Com a devida vênia, o Tribunal incorreu em error in judicando ao não manter a sentença para reconhecer a nulidade do auto de infração ambiental lavrado com base no artigo 50 do Decreto 6.514/08 por desmatamento na região da Floresta Amazônica, porque tal tipo administrativo não se aplica nesse bioma em razão da Amazônia não ser de especial proteção.
Inicialmente, contrariamos o entendimento do Tribunal, porque a declaração de nulidade do Auto de Infração Ambiental com fundamento em erro na tipificação legal da infração cometida é de rigor, porque a Floresta Amazônica não é de especial proteção ou preservação.
No caso, o IBAMA enquadrou o Auto de Infração Ambiental no artigo 50 do Decreto 6.514/08 em razão de a parte autuada ter desmatado área de especial proteção, porém, sem identificar legislação que a considera como tal.
O IBAMA também fundamentou a autuação ambiental no artigo da Constituição Federal que trata das áreas consideradas Patrimônio Nacional, mas que submete sua utilização à edição de lei regulamentadora (art. 225, §4º ). In verbis:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (…)
4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
Do exposto acima se conclui que, para o IBAMA, qualquer área de floresta amazônica, seja pública ou privada, é considerada objeto de especial proteção, simplesmente por situar-se dentro da Amazônia Legal, em razão da interpretação que seus técnicos dão ao § 4° do art. 225 da Constituição Federal.
Contudo, o próprio dispositivo utilizado para fundamentar a infração cometida pelo alegado infrator ambiental dispõe sobre a necessidade de regime jurídico próprio e especial de conservação, ou seja, definição, limites e contornos detalhadamente descritos exatamente na forma de lei criada exatamente para complementar o mandamento constitucional instituído no art. 225, §4°, da Constituição Federal. Vejamos o art. 50 do Decreto 6.514/2008:
Art. 50. Destruir ou danificar florestas ou qualquer tipo de vegetação nativa ou de espécies nativas plantadas, objeto de especial preservação, sem autorização ou licença da autoridade ambiental competente: Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare ou fração. […]
2° Para os fins dispostos no art. 49 e no caput deste artigo, são consideradas de especial preservação as florestas e demais formas de vegetação nativa que tenham regime jurídico próprio e especial de conservação ou preservação definido pela legislação.
Todavia, apesar da previsão constitucional de proteção especial, não houve, até o momento, edição de norma específica para disciplinamento da Floresta Amazônica como área de proteção especial — diferente, como visto acima, do bioma Mata Atlântica.
Fica claro no § 2° do art. 50 do Decreto 6.514/2008, acima citado, que há uma definição do que seja especial preservação: regime jurídico próprio e especial definido em legislação.
Assim, quais áreas da Amazônia seriam objeto de especial preservação? As áreas de preservação permanente e as de reserva legal, bem como as unidades de conservação criadas na forma da legislação, pois só essas têm regime jurídico próprio e especial.
Dito de outra forma, não há regime jurídico especial para as áreas particulares situadas na Amazônia, onde é permitido o uso alternativo do solo. Partindo dessa análise, constatamos que nem todo o território abrangido pela Floresta Amazônica é área de proteção especial, por falta de legislação específica.
Justamente por isso, devem ser identificadas as áreas de preservação permanente e reserva legal — que no caso da Amazônia Legal poderá variar entre 20 e 80%, conforme art. 12, da Lei 12.654/12 — para fins de enquadrar a infração no tipo administrativo do artigo 50 do Decreto 6.514/08, caso contrário, não haverá infração ambiental. Se fosse adotado entendimento diverso nenhuma área da Amazônia Legal poderia ser desmatada ou cultivada.
Dessa forma, para aferição de infração ambiental em área situada na Amazônia Legal, mister se faz a delimitação dessas áreas (preservação permanente e reserva legal) dentro da área total do imóvel, para que, então, seja aplicada a legislação pertinente.
Não tem cabimento a interpretação dada pelo IBAMA no auto de infração ambiental, tampouco a interpretação do Tribunal ao reformar a sentença que acertadamente tinha reconhecido que não é qualquer área da Amazônia que pode ser considerada objeto de especial proteção.
