Modelo de petição de contrarrazões ao recurso de apelação em mandado de segurança do IBAMA contra sentença que concedeu a ordem para revogação de termo de embargo ambiental.
EXCELENTÍSSIMA SENHORA JUÍZA FEDERAL DA VARA FEDERAL DE
Apelada, já qualificada nos autos do Mandado de Segurança em epígrafe impetrado contra ato coator de Gerente Executivo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por seus advogados, nos termos do art. 1.003, § 5º, do Código de Processo Civil, apresentar suas CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA interposto pelo IBAMA contra a r. sentença proferida por esta MM. Juíza, pelas razões e fundamentos adiante aduzidos.
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL
CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO DO IBAMA
1. BREVE SÍNTESE DA DEMANDA
Trata-se de apelação interposta pelo Apelante contra a r. que concedeu a segurança ao presente mandado de segurança, ratificando a liminar anteriormente concedida e, por conseguinte, determinando a cessação dos efeitos dos termos de embargo lavrados pelo IBAMA, ora Apelante, em virtude de supostas irregularidades imputadas à Apelada no que concerne à compra de produto, as quais indicariam o recebimento de animais pretensamente provenientes de fazendas embargadas pelo IBAMA.
Conforme comprovado na exordial por meio de licenças ambientais e seus respectivos pedidos de renovação tempestivamente protocolados, a Apelada se encontram devidamente licenciada perante o órgão estadual competente.
Especificamente em relação à sua preocupação com os eventuais impactos de suas atividades no meio ambiente, a Apelada firmou Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público, por meio do qual se comprometeu a não adquirir produtos proveniente de propriedades consideradas irregulares sob os mais diversos aspectos: áreas embargadas, desmatamento ilegal, propriedades em unidades de conservação e terras indígenas, grilagem etc.
1.1. DA FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL
Pois bem. A Apelada recebeu visita de agentes fiscalizadores do Apelante, que, segundo informaram, estariam em diligência no âmbito de uma operação para combater a compra de produtos de áreas embargadas pelo IBAMA.
Na ocasião, muito embora tenha a Apelada tentado explicar aos agentes todo o procedimento adotado para garantir que não seja adquirido produtos proveniente de fazendas embargadas, os agentes do Apelante ainda assim entenderam por bem lavrar os termos de embargo ora questionados.
Neste ponto, cumpre ressaltar que não merecem acolhida as frágeis alegações do Apelante no sentido de que seria necessário conduzir uma dilação probatória para comprovar fatos ocorridos na diligência da fiscalização.
Vejam, Excelências, pouco importa o que ocorreu na ocasião em que os agentes fiscais federais estiveram nos estabelecimentos da Apelada para entregar os termos de embargo, e não em uma simples visita.
De fato, o que importa para a análise do direito líquido e certo da Apelante são as provas documentais pré-constituídas e juntadas aos autos, que, ao comprovarem a eficiência dos sistemas de rastreamento da Apelada, informam por completo as equivocadas constatações do órgão fiscalizador e jogam por terra a necessidade de dilação probatória.
Nesse sentido, ressalta-se que, até mesmo em cumprimento ao TAC celebrado com o MPF, a Apelada implementou um rigoroso sistema de monitoramento para impedir o recebimento de produto proveniente de fazendas embargadas pelo IBAMA, de modo justamente a evitar esse tipo de infortúnio.
Importante observar que o mencionado procedimento adotado pela Apelada é conhecido de longa data do MPF e dos órgãos de fiscalização ambiental, além de ser periodicamente acompanhado e auditado por entidades externas e pelo próprio MPF.
Nesse contexto, ficou evidente que a desregrada atuação dos agentes do IBAMA não teve qualquer fundamento fático ou legal, em especial diante de todo o material probatório apresentado junto à petição inicial, que comprovou de forma inequívoca o direito líquido e certo da Apelada, por cumprir à risca todas as suas obrigações para impedir a aquisição de produto proveniente de fazendas irregulares.
