Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) Federal da Vara Federal da Subseção Judiciária de
Parte autora, brasileiro (a), estado civil, profissão, inscrito (a) no RG sob o n… e CPF…, residente e domiciliado (a) na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, vem, por seus advogados, à presença de Vossa Excelência, propor ação anulatória de auto de infração ambiental com pedido de tutela de urgência contra Parte ré, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ n…, com sede na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
1. Da síntese dos fatos
A autora foi surpreendida com o protesto por uma dívida de Multa no Auto de Infração Ambiental XXX, a qual não foi paga, no valor de R$ 00.000,00, sendo o valor atualizado do protesto a importância de R$ 00.000,00 já acrescidos dos emolumentos cartorários.
O referido protesto decorre de um auto de infração, onde supostamente os policiais ambientais em patrulhamento rural constatando no local a existência de animais bovinos e equinos pastoreando em área de preservação permanente, cuja a propriedade foi atribuída a autora.
Em processo administrativo o Magistrado optou pela manutenção da penalidade de multa imposta pelo órgão fiscalizador, tendo então o valor da dívida, após o trânsito em julgado, sido protestado pela ré, por não pagamento.
Em que pese a referida dívida ter sido protestada pelo órgão estatal, entende-se que o débito não é devido pelos fundamentos que passa a expor.
2. Do Direito
2.1 Da Ausência De Prévia Advertência
O artigo 72 da Lei n° 9.605/98 dispõe que a multa deverá ser aplicada somente quando o agente, advertido por irregularidade, deixar de saná-las em prazo determinado.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6°: § 3° A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo: I – advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
No entanto, a parte autora não foi previamente advertida pelos agentes da autarquia ambiental. ASSIM, A APLICAÇÃO DA MULTA PELOS AGENTES DE FISCALIZAÇÃO DA AUTARQUIA AMBIENTAL OFENDEU O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE, porquanto sua aplicação se encontra condicionada a uma prévia e necessária advertência, o que não foi observado, como se verifica do Processo Administrativo.
Diante do exposto, a anulação da multa pelo Poder Judiciário mostra-se necessária, na medida em que toda e qualquer atividade administrativa deve estar autorizada por lei.
2.2 Da Violação À Tipicidade E À Reserva Legal.
Antes de penetrar propriamente na questão da violação à tipicidade e à reserva legal para aplicação da sanção pecuniária em questão cumpre fazer breve discussão a respeito da similaridade entre os regimes do direito penal e do direito administrativo sancionador ambiental.
Os ilícitos ambientais são um evento único sobre qual se debruçará uma sanção administrativa com um regime jurídico próprio, mas como se pretende demonstrar no caso das sanções administrativas as regras de direito penal se aplicam de forma subsidiária:
A mais importante e fundamental consequência da suposta unidade de ius puniendi ao Estado é a aplicação de princípios comuns ao direito penal e ao direito administrativo sancionador, reforçando-se nesse passo algumas garantias individuais. (Fábio Media Osório. Direito Administrativo Sancionador. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 102.);
A Lei Federal n° 9.605/98, que traz o regime geral das infrações administrativas ambientais, justamente em seu artigo 79, estabelece a possibilidade de aplicação subsidiária do direito penal.
Já o dispositivo básico da responsabilização administrativa ambiental como previsto no artigo 72, da Lei Federal n° 9.605/98, prevê que as disposições penais relativas à gradação da pena criminal, constantes do próprio artigo 6° do diploma, servem para a dosimetria das sanções administrativas ambientais.
Resta muito evidente a relação próxima que o direito penal e o direito administrativo ambiental possuem no trato que dão à apuração das infrações administrativas ambientais.
Vigora no direito administrativo sancionador o princípio da legalidade, como preceituam os artigos 5°, II e 37, da Constituição Federal:
Por tais motivos, a infração administrativa e a respectiva sanção devem ser criadas pelo órgão legislativo, composto por representantes da coletividade. (Rafael Munhoz de Mello. Princípios Constitucionais de Direito Administrativo Sancionador. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 132).
A partir da necessidade que as infrações e as sanções sejam previstas em lei em sentido estrito surge o princípio da tipicidade como decorrente direto da legalidade.
