Agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo. Modelo de recurso. Defesa. Ação civil pública ambiental. Liminar deferida. Concessão de tutela antecipada. Ministério Público. Infração Ambiental. Desmatamento. Advogado. Escritório de Advocacia.
EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MATO GROSSO
Ação civil Pública Ambiental – Desmatamento
AGRAVANTE, brasileiro, inscrito no CPF sob o n…, residente na Fazenda…, s/n, zona rural do Município de Sinop/MT, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, interpor
AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO
contra decisão proferida pela MM Juíza da 1ª Vara de…, que concedeu a tutela de urgência requerida nos autos da ação civil pública em epígrafe proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, que causará lesão grave e de difícil reparação – como se demonstrará nas anexas razões recursais –, motivo pelo qual se requer, desde logo, a atribuição do efeito suspensivo aos moldes do art. 995, parágrafo único, e art. 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil, requerendo seja recebido e processado, para ao final, ser conhecido e provido.
Como pressupostos de admissibilidade, informa como Advogado do Agravante…, e, Representante do Agravado, o Promotor de Justiça do Ministério Público de Mato Grosso…
Na falta da cópia de qualquer peça que Vossa Excelência julgue necessária ou no caso de algum outro vício que comprometa a admissibilidade e julgamento do agravo de instrumento, requer, seja aplicado o disposto no art. 932, parágrafo único, e art. 1017, § 3º, todos do CPC.
A guia de preparo foi devidamente recolhida e segue inclusa, e os autos de origem são eletrônicos, razão pela qual deixa de juntar as peças na forma do § 5 do art. 1.1017, CPC.
Por fim, esclarece que o recurso é tempestivo, na medida em que o mandado de citação foi juntado aos autos no dia 20.10.2020, cuja fluência do prazo iniciou no dia 21.10.2020.
Pede que seja recebido, conhecido e provido.
Florianópolis, 23 de outubro de 2020.
Advogado
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MATO GROSSO
Recurso de Agravo de Instrumento com Pedido de Efeito Suspensivo
Agravante…
Agravado: Ministério Público de Mato Grosso
Ação Civil Pública n…
Origem: 1ª Vara da Comarca de…
EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DESEMBARGADOR (A) RELATOR (A)
COLENDA CÂMARA
DOUTA PROCURADORIA
1. DO CABIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO COM EFEITO SUSPENSIVO
O art. 1015 do Código de Processo Civil dispõe que o agravo de instrumento será cabível contra decisão interlocutória (art. 203, §2º do CPC), nas hipóteses previstas na Lei. In casu, ao deferir a tutela de urgência, a MM Juíza a quo proferiu decisão prevista no art. 1015, I do CPC.
Cediço que, em regra, o agravo de instrumento é dotado tão somente de efeito devolutivo. No entanto, em situações peculiares, poderá o relator atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão (CPC, art. 1.019, I).
Assim, quando a decisão recorrida possui carga positiva, ou seja, quando o juiz de primeiro grau concede a tutela em sede antecipada contra o agravante, é possível requerer o efeito suspensivo ao agravo de forma a suspender aquilo que foi deferido pela decisão agravada.
O efeito suspensivo, nestes casos, exige a presença concomitante dos requisitos do art. 995, parágrafo único, do Código de Processo Civil, a saber, risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação (periculum in mora), e demonstração da probabilidade de provimento do recurso (fumus boni iuris).
Feita essa digressão e analisando a situação retratada nos autos à luz dos pressupostos necessários para a concessão efeito suspensivo ao agravo, verifica-se que o pleito formulado pelo Agravante comporta acolhimento, conforme passa a demonstrar.