1.2. DA LAVRATURA DO TERMO DE EMBARGO
De fato, o principal motivo que teria ensejado os ilegais embargos seria uma suposta ineficiência dos sistemas de rastreamento da Apelada, que estariam permitindo a aquisição de produto pretensamente irregular, por serem objeto de fraude por parte de fornecedores (“esquentamento”).
Ocorre que o “esquentamento” seria um procedimento fraudulento perpetrado por fornecedores, que supostamente estariam produzindo em áreas embargadas e posteriormente os movimentando para áreas regulares antes de efetuar sua venda.
Assim, para quem realiza a compra, o produto recebido é absolutamente regular, uma vez que os respectivos documentos demonstram sua expedição a partir de propriedade sem qualquer impedimento, não havendo qualquer maneira factível para a Apelada identificar pretensas irregularidades que eventualmente tenham ocorrido ao longo do ciclo produtivo.
E é exatamente aí que reside o direito líquido e certo da Apelada contra os ilegais embargos aqui combatidos: ainda que se confirmassem as supostas irregularidades apontadas pelos agentes do IBAMA, fato é que a Apelada não possuiria qualquer relação com elas, vez que se tratam de alegadas infrações cometidas por terceiros alheios ao controle da Apelada.
Nesse contexto, o que deveria ter ocorrido era uma operação de fiscalização contra os fornecedores que pretensamente fraudam a movimentação de seus produtos, e não contra quem adquire o produto de boa-fé.
Assim é que, diante dos graves e irreparáveis prejuízos à Apelada e à economia local representados pela demora no levantamento do embargo, a Apelada viu-se compelida a se socorrer do Poder Judiciário para que, com fundamento nos incontestáveis argumentos aduzidos na exordial, fosse determinada a suspensão dos efeitos dos termos de embargo supramencionados.
1.3. CONCESSÃO DA LIMINAR PARA SUSPENDER O EMBARGO
Como não poderia ser diferente, o MM. Juízo a quo deferiu a liminar para suspender os efeitos dos termos de embargos, autorizando a Apelada a voltar a desenvolver suas atividades como vinha fazendo anteriormente, tendo em vista a presença dos requisitos necessários à concessão da tutela de urgência (quais sejam, o fumus boni iuris e o periculum in mora).
De fato, acertadamente, foi concedida a segurança ao presente mandamus, ratificando a liminar anteriormente concedida e determinando a cessação dos efeitos dos embargos impostos pelo Apelante, bem como reconhecendo a ilegalidade desses atos administrativos.
Em relação às preliminares suscitadas pelo IBAMA, o MM. Juízo de primeira instância entendeu que não há erro na indicação da autoridade tida por coatora, e que o fato de o Apelante entender que há necessidade de produção de provas suplementares não possui o condão de tornar inadequado o rito mandamental.
Isso porque, os fatos impugnados pelo Apelante são meramente fruto da contextualização da atuação do IBAMA como órgão fiscalizador, de modo que não são relevantes e sequer constituem causa de pedir da ação propriamente dita.
No mérito, a sentença determina que devem ser mantidas as conclusões constantes da decisão liminar, no sentido de que o quadro fático-probatório demonstra que a situação retratada em relação à Apelada, é completamente diversa da sua situação atual no que tange a sua preocupação e diligência para evitar a aquisição de produto proveniente de fazendas irregulares.
Tal situação, por óbvio, não justifica a determinação de penalidade tão gravosa quanto a imposição de embargo aos frigoríficos da Apelada, paralisando completamente o seu funcionamento.
É contra esta irretocável sentença que se insurgiu o Apelante sem, no entanto, apresentar quaisquer justificativas razoáveis capazes de sustentar seu pleito. Como restará demonstrado, o Apelante não teve outra alternativa em seu recurso senão repetir os mesmíssimos argumentos já rebatidos, fundamentadamente, pelo MM. Juízo que proferiu a sentença apelada.
