EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE…
AGRAVANTE, por seus advogados legalmente constituídos mediante instrumento de mandato anexo, com fundamento nos arts. 1.015, inciso I[1], e seguintes do Código de Processo Civil, vem interpor tempestivamente o presente recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO contra a r. decisão de que concedeu a tutela de urgência requerida pelo Ministério Público nos autos da Ação Civil Pública, fazendo-o com fundamento nos fatos e motivos de direito que passa a expor.
Cumpre registrar que os efeitos da r. decisão agravada causam ao Agravante lesão grave e de difícil reparação – como se demonstrará nas anexas razões recursais –, motivo pelo qual se requer, desde logo, a atribuição do efeito suspensivo pleiteado, conforme determinação expressa no art. 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil[2].
Para o cumprimento dos requisitos exigidos pelos arts. 1.016 e 1.017, ambos do Código de Processo Civil[3], o Agravante apresenta, em suas razões recursais, (i) o nome das partes; (ii) a exposição de fato e do direito; (iii) as razões do pedido de reforma da decisão e o próprio pedido; (iv) o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo; e (v) a relação de cópias das peças obrigatórias e facultativas que devem instruir o presente recurso, os quais conferem com os originais, nos termos do art. 425, inciso IV, do Código de Processo Civil[4].
Ademais, requer a juntada do comprovante de recolhimento das custas de preparo do presente Agravo de Instrumento, conforme previsto no art. 1.017, § 1º, do Código de Processo Civil[5].
RAZÕES DE AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nos termos do art. 1.003, § 5º, combinado com os arts. 216, 219, 224, 231, inciso VI, e 239, todos do Código de Processo Civil[6], o prazo para a interposição de Agravo de Instrumento é de 15 (quinze) dias úteis, contados a partir da data da juntada aos autos de origem do comunicado por carta precatória devidamente cumprida.
Nesse sentido, no presente caso, registra-se que a citação foi realizada por Oficial de Justiça, por meio de Carta Precatória, a qual foi juntada nos autos, conforme indicação na lateral da certidão. Portanto, com a interposição do presente recurso na presente data, resta demonstrada a sua patente tempestividade.
1. SÍNTESE PROCESSUAL E DECISÃO AGRAVADA
A demanda, proposta pelo Ministério Público, ora Agravado, contra a Agravante, em brevíssima síntese, pretende a condenação do Agravante que a agravante deixe de intervir, permanecer ou adentrar na área descrita, abandonando-a de forma definitiva, mas retirando previamente gado e outros animais exóticos, barramento de cursos d’água, culturas exóticas e outras intervenções existentes, colocando a área à disposição do órgão gestor ao qual deverá apresentar projeto de restauração ecológica no mesmo prazo.
Pede ainda, que a agravante se abstenha de promover qualquer tipo de nova intervenção em referida área, exceto para fins de cumprimento de ordem judicial, adotando as medidas de reparação dos danos ambientais eventualmente indicadas pela Fundação Florestal ao longo da vigência da medida liminar, após o crivo jurisdicional;
No mérito, pede que a agravante deixe de intervir, permanecer ou adentrar na área, abandonando-a de forma definitiva, previamente retirando da UC todo o gado e outros animais exóticos, barramentos de cursos d’água, culturas exóticas e outras intervenções não autorizadas de qualquer gênero, colocando a área à disposição do órgão gestor (Fundação Florestal), e ainda:
- apresentar, no prazo de 30 dias, para aprovação junto ao órgão estadual competente (Fundação Florestal), projeto de restauração ecológica da área ocupada ou outras contíguas onde exerça posse, devendo iniciar a execução do projeto no prazo máximo de 30 dias após sua aprovação, de modo a verificar o método de restauração ecológica devido para garantir integral reconstituição da flora nativa no local, atendendo integralmente as exigências do órgão gestor da UC, após o crivo jurisdicional;
- abster-se de transferir ou alienar por qualquer meio a área descrita nesta inicial (rodízio de posse), sob pena de multa equivalente ao dobro da avença ou de no mínimo R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por ato;
- pagar indenizações por dano moral coletivo e por dano ambiental interino (ou intermediário), em quantias a serem determinadas de acordo com o prudente arbítrio de V. Exa., mas tendo como parâmetro o valor de reparação das áreas degradadas, a ser recolhida ao Fundo Estadual de Reparação aos Interesses Difusos lesados;
- pagar indenização pelos danos ambientais que se constatarem de impossível reparação (dano ambiental residual ou permanente), em valor a ser quantificado em liquidação de sentença; e
- aos ônus da sucumbência, a saber: custas do processo, honorários de peritos, emolumentos eventualmente devidos ao órgão técnico ambiental e outras despesas processuais.