2. SÍNTESE PROCESSUAL E DECISÃO AGRAVADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL
Na origem, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso, ora Agravado, propôs Ação Civil Pública com pedido de tutela de urgência, sustentando que, no ano de 2015, o IBAMA lavrou auto de infração ambiental aplicando multa ambiental administrativa no valor de R$ 4.250.000,00 e termo de embargo em face do Agravante a partir de imagens de geoprocessamento, por suposta degradação ambiental que data de 2011, consistente no desmatamento de 850 hectares de floresta nativa, objeto de especial preservação, sem autorização do órgão ambiental competente.
Ao propor a ação na origem, o Agravado alegou que tais documentos (auto de infração, termo de embargo, relatório de fiscalização e notícia de fato), mesmo sem qualquer fiscalização in loco ou trânsito em julgado do processo administrativo, demonstrariam e comprovariam o dano ambiental de modo que, seria cabível a imposição de obrigação de reparar o dano e ao pagamento de indenização por dano moral coletivo e dano ambiental, este último valorado em R$ 12.640.540,25.
Assim, pleiteou a concessão de antecipação dos efeitos da tutela para que o Agravante paralisasse as atividades na área, bem como, se abstivesse de exercer qualquer atividade no local (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações, etc), sob pena de multa diária, o que foi atendido pela Juíza a quo, conforme extrai-se do decisum objurgado:
ANTE O EXPOSTO, com base na motivação supra, DEFIRO o pedido de tutela de urgência e determino ao requerido que se abstenha de exercer qualquer atividade no local (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações, etc.), somente retornando com a atividade com autorização do órgão ambiental competente, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Todavia, a despeito das razões trazidas pelo Agravado, encampadas pela MM Juíza a quo, é certo que a realidade dos fatos, cotejada à luz do direito incidente sobre a hipótese, impõe, para além da concessão de efeito suspensivo, o provimento do presente Agravo de Instrumento, para reformar in totum a r. decisão liminar agravada, conforme será demonstrado.
3. DAS RAZÕES PARA A REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA QUE DEFERIU LIMINAR EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL
É por demais sabido que para a concessão das tutelas de urgência deve o magistrado, pautar-se nos termos dispostos nos artigos 300 e seguintes do Código de Processo Civil, dentre os quais se exige a presença cumulativa dos requisitos da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e perigo da demora (periculum in mora).
No presente caso, ambos os requisitos estão ausentes, além de estar configurada hipótese de irreversibilidade a que se refere o art. 300, § 3º, do CPC, o que impõe, sob qualquer ângulo, a reforma da r. decisão agravada.
Prima facie, há de se considerar que o Agravante é proprietário de imóvel localizado em área rural com ocupação consolidada há décadas, de modo que não há motivos fáticos ou jurídicos para o comando de se cessar a manutenção do plantio, cultivo ou uso a título da área.
Ademais, inexistindo a possibilidade de um dano iminente irreversível ao meio ambiente, falece razão à medida liminar pleiteada, mormente em se tratando de situação estável que perdura há anos.
Assim, data maxima venia, a r. decisão agravada, ao deferir a tutela de urgência determinando que o Agravante se abstenha de exercer qualquer atividade no local (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações, etc.), sob pena de multa diária de R$ 10.000,00, agiu em desconformidade com a legislação e com a própria situação fática.
Por outro lado, não há indício algum de que as atividades desenvolvidas na área pelo Agravante estejam sujeitando a coletividade e o meio ambiente a risco de dano, até porque, o Agravado não indicou quais seriam os danos ou atividades desenvolvidas pelo Agravante na área, que a título de informação, não está inserida em área de preservação permanente, reserva legal, e muito menos em parque ou unidade e conservação.
Ora. A concessão de medidas liminares se justifica em situações emergenciais, a fim de evitar danos frente à demora da prestação jurisdicional. O receio que justifica a atuação do poder geral de cautela é o que se relaciona a um dano provável, embasado em circunstâncias concretas ─ e não apenas possível ou eventual ─, e, ainda, a um perigo iminente, de forma que a espera do curso normal do processo resulte na inutilidade do provimento. Em se tratando de situação estável, que perdura há anos, inexiste o perigo da demora.
