apresentados influam no convencimento, não prestigia o princípio que assegura ao autuado por infração ambiental que se defenda, mas tão somente significando o cumprimento de uma formalidade legal, que só traria mais ônus ao autuado.
Essa, definitivamente, não é a finalidade da garantia constitucional que prestigia a ampla defesa e o contraditório, tanto no âmbito administrativo quanto no judicial, impondo a procedência da presente ação declaratória de nulidade de ato administrativo.
Defesa prévia e recurso não analisados
A Autora, em sede de defesa prévia e recurso administrativo, sempre alegou a legalidade da edificação e juntou documentos aptos a comprovar suas alegações, os quais não foram analisados de forma satisfatória.
Em que pese ser permitido à autoridade ambiental julgadora que adote fundamentos de anteriores pareceres, informações ou decisões, bastando sua declaração de concordância ao julgar processo administrativo (art. 125, do Decreto 6.514/08), o Parecer emitido pela Procuradoria Federal Especializada – IBAMA não apresenta os critérios mínimos exigidos.
Isso porque, limitou-se a indicar que competia à Autora a produção de provas, deixando de emitir qualquer parecer razoável, tocantemente ao mérito do caso concreto.
Julgamento em primeira instância
E ao julgar, a autoridade de primeira instância fundamentou assim a sua decisão:
II— FUNDAMENTAÇÃO
- As alegações e documentos apresentados na defesa administrativa foram objeto de análise técnica e jurídica, sendo as informações prestadas pela área técnica e fiscal na instrução dos autos aliadas ao Parecer Jurídico da Procuradoria Federal Especializada são suficientes para motivar a presente decisão, não sendo necessária sua reprodução.
- Desta forma, nos termos do art. 125, parágrafo único, do Decreto 6.514, de 2008, concordo com os fundamentos apresentados pelo Parecer Jurídico da Procuradoria Especializada e homologo as informações prestadas pela área técnica e fiscal desta Autarquia Federal, fazendo-os parte integrante deste ato decisório.
Julgamento em segunda instância
Já a autoridade de segunda instância decidiu pelo improvimento do recurso pelos seguintes motivos:
Não havendo no recurso interposto elementos capazes de modificar o ato decisório de primeira instância, em face de razões de legalidade e de mérito – conforme Parecer Técnico Recursal para Recurso do Interessado e Despacho, DECIDO pelo improvimento do recurso, pela manutenção do Auto de Infração, da multa aplicada e do Termo de Embargo/Interdição e pela demolição da obra e recuperação da área degradada, nos termos do art. 70, § 4º, e art. 72, incisos II e VII, ambos da Lei 9.605/98; do art. 3º, incisos II e VII, art. 108 e art. 127, § 2º, todos do Decreto 6.514/08; e do art. 152, § 1º, da Instrução Normativa 14/09.
Ora! Não poderiam essas autoridades julgadoras concordar com pareceres que não apreciaram as provas, documentos e argumentos levantados pela Autora/autuada, limitando-se a rechaçar a defesa de forma genérica e vazia, sem combater as teses ali apresentadas.
Está evidente que apenas foi oportunizado o direito a defesa e ao contraditório à Autora para cumprimento de formalidade legal, de modo que, a autuação foi mantida com base em parecer visivelmente padronizado, que irrefutavelmente ofende o princípio da motivação e conduz à procedência da ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental.
Parecer ao recurso administrativo
E quando interposto o recurso administrativo, a equipe técnica do IBAMA elaborou o Parecer Técnico Recursal para o Recurso do Interessado, que de igual forma, é padronizado e não analisou o recurso muito menos as provas juntadas pela Autora/recorrente, limitando-se a análise genérica e vazia.
Não há dúvidas que o Parecer Técnico Recursal para o Recurso do Interessado em anexo não serve como fundamento de decidir, porque se limitou, dentre outros pontos, a dizer que “todos os argumentos e alegações trazidos pelo autuado no recurso e que constam na defesa foram analisados pela autoridade julgadora”, quando de fato não foram!
É notório que não houve a análise da defesa prévia, nem do recurso e muito menos das provas juntadas pela Autora, pois sequer é possível encontrar menção a estas nos documentos que instruem o processo administrativo ambiental, a demonstrar de forma inequívoca a ilegalidade do processo administrativo em questão para julgar procedente a ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental.