Pela tipicidade o comportamento proibido e a sanção a ele atrelada devem estar descritos de forma detalhada em lei para que o particular não seja surpreendido com a imposição de sanção por um comportamento que desconhecia ser proibido.
Desta forma, é imensa a fragilidade do auto de infração lavrado pelo agente público sustentado unicamente em norma infralegal que deve ser desconstituída por clara violação à tipicidade.
2.3 Da Desproporcionalidade Da Sanção Aplicada
A partir da análise dos autos verifica-se que a multa imposta de elevadíssimo valor não guarda correspondência com a conduta e suas eventuais consequências ao meio.
No que se refere a multa simples aplicada inicialmente, é impossível traçar a correlação entre a infração imputada e a sansão em razão da precariedade da descrição da conduta da Autora nos autos de infração e da ausência de efetiva apuração das áreas afetadas ou dos reais impactos ao ambiente.
Não houve apuração objetiva das áreas afetadas e deixou-se de identificar os impactos reais ao meio ambiente para a imposição da multa na intensidade feita, portanto esta não guarda relação direta com os fatos e acaba por ser desproporcional.
A multa que foi imposta deveria refletir com exatidão, dentre outros elementos, a intensidade e a real extensão da intervenção feita sob a ótica ambiental e UM AGENTE PÚBLICO NÃO PODE POR SI SÓ ESTABELECER O VALOR DA MULTA QUANDO ESTA DEPENDA DESTA APURAÇÃO TÉCNICA AMPLA:
Seria um paradoxo aceitar que o agente sem formação técnica superior emitisse auto de infração de até R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), quando na esfera penal a cominação de pena de multa é de no máximo 356 vezes o salário mínimo (R$ 48.416,00), onde se exigem dois peritos portadores de diploma de curso superior para encontrar a materialidade e extensão e um juiz de direito para cominar a pena de multa. (Luís Carlos Silva de Moraes. Curso de Direito Ambiental. São Paulo: Atlas, 2001, pp. 111. Marcações nossas).
A forma sumária de apuração da infração realizada não se mostra acertada ao que preceitua também a Lei Federal n° 9.605/98 que:
Procura assegurar a proporcionalidade entre os ilícitos administrativos e as sanções a serem impostas, permitindo que o aplicador confira aos poluidores tratamento compatível com os gravames efetivamente causados. (Nicolao Dino De Castro e Costa Neto, Ney De Barros Bello Filho e Flávio Dino de Castro e Costa. Crimes e Infrações Administrativas Ambientais. Brasília: Brasília Jurídica, 2001, p. 406)
O artigo 74, da Lei Federal n° 9.605/98 exige que a multa tenha por base o objeto jurídico lesado, ou seja, o dano ambiental causado, sem embargo, a multa simples aplicada fere a proporcionalidade e a razoabilidade por ter deixado de observar este critério básico e ser totalmente desconhecidos os critérios manejados para delimitação da área atingida e assim fixação da multa.
É desproporcional a imposição de multas administrativas de tamanha monta, tendo em vista que não se pode traçar qualquer relação de correspondência com a conduta por falta de apuração objetiva, pois em nenhum instrumento de fiscalização foi relatada a forma de medição das áreas afetadas.
O ato punitivo deve sempre obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista do bom senso e segundo o princípio da proporcionalidade deve ser limitado em sua extensão e intensidade para que seja suficiente à satisfação do interesse público.
O princípio da proporcionalidade implica em verdadeira vedação ao excesso, pois a autuação administrativa deve estar adstrita aos limites legais da Lei Federal n° 9.605/98, O QUE NÃO OCORREU.
Por todas as razões expostas não subsistem motivos para manutenção da sanção na forma como foi lançada nos autos de infração porque ela se marca pela desproporcionalidade resultante da ausência de apuração objetiva das áreas afetadas.
A multa que seja imposta deveria refletir, dentre outros elementos, a intensidade e a amplitude da intervenção feita sob a ótica ambiental:
Na atividade da autoridade ambiental, é preciso, pois, correlação entre meios e fins; se uma dada fábrica polui, embora de forma pouco grave, a eventual penalidade administrativa deve ser imposta à medida dos fatos, ou motivos, que a originaram. O mesmo não ocorre se o agente ambiental aplicar a sanção administrativa aquém do que seria suficiente para atender à finalidade legal. (Heraldo Garcia Vitta. Responsabilidade Civil e Administrativa por Dano Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2008, pp. 34/35).