Assim, a Apelada vem apresentar sua contraminuta de apelação, para que reste uma vez mais demonstrada a necessidade de manutenção da r. sentença apelada em todos os seus termos, na medida em que carecem de qualquer fundamento todas as alegações do Apelante.
2. RAZÕES PARA O DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO E MANUTENÇÃO DA R. SENTENÇA APELADA
Como cediço, em se tratando de mandado de segurança, a competência jurisdicional territorial é definida de acordo com o endereço funcional da autoridade coatora.
No presente caso, ao contrário do que tenta fazer crer o Apelante, a autoridade coatora, ou seja, a autoridade que idealizou, planejou, e colocou em prática a operação, foi a Gerência Executiva do IBAMA. Vejam, Excelências, esta não é uma simples afirmação da Apelada.
Não bastasse toda a sucessão de eventos demonstrando de maneira insofismável que a Operação foi levada a cabo pela Gerência Executiva do IBAMA, é preciso registrar uma razão ainda mais pragmática, que comprova a competência do Juízo a quo para processar e julgar a presente demanda: a própria Superintendência Estadual do IBAMA no estado, à qual a Gerência Executiva está vinculada, reconheceu essa situação.
Portanto, Excelência, diante do afirmado pelo próprio IBAMA, caem por terra quaisquer argumentos que o Apelante tenha aduzido quanto à suposta incompetência da Subseção Judiciária, restando, ao inverso, incontestável a sua competência para julgamento e processamento do mandado de segurança em comento.
Por conseguinte, quaisquer alegações de nulidade perpetradas pelo Apelante não merecem prosperar.
2.1. O DIREITO LÍQUIDO E CERTO DA APELADA
Na forma do que dispõem os arts. 101, § 1º[1], e 108[2] do Decreto Federal 6.514/08, a imposição da penalidade de embargo deve ter por objetivo impedir a continuidade de dano ambiental e a ocorrência de novas infrações, propiciar a regeneração e a recuperação do meio ambiente, e garantir o resultado prático do processo administrativo.
Outrossim, o art. 31 da Instrução Normativa IBAMA 10/12 dispõe que o embargo dar-se-á, dentre outras hipóteses, “quando a atividade estiver sendo exercida de forma irregular e houver risco de continuidade infracional ou agravamento de dano”.
Nesse sentido, basta analisar os termos de embargo acertadamente suspendidos pelo MM. Juízo a quo à luz da legislação cabível para concluir que se tratam de atos manifestamente ilegais, pois não preenchem quaisquer das hipóteses que legitimariam a imposição de tão gravosa medida.
Afinal, notadamente em razão de todas as evidências trazidas aos autos comprovando que a Apelada realiza sistematicamente o controle de seus fornecedores, é evidente que não se está diante de uma situação de continuidade infracional ou agravamento de qualquer dano.
2.2. JURISPRUDÊNCIA
Em consonância com o entendimento do MM. Juízo a quo, a jurisprudência pátria é pacífica no sentido de que a medida administrativa de embargo deve ser utilizada com parcimônia, respeitando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e somente quando estritamente verificados os pressupostos para sua imposição.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INFRAÇÃO AMBIENTAL. EMBARGO E INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO. APREENSÃO DE PRODUTOS E EQUIPAMENTOS. PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO DE OFENSA A DECRETO, NA VIA ESPECIAL. MATÉRIA FÁTICA. REEXAME. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE PROVIDO. (…)
O Tribunal a quo, soberano na análise do material cognitivo produzido nos autos, concluiu que, “no que diz, ainda, com a real necessidade das penalidades de embargo/interdição e apreensão em hipóteses análogas, oportunas as palavras do ilustre representante do Ministério Público, verbis:
A regra extraordinária da aplicação de medidas acauteladoras por parte da autoridade administrativa ambiental (sanção administrativa) com a posterior instauração do devido processo legal (art. 45 da Lei 9.784/99), não se aplica, portanto, in casu, MORMENTE POR NÃO ESTAR CARACTERIZADO O RISCO IMINENTE DE DANO DERIVADO DA ATIVIDADE DA EMPRESA.