À propósito, consta nos autos de origem que a cópia do processo administrativo foi enviado ao Agravado em abril de 2016, enquanto a ação civil pública somente foi proposta em junho de 2020.
Ora, se o próprio Agravado aguardou tanto tempo para propor a ação, resta claro que inexiste qualquer perigo de dano a justificar a excepcional concessão da liminar nos moldes em que requerida.
Além do mais, para a concessão da medida de urgência se faz necessário e imprescindível a demonstração, por meio de prova inequívoca, de um dano ou risco efetivo que justifique a antecipação do provimento jurisdicional pleiteado pela parte, o que não aconteceu no caso em voga.
Isso porque, o Agravante se limitou a levantar argumentos genéricos no sentido de que as condutas do Agravado causariam gravíssimos danos ambientais capazes de evoluir para lesões irreparáveis, sem, contudo, imputar qualquer conduta específica praticada em detrimento do meio ambiente, que, aliás, funda-se tão somente em auto de infração ambiental lavrado no ano de 2015 por fatos supostamente ocorridos em 2011.
Embora a exigência de prova inequívoca para a antecipação dos efeitos da tutela possa sofrer mitigações em litígios que envolvam questões ambientais, é preciso que a verossimilhança das alegações e o perigo de dano estejam minimamente comprovados nos autos, mormente quando se pretende impor à parte adversa uma série de obrigações, como é o caso dos autos.
Contudo, há uma tendência em penalizar toda e qualquer conduta contra o meio ambiente. Daí que o decisum objurgado merece reforma.
De se notar ainda, que a mera lavratura do auto de infração ambiental não comprova a materialidade e autoria para a propositura de ação civil pública, nem a obrigação de reparar ou indenizar, muito menos, autoriza a concessão de liminar para impedir o uso da terra, sendo imprescindível a prévia comprovação do dano na inicial de origem, o que não ocorreu.
Aliás, não há sequer no decisum objurgado, a delimitação da área que não poderá ser utilizada, o que inarredavelmente, confronta a vontade do Legislador quando previu as possibilidades de concessão de liminar.
À propósito, o eminente Ministro Marco Aurélio Mello, da Corte Suprema, tem defendido com veemência que ao magistrado cabe aplicar a Lei:
Nunca é demasiado reconhecer que a atuação do Judiciário é vinculada ao Direito aprovado pelo legislador, pelo Congresso Nacional. Nessa premissa está a segurança jurídica, a revelação de viver-se não em um regime de exceção, mas num Estado Democrático de Direito.[1]
Portanto, não restaram configurados os pressupostos autorizadores da medida urgente pleiteada conforme determina a Lei, uma vez que, mesmo que estivesse a sua pretensão acobertada pela fumaça do bom direito, não restou demonstrado, concretamente, o efetivo perigo de dano grave ou de difícil reparação que possa advir do decisum, conforme melhor exposto a seguir.
3.1. DA AUSÊNCIA DE PROBABILIDADE DO DIREITO PARA CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
O primeiro requisito indicado pelo caput do artigo 300 do Novo Código e Processo Civil para a concessão da tutela de urgência é a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito alegado, também conhecido como fumus boni iuris ou fumaça do bom direito.
Sobre o tema, Fredie Didier Jr. destaca que os elementos que evidenciam a probabilidade do direito são a (i) verossimilhança fática, com a constatação de que há um considerável grau de plausibilidade em torno da narrativa trazida pelo autor e a (ii) plausibilidade jurídica, com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos.[2]
Em sua inicial, o Agravado afirma a existência da probabilidade do direito com o seguinte argumento:
O “fumus boni juris”, ou seja, a plausibilidade do direito invocado, consubstancia-se nos elementos contidos na notícia de fato instaurada por este Órgão e que atestam, de forma inequívoca, que está havendo flagrante desrespeito às normas ambientais vigentes, como demonstrado anteriormente.
