Modelo de Defesa Prévia. Auto de Infração Ambiental. Multa Ambiental. Recurso Administrativo. Polícia Militar Ambiental.
ILUSTRÍSSIMO SENHOR COMANDANTE DO 1º PELOTÃO DA 1ª COMPANHIA DO 1º BATALHÃO DE POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL – SC
AUTUADA…, brasileira, agricultora, inscrita no CPF n…, residente e domiciliada em…, s/n, Interior, Município/SC, CEP…, vem, por seu advogado, à presença de Vossa Senhoria, com fundamento no art. 73 da Lei Estadual 14.675/2009, art. 98 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/2019, e art. 300 do Código de Processo Civil de 2015, apresentar
DEFESA PRÉVIA CONTRA AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL
em razão do Auto de Infração Ambiental – AIA n… e Termo de Embargo n…, lavrados por agentes fiscais do 1ºPel/1ªCia/1ºBPMA, em 29 de maio de 2020, consoante as razões de fato e de direito a seguir expostas, requerendo, após as formalidades legais, seja remetido à Autoridade Julgadora para apreciação do pedido liminar e julgamento.
1. DA TEMPESTIVIDADE
O auto de infração ambiental n…, foi lavrado no dia 29 de maio de 2020. Contudo, os prazos processuais estão suspensos em razão da Pandemia, e ainda que assim não fosse, nos termos do art. 73 da Lei Estadual 14.675/2009 e art. 98 c/c art. 28 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/2019, o prazo para a apresentação de Defesa Prévia é de 20 (vinte) dias úteis, contados da ciência do autuado. Portanto, indiscutível a tempestividade da presente defesa.
2. PRELIMINARMENTE
Antes de adentrar no mérito, é necessário requerer em caráter liminar, a restituição dos bens apreendidos e a suspensão do termo de embargo, com fundamento no art. 300 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), por força do art. 15 do mesmo diploma, que prevê expressamente a possibilidade de aplicação subsidiária e supletiva das suas normas aos processos administrativos, in verbis:
Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.
A doutrina processualista civil justifica essa aplicação subsidiária e supletiva aos demais ramos processuais com o seguinte argumento: o CPC é a principal fonte de direito processual no ordenamento jurídico brasileiro; consiste em uma lei geral do processo ou lei processual residual por excelência[1], e, devendo ser aplicado aos processos como um todo, e não apenas o processo civil[2].
De acordo com Cândido Rangel Dinamarco[3], o objetivo de tal dispositivo foi o de propagar aos processos não jurisdicionais toda a exigência de respeito aos princípios e normas inerentes ao direito processual constitucional, bem como a sua própria disciplina desses preceitos superiores, além de certos institutos técnico-processuais.
Cediço que a norma ambiental é omissa quando a possibilidade de concessão de pedido liminar ou de urgência em sede administrativa. Daí a necessidade de aplicação do Código de Processual Civil de 2015, sobretudo, o art. 300:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
In casu, a probabilidade do direito está evidenciada na ausência de área de preservação permanente, conforme será demonstrado nos capítulos seguintes.
Já o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, exsurge da paralisação e deterioração da obra, que está a céu aberto, sem qualquer proteção.
Cabível, portanto, em caráter liminar, a restituição dos bens e suspensão do termo de embargo conforme passa a demonstrar.
2.1. RESTITUIÇÃO DOS BENS APREENDIDOS – AUTUADO NA CONDIÇÃO DE FIEL DEPOSITÁRIO – POSSIBILIDADE
Como será demonstrado na síntese fática, o Autuado não estava no local objeto da suposta infração, e por isso, houve a apreensão de ferramentas e objetos utilizados na construção civil.
Entretanto, para que se evite a deterioração ou até mesmo eventual extravio das ferramentas, se impõe como medida justa e adequada, a restituição dos bens apreendidos ao Autuado, na forma do art. 56 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/2019, in verbis:
Art. 56. Nos casos em que a administração não dispor de local adequado para a guarda ou depósito dos bens apreendidos, a critério da Autoridade Ambiental Fiscalizadora, o depósito poderá ser confiado: […]
II – ao próprio autuado, desde que a posse dos bens ou animais não traga risco de utilização em novas infrações.
Comando semelhante é encontrado nos artigos 105 e 106, II, do Decreto 6.514/2008, permitindo que o próprio autuado ostente a posição de fiel depositário do bem apreendido, estabelecendo tal possibilidade “desde que a posse dos bens ou animais não traga risco de utilização em novas infrações”:
Art. 105. Os bens apreendidos deverão ficar sob a guarda do órgão ou entidade responsável pela fiscalização, podendo, excepcionalmente, ser confiados a fiel depositário, até o julgamento do processo administrativo.