Ora. Não se pode considerar como motivado um ato administrativo que não combate a defesa prévia e recurso administrativo apresentados pelo administrado, limitando-se a decisões genéricas, vazias e padronizadas.
A conclusão extraída disso, é que houve expressa violação ao art. 20, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657/42); aos art. 1º, art. 5º, LIV e LV, art. 37, caput, e art. 93, inciso IX, da Constituição Federal de 1988; art. 2º e art. 50 da Lei Federal 9.784/99; e, art. 95 do Decreto 6.514/08, assim descritos:
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão
Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.
Constituição Federal de 1988
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […]
III – a dignidade da pessoa humana;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […]
Art. 93. […]:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
Lei Federal 9.784
Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
I – atuação conforme a lei e o Direito;
II – atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;
III – objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;
IV – atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;
V – divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;
VI – adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;
VII – indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;
IX – adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;
X – garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;
XI – proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;
XII – impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;
XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;
IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;
V – decidam recursos administrativos;
VI – decorram de reexame de ofício;
VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;
VIII – importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato. […]
Decreto 6.514/08
Art. 95. O processo será orientado pelos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência, bem como pelos critérios mencionados no parágrafo único do art. 2º da Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
Os dispositivos acima tratam do óbvio: a fundamentação e motivação tem como pressuposto a análise das alegações apresentadas pelas partes, o efetivo contraditório e o exercício da ampla defesa. Em última análise, trata-se do respeito ao devido processo legal.
Não se desconhece que a autoridade julgadora poderia ter motivado sua decisão na declaração de concordância com fundamento no Parecer e demais informações, como o fez.
Ausência de motivação
Ocorre que, as informações dos autos do processo administrativos e principalmente dos pareceres, não consistem em motivação explícita, clara e congruente, muito menos possuem a indicação dos fatos e fundamentos jurídicos aptos a desqualificar a defesa da Autora, justamente porque não houve qualquer análise do que foi dito pela Autora, daí que deve ser julgada procedente a ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental.
É de lembrar que a motivação funciona como instrumento para verificar se a Administração Pública fez cumprir os princípios constitucionais, tais como: o da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade e da eficiência, expressamente previstos no art. 37 da Constituição Federal.
O que diz a doutrina
Assim sendo, leciona DI PIETRO[1] que “o princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões” e que a “sua obrigatoriedade se justifica em qualquer tipo de ato, porque se trata de formalidade necessária para permitir o controle de legalidade dos atos administrativos”.
E continua a doutrinadora a sublinhar que esta exigência está regrada no parágrafo único, inciso I, Art. 2º da Lei 9.784/1999 no qual se exige a
“indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão”. Além disso, destaca que “a motivação consta de pareceres, informações, laudos, relatórios […]”, feitos pelo próprio órgão ou por outros, “sendo apenas indicados como fundamento da decisão. Nesse caso, eles constituem a motivação do ato, dele sendo parte integrante”.
Isso significa que, os pareceres, informações, laudos e relatórios que constituem a motivação do ato devem se prestar a combater de forma satisfatória aquilo que é alegado pelo administrado, e sendo assim, não podem ser padronizados, vazios e genéricos, como aconteceu no caso em tela.
Teoria dos fatos determinantes
Por fim, DI PIETRO[2] assevera no que tange a teoria dos fatos determinantes:
Entendemos que a motivação é, em regra, necessária, seja para os atos vinculados, seja para os atos discricionários, pois constitui garantia de legalidade, que tanto diz respeito ao interessado como à própria Administração Pública; a motivação é que permite a verificação, a qualquer momento, da legalidade do ato, até mesmo pelos demais Poderes do Estado….
Ainda relacionada com o motivo, há a teoria dos motivos determinantes, em consonância com a qual a validade do ato se vincula aos motivos indicados como seu fundamento, de tal modo que, se inexistentes ou falsos, implicam a sua nulidade.
Por outras palavras, quando a Administração motiva o ato, mesmo que a lei não exija a motivação, ele só será válido se os motivos forem verdadeiros. […].