Por falta de norma que regulamente a Amazônia como sendo de especial proteção, serão protegidos de forma específica só os espaços assim designados em lei, como no caso da reserva legal, da área de preservação permanente ou unidades de conservação.
Entretanto, no caso em estudo, este não foi o procedimento adotado quando da lavratura do Auto de Infração Ambiental. Não há referência quanto a áreas de preservação permanente ou de reserva legal. Autuou-se por se danificar 8 hectares de floresta amazônica, simplesmente.
Porém, se a área desmatada estiver fora da área de reserva legal, ou ainda, caso não seja área de preservação permanente, encontra-se por demais equivocado o Auto de Infração Ambiental.
Logo, o Auto de Infração Ambiental objeto da análise padecia de vícios em sua origem, tendo sido certa a sentença que declarou de nulidade do magistrado de primeira instância, e totalmente equivocada a sua reforma para restabelecer a sanção, a qual feriu o Princípio da Legalidade, conforme se depreende da leitura do voto abaixo:
Leia o acórdão que reformou a sentença
Trata-se de ação anulatória ajuizada contra o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em que impugna o Auto de Infração e a multa ambiental dele decorrente, impostos pela referida autarquia, no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), tendo como motivação destruir 8,00 (oito) hectares da floresta amazônica, em área de especial preservação, sem autorização do órgão ambiental competente.
Deferido o pedido de assistência judiciária gratuita e o de tutela de urgência para determinar a exclusão do nome do autor dos cadastros de inadimplentes.
Foi proferida a sentença, julgando procedente o pedido, para “anular o Auto de Infração Ambiental e o Termo de Embargo, bem como os atos deles provenientes”.
Inconformado, apela o Ibama, sustentando a legalidade do Auto de Infração Ambiental, ao argumento de que o art. 225, § 4º, da Constituição Federal, “não condicionou a natureza de patrimônio nacional à existência da lei, mas apenas determinou que os biomas que foram classificados como patrimônio nacional devem ter lei própria quanto ao seu uso”, esclarecendo que o art. 15 da Lei n. 4.771/1965 já dispunha sobre a proibição de exploração das florestas primitivas da bacia amazônica, defendendo, assim, que “a Amazônia Legal é área objeto de especial preservação.”
Houve contrarrazões. É o relatório.
VOTO
O Ibama se insurge contra a sentença que julgou procedente o pedido, para “anular o Auto de Infração Ambiental e o Termo de Embargo, bem como os atos deles provenientes”.
Entendeu o MM. Juiz Federal que sentenciou o feito, que a Autarquia Federal descreve, no auto de infração ambiental, a área desmatada como sendo de especial proteção, sem, contudo, identificar legislação que a considera como tal, sendo que ao art. 225, § 4º, da CF/1988, necessita de regulamentação, situação essa que pode ser vista, inclusiva, no art. 50, § 2º, do Decreto n. 6.514/2008.
O art. 225, caput da Constituição Federal, estabelece que todos “têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Por sua vez, o § 4º do referido artigo, estatui que a “Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais”.
Assiste razão ao recorrente, pois a descrição da conduta por destruir área da floresta amazônica de especial preservação ambiental está prevista no art. 50 do Decreto 6.514/2008, o que está em consonância com o art. 10 da Lei n. 6.938/1981, sendo que o art. 14 expressamente estabelece que “o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores”, às penalidades administrativas descritas em seus incisos, dentre eles, a imposição de multa (inciso I), tudo dentro da descrição constante do art. 225, § 4º, da CF/1988.
Nesse sentido, no que interessa ao caso dos autos, é o seguinte precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. AMAZÔNIA. DESMATAMENTO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. IGARAPÉ. CORREDORES ECOLÓGICOS. NASCENTES. CASTANHEIRA. USO DE FOGO. MULTA PREVISTA NO ART. 14, I, DA LEI 6.938/1981. APLICAÇÃO. FALTA DE REGULAMENTAÇÃO NÃO CONFIGURADA.