Art. 106. A critério da administração, o depósito de que trata o art. 105 poderá ser confiado: […]
II – ao próprio autuado, desde que a posse dos bens ou animais não traga risco de utilização em novas infrações. […]
2º Os bens confiados em depósito não poderão ser utilizados pelos depositários, salvo o uso lícito de veículos e embarcações pelo próprio autuado.
Extrai-se da norma, a possibilidade de nomear o Requerente como fiel depositário das ferramentas e objetos apreendidos até o julgamento do processo administrativo, mesmo porque, são ferramentas e sua utilização é de caráter necessário, não no local objeto da suposta infração, mas na atual residência alugada do Autuado.
Portanto, a liberação dos bens apreendidos pleiteada, encontra amparo legal, inclusive no CPC, razão pela qual requer, que esta Autoridade se digne liminarmente, a restituir os bens ao Autuado na condição de fiel depositário até o julgamento do processo administrativo, comprometendo-se este, a firmar termo de compromisso de que não utilizará os bens apreendidos para a prática de nova infração ambiental.
2.2. PEDIDO DE DESEMBARGO – POSSIBILIDADE
Por entender que construção se afigurava como infração, a equipe de fiscalização lavrou o Termo de Embargo n…
Contudo, conforme será demonstrado nos capítulos seguintes, que a área objeto da suposta infração não constitui área de preservação permanente, e portanto, não há que se falar em dano ambiental.
Nesta senda, o art. 64 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/2019 dispõe que:
Art. 64. O embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas é uma medida preventiva que visa impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada e será aplicada pelo agente fiscal, devendo ser restrita aos locais onde efetivamente caracterizou-se a infração ambiental, não alcançando as demais atividades ou obras realizadas legalmente pelo administrado.
Ocorre que não há a área a ser recuperada, até porque não houve supressão de vegetação.
Trata-se, de área consolidada e com viabilidade para construção, restando equivocado o Termo de Embargo lavrado, e que está acarretando a deterioração da obra paralisada.
Nesse sentir, é possível a suspensão do termo de embargo, nos termos do § 3º do art. 64 da referida Portaria:
3º As decisões de suspensão de termos de embargo pela Autoridade Ambiental Fiscalizadora, de acordo com as suas atribuições, deverão estar embasadas técnica ou juridicamente.
Portanto, por ser medida justa e adequada, fundamenta sobretudo no art. 300 do CPC, requer, liminarmente, a revogação do Termo de Embargo n….
3. BREVE SÍNTESE DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL
No dia 14 de maio de 2020, os Policiais Militares do 1ºPel/1ªCia/1ºBPMA em atendimento a denúncia anônima, se deslocaram até a Rodovia João Gualberto Soares, no Bairro Rio Vermelho, e constataram a construção de uma residência unifamiliar medindo aproximadamente 80m², a uma distância de 31 metros do córrego, e em área de preservação permanente segundo o sistema de Geoprocessamento da Prefeitura de Florianópolis.
Na ocasião, a equipe de fiscalização abordou um rapaz que estava no local, mas que não sabia informar quem era o proprietário, razão pela qual foram apreendidos os seguintes objetos supostamente utilizados na construção, depositados no 1ºPel/1ªCia/1ºBPMA…
Após a apreensão dos materiais supramencionados, um senhor compareceu no 1ºPel/1ªCia/1ºBPMA se declarando proprietário da betoneira apreendida, a qual estava alugada para…, fazendo presumir que seria este o construtor, razão pela foi autuado em 29 de maio de 2020, como incurso no art. 74 do Dec. 6.514/98, in verbis:
Art. 74. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: […]
Em razão disso, a equipe de fiscalização aplicou multa no valor de R$ 10.750,00 (dez mil setecentos e cinquenta reais), e lavrou o Termo de Embargo n…
Contudo, o auto de infração epigrafado merece ser anulado/cancelado ante a atipicidade da conduta, pois a construção não está inserida em área de preservação permanente, conforme será demonstrado.
4. DO MÉRITO DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL
A Constituição Federal de 1988 assegura em seu art. 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, e ainda:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Cediço que a imposição de multa administrativa possui caráter penalizador, e afigurando-se como medida rigorosa e privativa de uma liberdade pública constitucionalmente assegurada, exige-se a demonstração cabal da autoria e materialidade, que são pressupostos autorizadores da imposição de sanção.