Resulta que a elevada sanção administrativa imposta, não se adequa aos fatos porque a área não foi devidamente mensurada, os impactos ambientais seriam presumidos, bem como não foi executada a devida apuração dos efeitos ambientais.
Posto isto, e diante de tudo que foi exposto até o presente momento, os autos de infração em voga devem ser desconstituídos por falta de proporcionalidade ou omissão na aplicação das sanções referentes a conduta da autora.
2.4 Da Ofensa Ao Princípio Da Razoabilidade
É sabido que a Administração Pública possui a faculdade de, junto à determinada situação do mundo fenomênico, escolher uma dentre as várias soluções juridicamente possíveis e admitidas pelo legislador.
Tal faculdade denomina-se Poder Discricionário, que se caracteriza pela possibilidade de a Administração fazer opções, ou seja, liberdade na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato que deseja expedir.
Sucede que o exercício dessa competência discricionária encontra limites na Constituição da República.
Estamos nos referindo ao princípio da razoabilidade, que veda a atuação desarrazoada dos órgãos do Poder Público. Assim, por se tratar de uma pauta de natureza axiológica decorrente dos ideais de justiça, prudência, justa medida, referido princípio tem sido habitualmente utilizado para aferir a legitimidade das restrições aos direitos dos administrados.
O grande fundamento do princípio da proporcionalidade, segundo Nome:
“é o excesso de poder, e o fim a que se destina é exatamente o de conter atos, decisões e condutas de agentes públicos que ultrapassem os limites adequados, com vistas ao objetivo colimado pela Administração, ou até mesmo pelos Poderes representativos do Estado. Significa que o Poder Público, quando intervém nas atividades sob seu controle, deve atuar porque a situação reclama realmente a intervenção, e este deve processar-se com equilíbrio, sem excessos e proporcionalmente ao fim a ser atingido”.
FILHO, José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo – 22a Edição – Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2009. p.38.
Segundo os ensinamentos da doutrina alemã, a aplicação deste princípio exige a verificação do ato do Poder Público quanto aos seguintes aspectos:
a) adequação, no sentido de o meio empregado ser
compatível com o fim colimado;
b) necessidade , vinculando os agentes públicos, no exercício de sua atuação, a empregar o meio menos gravoso para alcançar o interesse público, ou seja, a escolha deve ser aquela que cause o menor prejuízo possível aos administrados; e
c) proporcionalidade em sentido estrito, que impõe
a sobreposição das vantagens em relação às desvantagens da medida adotada.
Da análise do Processo Administrativo, conclui-se que a aplicação da multa pecuniária pelo agente público à parte autora – que é pessoa humilde, de parcos conhecimentos e de baixa renda – não respeitou mencionados subprincípios, mostrando-se ilegal e desarrazoada, o que se extrai da subsunção dos fatos aos seguintes preceitos jurídicos:
Lei n° 9.605/98
Art. 6° – Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
[…]Art. 72 – As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6°:
I – advertência;
II – multa simples;
III – multa diária;
IV – apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
V – destruição ou inutilização do produto;
VI – suspensão de venda e fabricação do
produto; VII – embargo de obra ou atividade;
VIII – demolição de obra;
IX – suspensão parcial ou total de
atividades; X – (VETADO)
XI – restritiva de direitos. § 1° Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais
infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.
§ 2° A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta Lei e da legislação em vigor, ou de preceitos
regulamentares, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.
§ 3° A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
I – advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
II – opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
§ 5° A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo.
§ 6° A apreensão e destruição referidas nos incisos IV e V do caput obedecerão ao disposto no art. 25 desta Lei.
§ 7° As sanções indicadas nos incisos VI a IX do caput serão aplicadas quando o produto, a obra, a atividade ou o estabelecimento não estiverem obedecendo às prescrições legais ou regulamentares.
§ 8° As sanções restritivas de direito são:
I – suspensão de registro, licença ou autorização; II – cancelamento de registro, licença ou autorização; III – perda ou restrição de incentivos e benefícios
fiscais;
IV – perda ou suspensão da participação em linhas
de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;
V – proibição de contratar com a Administração
Pública, pelo período de até três anos.
