Escorreita a sentença proferida pela Juíza Federal que julgou procedente a ação anulatória ajuizada por um produtor rural contra o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, com pedido liminar, objetivando a suspensão de todos os efeitos do auto de infração ambiental e a suspensão do termo de embargo imposto sobre a sua propriedade.
O autor da ação, um produtor rural, alegou na ação anulatória que foi autuado e teve sua propriedade embargada pelo IBAMA no dia 22 de julho do ano de 2014 por, em tese, “destruir Floresta Amazônica, considerada de especial preservação, sem autorização do órgão ambiental competente”.
A principal tese para anular o auto de infração e termo de embargo ambiental foi a prescrição intercorrente trienal e prescrição da pretensão punitiva quinquenal ocorrida durante o trâmite do processo administrativo.
O IBAMA foi citado e apresentou contestação objetivando a improcedência da ação anulatória. Além disso, o réu também apresentou reconvenção requerendo a condenação do autor/reconvindo à reparação do dano ambiental.
Não houve requerimento de produção de provas e a Juíza Federal proferiu sentença de procedência determinando a anulação do auto de infração ambiental, bem como do termo de embargo em razão da prescrição. Isso porque, uma vez reconhecida a prescrição do auto de infração, esta se estende também ao termo de embargo, vez que ele deriva da lavratura do auto de infração.
Quanto à reconvenção, inobstante o Código de Processo Civil de 2015 preveja, no art. 343, que, na contestação, o réu poderá propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa, a ação civil pública é regulada por lei especial (Lei 7.347/85), a qual não contempla tal instituto processual, dada sua específica finalidade, legitimação restrita e eficácia sentencial abrangente, razão pela qual a Juíza Federal indeferiu a reconvenção proposta pelo IBAMA.
De fato, não há conexão entre a ação que visa a anulação de auto de infração com eventual ação de reparação de danos ambientais, cumulada com pedido indenizatório, diante da autonomia das instâncias.
Trata-se de matérias e ritos procedimentais diversos, a primeira, de direito administrativo, pelo procedimento comum ordinário, e a segunda, de responsabilidade civil ambiental, a ser postulada através de ação civil pública (Lei 7.347/1985).
Portanto, correta a sentença que anulou o auto de infração e embargo ambiental pela incidência da prescrição, e mais correta ainda ao indeferir a reconvenção formulada pelo IBAMA diante da incompatibilidade de procedimentos.
Leia a sentença que anulou o auto de infração e embargo ambiental
Ação anulatória de auto de infração. Procedência.
No caso em análise, a parte autora requer, em sede liminar, suspensão do Auto de Infração e do Termo de Embargo Ambiental, sob alegação de que houve nulidade no processo administrativo, já que não houve tentativa de intimação pessoal do autuado/autor para apresentar alegações finais, bem como que ficou configurado a ocorrência de prescrição intercorrente e quinquenal.
Pois bem. Tratando-se do processo administrativo ambiental, a prescrição pode ser de duas formas, a prescrição propriamente dita, aquela que se consuma no prazo de 5 (cinco) anos, bem como a prescrição intercorrente, a qual se opera no prazo de 3 (três) anos.
A prescrição intercorrente é tratada tanto pela lei 9.873/99, como pelo Decreto 6.514/08, e tem como finalidade principal coibir a inércia dos órgãos públicos, responsáveis pela prática dos atos administrativos no curso do processo, vejamos:
Lei nº 9.873/99
Art. 1º (…) §1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.
Art. 21 (…) § 2° Incide a prescrição no procedimento de apuração do auto de infração paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação.
Desse modo, é possível concluir que a prescrição intercorrente ocorre quando o processo administrativo permanecer paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho.
Importante frisar que não é qualquer despacho que tem o poder de interromper o prazo prescricional, mais sim, aquele que efetivamente dê impulso ao procedimento, não servindo para fins de interrupção os despachos que não surtam tal efeito, como aqueles que apenas enviam os autos de um setor para outro.
