EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE…
REQUERENTE, vem, por seus procuradores regularmente constituídos, propor AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA, INAUDITA ALTERA PARTE POR PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE contra a REQUERIDA, o que faz com fundamento nas razões de fato e de direito a seguir expostas, e conforme custas iniciais devidamente recolhidas.
1. OBJETO DA PRESENTE AÇÃO
Por meio da presente ação, a Requerente objetiva a anulação dos Autos de Infração Ambiental, lavrados em razão de suposto uso não autorizado de fogo. Por consequência, foram impostas multas pecuniárias cujo valor histórico consolidado.
Contudo, além de ter ocorrido gritante prescrição intercorrente em ambos os processos administrativos de apuração da infração, o que se verá é que a Requerente jamais fez uso de fogo.
Tratou-se, em verdade, de incêndio de autoria desconhecida, iniciado às margens de curso d’água com alta movimentação (atividades de pesca e lazer em geral) e sem qualquer conduta por parte da requerente, o que configura fato de terceiro.
Assim, espera- se a declaração de nulidade integral dos autos de infração ambiental em razão dos vícios de legalidade e motivação.
Em sede de tutela provisória de urgência, com base no oferecimento de seguro garantia idôneo e suficiente, a Requerente postula a suspensão imediata da exigibilidade das multas que lhe foram indevidamente imputadas, até o julgamento de mérito da presente demanda.
2. SÍNTESE DOS FATOS
Trata-se de ação declaratória de nulidade de atos administrativos (Autos de infração ambiental), lavrados por agentes vinculados à Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Como dito, os autos de infração ambiental foram expedidos em razão de suposto uso não autorizado de fogo, na propriedade da requerente.
Observe-se que: (i) o auto de infração ambiental foi lavrado em decorrência de suposto uso de fogo não autorizado em áreas agropastoris; e (ii) o auto de infração ambiental, por danificar vegetação nativa em estágio pioneiro, mediante emprego de fogo, em área considerada de preservação permanente (“APP”), sem autorização do órgão competente.
Ocorre que o conjunto fático da presente demanda demonstrará a ocorrência de prescrição intercorrente nos processos administrativos instaurados a partir da lavratura dos autos de infração ambiental em questão.
Não bastassem as razões de mérito que foram ignoradas pelas autoridades julgadoras na esfera administrativa, o Requerido também fechou os olhos para a gritante prescrição intercorrente evidenciada nos dois processos administrativos instaurados para apurar a suposta infração.
Isso porque, inquestionavelmente, os procedimentos permaneceram paralisados por mais de três anos, sem qualquer tramitação no sentido de apurar a infração.
Veja, Excelência: (i) em relação ao auto de infração ambiental, o recurso administrativo da Requerente foi interposto contra a decisão de 1ª instância da autoridade fiscalizadora, porém a reunião para julgamento só ocorreu em…; e, (ii) quanto ao auto de infração ambiental, o recurso administrativo foi protocolado em…, ao passo que a reunião para julgamento de 2ª instância administrativa data de…
É nesse contexto que, esgotada a via administrativa, a Requerente se viu compelida a propor a presente ação para que seja declarada a nulidade integral dos Autos de infração ambiental impugnados.
Outrossim, como se verá adiante, pleiteia-se a suspensão da exigibilidade das multas em sede de tutela provisória de urgência.
3. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DOS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS
Inicialmente, registre-se que o instituto da prescrição guarda íntimo vínculo com a segurança jurídica, conforme ensinamentos de José dos Santos Carvalho Filho[1], bem como com a razoável duração do processo (princípio resguardado pela Constituição da República no artigo 5, LXXVII).
Trata-se de essencial instrumento para a limitação de arbitrariedades por parte da Administração Pública, especialmente para impedir que o administrado fique eternamente à mercê de suas decisões.
Assim, a prescrição é um instituto que busca justamente evitar que a tutela do interesse público acabe configurando violência aos direitos do administrado, o que fatalmente ocorre quando este, em virtude de atos e fatos ocorridos no passado, fica sujeito à atuação estatal há mais tempo do que um período razoável.
No que diz respeito aos processos administrativos sancionadores, uma das manifestações do referido instituto se materializa por meio da prescrição intercorrente, segundo a qual o andamento do processo administrativo não deve permanecer inerte além de determinado lapso temporal, sob pena de extinção da pretensão punitiva estatal. Nesse sentido, dispõe o Decreto Federal 6.514/2008:
Art. 21, § 2º – Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração PARALISADO POR MAIS DE TRÊS ANOS, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação.
Art. 22 – Interrompe-se a prescrição:
I- pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator por qualquer outro meio, inclusive por edital;
II- por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração do fato;
III- pela decisão condenatória recorrível.
Como se percebe, ao serem lidos em conjunto, tais dispositivos estabelecem que ocorrerá a prescrição intercorrente sempre que o procedimento administrativo permanecer paralisado por mais de três anos, sendo que a prescrição somente se interrompe por atos inequívocos que importem na apuração do fato.