Soma-se a isso a presença concreta da possibilidade de que, com a interdição da empresa e a apreensão de toneladas de grãos, grandes prejuízos econômicos sejam causados ao apelado. (…) Agravo Regimental improvido.
Diante disso, extrai-se que a atuação dos agentes fiscalizadores do IBAMA se deu em absoluta violação ao princípio da legalidade, segundo o qual somente é lícito à Administração Pública atuar de acordo com estrita previsão em lei, conforme determinam a melhor doutrina[3] e jurisprudência[4].
Ademais, conforme já restou demonstrado, a ilegalidade dos termos de embargo materializa-se, também, na própria estrutura do ato administrativo em questão. Explica-se.
Como se sabe, todo ato administrativo deve ser constituído por cinco elementos e requisitos fundamentais, quais sejam: (i) competência, (ii) objeto, (iii) forma, (iv) finalidade e, por fim, (v) motivo.
2.3. VÍCIO DO ATO ADMINISTRATIVO
O vício em qualquer um destes elementos enseja, inevitavelmente, a nulidade do ato, demandando sua invalidação, como determina a unanimidade da doutrina administrativista[5]. Quanto ao presente caso verificam-se, de plano, vícios nos elementos finalidade, motivo e competência.
A finalidade, que seria aquela prevista nos já abordados arts. 101, § 1º, e 108, do Decreto Federal 6.514/08, simplesmente não é aplicável ao presente caso, já que não se verificam situações que demandariam a imposição de um embargo: inexiste risco de dano ou de agravamento de dano, bem como necessidade de regeneração ou recuperação de área degradada.
O elemento motivo, por sua vez, seria a suposta compra irregular de produto proveniente de fazendas embargadas. Entretanto, é preciso reiterar uma vez mais, sob pena de incorrer em redundância, que tal motivo simplesmente não condiz com a realidade dos fatos.
No que concerne ao vício no elemento competência, não obstante seja comum a competência administrativa para a proteção do meio ambiente, esta deve ser exercida em regime de cooperação entre os entes federativos, em obediência à Lei Complementar Federal 140/11.
Nesse sentido, verifica-se que o único órgão ambiental competente para autuar a Apelada seria o órgão ambiental licenciador estadual, e não o IBAMA, a quem caberia tão somente comunicar o órgão licenciador a respeito de eventuais irregularidades.
Ao imiscuir- se na competência do órgão licenciador competente, os agentes do IBAMA violaram as regras de cooperação estabelecidas tanto pela Lei Complementar 140/11, como pela própria Constituição.
Como se não bastassem os já demonstrados vícios de legalidade, finalidade, motivação e competência, chega a ser gritante como a imposição de embargo na situação ora narrada afronta também os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
2.4. O QUE DIZ A DOUTRINA
Como sabido, a atuação da Administração Pública deve obrigatoriamente se pautar em tais princípios, não cabendo ao ente fiscalizador aplicar sanções em desacordo com as supostas infrações cometidas.
De fato, segundo o art. 2º, parágrafo único, inciso VI, da Lei Federal 9.784/99, que regulamenta o processo administrativo em âmbito federal, o princípio da proporcionalidade é aquele que impõe “adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público”. Nesse sentido, entende a Doutrina:
As sanções devem guardar uma relação de proporcionalidade com a gravidade da infração. Ainda que a aferição desta medida inúmeras vezes possa apresentar dificuldade em ser caracterizada, em inúmeras outras é clara; ou seja: há casos em que se pode ter dúvida se tal ou qual gravame está devidamente correlacionado com a seriedade da infração – ainda que se possa notar que a dúvida nunca se proporá em uma escala muito ampla, mas em um campo de variação relativamente pequeno –, de par com outros casos em que não haverá dúvida alguma de que a sanção é proporcional ou é desproporcional (…). De todo modo, é certo que, flagrada a desproporcionalidade, a sanção é inválida.[6]