Nesse sentido, tem decido os Tribunais Regionais Federais:
ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. IBAMA. AUSÊNCIA DESPACHO OU JULGAMENTO POR MAIS DE TRÊSANOS. PRESCRIÇÃO. LEI N. 9.873/99, ART. 1º, § 1º. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DESPROVIDAS. Tendo sido autuado por infração à legislação específica em 04/06/2002, a sentença, contra a qual se volta o IBAMA, destacou que “da data da apresentação da impugnação pelo Impetrante – 20/06/2002 (fl. 36/45) à data do despacho proferido (fl. 55) – 17/08/2005, decorreram-se mais de 03 anos”. O legislador, ao enunciar que “incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho”, prestigia o princípio da razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII). Por “despacho” ou “julgamento”, há de se reputar o ato oficial que implique verdadeiro impulsionamento do processo a fim de se chegar a uma solução (decisão) final. Não faz suas vezes simples certidão ou movimentação física dentro da repartição administrativa. Não tendo havido despacho ou decisão em três anos, de rigor reconhecer-se prescrita a pretensão punitiva da Administração, conforme disposto pelo art. 1º, § 1º, da Lei n. 9.873/99. Apelação e remessa oficial desprovidas. (TRF1ª, AC 0025514-21.2009.4.01.3800/MG, rel. convocado juiz federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho, Quinta Turma, e-DJF1 de 20/4/2016). (TRF1ª, AC 0025514-21.2009.4.01.3800/MG, rel. convocado juiz federal Evaldo de Oliveira Fernandes Filho, Quinta Turma, e-DJF1 de 20/4/2016)
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. APLICAÇÃO DE MULTA EM DECORRÊNCIA IRREGULARIDADE COMETIDAS. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE RECONHECIDA. LEI 9.873/99. SENTENÇA REFORMADA. 1. O Auto de infração sob análise foi lavrado pela Agência Nacional de Petróleo – ANP em função de haver a empresa-autora supostamente (i) ostentado bandeira de uma distribuidora e adquirido combustível de outra e (ii) deixado de exibir quadro informativo com os dados do posto revendedor e do órgão fiscalizador, em violação aos arts. 10, VIII e 11, § 2º, da portaria ANAP 116/2000 e art. 3º, XV, da Lei 9.847/1999. 2. Importante frisar que o simples encaminhamento do procedimento administrativo para realização da instrução, por constituir mero ato de expediente que impõe a lógica procedimental, não tem, em verdade, o condão de interromper o prazo prescricional, vez que não se encaixa às hipóteses previstas no art. 2º da Lei 9.873/99. 3. Extrapolado o período de 3 (três) anos previsto no § 1º, do art. 1º, da Lei 9.873/1999 entre a data da lavratura do auto de infração (29.08.2000) e o despacho de natureza saneadora que determinou remessa de sua cópia à autuada com o fim de que ela, querendo, apresentasse alegações finais (22.06.2004), forçoso reconhecer a ocorrência da prescrição intercorrente da pretensão punitiva da Administração. 4. Recurso de apelação conhecido e provido para, reconhecida a prescrição intercorrente, declarar a nulidade do procedimento administrativo, bem como das penalidades dele decorrentes. Invertidos os ônus da sucumbência. (TRF1 Numeração Única: 0004806-82.2007.4.01.3811 APELAÇÃO CÍVEL N. 2007.38.11.004824-7/MG Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL. DÍVIDA NÃO TRIBUTÁRIA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE TRIENAL. LEI N. 9.873/99. OCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. – A prescrição intercorrente no âmbito administrativo, em se tratando de dívida ativa não-tributária, objeto de auto de infração, sujeita-se ao prazo trienal previsto no artigo 1º, § 1º da Lei nº 9.873 /1999, estando sujeita à interrupção nos moldes do artigo 2º do mesmo diploma legal. – No caso em tela, o processo administrativo foi instaurado com a lavratura do documento fiscal e do auto de infração em 07/07/2005 (doc. id nº 3659264 – pag. 02/06), em 15/07/2005 foi apresentada impugnação administrativa (data da postagem nos Correios – doc. id nº 3659264 – pag. 08/10), e somente em 09/10/2009 foi proferido despacho a fim de determinar o regular processamento do feito (doc. id nº 3659265 – pag. 22/23). – Observo que, nesse ínterim, foram realizadas algumas diligências internas/atos de