A motivação não pode limitar-se a indicar a norma legal em que se fundamenta o ato. É necessário que na motivação se contenham os elementos indispensáveis para controle da legalidade do ato, inclusive no que diz respeito aos limites da discricionariedade.
É pela motivação que se verifica se o ato está ou não em consonância com a lei e com os princípios a que se submete a Administração Pública. Verificada essa conformidade, a escolha feita pela Administração insere-se no campo do mérito.
A exigência de motivação, hoje considerada imprescindível em qualquer tipo de ato, foi provavelmente uma das maiores conquistas em termos de garantia de legalidade dos atos administrativos.
ALEXANDRINO e PAULO
De acordo com ALEXANDRINO e PAULO[3] a motivação é:
[…] a declaração escrita do motivo que determinou a prática do ato. É a demonstração, por escrito, de que os pressupostos autorizadores da prática do ato realmente estão presentes, isto é, de que determinado fato aconteceu e de que esse fato se enquadra em uma norma jurídica que impõe ou autoriza a edição do ato administrativo que foi praticado. […] Em regra, a motivação, quando obrigatória, deve ser prévia ou contemporânea à expedição do ato, sob pena de nulidade deste. […]”
Como se indicou, o princípio da motivação é instrumental e corolário do princípio do devido processo da lei (art. 5.º, LIV, da Constituição), tendo necessária aplicação às decisões administrativas, assim como nas decisões judiciárias.
O que se entende por decisão
Por decisão, não se deve entender, porém, qualquer ato administrativo ou judiciário que apenas contenha um mandamento, senão aquele cujo comando aplique uma solução a litígios, controvérsias e dúvidas, conhecendo, acolhendo ou denegando pretensões, através das adequadas vias processuais, ainda que atuando de ofício.
Essa, a ratio do art. 50 da Lei 9.784, impõe à Administração Pública o dever de motivar os atos administrativos que neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses dos administrados, não podendo os fazer com base em pareceres jurídicos padronizados, genéricos e omissos às alegações do administrado em sede de defesa.
Motivação necessária
Os atos administrativos devem ser sempre motivados para assegurar que as decisões administrativas velem pelos direitos e garantias individuais, além de garantir o controle popular e o atendimento ao princípio da publicidade. A motivação consiste em dar uma justificativa ou exposição das razões originárias daquele ato administrativo.
Logo, a falta de motivação no ato discricionário abre a possibilidade de ocorrência de desvio ou abuso de poder, dada a dificuldade ou, mesmo, a impossibilidade de efetivo controle judicial e popular, pois, pela motivação, é possível aferir a verdadeira finalidade buscada pelo agente na prática do ato administrativo. Assim, verifica-se que a necessidade de motivação também visa garantir o PRINCÍPIO DA MORALIDADE, já que faz transparecer a eticidade da atuação do agente público.
O ilustre Professor Diogenes Gasparine[4] ensina que:
“a motivação é necessária para todo e qualquer ato administrativo, pois a falta de motivação ou indicação de motivos falsos ou incoerentes torna o ato nulo devido a Lei 9.784/99, em seu art. 50, que prevê a necessidade de motivação dos atos administrativos sem fazer distinção entre atos vinculados e os discricionários, embora mencione nos vários incisos desse dispositivo quando a motivação é exigida. ”
Cediço que a motivação é necessária para todo e qualquer ato administrativo, inclusive em anteriores pareceres que embasam decisão das autoridades julgadoras.
Sem isso, fica prejudicada a análise das condutas administrativas, sem as razões motivadoras que permitissem reconhecer seu afinamento ou desafinamento com os princípios administrativos como da legalidade, da finalidade, da proporcionalidade, da razoabilidade, da moralidade, do contraditório e ampla defesa, permitindo assim formar uma linha divisória entre os atos praticados dentro da legalidade ou atos eivados de vício.
Assim, a mera enunciação do artigo da lei ou alegação de que caberia à autuada produzir prova em contrário capaz de derruir o ato administrativo, não é suficiente para se considerar suprida a exigência de motivação.
Também não basta a simples enumeração dos fatos que deram margem ao ato, devendo ser substancialmente motivado, não servindo mera fundamentação formalística, vazia e padronizada, exigência necessária em virtude do direito que se tem em saber o motivo da imposição da penalidade.