Na hipótese de constarem nos autos elementos de prova que conduzam à dúvida acerca da autoria delitiva, o cancelamento do auto de infração é medida que se impõe, em observância ao princípio do in dubio pro reo.
E mais. A Administração Pública só pode fazer o que está expressamente previsto em lei, ou seja, só se pode lavrar auto de infração quando ficar evidenciada uma ação ou omissão contrária a legislação ambiental, o que não é o caso em tela, como será melhor delineado nos capítulos seguintes, e que importa na anulação do auto de infração em tela.
4.1. DA ATIPICIDADE DA CONDUTA
Segundo a equipe de fiscalização da Polícia Militar Ambiental, o Autuado estaria erigindo edificação em área de preservação permanente assim considerada pela Prefeitura de Florianópolis, sem a devida licença ou autorização ambiental, originando o auto de infração ambiental n…, cuja norma infringida seria o art. 74 do Dec. 6.514/98, in verbis:
Art. 74. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: […]
Ocorre que, o auto de infração ambiental é frágil. Além de não possuir nenhum dos elementos do tipo no local, foi lavrado com base em meras imagens do sistema de Geoprocessamento da Prefeitura de Florianópolis que apontam a área como sendo de preservação permanente.
Sobreleva notar que a equipe de fiscalização desconsiderou por completo a ausência dos requisitos para que se configure uma APP.
Isso porque, consta no art. 3º, inciso II, da Lei Federal 12.651/12 que:
Área de Preservação Permanente – APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;
E no art. 4º, incisos I a XI, do mesmo diploma, enumeram-se quais são as áreas consideradas APP, ou seja, ex lege, sendo que nenhuma delas consta no auto de infração ambiental, senão vejamos:
Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:
I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:
a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;
b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
II – as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:
a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;
b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;
III – as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;
IV – as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;
V – as encostas ou partes destas com declividade superior a 45º, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive;
VI – as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
VII – os manguezais, em toda a sua extensão;
VIII – as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;
IX – no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25º, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação;
X – as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação;
XI – em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado. […]
Com efeito, não há que se falar em APP, porque nenhum dos requisitos da Lei estão presentes. Tanto o é, que não consta no auto de infração ambiental qualquer das hipóteses previstas no art. 4 da Lei Federal 12.651/12.
Portanto, ausente os pressupostos caracterizados da infração hostilizada, requer a anulação ou cancelamento do auto de infração ambiental lavrado em face do Autuado.
5. CONVERSÃO DA MULTA AMBIENTAL EM ADVERTÊNCIA – POSSIBILIDADE
Ao lavrar o auto de infração ambiental n…, a equipe de fiscalização da Polícia Militar aplicou multa simples no valor de R$ 10.750,00. Ocorre que, a construção em estágio inicial não causou nenhum dano ao meio ambiente.
E ainda que se entenda diferente, não foi realizada nenhuma intervenção em área de preservação permanente, muito menos supressão de qualquer tipo de vegetação.
Além do mais, a edificação pode ser classificada como de baixo impacto ambiental. Nesse sentir, dispõe o art. 62 da Lei Estadual 14.675/2009:
Art. 62º. Sempre que de uma infração ambiental não tenha decorrido dano ambiental relevante, serão as penas de multa convertidas em advertência, salvo em caso de reincidência.
Frise-se que não há reincidência. Já o conceito de dano ambiental relevante vem expresso no parágrafo único do próprio dispositivo, veja:
Parágrafo único. Dano ambiental relevante é aquele que causa desocupação da área atingida pelo evento danoso, afeta a saúde pública das pessoas do local, ou causa mortandade de fauna e flora.
Evidente que a edificação em estágio inicial, conforme depreende-se das imagens acostas no Boletim de Ocorrência…, não causou a desocupação da área atingida, e de igual forma, não afetou a saúde pública, tão pouco mortandade de fauna ou flora.
Portanto, a aplicação do art. 62, é medida que se impõe, até porque, é uma obrigação imposta por Lei (v. termo “serão”).
6. ATENUANTES DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL
Subsidiariamente, se esta autoridade julgadora não entender pela nulidade do auto de infração ambiental n…, ou conversão da multa em advertência, requer sejam aplicadas as circunstâncias atenuantes para fins de redução do valor da multa, porque
(i) o Autuado colaborou com a fiscalização;
(ii) atendeu à guarnição para ser autuado;
(iii) possui baixo grau de instrução ou escolaridade;
(iv) é micro infrator; e,
(v) os supostos danos são reversíveis em curto espaço de tempo;
Dessa forma, requer a redução do valor da multa para o mínimo legal previsto no art. 66 do Decreto 6.514/08.