mero expediente pela Administração Pública (memorando para encaminhamento de documentos; ofício para localização de documentos supostamente extraviados; e consulta à procuradoria federal para verificação da ocorrência da prescrição intercorrente), que não tiveram o condão de interromper a contagem do prazo prescricional, na medida em que não consistiram em ato inequívoco que importasse apuração dos fatos (art. 2º, inciso II, da Lei 9.873 /1999). – Somente a prática de ato inequívoco por parte da Administração que importe a apuração do ato ilícito tem o condão de interromper a prescrição intercorrente trienal, caso contrário, fica caracterizada inércia que inviabiliza o regular processamento do feito. Precedente TRF3. – Considerando-se que, no caso concreto, o procedimento administrativo ficou paralisado por mais de três anos pendente de despacho, foi correta a r. sentença que reconheceu a ocorrência da prescrição administrativa intercorrente. – Apelação desprovida (TRF3ª, AC 5000450-30.2018.4.03.6005, rel. Desembargador Federal Monica Autran Machado Nobre, Quarta Turma, e-DJF3 de 18/12/2020) (grifos acrescidos)
Nesse contexto, percebe-se que os tribunais federais têm decidido que despachos sem qualquer conteúdo decisório ou que não objetivavam a apuração de fato que resolveria a lide não tem o condão de interromper a prescrição intercorrente, pois não configura ato inequívoco que importe apuração do fato infracional.
Com tais ponderações, avaliemos o caso concreto. Em consulta aos autos do processo administrativo é possível observar que o auto de infração foi lavrado em 22/07/2014;
- o autuado foi notificado apenas em 12/07/2017, conforme Aviso de Recebimento – AR;
- em 02/08/2017 houve encaminhamento dos autos ao NUIP/STM para instrução processual e demais encaminhamentos;
- o autuado apresentou defesa administrativa em 26/07/2017, que foi juntada aos autos em 04/08/2017;
- em 02/10/2017 foi juntada certidão negativa de agravamento e manifestação instrutória;
- em 10/10/2017 foi juntada certidão informando que o autuado foi notificado por edital para apresentar alegações finais;
- houve encaminhamento do processo à Gerente Executiva/STM/IBAMA/PA para análise e julgamento em 26/10/2017;
- em 02/09/2021 houve a juntada de certidão informando que em 15/05/2021, os autos foram encaminhado à SUPES/PA pelo Superintendente do Ibama, conforme registrado no andamento processual, sem o devido Despacho de Encaminhamento ao GN-P, visando a instrução processual;
- em 09/09/2021 os autos forma encaminhados ao GN-I;
- em 30/09/2021 houve despacho determinando encaminhamento dos autos à AGU para informar qual data deve ser utilizada para fazer o cálculo da prescrição processual, se a data citada na certidão ou a data em que a certidão foi emitida e anexada ao processo;
- em 29/11/2021 foi emitido despacho pela AGU; em 01/12/2021 houve encaminhamento dos autos à DICON.
Diante do cronograma dos fatos ocorrido no processo administrativo em análise, é possível constatar que o IBAMA permaneceu inerte por mais de três anos, como alega a parte autora, vejamos.
- Após a notificação do autuado em 12/07/2017 (fato que interrompe a prescrição), houve a apresentação da defesa administrativa em 04/08/2017, ato contínuo, em 02/10/2017 foi juntada certidão negativa de agravamento e manifestação instrutória – fato que pode ser considerado como ato que tem como finalidade a solução do litígio, portanto interrompe a prescrição;
- em 10/10/2017 foi juntada certidão informando que o autuado foi notificado por edital para apresentar alegações finais – fato que também interrompe a prescrição;
- em 26/10/2017 houve encaminhamento do processo à Gerente Executiva/STM/IBAMA/PA para análise e julgamento em 26/10/2017 – ato que não interrompe a prescrição;
- em 02/09/2021 houve a juntada de certidão informando que em 15/05/2021, os autos foram encaminhado à SUPES/PA pelo Superintendente do Ibama, conforme registrado no andamento processual, sem o devido Despacho de Encaminhamento ao GN-P, visando a instrução processual – ato que não interrompe a prescrição, pois se trata de mero encaminhamento dos autos, sem o intuito de apurar os fatos e por fim ao litígio, mero ato procrastinatório.