Vê-se, para logo, que a legislação vincula o agente público a observar, quando da imposição e gradação das penalidades administrativas, a gravidade do fato, os antecedentes do infrator e sua condição econômica. No vertente caso, ao revés, o agente administrativo não observou referidos limites jurídicos para a aplicação da multa administrativa.
Vinculando o agente administrativo a observar o princípio da razoabilidade, dispõe o Decreto n° 6.514/2008, art. 24, § 9°, in verbis :
§ 9° – A autoridade julgadora poderá, considerando a natureza dos animais, em razão de seu pequeno porte, aplicar multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais) quando a contagem individual for de difícil execução ou quando, nesta situação, ocorrendo a contagem individual, a multa final restar desproporcional em relação à gravidade da infração e a capacidade econômica do infrator.
Portanto, pode-se concluir que, tanto para a escolha da sanção (modalidade multa) quanto para o valor estipulado, o agente público não observou as três balizas normativas, em especial a terceira, na medida em que a condição de hipossuficiente da parte autora possui o condão de afastar a aplicação da multa ou de reduzir seu valor.
Por outro lado, também se constata a ausência de razoabilidade entre a imposição da multa e a infração ambiental praticada pela parte autora, de forma a violar, em última análise, o princípio da legalidade. Esta é a razão pela qual a doutrina mais moderna faz a seguinte consideração:
Desse modo, quando alguns estudiosos indicam que a razoabilidade vai se atrelar à congruência lógica entre as situações postas e as decisões administrativas, parecer-nos que a falta da referida congruência viola, na verdade, o princípio da legalidade, porque, no caso, ou há vício nas razões impulsionadoras da vontade, ou o vício estará no objeto desta. A falta de razoabilidade, na hipótese, é puro reflexo da inobservância de requisitos exigidos para a validade da conduta.
Com esses elementos, desejamos frisar que o princípio da razoabilidade tem que ser observado pela Administração à medida que sua conduta se apresente dentro dos padrões normais de aceitabilidade. Se atuar fora desses padrões, algum vício estará, sem dúvida, contaminando o comportamento estatal. Significa dizer, por fim, que não pode existir violação ao referido princípio quando a conduta administrativa é inteiramente revestida de licitude. Acertada, pois, a noção de que o princípio da razoabilidade se fundamenta nos princípios da legalidade e da finalidade, como realça Celso Antônio Bandeira de Mello (…). (Grifo nosso). FILHO, José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo – 22a Edição – Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2009. p. 37.
À luz do gizado, resta patente que a multa administrativa imposta pelo agente administrativo ofendeu o princípio da razoabilidade e, em última instância, o próprio princípio da legalidade, pela não observância dos preceitos normativos radicados nos artigos 6° e 72 da Lei n° 9.605/98.
Subsidiariamente, caso não acatado o pedido de cancelamento, pugna-se pela diminuição da multa a valores mais acessíveis a demandante, pois ela, visivelmente, não tem condições de arcar integralmente com o valor imposto.
Salienta-se que se trata de uma aposentada, que sobrevive com um salário mínimo. Assim, a multa de R$ 00.000,00 afigura-se desproporcional, assumindo caráter verdadeiramente confiscatório, lembrando que, atualmente, o valor atualizado da dívida importa em R$ 00.000,00.
Observa-se que nossos Tribunais vêm afastando a imposição de multas desproporcionais aplicadas pelo IBAMA:
ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. MANTER EM CATIVEIRO ESPÉCIES DA FAUNA SILVESTRE BRASILEIRA SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO DO IBAMA. ADVERTÊNCIA NÃO APLICADA. MULTA. VALOR EXCESSIVO EM RELAÇÃO À SITUAÇÃO DA EXECUTADA. DISPENSA DA MULTA. 1. Não foi aplicada a pena de advertência, uma vez que os fiscais do IBAMA, ao observarem que as duas iguanas que a autora portava não obtinham licença do órgão ambiental, aplicaram multa, sem, contudo, abrir oportunidade para a mesma sanar a irregularidade. 2. A multa no valor de R$ 1.000,00 (quinhentos reais) imposta a quem é professora estadual e tem renda mensal de R$ 727,00 (setecentos e vinte e sete reais), aparenta manifesta desproporção, infligindo sanção que destoa da realidade do apenado. 3. A multa deve ser dispensada, tanto mais quando a própria Lei n° 9.605/98 prevê a aplicação de penas alternativas mais adequadas ao caso, a teor do contido no § 4° do art. 72, ou ainda, se considerarmos a previsão contida no § 2° do art. 11 do Decreto 3.179/99, que dispõe que em caso de guarda doméstica de espécime silvestre não considerada ameaçada de extinção – na hipótese dos autos, tal fato não restou comprovado – a multa pode ser dispensada. Apelação do IBAMA improvida. (AC 200938000294486, DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, TRF1 – QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA: 03/06/2011 PAGINA:200.)