Diante disso, a MM. Juíza a quo justificou a probabilidade do direito para a concessão da tutela de urgência da seguinte forma:
No caso em apreço, os documentos que instruem a inicial evidenciam a probabilidade do direito, na medida em que o auto de infração e termo de embargo, bem como relatório de fiscalização de fls. 24/29, revelam que foi identificado o desmate de 850 ha em fazenda localizada no estado de MATO GROSSO, efetuado em data posterior a 2011, o que demonstra o fumus boni iuris.
Entretanto, como já comprovado, as premissas fáticas em que se baseou a MM Julgadora estão equivocadas, de modo que no caso em análise não estão presentes os elementos que evidenciam a probabilidade do direito invocado, o que resulta na impossibilidade de manutenção da r. decisão agravada.
Isso porque, a ação na origem foi proposta exclusivamente com base em auto de infração ambiental e termo de embargo lavrados remotamente em 2015 por fatos supostamente ocorridos em 2011, de modo que não é possível extrair com exatidão a certeza de dano, quais as atividades que o Agravado desenvolve na área, qual é a área, e nem mesmo se a área é utilizada.
Portanto, não subsiste justificativa para a manutenção da r. decisão agravada, especialmente quando se pretende antecipar os efeitos do próprio provimento jurisdicional pleiteado pelo Agravado em sua exordial.
3.2. DA AUSÊNCIA DE PERIGO DA DEMORA PARA DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA
O outro requisito para a concessão da tutela de urgência segundo o artigo 300 do CPC, é o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Fredie Didier nos ensina que o deferimento da tutela provisória somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo para entregar a tutela jurisdicional, porque a demora do processo pode causar à parte um dano irreversível ou de difícil reversibilidade.
Em sua inicial, o Agravado justifica a presença do perigo da demora assim:
O “periculum in mora” é notório e decorre do risco da ocorrência de sequelas irreversíveis ao meio ambiente pois, no caso em questão, conforme documentação anexa, desde o ano de 2011 há registros de desmate no local pertencente ao requerido, sendo certo que a menos que se coíba por ordem judicial, venha ela antes do término da presente ação, a destruir irremediavelmente o referido patrimônio, com a prestação jurisdicional, que certamente advirá em favor da sociedade, restará inócua.
Por sua vez, a MM Juíza a quo afirma que:
O perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo está demonstrado pelo fato de que as atividades desenvolvidas pelo requerido representam potencial risco de dano ao meio ambiente, devendo ser aplicado o princípio da prevenção.
Entretanto, tal argumento também não se mostra correto, pelo simples fato de que não restou demonstrado pelo Agravado qualquer dano ou risco ao meio ambiente, porque a ação na origem foi proposta tão somente com base em documentos enviados pelo IBAMA que, a partir de imagens de satélite teria constatado suposto desmatamento, lavrado auto de infração ambiental e enviado cópia dos autos do processo administrativo ao Agravado.
O dano ao meio ambiente não pode ser descrito de forma genérica, exigindo a comprovação de sua eventual extensão, o que não restou comprovado nem nas entrelinhas da ação civil pública, mesmo porque, trata-se de situação estável, que perdura há anos, e, portanto, inexiste o perigo da demora.
Dessa forma, não há nos autos indícios da ocorrência de degradação ambiental atual que possa justificar uma intervenção imediata e tão gravosa ao Agravante, de modo que a reforma do decisum é necessária.
3.3. PERICULUM IN MORA INVERSO – INCIDÊNCIA DA HIPÓTESE DE IRREVERSIBILIDADE (art. 300, § 3°, do CPC)
Conforme demonstrado alhures, a ação proposta na origem tem como base, auto de infração ambiental e termo de embargo lavrados pelo IBAMA a partir de imagens georreferenciadas, cuja presunção de veracidade e legalidade não é absoluta.