Verifica-se que a certidão emitida em 02/09/2021 informa que o processo foi encaminhado à Supes/PA sem o despacho de encaminhamento em 15/05/2021, conforme registrado no andamento processual, fato que motivou a remessa dos autos administrativos à AGU para informar o início da contagem do prazo prescricional se data da certidão (02/09/2021) ou a data do despacho (15/05/2021) que não foi anexado aos autos.
No entanto, é possível concluir que nem a certidão, nem o suposto despacho tem o condão de interromper a prescrição intercorrente, tendo em vista que se tratam de mero encaminhamentos, sem o intuito de apurar os fatos e por fim ao litígio.
Ressalta-se. Ainda, que mesmo que esse não fosse do entendimento deste juízo, a prescrição intercorrente já havia se configurado quando o suposto despacho de encaminhamento foi emitido (15/05/2021), tendo em vista que o ato anterior que interrompeu a prescrição foi emitido em 10/10/2017 – notificação do autuado para apresentar alegações finais.
Nesse contexto, entendo que ocorreu prescrição intercorrente, tendo em vista que houve paralização do processo administrativo por mais de 3 (três) anos nesse período. Assim, declaro a prescrição intercorrente da dívida cobrada no processo administrativo.
Quanto as demais alegações da parte autora, esclareço que o Superior Tribunal de Justiça – STJ já decidiu que o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida.
Anulação do termo de embargo.
Requer a parte autora a anulação do termo de embargo em razão da nulidade e prescrição do processo administrativo.
Pois bem, apesar das alegações da autarquia ambiental, o reconhecimento da prescrição alcança o auto de infração e todos os demais atos dele decorrentes, incluindo o termo de embargo. Observe-se que tal termo não é autônomo, portanto, anulando-se aquele, este não perdura, já que a sorte do principal deve ser seguida pelo acessório.
Nesse sentido, segue decisões do TRF1 a seguir colacionadas:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. DESMATAMENTO. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO. PRESCRIÇÃO DOS ATOS DECORRENTES. TERMO DE EMBARGO. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. EXCESSO DE PRAZO PARA JULGAMENTO. DEMORA INJUSTIFICADA. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. I O IBAMA, no exercício regular do poder de polícia ambiental, detém, em perfeita sintonia com a tutela cautelar constitucionalmente prevista no art. 225, § 1º, V e respectivo § 3º, da Constituição Federal, atribuições para defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, para as presentes e futuras gerações (CF, art. 225, caput). II A demora excessiva e injustificada do Poder Público para a análise do processo administrativo, sob pena de violação aos princípios da eficiência, da moralidade e da razoável duração do processo, conforme preceitua a Lei nº 9.784/99 e os dispositivos insertos nos artigos 5º, inciso LXXVIII e 37, caput, da Constituição Federal, que a todos assegura o direito à celeridade na tramitação dos procedimentos administrativos, a autorizar, na espécie, a suspensão dos efeitos do referido Termo de Embargo até julgamento do citado processo (antecipação de tutela confirmada na sentença) III O Termo de Embargo/ Interdição deriva da lavratura de Auto de Infração e, em sendo declarada a prescrição deste, todos os atos dele decorrentes também estão prescritos. IV Recurso de apelação interposto pelo IBAMA a que se nega provimento. (TRF-1 – AC: 10003324420174013603, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 20/07/2020, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 23/07/2020).
