Modelo de Contrarrazões ao Recurso de Apelação interposto contra sentença que declarou nulo auto de infração ambiental por ausência de responsabilidade do proprietário pelo fogo sem autorização ou licença que atingiu sua área.
EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE…
APELADA, previamente qualificada, vem, à presença de Vossa Excelência, tempestivamente[1], por seu advogado, nos termos do art. 1.010, § 1º, do Código de Processo Civil – CPC, apresentar CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO interposto pela APELANTE, o que faz nos seguintes termos.
1. SÍNTESE FÁTICA E DA SENTENÇA APELADA
Cuidam os autos de ação anulatória de dois Autos de Infração Ambiental, lavrados pela Apelante em razão de suposto uso de fogo sem autorização ou licença do órgão competente, que resultou na imposição de multas ambientais astronômicas.
A Apelante foi citada e apresentou contestação frágil, deixando de se manifestar aos fatos suscitados pela Apelada, sobretudo quanto aos prejuízos sofridos pela Apelada em decorrência do incêndio e a ausência de benefício auferido com o fogo.
De igual modo, deixou de se manifestar quanto aos esforços da Apelada para a prevenção e combate ao incêndio, além de que a Apelada possui sistema de colheita mecanizado na propriedade que por si só demonstra que o uso de fogo ou incêndio não é necessário.
A demanda, como não poderia ser diferente, foi julgada procedente e anulou os autos de infração ambiental impugnados, tendo em vista que a responsabilidade ambiental administrativa é subjetiva e a Apelada não se beneficiou da queimada.
No entanto, a APELANTE interpôs a apelação, com argumentos novos, genéricos e vazios, na tentativa de rebater as provas produzidas pela Apelada ao longo do processo, que deveriam ter sido impugnadas em sede de contestação e não o foram.
Nota-se que a apelação somente reitera sua ilegal e arbitrária conduta na esfera administrativa, bem como tenta atribuir responsabilidade à Apelada por um incêndio e uso de fogo do qual foi vítima e em nada a beneficiou, de modo que a r. sentença merece manutenção, como se verá em detalhes a seguir.
2. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – APELADA QUE NÃO SE BENEFICIOU DA QUEIMA
A Apelante tenta atribuir responsabilidade à Apelada por ter auferido suposta vantagem decorrente do incêndio que acometeu a sua propriedade.
Entretanto, a ausência de benefício da Apelada é outro fato incontroverso, uma vez que os prejuízos sofridos foram comprovados na exordial e não impugnados pela Apelante em contestação.
Se é fato incontroverso que a Apelada não se beneficiou com o incêndio, mas sofreu, em verdade, graves prejuízos dele decorrentes, não pode a APELANTE tentar atribuir uma responsabilidade com base nesse “suposto benefício”.
Assim, essa linha de argumentação sequer deve ser considerada, como já adiantado na preliminar da presente resposta.
Entretanto, apenas por amor ao debate, cumpre demonstrar uma vez mais os prejuízos incorridos pela Apelada. Diante do exposto, o processamento da cana queimada não foi uma forma de auferir benefícios, mas a única alternativa que restou à apelada para que pudesse minimizar os prejuízos já experimentados.
Para que o alegado benefício fosse efetivamente configurado, seria preciso que o recebimento e processamento da cana queimada resultasse em uma vantagem que não seria obtida com o processamento da cana crua.
Todavia, o que se verificou foi exatamente o oposto: a cana crua seria cortada sem a necessidade de emprego de brigadas de incêndio e sem causar prejuízos às futuras safras, mas com a queima acidental, todos esses elementos não previstos tiveram de ser incorporados nos custos da Apelada.
2.1. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL QUE É SUBJETIVA
Em casos como o presente, a jurisprudência deste E. TJ-SP afasta a responsabilidade pela não comprovação de benefícios, mas sim de prejuízos:
“Anulação de Débito Fiscal – Ação que questiona a autuação por ter o infrator se beneficiado da queima de palha de cana-de-açúcar (…) Ação julgada improcedente – Recurso reativando os argumentos iniciais acolhidos na decisão – Possibilidade de se dar acolhida a tese da apelante – Interpretação da lei que deve ser feita de forma racional – Não havendo prova de que a parte deu causa ao incêndio, o beneficiar a cana acaba sendo a única solução lógica e menos prejudicial ao meio ambiente – Ação de beneficiar que não se enquadra praticamente no sentido da lei (…)
Recurso acolhido para julgar procedente a ação e anular CDA, cancelando qualquer restrição decorrente do débito e condenado a Fazenda a pagar honorários de 20% do valor da causa, já abrangendo a condenação em segundo – Recurso provido” (TJSP, Apelação nº 1000520-44.2016.8.26.0369, rel. Des. Miguel Petroni, 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, j. 22/02/2018).
“MULTA AMBIENTAL. Ação anulatória. (…) Benefício da cana-de-açúcar despalhada por meio de queima ocorrida em área a menos de 15 metros da faixa de segurança da linha de distribuição de energia elétrica. (…)
Não há como afirmar que a autora foi de qualquer modo ‘beneficiada’ pela queima; não há prova de que houve abatimento no preço ou concessão de qualquer outra vantagem por ter adquirido a cana queimada, que acabou colhida antes do prazo e foi moída com menor rendimento.
Impossibilidade de a usina diferenciar a cana regularmente cortada no restante da área daquela queimada, de modo que lhe é inviável definir qual cana pode receber e processar. Benefício não demonstrado na espécie. – Improcedência. Recurso da autora provido” (TJSP, Apelação nº 1000442- 84.2015.8.26.0369, rel. Des. Torres de Carvalho, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, j. 21/09/2017).
“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. Multa ambiental. (…) A responsabilidade administrativa é subjetiva, não objetiva como alega o Estado. Benefício. Não há como afirmar que a embargante foi de qualquer modo ‘beneficiada’ pela queima; ao contrário, a embargante traz prova do alegado prejuízo; demonstra que, por contrato, a cana é colhida crua e de forma mecanizada, (…)
Os relatórios de inspeção atestam que o produto da queima estava sendo colhido para processamento pela usina; contudo, também indicam que na área atingida pelo fogo a cana já havia sido colhida anteriormente, o que corrobora a afirmação da embargante, no sentido de que não pretendia utilizar a queima para a colheita e processamento da cana.
A época do ano em que ocorreu o incêndio e as circunstâncias demonstradas nos autos afastam a presunção de legalidade e legitimidade do ato administrativo impugnado. Benefício não demonstrado na espécie. – Procedência. Recurso da embargante provido. Recurso do Estado desprovido” (TJ- SP, Apelação nº 0004822- 43.2015.8.26.0572, rel. Des. Torres de Carvalho, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, j. 05/07/2018)
Não bastasse tudo isso, a responsabilização pelo benefício sequer possui respaldo fático ou jurídico, uma vez que, acaso fosse admitida a responsabilidade na modalidade “beneficiar-se”, estar-se-ia admitindo uma responsabilização administrativa com natureza objetiva, já que não seria necessária qualquer conduta relacionada ao efetivo uso de fogo.