Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) Federal da Subseção Judiciária de…
Parte autora, brasileiro (a), estado civil, profissão, inscrito (a) no RG sob o n… e CPF…, residente e domiciliado (a) na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, vem, por seu advogado, à presença de Vossa Excelência, propor a presente ação anulatória de termos de embargo lavrado em duplicidade, com pedido de tutela de urgência inaudita altera pars contra a Parte ré, pessoa jurídica, inscrita no CNPJ…, com sede na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…,, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
Resumo estruturado
Trata-se de ação anulatória que visa à nulidade dos termos de embargo, lavrados pela parte ré contra um autuado “desconhecido” que recaem sobre área que atualmente pertence à parte autora.
Ocorre que os processos administrativos, que ensejaram, respectivamente, a aplicação dos termos de embargo supracitados, e que tramitam apensos ao processo administrativo, são nulos, uma vez que estão eivados de vícios, em razão de duplicidade dos embargos.
Fato é que foram lavrados novos embargos ambientais em substituição aos antigos, violação aos princípios da legalidade, do non bis in idem, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, bem como pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal.
Portanto, padecem de nulidade os termos de embargos, motivo pelo qual os atos administrativos devem ter sua nulidade declarada, com o fim de seus efeitos, determinando-se a retirada dos embargos da lista pública de áreas embargadas.
1. Da síntese do feito
Em 00.00.0000, a autarquia ré também lavrou o termo de embargo ambiental contra a parte autora, embargando quaisquer atividades agropecuárias na área objeto da vistoria, totalizando 00,000 hectares da propriedade, e inserindo o embargo em lista pública de áreas embargadas.
Ocorre que em 00.00.0000 foi emitido relatório circunstanciado nos autos principais, ocasião em que o IBAMA afirmou que o termo de um dos embargos, por corresponder à penalização pela mesma conduta (desmate ilegal), incidir sobre grande parte da propriedade e abranger os embargos, substituiu estes.
A ação de fiscalização que resultou nos embargos é a mesma que resultou na lavratura do embargo anterior, pois todos os termos foram lavrados na mesma data e pela mesma equipe.
Os termos de embargo, processados nos processos administrativos, existem em duplicidade, configurando dupla punição pelo mesmo fato, na medida em que deveriam ter sido extintos a partir da lavratura do termo de um dos embargos, que os substituiu, conforme reconhecido pela própria autarquia ré no relatório circunstanciado elaborado nos autos (número processo).
Assim, sendo certo que os termos de embargo que atingem o direito de propriedade da parte autora encontram-se fulminados por diversos vícios insanáveis, a declaração de suas nulidades é medida que se impõe.
2. Da inocorrência de prescrição do direito de ação
Ab initio, convém consignar que não há se falar em prescrição do direito de ação, sob a alegação de que os processos administrativos já teriam sido finalizados em 00.00.0000, com a decisão de homologação dos embargos e determinação de apreensão de todos os animais porventura existentes na área, com decretação de perdimento e doação sumária.
Isso porque é pacífico o entendimento nos tribunais pátrios de que “o curso do prazo prescricional do direito de reclamar inicia-se somente quando o titular do direito subjetivo violado tem ciência do fato e da extensão de suas consequências, conforme o princípio da actio nata”[1]. Ainda, os efeitos dos embargos se renovam diariamente, já que se protrai pelo tempo.
Sendo assim, registra-se que a parte autora somente tomou conhecimento acerca da existência dos embargos após o cumprimento da ordem judicial em meados de novembro de 0000, quando o IBAMA levantou o termo de um dos embargos, vez que este abrange área maior e se sobrepõe àqueles, o que impedia que fossem visualizados no mapa, bem como porque eles foram lançados em nome de “desconhecido” e para que fosse possível uma consulta na lista pública de áreas embargadas era necessário, ao menos, que a parte autora soubesse seus números ou as coordenadas geográficas dos polígonos embargados, informações que não possuía.
Frisa-se que, após deparar-se com os citados embargos, este causídico realizou diligências e solicitou cópias dos processos administrativos a que estão atrelados, tendo as obtido em 00.00.0000, oportunidade em que tomou conhecimento do imbróglio que os envolve, especificamente o apensamento de seus autos ao processo administrativo (referente ao um dos embargos) e a paralisação de suas tramitações, deixando pendentes e válidos os embargos mesmo após anos sem quaisquer movimentações e já existindo outro termo de embargo que os substituía.