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO. MULTA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. LEI 9.873/99, ART. 1º, § 1º. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE CAUSA INTERRUPTIVA. RECONHECIMENTO. LEVANTAMENTO DO EMBARGO. DEMORA EXCESSIVA NA CONCLUSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL. APELAÇÃO DO IBAMA PREJUDICADA. 1. Nos termos do art. do §1º do art. 1º da Lei 9.873/99, “incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada (…)”, regra reforçada pelo art. 21, § 2º, do Decreto nº 6.514/2008. 2. Não é causa interruptiva do prazo prescricional o mero encaminhamento dos autos à equipe técnica, sem qualquer ato de conteúdo decisório ou de instrução, consoante se extrai do art. 2º da Lei nº 9.873/99. Nesse sentido, a reiterada jurisprudência deste Tribunal: AC 0001082-21.2017.4.01.3908, Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas, TRF1 – Sétima Turma, PJe 26/04/2023; AC 0004806-82.2007.4.01.3811, Desembargador Federal Kassio Nunes Marques, TRF1 – Sexta Turma, e-DJF1 27/04/2016. 3. No caso em apreço, não se verifica, das peças do processo administrativo nº 02002.001603/2007-19, o referido cunho instrutório nos atos que se deram entre o Parecer Técnico Instrutório elaborado 04/03/2011 e a data do ajuizamento da presente ação, de 03/06/2014, não se afigurando aptos a interromper a prescrição os atos ou despachos de mero encaminhamento interno e a simples publicação de editais de notificação para apresentação de alegações finais, tal como se deu na espécie. Consumado, portanto, o prazo trienal de que dispunha a Administração para impulsionar o processo administrativo com a finalidade de instruí-lo ou de exercer a sua função sancionatória. 4. A demora excessiva e injustificada da Administração na conclusão do processo administrativo, que na espécie dos autos perdura desde 2007, permite o levantamento do termo de embargo incidente sobre a atividade do autuado, o qual não pode ficar de à mercê do Poder Público, sem a definição de sua situação em prazo razoável. No mesmo sentido: AG 1027151-55.2020.4.01.0000, Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, Sexta Turma, PJe 27/09/2022; AC 1000332-44.2017.4.01.3603, Rel. Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, TRF1 – Sexta Turma, PJe 23/07/2020. 6. Apelação do autor a que se dá provimento para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado na inicial, declarando a ocorrência da prescrição intercorrente no bojo do processo administrativo nº 02002.001603/2007- 19, bem como a nulidade de eventual sanção aplicada em decorrência do Auto de Infração nº 525452 – D. 7. Antecipação da tutela recursal para suspender os efeitos de eventual sanção aplicada em decorrência do Auto de Infração nº 525452-D, bem como para determinar o levantamento do termo de embargo incidente sobre a atividade do autuado. 8. Fica, por conseguinte, prejudicada a apelação do Ibama, porquanto restrita aos critérios de fixação dos honorários de sucumbência, que ora se invertem em favor do autor, mantendo-se o valor arbitrado em sentença, de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). (AC 0004082-42.2014.4.01.3000, DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHAO COSTA, TRF1 – QUINTA TURMA, PJe 14/08/2023 PAG.)
Nesse viés, reconheço a nulidade do termo de embargo, em razão da prescrição intercorrente do processo administrativo.
Ante a existência de reconvenção com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, segue-se para análise.
Reconvenção. Ação civil pública. Não conhecimento.
O IBAMA apresenta, em sede de contestação, pedido de reconvenção, de modo que pretende a transformação do presente feito de anulação de auto de infração em verdadeira ação civil pública pela prática de dano ambiental. A pretensão em questão é absolutamente inviável.
