EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITODA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO…
AUTORA, vem, à presença de Vossa Excelência, por seus advogados, propor AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE MULTA AMBIENTAL COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA contra ÓRGÃO AMBIENTAL, pelas razões de fato e direito adiante deduzidas.
1. DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL VERGASTADO
A autora se dedica ao exercício dessa atividade de transporte e por isso mantém um terminal de armazenagem e transbordo ferroviário, o qual foi atingido por um incêndio, que demandou dias para ser inteiramente controlado.
Os órgãos competentes foram acionados e todas as decisões acerca do sinistro passaram a ser discutidas e tomadas conjuntamente considerando-se as áreas de atuação específicas de cada órgão.
A autora, de forma diligente e proativa, realizou todas as medidas que lhe foram ordenadas pelos órgãos competentes, bem como, atendeu as medidas adicionais para evitar impactos ao meio ambiente.
No entanto, apesar das condutas refletirem absoluta colaboração em atender às demandas das autoridades competentes, bem como a prática de todas as ações que se encontravam a seu alcance para mitigar os potenciais danos ambientais que o incêndio que a vitimou poderia causar, ainda assim foi injustamente autuada administrativamente pelo órgão ambiental, ora Réu.
O Auto de Infração Ambiental com Imposição de Penalidade de Multa contra a Autora foi lavrado com fundamento no art. 3º, II, combinado com o art. 4º, I, II e III, ambos do Decreto Federal 6.514/2008, a penalidade de multa no vultoso valor por suposta violação ao art. 61, combinado com o art. 62, I e VIII, do Decreto Federal 6.514/2008.
Por considerar descabida sua penalização na esfera administrativa, a Autora apresentou Defesa Administrativa. Tal defesa, pois, restou indeferida e a Autora interpôs Recurso Hierárquico cumulado com proposta de acordo para a conversão da multa em serviços de melhoria e preservação ambiental, como autoriza o art. 139 do Decreto Federal 6.514/2008[1], bem como projeto de construção de um sistema de afastamento e tratamento de esgoto gerado no distrito.
Sem avaliar a proposta de acordo ofertada, a Ré indeferiu o Recurso Hierárquico interposto, mantendo a autuação por seus próprios fundamentos.
Por não se conformar com o entendimento do órgão ambiental, a autora interpôs recurso ao Conselho Estadual do Meio Ambiente, que decidiu apenas pela redução da multa ambiental.
Portanto, não restou alternativa à autora a não ser propor a ação anulatória do Auto de Infração Ambiental, conforme passa a demonstrar.
2. AUTO DE INFRAÇÃO QUE VIOLA OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE
Trata-se de auto de infração ambiental que impôs multa ambiental exorbitante, imposta erroneamente com base nos preceitos da lei federal, razão pela qual deve ser aplicado os parâmetros estaduais, em virtude exorbitância da multa imposta, que beira ao confisco.
Assim, faz- se necessária a revisão e adequação da sanção imposta para o devido atendimento dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, que norteiam a atuação do Poder Público.
Quanto à possibilidade da revisão e adequação da sanção de multa pelo Poder Judiciário, é certo que “Caracterizada a exorbitância da sanção administrativa, é cabível ao judiciário, excepcionalmente, alterar o valor aplicado, de sorte a restabelecer a proporcionalidade entre o ilícito praticado e a multa impingida ao particular.
Excepcionalmente, o Poder Judiciário pode, atendendo às circunstâncias do caso concreto, reduzir multa excessiva imposta pela Administração Pública, sempre que a sanção implicar em ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, ou configurar confisco”[2].
Sobre a proporcionalidade, Celso Antônio Bandeira de Mello é categórico ao afirmar que “as multas têm que atender ao princípio da proporcionalidade, sem o quê serão inválidas.
Além disto, por muito grave que haja sido a infração, as multas não podem ser confiscatórias, isto é, de valor tão elevado que acabem por compor um verdadeiro confisco. Nisto há prazível concórdia tanto na doutrina como na jurisprudência.[3]”
Sobre a razoabilidade, o mesmo autor discorre:
Princípio da Razoabilidade: Enuncia-se com este princípio que a Administração, ao atuar no exercício de discrição, terá de obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosa das finalidades que presidiram a outorga da competência exercida.