Note-se que, com argumentos desprovidos de prova e fora do contexto fático da realidade do caso em questão, ao postular os pedidos que julga ser de urgência, o Agravado tenta, em verdade, antecipar os efeitos praticamente in totum do próprio provimento jurisdicional pleiteado na inicial.
Mesmo diante disso, a MM. Juíza a quo entendeu por bem deferir a tutela de urgência pleiteada, inaudita altera pars, deferindo a tutela de urgência pleiteada na inicial para determinar que o requerido.
Todavia, a despeito das razões trazidas pelo Agravado, encampadas pela MM. Juíza a quo, é certo que a realidade dos fatos, cotejada à luz do direito incidente sobre a hipótese, impõe, para além da concessão de efeito suspensivo, o provimento do presente Agravo de Instrumento, devendo ser reformada in totum a r. decisão liminar agravada. Senão vejamos.
2. DAS RAZÕES PARA A REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA
É por demais sabido que para a concessão das tutelas de urgência deve o magistrado pautar-se nos termos dispostos nos arts. 300 e seguintes do Código de Processo Civil, dentre os quais se exige a presença cumulativa dos requisitos da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e perigo da demora (periculum in mora).
No presente caso, ambos os requisitos estão ausentes, além de estar configurada hipótese de irreversibilidade a que se refere o art. 300, § 3º, do CPC, o que impõe, sob qualquer ângulo, a reforma da r. decisão agravada. Senão vejamos.
2.1. DA AUSÊNCIA DE PROBABILIDADE DO DIREITO
O primeiro requisito indicado pelo caput do art. 300 do Novo Código de Processo Civil para a concessão da tutela de urgência é a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito alegado, também conhecido como fumus boni iuris.
Sobre o tema, Fredie Didier Jr. destaca que os elementos que evidenciam a probabilidade do direito são a (i) verossimilhança fática, com a constatação de que há um considerável grau de plausibilidade em torno da narrativa trazida pelo autor e a (ii) plausibilidade jurídica, com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos[7]. Em sua inicial, o Agravado afirma a existência da probabilidade do direito com o seguinte argumento:
“Não só a probabilidade ou a plausibilidade do direito – fumus boni iuris – está demonstrada. Há certeza quanto à caracterização do interesse difuso exposto acima, quando se exige respeito ao direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, assim declarado pela Constituição da República (art. 225), que é bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, devendo ser defendido e preservado por todos; pelo cumprimento da função socioambiental do imóvel, com base na Constituição da República (arts. 5º, XXIII, 170, III e 186, II); pela recomposição das florestas de preservação permanente, objetivando, desse modo, a restauração dos processos ecológicos essenciais; o manejo ecológico dos ecossistemas; a preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético do País; a proteção dos espaços territoriais e seus componentes especialmente protegidos; a proteção da fauna e da flora, nos termos da Constituição da República (arts. 225, §1º, I, II, III e IV), isto para citar apenas a Lei Maior. Adotando-se o mesmo raciocínio pode ser verificado não apenas o perigo de dano, mas a prova concreta dos danos ambientais, já que as atividades descritas pela Fundação Florestal perpetuam, renovam e ampliam danos ambientais, cenário em absoluto descompasso com a finalidade legal da unidade de conservação. A prova dos danos é inequívoca.”
Diante disso, a MM. Juíza a quo justificou a probabilidade do direito:
“As provas colacionadas pelo Ministério Público são fartas e robustas e, a princípio, não deixam dúvidas sobre os fatos trazidos na inicial, nem quanto ao responsável pelos atos danosos ao meio ambiente. Por sua vez, os documentos também indicam que existe intervenção indevida na área, a qual está inserida no Parque Estadual, sendo de preservação integral, permitindo- se, somente, o uso indireto dos seus recursos naturais. A urgência da tutela jurisdicional está configurada, pois a proteção ambiental exige medidas imediatas. O prolongamento do tempo, no caso presente, pode acarretar o agravamento da degradação ou, ao menos, o retardamento da recomposição natural da vegetação. Assim, pelos princípios da prevenção e da precaução, devem ser priorizadas medidas que evitem atentados ao meio ambiente”.
Entretanto, como ficará comprovado, as premissas fáticas em que se baseou a MM. Julgadora estão equivocadas, de modo que no caso em análise não estão presentes os elementos que evidenciam a probabilidade do direito invocado, o que resulta na impossibilidade de manutenção da r. decisão agravada.
2.2. DA IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E ILEGITIMIDADE PASSIVA: AGRAVANTE QUE NÃO EXERCE A POSSE OU PROPRIEDADE SOBRE O IMÓVEL
Inicialmente, cumpre reiterar que o Agravante não é mais o possuidor da área, vez que a mesma foi permutada. Assim, não há como determinar que o Agravante execute a decisão liminar, em razão de se tratarem de medidas que fogem ao seu alcance, já que não responde mais pela área – leia-se, não tem sequer acesso a ela ou qualquer sorte de ingerência.