Na origem, trata-se de Ação visando à anulação de autos de infração por falta de regulamentação da sanção pecuniária. A sentença julgou procedente a Ação e declarou nulos os atos do Ibama. O acórdão negou provimento à Apelação. O Recurso Especial foi admitido na origem.
Revelam-se descabidos os argumentos de falta de regulamentação, porquanto ficou demonstrado que as condutas praticadas, consubstanciadas no desmatamento com uso de fogo em Área de Preservação Permanente com destruição de espécies vegetais em extinção (p. ex. castanheiras) e degradação de igarapés e nascentes legalmente protegidas, estão subsumidas no art. 14, I, da Lei 6.938/1981. Neste dispositivo há base suficiente para a imposição de multa pela degradação do meio ambiente, seja por ação, seja por omissão.
As sanções administrativas aplicáveis ao desmatamento independem de prescrição ou medidas específicas, caso a caso, do órgão ambiental ou de expedição de advertência prévia, pois decorrem diretamente de comportamentos vedados pela legislação lato sensu, e não pelo Administrador. Degradar ou destruir nascentes, igarapés e espécies ameaçadas de extinção caracteriza infração ambiental de máxima gravidade, pois significa atacar núcleo central do regime jurídico-ambiental brasileiro. Os igarapés – Área de Preservação Permanente em toda sua extensão – representam o casamento naturalmente perfeito e indissolúvel entre curso d’água e floresta, daí sua essencialidade na formação de corredores ecológicos, verdadeiras autoestradas de fluxo gênico da flora e da fauna que compõem o bioma. Na Amazônia, sem os igarapés, a floresta e os rios não existiriam ou sobreviveriam, pois, em analogia com o sistema circulatório do corpo humano, equivalem aos vasos capilares que constituem e conservam o tecido complexo da maior bacia fluvial do Planeta.
Merece reparos a sentença que anulou os autos de infração por falta de regulamentação da sanção pecuniária. O balizamento previsto no inciso I do art. 14 da Lei 6.938/1981 atende ao princípio da legalidade na instituição da multa administrativa e deve ser interpretado em conjunto com a totalidade do ordenamento ambiental de então, sobretudo em relação a infrações praticadas antes de setembro de 1999 (data em que regulamentada a Lei 9.605/1998 – que trouxe tipos infracionais administrativos específicos – por meio do Decreto Federal 3.179/1999), tudo sem prejuízo da responsabilização civil objetiva e solidária do infrator pelos danos causados. Precedentes: REsp 543.952/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 27.8.2009; AgRg no REsp 1.284.780/ES, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 16.8.2016; AgInt nos EDcl no REsp 1.331.239/MG, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 14.5.2018.
Recurso Especial provido, a fim de que seja reconhecida a legalidade dos autos de infração aplicados pelo recorrente com base no art. 14, I, da Lei 6.938/1981. (REsp 1.793.745/AM, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 30.05.2019)
Ademais, a regulamentação de que trata o § 4º do art. 225 da CF/1988 se refere à utilização dos biomas nele descrito, não fazendo qualquer referência à natureza da floresta amazônica como sendo patrimônio nacional, o que está de acordo com o princípio de desenvolvimento sustentável implícito no caput do referido dispositivo constitucional.
Sentença reformada. Demais questão analisadas com base no art. 1.013, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015.
Postas essas linhas introdutórias, o Auto de infração está fundamentado nos artigos 70, § 1º, 72, incisos II e VII, da Lei n. 9.605/1998, e artigos 3º, incisos II e VII, e 50 do Decreto n. 6.514/2008, assim redigidos:
Da Lei n. 9.605/1998:
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha. (…)
3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade. (…)
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º: (…)
II – multa simples; (…)
VII – embargo de obra ou atividade;
Do Decreto n. 6.514/2008:
Art. 3º As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções: (…)
II – multa simples; (…)
VII – embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas; (…)
Art. 50. Destruir ou danificar florestas ou qualquer tipo de vegetação nativa ou de espécies nativas plantadas, objeto de especial preservação, sem autorização ou licença da autoridade ambiental competente:
Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare ou fração.