3.1. JURISPRUDÊNCIA RECONHECE A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE
Abaixo, veja-se julgado meramente exemplificativo no qual, em um caso concreto similar ao presente, envolvendo suposta infração ambiental por queima de palha de cana, reconheceu-se que a prescrição intercorrente é aplicável no âmbito estadual, com base no Decreto Federal 6.514/2008:
“Prescrição intercorrente. LF nº 9.873/99. Decreto nº 6.514/08. Resolução SMA nº 32/2010. Ao contrário do que sustenta a apelante, a LF nº 9.837/99 rege a prescrição para o exercício da ação punitiva no âmbito da Administração Pública Federal, não sendo aplicável às ações administrativas punitivas desenvolvidas por Estados e municípios. É o entendimento que prevalece nas câmaras ambientais, conforme inclusive ao precedente citado pela embargante. Porém, no caso de procedimento administrativo estadual, aplica-se o art. 98 da Resolução SMA nº 32/2010, que expressamente autoriza a incidência do DF nº 6.514/2008, cujo art. 21, § 2º prevê que ‘Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação”[2].
Em outros casos semelhantes, também dizendo respeito a autuações por supostas infrações ambientais, este E. TJSP[3] reconheceu reiterada e expressamente a aplicabilidade da prescrição intercorrente em processos administrativos no âmbito de Estados e Municípios.
Ademais, exatamente pelo fato de a prescrição intercorrente ser um dos corolários dos princípios da segurança jurídica, da eficiência e da duração razoável do processo, é que a Administração Pública não pode permitir que processos sob sua responsabilidade se perpetuem indefinidamente.
É exatamente nesse sentido que o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do E. STJ, afirmou que:
“A prescrição da atividade sancionadora da Administração Pública regula- se diretamente pelas prescrições das regras positivas, mas também lhe é aplicável o critério da razoabilidade da duração do processo, conforme instituído pela EC 45/04, que implantou o inciso LXXVIII do art. 5o. da Carta Magna[4].”
No caso em apreço, lembre-se que houve um lapso temporal de mais de três anos, nos dois processos administrativos, entre o protocolo do recurso hierárquico apresentado pela Requerente e seu julgamento, o que nitidamente configura a ocorrência de prescrição intercorrente.
Relembre-se que, em relação ao auto de infração ambiental, o recurso administrativo foi interposto pela Requerente no dia, mas a reunião para julgamento de 2ª instância administrativa só ocorreu em
Nesse meio tempo, por óbvio, os procedimentos ficaram pendentes de julgamento por mais de três anos (nos exatos termos do já mencionado artigo 21, § 2º, do Decreto Federal 6.514/2008), não tendo havido qualquer tramitação ou movimentação no sentido de apurar a infração.
Diante do exposto, não há como afastar a prescrição intercorrente no presente caso, de sorte que a declaração de extinção da punibilidade das multas imputadas à Requerente é medida de rigor.
4. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA INAUDITA ALTERA PARTE
Em sede de tutela provisória de urgência, a Requerente postula a suspensão imediata da exigibilidade das multas que, como visto, lhe foram indevidamente imputadas, até que o mérito da presente ação seja julgado.
Logo, impõe-se a concessão da tutela de urgência inaudita altera parte para evitar que a Requerente sofra prejuízos diante do comportamento equivocado dos agentes da Requerida.
Para que não reste qualquer receio por parte de V. Exa., a Requerente oferece seguro garantia no valor total e atualizado das multas, acrescido de 30% (trinta por cento), com fundamento no art. 9, II e § 3º[5], da Lei Federal 6.830/80, com redação dada pela Lei Federal 13.043/14, e no art. 848, parágrafo único[6], do CPC.
De pronto, não custa reforçar que o oferecimento de seguro garantia nos termos acima indicados é perfeitamente suficiente para que se viabilize a suspensão da exigibilidade das multas. Tal entendimento se encontra consolidado na jurisprudência do E. TJSP:
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ANULATÓRIA – MULTA AMBIENTAL – TUTELA ANTECIPADA – PEDIDO DE SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO DE CDA – OFERECIMENTO DE CAUÇÃO IDÔNEA (APÓLICE DE SEGURO GARANTIA) – CABIMENTO – INTELIGÊNCIA DO ART. 8º DA LEI ESTADUAL Nº 12.799/08 C/C ART. 7º DA LEI FEDERAL Nº 10.522/02, NORMAS QUE REGULAM O CADIN FEDERAL – RECURSO PROVIDO. A multa ambiental, que não tem natureza tributária, não se submete à disciplina do art. 151 do CTN, diante da existência de norma especial que regula hipótese semelhante, ora aplicada por analogia, conforme precedentes da 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do TJSP. Ademais, a caução oferecida (apólice de seguro garantia), no caso, deve ser considerada idônea, mormente em casos como o ora analisado, em que a parte zelosa se antecipa e ajuíza ação com o fim de defender seus próprios interesses, demonstrando que tem razões relevantes para evitar o comprometimento de seu nome e de suas atividades e que tem capacidade econômica de fazer frente a eventual revés na decisão final, razão por que não há óbice legal para que, assegurada a garantia do Estado, se defira medida capaz de manter o equilíbrio entre os interesses contrapostos.
Não bastasse o oferecimento de caução idônea e suficiente, encontram-se inegavelmente preenchidos os requisitos para a concessão de tutela provisória de urgência previstos no art. 300 do CPC. São eles: (i) probabilidade do direito – fumus boni juris; e (ii) perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo – periculum in mora.
Nesse sentido, reporta-se a Requerente a todo o exposto nos capítulos anteriores, uma vez que a descrição dos fatos, a base legal, jurisprudencial e doutrinária pertinente são mais que suficientes para confirmar a probabilidade do direito ora alegado.