Di pietro
Nesse sentido, vale destacar a doutrina de DI PIETRO[5]:
O princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Ele está consagrado pela doutrina e pela jurisprudência, não havendo mais espaço para as velhas doutrinas que discutiam se a sua obrigatoriedade alcançava só os atos vinculados ou só os atos discricionários, ou se estava presente em ambas as categorias. A sua obrigatoriedade se justifica em qualquer tipo de ato, porque se trata de formalidade necessária para permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
A obrigatoriedade de motivar decisões, estendeu-se, com a Constituição Federal de 1988, a seus próprios atos administrativos com características decisórias (art. 93, X). Por via de consequência, o princípio da motivação abrange as decisões administrativas tomadas por quaisquer dos demais Poderes, corolário inafastável do princípio do devido processo da lei.
Com efeito, se o Poder Judiciário, a quem caberá sempre o controle final da juridicidade de qualquer decisão, está obrigado à motivação das suas decisões administrativas, com mais razão, a ela também estarão os Poderes Legislativo, Executivo e os órgãos constitucionalmente autônomos, cada um em suas respectivas decisões administrativas, pois só assim ficará garantida a efetividade do controle.[6]
Em outras palavras, o dever de motivação e fundamentação dos atos administrativos decorre tanto da necessidade de se assegurar a ampla defesa e o devido processo ao administrado, quanto também do princípio constitucional da publicidade — poderoso instrumento posto à disposição da cidadania para exercer o controle da administração, sobretudo a partir da análise dos motivos que deflagram a expedição de atos que limitam direitos dos administrados.
Assim, sempre que houver a imposição de sanção ou a prática de ato administrativo gravoso ao administrado, a Administração tem o dever de motivá-lo.
Ausência de motivação explícita
E, repise-se, que tal motivação amparada no Parecer colacionado ut retro e outros documentos produzidos pelo Réu nos autos do processo administrativo, não consistiram em motivação explícita, clara e congruente, muito menos analisaram as provas acostadas ou indicaram os fatos e fundamentos jurídicos aptos a desqualificar a defesa da Autora, o que implica na procedência da ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental.
À propósito, embora não haja regra formal no ordenamento jurídico brasileiro que apresente cominação expressa de sanção em razão do descumprimento da obrigação de motivar os atos administrativos, pode-se afirmar, com fundamento no princípio da legalidade administrativa,
que o ato administrativo sem fundamentação, com motivação obscura ou incongruente padece de vício que, em princípio, pode acarretar sua invalidade[7].
Resumo
Em resumo: ato desprovido de motivação é ato insuscetível de compor objeto do controle analítico de legalidade exercido pelo Poder Judiciário, nos termos do art. 53 da Lei 9.784/99 e Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal.
Logo, o gravame imposto à Autora deve ser anulado, julgando procedente a ação declaratória de nulidade, sob pena de se criar um processo administrativo de nítido cunho inquisitório, daí que procedente a ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental.
Não se desconhece que o auto de infração constitui ato administrativo dotado de presunção juris tantum de legalidade e veracidade, de modo que para que seja declarada a ilegalidade de um ato administrativo, cabe ao administrado provar os fatos constitutivos de seu direito, e a inexistência dos fatos narrados como verdadeiros no auto de infração ambiental.
No entanto, não adianta a Administração Pública oportunizar ao autuado o direito ao contraditório e a ampla defesa apenas para cumprir direito constitucionalmente assegurado, se as alegações produzidas por ele forem desconsideradas sem o mínimo de análise.
Repise-se que a Autora juntou ao processo administrativo, documentos aptos a comprovar a inexistência de danos ambientais da obra.
Procedência da ação declaratória de nulidade
No entanto, tais documentos não foram objeto de análise, nem pelas autoridades que emitiram pareceres, muito menos pelas autoridades julgadoras de primeira e segunda instância, limitando-se a decisões vazias, genéricas e padronizadas.
Portanto, tendo o Réu se limitado a negar a pretensão da Autora, sem qualquer justificativa plausível e sem realizar a efetiva subsunção da norma ao caso concreto ou análise das provas apresentadas, baseando-se unicamente em anteriores pareceres e informações não fundamentados e muito menos motivados, deve ser julgada procedente a ação declaratória de nulidade de ato administrativo de multa ambiental…