EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
Autora, por seus advogados, vem, respeitosamente, com fundamento nos arts. 319 e seguintes do Novo Código de Processo Civil (“NCPC”), ajuizar AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA contra a Instituto do Meio Ambiente, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
1. OS FATOS
O Ministério Público Federal (“MPF”) ajuizou ação civil pública contra a Ré tendo por objeto vícios e irregularidades no licenciamento ambiental e nas operações.
Durante o trâmite processual, houve decisão judicial impondo a cessação das atividades da autora, além de ter sido produzido trabalho pericial segundo o qual, sem qualquer referência específica, teria sido constatado dano ambiental relacionado ao aterramento inadequado de rejeitos industriais em seu estabelecimento.
Findo o trâmite processual, foi proferida sentença que condenou a Ré a recuperação dos danos ambientais causados, a serem apurados em fase de liquidação. Após a rejeição dos recursos interpostos ao Tribunal Regional Federal, a condenação transitou em julgado.
Decorridos três anos do trânsito em julgado do acórdão que manteve a sentença condenatória, e muito embora sequer tenha sido parte naquela demanda, a autora recebeu notificações que a comunicavam da lavratura em seu desfavor dos Autos de Infração Ambiental.
Cada uma das autuações lavradas pela IMA aplicaram sanção de multa no valor estratosférico, sob o pretexto de suposta falha na inertização dos resíduos oriundos de unidades industrial e florestal.
Passados quase anos, desde o protocolo das defesas administrativas os respectivos procedimentos administrativos permanecem sem qualquer andamento. Aliás, até a data da propositura desta ação, no melhor conhecimento da empresa, sequer houve a efetiva instauração e autuação de procedimentos administrativos relativos ao auto de infração ambiental, para análise e decisão acerca das defesas apresentadas pela autora.
A inércia da IMA em analisar os argumentos levantados nas defesas administrativas arrasta-se por anos, repercutindo negativamente no meio social da autora e impondo-lhe restrições mercantis, vez que contra ela consta a lavratura de autuações impondo-lhe multas milionárias.
Sequer vista dos autos dos processos administrativos vêm sendo permitida à autora, confirmando que procedimento algum foi formalmente autuado. Assim, não resta à autora alternativa senão a propositura desta ação anulatória.
2. O DIREITO – RAZÕES PARA ANULAÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO
Não foi apenas a autora que remeteu resíduos à empresa terceirizada para tratamento e destinação final. De uma batelada só, foram lavrados nada menos do que quase uma centena de autos de infração pelo IMA, com conteúdo praticamente idêntico ao dos autos de infração objeto desta demanda.
A multiplicidade de autuações lavradas contra as empresas que contrataram os serviços da autora ensejou o ajuizamento de inúmeras medidas judiciais que têm por objeto cancelar autuações análogas àquelas ora impugnadas, no âmbito das quais o C. Tribunal de Justiça já reconheceu que a ação punitiva do IMA encontrava-se prescrita no momento da lavratura dos autos de infração, dada a interdição da autora ocorrida:
“No caso dos autos, a impetrante pretende ver reconhecida a prescrição da pretensão punitiva oriunda do auto de infração lavrado pela autoridade coatora em decorrência de irregularidades ambientais apuradas na empresa, para a qual eram encaminhados resíduos industriais. Aduz que como a referida empresa teve suas atividades suspensas, por ordem judicial, e o ato objurgado foi lavrado e dele teve ciência somente anos depois, ocorreu a prescrição quinquenal da pretensão de penalização.
Por sua parte, a autoridade coatora alega que os prejuízos decorrentes de dano ambiental podem ser avaliados a qualquer tempo, e, por isso, é imprescritível o poder de polícia para apuração e responsabilização. Assim, o auto de infração é hígido e deve ser mantido, inclusive porque inexistia fundamento legal à época dos fatos a impor prazo para responsabilização das partes envolvidas.
Consta dos autos que na ação civil pública que tramita na Justiça Federal, promovida pelo Ministério Público Federal contra a empresa e o IMA, o MM. Juiz do feito, diante dos fatos ocorridos nas dependências da referida demandada, determinou a “cessação das atividades da empresa”.
Já nos autos do cumprimento de sentença que tramita na Justiça Federal, também promovida pelo Ministério Público Federal contra o IMA, determinou- se à executada: “c) promover a notificação e os procedimentos administrativos cabíveis, em relação a cada uma das empresas identificadas que tenham fornecido resíduos tóxicos e perigosos de classe I (perigoso) e II (não inerte) à empresa, para o fim de serem ‘inertizados’ pelo seu processo industrial de ‘inertização/neutralização'”.
Ocorre, entretanto, que o IMA não considerou a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, que é quinquenal, decorrente do encerramento das atividades, que, como se viu, ocorreu por ordem judicial. Assim se entende pela leitura do art. 1º do Decreto Federal 20.910, de 6/01/1932, e do art. 1º da Lei Federal 9.873, de 23/11/1999, que trata da prescrição da pretensão punitiva da Administração Pública Federal.