O rito e o propósito privado de uma simples ação anulatória é totalmente incompatível com os propósitos difusos de uma ACP. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO. IBAMA. UTILIZAÇÃO DE REDE DE ARRASTO. RECONVENÇÃO AFASTADA. DANO AMBIENTAL. INCOMPATIBILIDADE PROCEDIMENTAL. 1. O exercício do poder de polícia pela atividade desempenhada, bem como a presunção de legitimidade do ato administrativo praticado está em consonância com o princípio da legalidade. 2. Os argumentos apresentados pelo demandado não encontram amparo legal ou fático para acolhimento. 3. Afastada a reconvenção do IBAMA, diante a incompatibilidade de procedimentos. 4. Manutenção da sentença na íntegra. (TRF-4 – AC: 50051342020144047101 RS 5005134-20.2014.404.7101, Relator: LUÍS ALBERTO D’AZEVEDO AURVALLE, Data de Julgamento: 05/04/2017, QUARTA TURMA)
O próprio Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em precedentes recentes, tem encampado, em absoluto, esse entendimento. No ensejo, remonto às decisões proferidas nos agravos de nº 0024377-74.2017.4.01.0000 e 47306-04.2017.4.01.0000. No segundo desses precedentes, foi proferido voto vogal cujo excerto peço vênia para reproduzir:
“O DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS PIRES BRANDÃO: Ouvi atentamente o procurador do Ibama, a Dra. Michele também, procuradora da República, e percebi o foco, que é na eficiência, na celeridade. Esse foco da eficiência, da celeridade também foi reproduzido pelo Dr. Ilan. Agora, eu queria trazer um outro olhar numa outra perspectiva, que é a perspectiva da cidadania, que é o direito que o cidadão tem de participar, dentro dos mecanismos previstos na Constituição, do controle da atuação pública. No Brasil, adotamos o Judiciário único, com a possibilidade de a Administração Pública ser sindicada pelo cidadão. Esse é um direito bem antigo, está conosco desde o tempo da instauração da República, e somente em alguns momentos episódicos da vida político-institucional brasileira é que esse amplo direito foi suspenso. Mas não é o caso agora, em que estamos em uma democracia fundada numa democracia participativa, deliberativa, cooperativa também por parte da cidadania. Então, a minha visão é uma visão que pretende enaltecer essa atuação de controle que o cidadão tem em relação aos atos da Administração Pública. Admitir-se a possibilidade de, numa ação anulatória em que se pretende aferir as legalidades formais, legalidades também substantivas da atuação pública, fazer-se uma ampliação do objeto de uma ação que tem o cunho de cidadania e que é apresentada contra o Poder Público, admitir-se a possibilidade de que esse trânsito seja conjunto com uma ação civil pública seria onerar demasiadamente o processo que pretende abrir o acesso à Justiça para a cidadania. Muitas vezes, tomamos os números, os aspectos quantitativos muito em conta, especialmente na ciência; a ciência nasceu e cresceu com base no quantitativo, na Matemática. De fato, quando anunciamos a possibilidade de menores atos processuais, se admitirmos a reunião desses dois processos, isso é verdade, no entanto, temos que fazer também uma interpretação qualitativa das consequências que a admissão dessa reconvenção, as consequências que poderiam ser geradas com a admissão dessa reconvenção. Penso que essa atuação que vem do Império de autoridade, essa atuação pela ação civil pública se confronta com esse direito de acesso que o cidadão tem para o controle dos atos administrativos. Então, são duas ações com procedimentos distintos, com bases empíricas distintas, porque, de alguma forma, há uma ampliação objetiva com a apresentação da reconvenção, quer dizer, há uma ampliação dos pedidos, e esses pedidos que são apresentados pela entidade da Administração Pública contra o cidadão terminam sobrecarregando um processo que se pretendia tão somente anular o ato administrativo. Então, há consequências em relação a honorários, consequências em relação a perícias que seriam desenvolvidas no presente processo. A democracia não se perfaz só com aspectos substantivos de defesa de determinados valores substantivos, mas a democracia exige ritos, exatamente para proteger um ambiente que seja de confiança entre as partes. Assim, admitir-se uma reconvenção — não digo só neste caso, mas em outros também —, uma reconvenção se dá por meio de uma ação civil pública, conjuntamente com uma simples ação que pretende anular uma atuação administrativa, gera efeitos simbólicos e conceituais também que podem, de alguma forma, reprimir essa atuação de cidadania. Então não vejo razão para admitir essa proposição da reconvenção na própria contestação, especialmente agora com o novo CPC, em que ela não é mais apresentada de forma incidental, mas é apresentada na própria contestação. É possível reconvenção? Sim, o código permite, mas não em hipóteses de ações com ritos e com objetos extremamente