Entretanto, a MM Juíza a quo fixou multa diária no valor de R$ 10.000,00 sem qualquer limite, caso o Agravante descumpra as medidas impostas pela r. decisão agravada. Referido decisum foi pautado tão somente nas alegações do Agravado, desprovidas de amparo legal, sem considerar a realidade fática do local e a ausência de documentos ou prova de efetivo dano.
Ora. Não é admissível para o caso em apreço justificar a urgência da pretensão liminar na afirmação de que as condutas do Agravante causam gravíssimos danos ambientais capazes de evoluir para lesões irreparáveis, quando o próprio relatório de fiscalização relata que a suposta supressão ocorreu no ano de 2011, ou seja, há quase uma década.
Relembre-se que o Agravado obteve ciência do processo administrativo instaurado em abril de 2016, enquanto a ação civil pública somente foi proposta em junho de 2020. É dizer que, se o próprio Agravado aguardou tanto tempo para propor a ação na origem, evidente que inexiste qualquer perigo de dano a justificar a excepcional concessão da liminar.
Nesse passo, a MM Juíza a quo, ao deferir a tutela de urgência postulada pelo Agravado, ignorou totalmente o cenário, deixando de analisar os riscos que o provimento causará ao Agravante, que estará sujeito a multa diária no valor de R$ 10.000,00 sem qualquer limite, na medida em que poderá não cumprir as obrigações impostas pela r. decisão agravada diante da ausência de documentos para que se identifique e delimite a área objeto dos autos. Ou seja, o Agravante sequer sabe a área que pode ou não continuar com sua cultura.
Assim, o periculum in mora reverso resta evidente no caso sob análise e, por consequência, a existência de perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, na medida em que o Agravante poderá ser multado de forma injusta, ou impedido de colher os frutos já plantados e que certamente perecerão.
Nesse sentido, já decidiu este e. Tribunal de Justiça:
RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – DESMATE IRREGULAR EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL – PARQUE ESTADUAL SERRA RICARDO FRANCO – PESRF – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – EMBARGO DA ÁREA DEGRADADA – IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇOES DE NÃO FAZER: ABSTENÇAO DA PRÁTICA DE ATIVIDADES LESIVAS AO MEIO AMBIENTE – RETIRADA DO REBANHO DO IMÓVEL RURAL – INDISPONIBILIDADE DE BENS – RECOMPOSIÇÃO DA ÁREA DEGRADADA– PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA – NÃO EVIDENCIADA APARÊNCIA DO BOM DIREITO – DELIMITAÇÃO GENÉRICA DA ÁREA DEGRADADA – CONTROVÉRSIA ACERCA DO PERÍODO DO DESMATAMENTO – DESPROPORCIONALIDADE DAS MEDIDAS APLICADAS – CELEBRAÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA – COMPROMISSOS ASSUMIDOS PARA A IMPLANTAÇÃO E REGULARIZAÇÃO DA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO – CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO – IRREGULARIDADE NA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL – DESAPROPRIAÇÃO E INDENIZAÇÃO – INOCORRÊNCIA – ANTROPIZAÇÃO DA ÁREA – MATÉRIAS A SEREM DIRIMIDAS NA AÇÃO PRINCIPAL – PERICULUM IN MORA INVERSO – PREQUESTIONAMENTO – RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. Não se olvide que a cessação do dano ambiental quanto mais cedo determinada, mas eficaz será. Todavia, conforme o art. 300 da NCPC, para a concessão da tutela de urgência é necessário que haja prova suficiente a dar respaldo ao julgador na convicção da verossimilhança das alegações da parte autora, bem como que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, o que não se evidencia das alegações ministeriais. 2. Uma vez ocorrido o dano, o que vige é o princípio da reparação, já que medidas mitigadoras não mais se mostram viáveis, de modo que a reparação do dano ambiental, se não for possível de recuperação, pode ser realizada por outras formas, inclusive por medidas de compensação. 3. Não se afigura razoável a medida de embargo da atividade rural, bem como a restrição total e generalizada de todo o imóvel, quando desconhecidos o perímetro da Unidade de Conservação em que supostamente estaria inserida a área degradada, além de que há controvérsia quanto ao período e ao processo de antropização na área. 4. […]. 6. Em que pese em se tratando de preservação ambiental deva prevalecer o interesse público sobre o particular, a desproporcionalidade das medidas inibitórias/reparatórias, determinadas pelo juízo na origem, extrapolam aquelas necessárias a garantir a compensação ambiental, a caracterizar o periculum in mora inverso. 7. […]. (N.U 1001065-40.2017.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, EDSON DIAS REIS, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, TJMT, Julgado em 06/11/2019, Publicado no DJE 22/11/2019).