Ainda, em consonância com o § 4° do art. 72 da Lei n° 9.605/98, a multa simples imposta ao cidadão, como no caso em tela, pode ser convertida em serviços de preservação do meio ambiente, in verbis :
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6°. (…)
§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
Portanto, subsidiariamente, requer-se a substituição da multa mediante a imposição de serviços de preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente, OS QUAIS JÁ FORAM DEVIDAMENTE REALIZADOS PELA AUTORA.
2.5 Da Ocorrência De Erro E Da Boa-Fé
Importante ressaltar que em momento algum a autora agiu de má-fé, muito antes pelo contrário.
Verificando-se que a demandante é pessoa idosa, de baixa renda e de pouco estudo, certo é que não possuía conhecimentos acerca das inúmeras leis existentes em nosso País, tampouco poderia imaginar existir um dispositivo legal que lhe imputaria sanções por um ato que praticava como se permitido fosse.
Diante do exposto, claramente se percebe que a conduta da demandante se trata de erro de proibição, motivo pelo qual, em conformidade com a melhor doutrina, impõe-se necessário o reconhecimento da excludente da infração ou sanção. Vejamos o que refere Nome, na doutrina “Curso de Direito Administrativo”, 20a edição, pg. 800:
“É corrente o uso da expressão ‘excludentes’ para referir hipóteses em que se considerará inexistente a infração, ou não sancionável a conduta, conforme o caso. São encontráveis menções ao (1) fato da natureza (força maior); (2) caso fortuito; (3) estado de necessidade; (4) legítima defesa; (5) doença mental; (6) fato de terceiro; (7) coação irresistível; (8) erro; (9)obediência hierárquica; (10) estrito cumprimento do dever legal; (11) exercício regular de direito. Em nosso entender, as oito primeiras hipóteses dizem com a falta de voluntariedade – logo, elidem o próprio cometimento da infração, uma vez que a voluntariedade é o mínimo elemento subjetivo que se exige para imputação de uma infração a alguém. Já as três últimas correspondem a uma exclusão da sanção propriamente dita.” (grifo nosso).
Levando-se em consideração a colaboração da demandante no momento da fiscalização e o desconhecimento da existência de norma proibitiva, verifica-se, indubitavelmente, a boa-fé da autora, devendo, assim, ser reconhecida a excludente de erro.
No caso em apreço, salvo melhor juízo, deve sobrepor-se a garantia individual de não ser submetido a uma decisão administrativa calcada em procedimento viciado. Veja-se, a autora já foi equivocadamente submetida ao dissabor de responder a um processo administrativo por fato a que, em medida alguma, tinha conhecimento de sua amplitude. Impor-lhe a sanção de pagar multa, no montante fixado, após o encerramento de processo é, por demais, arbitrário.
Ademais, em que pese o dever da Administração Pública de bem zelar pelo patrimônio público, função na qual se insere a preservação de um meio ambiente sadio, temos que isso não justifica o uso do arbítrio pelo Estado. Isso porque, o que se pode verificar no presente caso é a tentativa apressada da Administração em ver cumprida sua função, de modo bastante questionável, a respeito da análise de todos os fatos.
Por conseguinte, é temerário imputar a um cidadão a autoria de uma conduta penalmente tipificada, sem a existência de culpa ou dolo do mesmo, haja vista que a autora incorreu em erro, quando não obtinha conhecimento que se tratava de ato ilícito.
Vale dizer: em se tratando do exercício do jus puniendi estatal, com a imposição de sanção sobre o particular, não há falar em presunção de autoria ou algo semelhante, mas sim na certeza absoluta acerca da identidade daquele a quem será imputada a sanção.