A atuação da Administração deve obedecer aos princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade.
É importante observar que o autor foi autuado por destruir área de floresta amazônica, em área de reserva legal, o que motivou a aplicação da multa.
Por outro lado, o art. 6º da Lei n. 9.605/1998 impôs ao órgão fiscalizar limitação ao seu poder de polícia, ao estabelecer critérios para a imposição de penalidades, assim dispondo:
Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
Não é outra a redação do art. 4º do Decreto 6.514/2008 (art. 6º do revogado Decreto n. 3.179/1999):
Art. 4º. O agente autuante, ao lavrar o auto de infração, indicará as sanções estabelecidas neste Decreto, observando:
I – gravidade dos fatos, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – antecedentes do infrator, quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e
III – situação econômica do infrator.
1º. Para a aplicação do disposto no inciso I, o órgão ou entidade ambiental estabelecerá de forma objetiva critérios complementares para o agravamento e atenuação das sanções administrativas.
O art. 72 do diploma legal de 1998, ao discriminar as sanções cabíveis, em caso de prática de conduta lesiva ao meio ambiente, manda observar a gradação prevista no já citado art. 6º.
Em outros julgamentos, nos quais estava em discussão a imposição de multa, com base na mesma motivação que deu origem ao auto de infração, objeto do presente processo, este Tribunal adotou o entendimento de que devem ser observados, não só o princípio da legalidade, mas, também, o da razoabilidade e o da proporcionalidade, considerando a peculiaridade de cada caso.
São elucidativos, quanto a esse ponto, os seguintes julgados proferidos por este Tribunal:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA. AUTO DE INFRAÇÃO. MULTA. LEI 9.605/98, DECRETO 3.179/1999. IMPEDIMENTO DE REGENERAÇÃO NATIVA. REDUÇÃO DA MULTA. VIOLAÇÃO DA LEGALIDADE. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. REVISÃO DO ATO. SENTENÇA REFORMADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
Lavrado auto de infração, pelo IBAMA, em que se imputa a prática de impedir a regeneração de floresta nativa e demais formas de vegetação – infração administrativa prevista no artigo 33, do Decreto 3.179/99, sujeita a multa.
Impedir ou dificultar a regeneração de florestas nativas e demais formas de vegetação é conduta lesiva ao meio ambiente, ainda que potencialmente considerada. As circunstâncias fáticas em que praticada a conduta, no entanto, devem ser avaliadas no contexto de aplicação e adequação da penalidade.
Para imposição e gradação da penalidade ambiental, a autoridade competente deverá observar: I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente; II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e III – a situação econômica do infrator, no caso de multa (art. 6º da Lei 9.605/1998).
A pena de advertência é aplicada a infrações de menor lesividade ao meio ambiente, assim entendidas aquelas em que a multa máxima cominada não ultrapasse o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), ou que, no caso de multa por unidade de medida, a multa aplicável não exceda esse valor, na forma do 5º, §§ 1ºe 2º, do Decreto nº 6.514/08.
“A aplicação da multa deve ter em conta a situação fática e os critérios estabelecidos por lei (art. 6º da Lei n. 9.605/98) em respeito ao princípio da individualização da pena, bem como observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.” ( AC 0016472-97.2008.4.01.3600 / MT, Rel. JUIZ FEDERAL EVALDO DE OLIVEIRA FERNANDES, filho, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.472 de 12/11/2015).
Ofende a legalidade o dispositivo do ato regulamentar, no caso o artigo 33, do Decreto 3.179/99, que não prevê índices mínimo e máximo para cominação da multa, em desacordo com o comando de regulamentação contido nas disposições do art. 75, da Lei 9.605/98 (lei em sentido estrito regente da matéria), o qual determina: “o valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais)”.