Nestes termos, dadas as especificidades desta demanda e os riscos a que está sujeito o Agravante, além da completa irrazoabilidade e desproporcionalidade da r. decisão liminar objurgada, já que pautada em ilações e não na legislação vigente, em que ausentes até mesmo o nexo causal entre a alegada conduta do Agravante e o dano, ou prova de autoria e materialidade, está presente o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, a teor do que dispõe o referido art. 300, § 3°, do CPC/2015, autorizando, maxima venia, a reforma do decisum objurgado.
4. ALTERNATIVAMENTE – NECESSIDADE DE REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA
No caso deste (a) e. Relator (a) não entender pela reforma do decisum in totum nos termos expostos anteriormente, e, pelo princípio da eventualidade, necessário então, requerer a redução do valor da multa diária imposta na decisão agravada, bem como, a aplicação de um teto.
Conforme se infere da r. decisão objurgada, a MM Juíza a quo determinou a aplicação de multa diária no importe de R$ 10.000,00 em caso de descumprimento, sem delimitar um limite máximo.
Cediço que o princípio da proporcionalidade e razoabilidade é, pois, instrumento de interpretação a ser utilizado pelo Magistrado na ponderação de direitos em colisão, objetivando aferir aquele que, diante das circunstâncias fáticas e jurídicas do caso concreto, detém o maior peso específico, devendo prevalecer um sobre o outro na solução da lide.
Assim, imprescindível que, ao proferir decisão como a do caso em tela, deverá o Juízo, em estrita observância aos ditames principiológicos, decidir com base nas circunstâncias fáticas e jurídicas, interpretando a legislação de modo a viabilizar o cumprimento das determinações pelas partes, sem que a decisão represente injusto risco de dano à parte prejudicada.
Está evidente que a decisão proferida pela MM Juíza a quo deixou de observar o princípio da razoabilidade e proporcionalidade, porque pode gerar danos e prejuízos irreparáveis ao Agravante, ao impor elevadíssima multa em caso de descumprimento e sem qualquer limite máximo.
É certo que a fixação de multa deve ter o seu caráter pedagógico, devendo ocasionar efetivo abalo ao destinatário da ordem, para que a cumpra, incondicionalmente, mesmo porque, sem a força coercitiva pela irrisoriedade da quantificação, fomenta o desprezo e a conduta em desprestígio da própria Justiça, o que se mostra inadmissível e intolerável.
No entanto, a multa não pode configurar um ônus excessivo, como bem pontua Theotonio Negrão, José Roberto F. Gouvêa e Luis Guilherme A. Bondioli:
Embora a astreinte deva ser expressiva, a ponto de coagir o devedor a cumprir o preceito, não pode configurar-se como ônus excessivo, sob pena de se estar olvidando, com isso, as noções de equidade que devem pautar as decisões judiciais (JTJ 260/321).[3]
Outrossim, a fixação da multa não pode ensejar a natureza de confisco e nem enriquecimento sem causa a quem favorece, bem como considerando que pesa o comportamento do destinatário da ordem no dimensionamento do valor da multa[4], e, portanto, de rigor sua redução para patamares razoáveis, isto é, levando em conta as peculiaridades do caso concreto, em que se trata de pequeno agricultor cuja subsistência está ligada intimamente à agricultura.