díspares, embora sejam objetos que tangenciem nas suas causas de pedir. A decisão do magistrado funda-se nos seguintes argumentos: a reconvenção em comento possui natureza de ação civil pública, na medida em que tutela a proteção ao meio ambiente, porque é interesse difuso. Veja aí a ampliação que se está fazendo ao conjunto de objetos que estão sendo veiculados perante o sistema judicial. Então se tramita um interesse particular, embora seja público, ele controla o interesse público e, ao mesmo tempo, vai-se admitir o trânsito de uma ação civil pública para a proteção de interesse difuso? Será que [inaudível] isso no nosso sistema seria possível? Será que não haveria uma diluição desse interesse particular no interesse difuso, que tem maior proteção? Então aí segue o juiz: nesse sentido, a ela devem ser aplicados os regramentos próprios àquela espécie de ação, inclusive o rito previsto na Lei 7.347/85. Sem embargo do entendimento do IBAMA, no sentido de que a ação civil pública em questão pode ser ajuizada por meio de reconvenção em atos de ação anulatória de autos de infração, tal posicionamento não é o mais adequado, segundo a jurisprudência pátria. É que, para que seja possível processar a reconvenção apresentada pelo réu, entende a doutrina que se deve fazer presente a mesma qualidade jurídica das partes com que figura na ação originária. Trata-se da regra da identidade bilateral concernente à identidade subjetiva do direito. Nas palavras da autorizada doutrina, trata-se do princípio da identidade bilateral, que não é identidade da pessoa física, mas identidade subjetiva do direito. De fato nos casos de ação civil pública proposta pelo IBAMA se tem entendido que não poderia o réu reconvir, deduzindo pretensão em face da autarquia em si, pois naquela demanda ela estaria agindo com legitimação extraordinária, deduzindo pretensão em nome da coletividade e não em nome próprio. Falta, portanto, identidade subjetiva bilateral. O que o juiz está querendo nos lembrar? É que na ação individual o IBAMA está respondendo por [inaudível] próprios, pretendendo a improcedência da ação. Quando apresenta a ação civil pública, ele não mais está apenas defendendo [inaudível] próprios, ele está na defesa de direitos difusos, da coletividade e, assim, está agindo na condição de um agente legitimado extraordinariamente. É essa identidade subjetiva bilateral que não existe nas duas ações. E aí segue o juiz: Igual raciocínio deve ser aplicado à reconvenção em sede de ação anulatória. A pretensão deduzida pela parte autora é direcionada à autarquia ambiental, que não pode, então, reconvir apresentando pretensão em nome de outrem, da sociedade, agindo como substituto processual, pois haveria alteração na qualidade jurídica de parte do IBAMA. Assim, é ausente o pressuposto processual de constituição válido do processo, a petição inicial da reconvenção deve ser indeferida. Então, com essas razões apresentadas pelo magistrado, que entende pela falta de legitimidade do IBAMA para a proposição de uma ação civil pública em reconvenção em ação anulatória, eu também acrescentaria essa incompatibilidade de ritos, que também, de alguma forma, foi apresentada pelo magistrado. Há ritos próprios da ação civil pública, e essa ação anulatória segue um rito mais geral. Então, com essas razões, nego provimento ao agravo de instrumento.”
Dispositivo
Diante do exposto, quanto à ação principal, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados na peça inicial, nos termos do art. 487, I do CPC, para reconhecer e Declarar a prescrição intercorrente dos processos administrativo e reconhecer a nulidade do auto de infração e termo de embargo/interdição ambiental.
Concedo a tutela de urgência requerida para determinar a imediata suspensão de todos os efeitos decorrentes do auto de infração/termo de embargo em questão.
Quanto à ação reconvencional, sem resolver o mérito da lide, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL DE RECONVENÇÃO, nos termos do art. 343 c/c 485, I, ambos do CPC.
Em relação à sucumbência quanto à ação principal, condeno o IBAMA ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do autor, que fixo em 8% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 3º, II, do CPC, devendo o IBAMA ressarcir a parte autora quanto às custas inicialmente recolhidas.
De outro lado, quanto à ação reconvencional, deixo de condenar a parte ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios, por isenção legal. Isso porque a reconvenção possui natureza de ação civil pública, vez que objetiva tutelar interesse difuso, consistente na proteção do meio ambiente. Nesse sentido, a ela devem ser aplicados os regramentos próprios àquela espécie de ação, inclusive o artigo 18, da Lei n. 7.347/85, que veda a condenação em honorários advocatícios no caso de sucumbência do reconvinte.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se.