De modo a preservar a legalidade do ato, e observar o atendimento aos princípios da individualização da pena, da razoabilidade e da proporcionalidade na aplicação da penalidade administrativa de multa por infração ambiental, faz-se necessário que o art. 33, do Decreto 3.179/99 receba interpretação conforme a Constituição, de modo que o valor cominado para o hectare – para fins de base do cálculo da sanção-, seja considerado como máximo, atento aos limites estabelecidos pelo art. 75, da Lei 9.605/98. Precedentes desta Corte.
Na hipótese, verificado que a conduta proscrita recai sobre uma área de 485,53 hectares, o que originou a aplicação de multa administrativa no montante de R$ 145.800,00 (cento e quarenta e cinco mil e oitocentos reais), orçada ao valor de R$ 300,00 (trezentos reais) por hectare/fração, deve ser revista para novo valor que deverá levar em consideração a quantia de R$ 50,00 por hectare/fração, sem que se comprometa o caráter educativo, repressivo e de prevenção da penalidade.
A aplicação no patamar mínimo legalmente previsto deve-se a ausência de exposição dos pressupostos fáticos para majoração da multa em sede administrativa, aqui compreendidas especialmente as circunstâncias da infração, as quais não sugerem motivação suficiente para elevar a pena.
Deve ser sublinhada a função pedagógica da jurisprudência que se firma nesta Corte, que confere o importante papel de sugerir o aperfeiçoamento das autuações lavradas pelo IBAMA em casos semelhantes, em que a autoridade administrativa deveria indicar minimamente a motivação para escolha da penalidade, em atenção ao próprio regramento contido na lei e ao seu poder de polícia que lhe pressupõe aptidão idônea a registrar e individualizar elementos específicos da conduta durante a fiscalização que é empreendida.
Configuração da infração. Comprovação do fato ilícito. Ausência de nulidade formal da autuação. Inaplicabilidade dos dispositivos do Código Florestal por falta de comprovação dos requisitos. Teses rejeitadas.
Reforma da sentença, apenas para redução do valor da penalidade de multa, conforme parâmetros expostos, com alteração, em conseq uência, da distribuição dos ônus sucumbenciais.
Apelação da parte autora da ação, conhecida e, em parte, provida, para minorar o valor da multa aplicada administrativamente.
( AC 0000010-39.2016.4.01.3906/PA, Relator Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, Sexta Turma, e-DJF1 de 02.03.2018)
POLÍCIA AMBIENTAL. TRANSPORTE DE PÁSSAROS DA FAUNA SILVESTRE BRASILEIRA SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE COMPETENTE. APREENSÃO E PENA DE MULTA. MOTIVAÇÃO SUCINTA, MAS SUFICIENTE, EXCETO PARA APLICAÇÃO DE MULTA ACIMA DO MÍNIMO. REDUÇÃO AO MÍNIMO LEGAL. CONVERSÃO EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AMBIENTAIS. IMPERTINÊNCIA, TENDO EM VISTA A NATUREZA DA INFRAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Fato atribuído à apelante no auto de infração: “Transportar 13 (treze) pássaros da fauna silvestre brasileira, sem portar no momento da fiscalização autorização do órgão competente – IBAMA”. Em seguida, houve tipificação na Lei n. 9.605/98 e no Decreto 3.179/99. O auto de infração está, assim, genericamente motivado.
Foi aplicada a multa de R$ 6.500,00 (seis mil e quinhentos reais), correspondente a R$ 500,00 reais por pássaro apreendido.
A Lei n. 9.605/98, art. 74, estabelece que “a multa terá por base a unidade, hectare, metro cúbico, quilograma ou outra medida pertinente, de acordo com o objeto jurídico lesado”. No art. 75, dispõe que “o valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000,00 (cinquenta milhões de reais)”.
O art. 11 do Decreto n. 3.179/99 prevê multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por unidade. Esse dispositivo deve ser interpretado, conforme a Constituição, como se fixasse o máximo de R$ 500,00 por unidade, de modo a preservar o princípio da individualização da pena. Como mínimo deve ser tomado o valor previsto na Lei n. 9.605/98, ou seja, R$ 50,00 (cinquenta reais) por unidade, corrigidos periodicamente.