Trata-se, pois, de obrigação impossível, na medida em que os comandos pretendidos pelo Autor, ora Agravado, e deferidos pela tutela de urgência ora combatida são inexequíveis pelo Agravante, o que autoriza, inclusive, o indeferimento da petição inicial com fundamento na ausência de interesse processual (art. 330, III do CPC[8]).
Frise-se, nessas circunstâncias, o provimento judicial almejado pelo Agravado é vedado pelos dispositivos legais aplicáveis à espécie, já que se volta contra aquele que não exerce de algum modo direito de posse ou de propriedade sobre o bem, de sorte que não há sequer utilidade no provimento judicial pretendido, não havendo “via própria ou adequada” para tais postulações.
Visto de outro modo, o Agravante é parte ilegítima para responder pelos comandos contidos na decisão agravada, já que na situação atual não tem ele qualquer liame ou vínculo com o bem imóvel que lhe permita ter acesso, ingerência ou poder de disposição sobre o bem ou o que nele se encontra (animais, edificações, plantações, trabalhadores rurais etc.).
Portanto, quanto aos pedidos liminares formulados contra o ora Agravante, mostram-se totalmente descabidos, sendo o caso de, nesta sede recursal, ser reformada a decisão agravada, bem como, na instância de origem, ser indeferida a petição inicial nos termos do arts. 17[9], 330, II[10] e 485, VI[11] do Código de Processo Civil, o que de pronto se requer.
2.3. CONCLUSÕES QUANTO À PROBABILIDADE DO DIREITO
Diante de todos esses argumentos, observa-se (i) a impossibilidade jurídica do pedido e a ilegitimidade passiva, na medida em que o Agravante não exerce a posse ou a propriedade sobre o imóvel; (ii) que inexistem indícios de que a área seja de domínio público; (iii) que existem fortes indícios de que a área é privada; (iv) que não foi observado o devido processo legal para criação de Unidade de Conservação em área privada; (v) que inexiste dano ou ameaça de dano e (vi) que se mostra impossível o esgotamento do mérito em tutela de urgência.
Disso, conclui-se que a “probabilidade do direito” tal como foi pautada pela MM. Juízo a quo, contrastada com o direito incidente sobre a hipótese, evidencia não subsistir justificativa para a manutenção da r. decisão agravada, especialmente quando se pretende antecipar os efeitos do próprio provimento jurisdicional pleiteado pelo Agravado em sua exordial.
2.4. DA AUSÊNCIA DE PERIGO DA DEMORA
O outro requisito para a concessão da tutela de urgência segundo o art. 300 do Novo CPC é o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Fredie Didier nos ensina que “o deferimento da tutela provisória somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo para entregar a tutela jurisdicional, porque a demora do processo pode causar à parte um dano irreversível ou de difícil reversibilidade”. Em sua inicial, o Agravado justifica a presença do perigo da demora da seguinte forma:
“Sem embargo, a não imposição de liminar apresente risco ao resultado útil do processo (fundado receio de ineficácia do provimento final), pois, caso não antecipada liminarmente a tutela – periculum in mora –, o demandado não só continuará a intervir irregularmente na área, como também poderá alienar clandestinamente a área a terceiro, dando início ao conhecido mecanismo de “rodízio de posse”, que visa dificultar a efetividade de provimentos jurisdicionais – conforme se verifica da documentação, a qual não é prova de que houve a transferência da posse, tampouco elide a responsabilidade ambiental do demandado –, notadamente em fase executiva, contexto que enseja a aplicação de regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece (art. 375, CPC)”.
Por sua vez, a MM. Juíza a quo afirma que “o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo mostra-se evidente, uma vez que o meio ambiente está eminentemente exposto à degradação. Entretanto, tal argumento também não se mostra correto.
Primeiro, como dito anteriormente, o Agravante esteve na qualidade de possuidor da área, não existindo qualquer urgência contra ele, pois se mostra impossível qualquer ação sua na área. Assim, não sendo possível o Agravante intervir na área, não existe o risco posto na r. decisão agravada dele expor o meio ambiente à degradação.
Segundo, tendo em vista que o desmatamento na área ocorreu antes de 1970 e que durante o período em que o Agravante esteve na posse da Fazenda houve aumento de cobertura de vegetação nativa no local, conforme se observa do Relatório Técnico, também não se mostra razoável afirmar a existência de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo que fundamente a antecipação da tutela.
Como já mencionado anteriormente, fosse se admitir que a ausência de vegetação na Fazenda constitui dano ambiental, estar-se-ia tratando de um dano de quase cinquenta anos, o que por si só já demonstra o descabimento da “urgência” declarada pelo Agravado e chancelada pelo MM. Juízo a quo.