Tais dispositivos fundamentaram a implementação trazida pelo Decreto Federal 6.514, de 22/07/2008, de que ‘prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado’, conforme art. 21. E em seu § 1º: ‘considera-se iniciada a ação de apuração de infração ambiental pela administração com a lavratura do auto de infração’. ”
“MANDADO DE SEGURANÇA. APLICAÇÃO DE MULTA EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO POR DANO AMBIENTAL. ATO ALEGADAMENTE DANOSO OCORRIDO MAIS DE OITO ANOS ANTES DA LAVRATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. APLICAÇÃO DO ART. 1º DO DECRETO N. 20.910/1932 ANTES DA VIGÊNCIA DO DECRETO N. 6.514/2008, QUE ESTABELECEU PRAZO IDÊNTICO. SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO MANTIDA. (…)
Na sentença examinada, declarou-se prescrita a pretensão de aplicar multa administrativa pela alegada infração ambiental. A prescritibilidade de pretensões desse gênero – que não se confundem com as de reparação do dano calcadas na responsabilidade civil – está fora de dúvida, já que foi expressamente reconhecida no art. 21 do Decreto 6.514/2008. Entretanto, a atividade considerada danosa se deu até o ano de. e o auto de infração foi recebido pela impetrante em. Em primeira instância, entendeu-se que, no período anterior à vigência do Decreto 6.514/2008, aplicava-se por analogia o prazo quinquenal previsto no art.1º do Decreto 20.910/1932. Essa interpretação é recomendada na doutrina, como lembrado no parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, favorável à manutenção da sentença, em que se referem os nomes de. Ademais, ainda que o ato danoso possa ter tido efeitos prolongados no tempo, a atividade prejudicial cessou. Logo, esse é o marco do prazo prescricional, o qual já se havia esgotado antes mesmo da edição do Decreto 6.514/2008.” (TJSC, Reexame Necessário nº 2012.032000-2, Rel. Des. Jorge Luiz de Borba, 1ª Câmara de Direito Público, j. em 24.9.2013– Doc. 21-grifos acrescidos)
“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO AMBIENTAL. AUTO DE INFRAÇÃO LAVRADO NO ANO DE… ATIVIDADE LESIVA CESSADA NO ANO DE… PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA CONFIGURADA. PRAZO QÜINQÜENAL TRANSCORRIDO. EXEGESE DO ART. 21 DO DECRETO N.6.514/08 E DO ART. 1º DO DECRETO N. 20.910/32. NULIDADE DO AUTO INFRACIONAL RECONHECIDA QUE, TODAVIA, NÃO INFIRMA A OBRIGAÇÃO DA IMPETRANTE DE REPARAR O DANO AMBIENTAL, EIS QUE IMPRESCRITÍVEL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO E REMESSA OFICIAL CONHECIDOS E DESPROVIDOS. (…)
Isso porque, conquanto tenha a infração […] ordenada pela decisão liminar proferida nos autos da ação civil pública n. 2001.72.09.001810- 1/SC –, resta incontroverso que o auto de infração somente restou recebido pela impetrante na data de, quando já vigentes as disposições constantes no Decreto 6.514/08. (…)
Por sucedâneo, tendo em vista que a infração cessou efetivamente na data de, embora os efeitos se possam ter protraído no tempo, verifica-se que a pretensão punitiva efetivamente encontra- se açambarcada pelo manto da prescrição desde a data de…, questão que conduz à nulidade do auto de infração lavrado pela impetrada e à manutenção integral da sentença vergastada.” (TJSC, Apelação e Reexame Necessário nº 2013.066821-1, Rel. Des. Paulo Ricardo Bruschi, 3ª Câmara de Direito Público, j. em 11.11.2014.
Tais precedentes foram prolatados em casos idênticos ao presente, confirmando que a lavratura do AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL ocorreu quando a pretensão punitiva da IMA já se encontrava fulminada pela prescrição, e que após apresentação de defesas administrativas ocorreu a prescrição intercorrente face à inação da IMA.
A bem da verdade, diante de tantos precedentes uníssonos a respeito, deveria a própria IMA ter tido a iniciativa de rever as autuações que lavrou para cancelá-las, evitando-se assim a desnecessária movimentação do Poder Judiciário por cada uma das empresas indevidamente autuadas.
O já reiterado e consolidado entendimento do TJSC acerca da ocorrência de prescrição a obstar as autuações lavradas pela IMA contra as empresas que destinaram resíduos à terceirizada, é ora invocado pela autora para que sejam anulados também o AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL.
2.1. O RECONHECIMENTO PELA PRÓPRIA IMA DA ARBITRARIEDADE INCORRIDA AO LAVRAR AS AUTUAÇÕES ORA COMBATIDAS
A IMA nomeou equipe multidisciplinar e emitiu o documento intitulado Relatório de Atividades que, embora posterior às autuações, tem o confesso propósito de definir “critérios fundamentados para a apuração preliminar da responsabilidade ambiental, conforme o percentual de participação de todas as empresas que enviaram resíduos à empresa durante sua operação”.
Tal relatório evidencia escancaradamente a absoluta ausência de fundamentos fáticos e jurídicos a embasar o AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. Com efeito, o Relatório de Atividade reconhece a necessidade de atribuir critérios objetivos às sanções e define uma nova metodologia para valoração da multa a cada uma das empresas autuadas.
Não obstante, em documento que antecedeu o Relatório de Atividade, a equipe multidisciplinar de membros da IMA expressamente admitiu a ocorrência dos vícios e de ostensiva arbitrariedade na lavratura das autuações.
Percebe-se que a própria IMA admitiu que as multas impostas através do AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL foram fixadas arbitrariamente, sem que a IMA partisse de critérios objetivos. Tanto assim que o Relatório de Atividades se contrapõe ao AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL ao indicar que o valor das multas impostas à empresa não deveria ser naquele valor.