Tem-se, então, que a ciência inequívoca do ato lesivo ao direito da parte autora, qual seja, a pendência de outros embargos eivados de vícios sobre a sua propriedade rural, somente se deu após o cumprimento da liminar em meados de novembro de 0000. Portanto, o termo a quo para a contagem do prazo prescricional do direito de ação se daria a partir daí, se o Juízo entender que a ação anulatória de termo de embargo é prescritível, já que seus efeitos são continuados no tempo.
3. Da nulidade por violação ao princípio do non bis in idem – duplicidade na lavratura dos termos de embargo e do termo de um dos embargos
Consabido que, mesmo diante de existência concreta de infração ambiental, a lavratura de dois ou mais autos de infração ambiental ou termos de embargo em decorrência do mesmo fato, viola o princípio do non bis in idem.
Isso porque a imputação da penalidade, seja ela multa ou embargo da área, acaba por aplicar dupla penalidade pelo mesmo fato gerador.
In casu, verifica-se que foi realizada vistoria in loco, visando identificar polígonos de desmatamento detectados por meio de imagens de satélite. Em razão dessa operação, em 00.00.0000, foram lavrados os termos de embargo, que passaram a ser apurados nos processos administrativos, respectivamente.
Como naquele momento a equipe de fiscalização não identificou a proprietária das áreas autuadas, lavrou os termos de embargo em face de “desconhecido”, os tendo lançado no SICAFI e publicado edital para torná-los públicos.
Todavia, em nenhum momento houve esforço por parte da administração para que ocorresse a identificação do detentor do imóvel.
Somente após o referido parecer é que foram envidados esforços para se conhecer a proprietária das áreas embargadas.
No final de 0000 foram realizadas pesquisas à base de dados de autuações e embargos do IBAMA e constatado que as áreas objetos dos embargos se sobrepunham a uma área maior objeto de autuação no termo de um dos embargos, tendo, então, sido recomendado o apensamento dos autos ao processo administrativo.
Ora, o auto de infração, que originou o embargo (00.00.0000), refere-se a suposta infração ambiental de destruir floresta nativa sem autorização ou licença da autoridade competente.
No mesmo sentido, os embargos (00.00.0000) foram lavrados em razão de suposto desmatamento irregular. Assim, é certo que os embargos em questão são penalidades aplicadas em decorrência da mesma infração ambiental, qual seja, desmate ilegal.
Importante ressaltar, também, que transcorreu menos de três anos entre os embargos, ou seja, não há se falar em regeneração da floresta e novo desmate, o que poderia ocasionar nova autuação.
Neste cenário, evidente que, após o lançamento do embargo, os embargos passaram a existir em duplicidade, configurando dupla punição pelo mesmo fato gerador, e, por isso, deveriam ter sido extintos. No entanto, mesmo após quase 00 anos, continuam válidos e produzindo efeitos.
Assim, sendo os embargos afetos ao mesmo polígono do um dos embargos, bem como sendo todos lavrados em decorrência da mesma conduta infracional, caracterizam-se como verdadeira afronta ao princípio do non bis in idem, sendo imperativo que sejam levantados.
Não é demais relembrar que o Direito Administrativo, quando no exercício do poder de polícia, em especial na aplicação de sanções administrativas, se aproxima do Direito Penal, uma vez que impõe ao administrado a constrição de algum bem da vida, como in casu, seu patrimônio, o direito de uso e gozo de sua propriedade.
Enveredando nesse entendimento, não seria razoável que princípios formadores da base do regime jurídico punitivo, como o da legalidade, da tipicidade, da irretroatividade, da culpabilidade, do non bis in idem e do devido processo legal, aplicados ao longo da trajetória evolutiva do Direito Penal, findassem resguardados apenas aos processos de tal ramo do Direito.
Desse modo, toda e qualquer atividade punitiva do Estado, seja através de sanções penais impostas pelo Poder Judiciário, seja através de sanções administrativas impostas pela Administração Pública, devem compartilhar dos mesmos princípios.
Ainda que no exercício de funções estatais distintas, com peculiaridades processuais a um e a outro, não deixa de ser o mesmo Estado que aplica a sanção administrativa e a sanção penal, não se podendo alegar que, em razão da diversidade do regime jurídico, sejam ignoradas as garantias dos particulares apenas pelo fato de ser a Administração Pública quem impõe a sanção.
Desta feita, o princípio do non bis in idem, decorrente do próprio princípio fundamental do Estado de Direito, protege o particular que enfrenta o poder punitivo estatal, tanto na…
[1] STJ, AgInt no AREsp 1.544.832/MA, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 5/12/2022.