No caso, não houve motivação específica para elevação da pena acima do mínimo, de modo que, de acordo com o raciocínio antes desenvolvido, a pena de multa, adequada à situação da apelante, é de 13 x R$ 50,00 = R$ 650,00, corrigidos periodicamente.
Não é caso de conversão em prestação de serviços ambientais, uma vez que, à míngua de proposta concreta da apelante quanto à natureza desses serviços, não se vislumbra que serviços possam ser pertinentes à infração de manter em cativeiro pássaros da fauna silvestre.
Parcial provimento à apelação para reduzir a R$ 650,00 (seiscentos e cinquenta reais), corrigidos periodicamente, o valor da multa.
( AC 0000509-02.2006.4.01.3800/MG, Relator Desembargador Federal João Batista Moreira, Relator Convocado Juiz Federal Evaldo de Oliveira Fernandes, filho, Quinta Turma, e-DJF1 de 16.06.2015)
Por outro lado, conforme art. 50-A, § 1º, da Lei n. 9.605/1998, “Não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do agente ou de sua família”.
Deve ser considerado, no entanto, o fato de que o art. 9º do Decreto 6.514/2008 (art. 5º do Decreto n. 3.179/1999) permite a autoridade responsável avaliar, em determinadas situações, se a multa cominada é desproporcional e aplicá-la, observado o “limite mínimo de R$ 50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais)”.
Por sua vez, o art. 75 do diploma legal de 1998, estabelece que: “O valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ .50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais)”.
Oportuno destacar que os citados dispositivos legais apenas estabelecem um limite mínimo e máximo da multa, observado o disposto no art. 6º da Lei n. 9.605/1998, e, ainda, o art. 74, dispondo que a “multa terá por base a unidade, hectare, metro cúbico, quilograma ou outra medida pertinente, de acordo com o objeto jurídico lesado”.
No caso, estendo necessária a imposição da penalidade, pois tem caráter educativo, de forma a proteger o meio ambiente, objetivo buscado pela legislação de regência, mormente quando, como já visto, trata-se de questão envolvendo a destruição de floresta nativa, considerada de especial preservação.
O autor requereu, alternativamente, na petição inicial, a redução da multa.
No caso, considerando que o autor assumiu a autoria do desmate e da queima de oito hectares de floresta amazônica de especial preservação ambiental, bem como a gravidade do auto infracional, conforme constou do Relatório de Fiscalização, a fixação do valor da multa em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), mostra-se razoável e de acordo com o art. 50 do Decreto n. 6.514/2008, que estabeleceu multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare destruído.
O embargo de obra e a suspensão de atividades estão previstas no art. 72, inciso VII e IX, da Lei n. 9.605/1998 e nos artigos 51 da Lei n. 12.651/2012, 3º, inciso VII, e 101, inciso II, do Decreto n. 6.514/2008, sendo que o art. 15-A e 101, § 4º, desse último diploma legal, estabelece que o “embargo de obra ou atividade restringe-se aos locais onde efetivamente caracterizou-se a infração ambiental, não alcançando as demais atividades realizadas em áreas não embargadas da propriedade ou posse ou não correlacionadas com a infração” ou, nos termos do art. 51, § 1º, da Lei n. 12.651/2012, o referido ato administrativo “restringe-se aos locais onde efetivamente ocorreu o desmatamento ilegal, não alcançando as atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel não relacionadas com a infração”, regra essa observada pelo ente fiscalizador (Termo de Embargo).
É necessário pontuar que o embargo da área de propriedade do autor, no caso dos autos, não se sujeita ao disciplinamento previsto no art. 18 do Decreto n. 6.514/2008, que cuida do embargo sanção em razão de seu descumprimento, pelo menos enquanto não descumprido o embargo.
Portanto, deve prevalecer o princípio da precaução, já que o “embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas tem por objetivo impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada” (art. 108 do Decreto n. 6.514/2008 e 51 da Lei n. 12.651/2012).
Ante do exposto, dou provimento ao recurso de apelação do Ibama, para reformar a sentença e reconhecer a legalidade do Auto de Infração e do Termo de Embargo.