Vale dizer: pretende-se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas – e, portanto, jurisdicionalmente invalidáveis -, as condutas desarrazoadas e bizarras, incoerentes ou praticadas com desconsideração às situações e circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada.
A esse respeito, veja-se o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
EXECUÇÃO FISCAL. Embargos à execução. Cobrança de Multa Ambiental. Auto de Infração Ambiental Ambiental n. 74.968, de 22/12/95. Lavrado sob o fundamento fático de que havia ação de degradação do meio ambiente em área de preservação permanente – existem provas nos autos que determinadas obras estavam sendo realizadas para evitar erosão no local e para corrigir trilheiros de gado – Aplicação dos princípios da boa-fé, da proporcionalidade e da razoabilidade – Provas produzidas pelo Ministério Público e pelo perito judicial nomeado que comprovam os fatos alegados pelo embargante. (…)
Provido o recurso voluntário do embargante, nos termos do acórdão. (…) Os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da isonomia devem estar sempre presentes na interpretação e aplicação da lei ambiental.” (TJSP – Apelação Cível n. 194.919-5/4-00, Comarca de Adamantina. 9a Câmara de Direito Público. Rel. Yoshiaki Ishihara; v. u.; julgado em 10.11.2004)
Já o citado Mestre Hely Lopes Meirelles manifesta-se nos seguintes termos:
Sem dúvida, pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais.
2.1. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE
É certo que a legislação ambiental determina, para imposição e gradação das penas, como já destacamos acima, que a autoridade competente observará: (i) a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente; (ii) os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e (iii) a situação econômica do infrator, no caso de multa.
Quanto à gravidade dos fatos, considerando-se os motivos e as consequências da alegada infração, deve-se destacar que o vazamento de efluentes para a área externa ao armazém da autora, apesar do notório preparo do Corpo de Bombeiros para atuação em situações similares, não foi previsto.
O referido vazamento muito menos se deu em razão de uma ação deliberada por parte da autora. Além disso, não houve uma avaliação consistente, por parte do órgão ambiental, acerca da extensão e gravidade do alegado dano ambiental que teria sido causado.
Com efeito, “é necessário que a autoridade ambiental e o eventual infrator busquem no caso concreto os argumentos de fato, do mundo real, para demonstrar se o ato de imposição de multa está proporcional e razoável – ou não- ao valor do objeto jurídico lesado (quilograma, unidade, hectare etc.), pois havendo discrepância disso, cabe ao Poder Judiciário examinar também essa questão: a desobediência aos princípios administrativos da razoabilidade e/ou proporcionalidade objetivas (art. 74, Lei 9.605/98)”[4]
Quanto à posição da autora no que tange ao cumprimento da legislação ambiental, cumpre destacar que a empresa sempre se pautou pela estrita observância de suas obrigações legais, inclusive aquelas de cunho ambiental, não tendo quaisquer maus antecedentes.
A autora também não possui uma situação econômica que justifique a imposição da sanção de multa no valor exorbitante aplicado, o qual, se mantido, terá o condão de trazer gravíssimos prejuízos às suas atividades.
Nesse sentido, trazemos aos autos as últimas demonstrações financeiras da empresa, que informam um prejuízo acumulado. Essas demonstrações também comprovam que a autora não está minimamente próxima de ter capital em caixa para fazer frente ao pagamento da multa que foi aplicada pelo órgão ambiental.
Essa é a informação correta para se apurar a realidade econômica da autora, a ser considerada no presente caso para o fim de aplicação dos princípios ora aludidos.
A Administração Pública jamais poderia considerar meras notícias de jornal, como as do Valor Econômico, a título de fonte de informação sobre a condição econômica da empresa, como feito e admitido na Informação Técnica.
Assim, se porventura Vossa Excelência ainda entender que a autora deve ser punida no presente caso, deverá, primeiramente, substituir a sanção de multa por advertência, considerando o que dispõe o art. 72, § 3º, inciso I da Lei Federal 9.605/1998, in verbis:
“Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º: § 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo: I – advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;”