Assim, inquestionável o dever de se rever o decisum objurgado no caso de não se entender pela sua reforma in totum, uma vez que foi fixada multa afrontosa aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e sem limite máximo.
5. NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, inciso I, ambos do CPC, é prevista a hipótese de concessão de efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento para suspender os efeitos da decisão recorrida, desde que haja risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e fique demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
A esse respeito, anotam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, com precisão, que o escopo da norma é evitar que o direito pereça, de sorte que o Juiz deve agir para que esse objetivo seja alcançado, conferindo ou não efeito suspensivo ao recurso, de acordo com a situação fática e as peculiaridades do caso concreto.[5]
Recorre-se, ainda, ao magistério de Humberto Theodoro Júnior, que acertadamente ponderou: se sem a suspensão do efeito da decisão recorrida o processo se torna inútil e injusto para o recorrente, claro é que a Justiça estará obrigada a conceder-lhe o provimento cautelar do art. 558. Não terá apenas a faculdade, mas o dever de fazê-lo.[6]
Vê-se que, in casu, estão presentes os requisitos autorizadores da concessão do efeito suspensivo, especialmente porque se levada a efeito a r. decisão agravada, o Agravante estará sujeito à aplicação de elevadíssima multa diária no valor de R$ 10.000,00 sem qualquer limite, ante a impossibilidade de cumprir as medidas determinadas pela MM Juíza a quo, pois, como visto alhures, não há qualquer documento que informe ou delimite a área objeto do decisum objurgado.
As razões expostas acima demonstram, nitidamente, a presença da relevância da fundamentação a ensejar o deferimento da concessão do efeito suspensivo pleiteado, uma vez que, dentro do juízo de aparência e da análise da exposição de mérito, é inegável a plausibilidade da argumentação contraposta ao decisum genérico.
Em outro giro, há periculum in mora reverso encontra-se respaldado na medida em que a paralisação das atividade no local, em especial a agricultura, importará perecimento dos frutos e, por consequência, comprometerá a fonte de renda não só do Agravante, mas de muitas famílias que dependem da colheita, e, inarredavelmente, haverá prejuízos de caráter grave e irreversível, uma vez que sem a concessão do efeito suspensivo, a demanda de origem terá o seu curso normal, em prejuízo à salvaguarda de seus direitos.
Não se tenta aqui negar a importância de se proteger e preservar o meio ambiente, no entanto, impõe-se seja realizada uma análise dos riscos em causa para que se possa definir qual a medida mais adequada e proporcional para o efetivo controle ambiental, em termos de eficácia e de viabilidade ambiental, social e econômica.
Não obstante, trata-se de situação estável, que perdura há anos e sem qualquer prova de dano, senão meras suposições do Agravado, e, portanto, inexiste o perigo da demora.
Importa registrar que, mesmo naquelas situações em que haja a efetiva configuração do fato consumado, o “mal já está feito”, e, ainda que não se perca de vista a realçada importância do meio ambiente, pode-se amenizar a regra de prevalência, mesmo que esteja em pauta a integridade ambiental. Há de se considerar que a agricultura é a fonte de renda do Agravante e de sua família, que ali desempenham suas atividades agropecuárias, inclusive, por um processo histórico e incentivado ao longo dos anos pelo próprio Poder Público.
Com efeito, com a determinação de impedir o Agravante de intervir no local, os frutos já plantados falecerão. Lado outro, haverá a proliferação de insetos e pragas no local de maneira e desnecessária, tornando inócua decisão posterior que reconheça razão ao Agravante, mesmo porque, simples análise perfunctória demonstra que o Agravado não comprovou qualquer dano no local, enquanto a MM Juíza a quo proferiu decisum genérico sem mencionar a área que se deva abster.
Portanto, vê-se premente a concessão de efeito suspensivo à r. decisão agravada, conforme possibilitam os artigos 995, parágrafo único e 1.019, I, ambos do CPC, sob pena de afronta a regra estatuída no art. 300, § 3°, do CPC.