EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 6ª VARA FEDERAL DE FLORIANÓPOLIS – SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTA CATARINA
REQUERIDA, previamente qualificada, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, apresentar proposta de acordo e oferecer CONTESTAÇÃO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA que pede demolição de imóvel em construído sobre dunas e restingas, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelas razões de fato e de direito que passa a expor.
1. SÍNTESE DOS AUTOS
Cuidam os autos de Ação Civil Pública com pedido liminar ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de e outros, sustentando que, no período compreendido entre os anos de, a Requerida teria promovido, sem autorização dos entes ambientais, a implantação de uma piscina e a construção de rampas e muros sobre o cordão de dunas frontais da praia, com remoção da vegetação de restinga fixadora de dunas, em terreno de marinha e área de preservação permanente.
Em continuidade, o Ministério Público Federal sustentou que na data de, a Requerida teria promovido, sem autorização do órgão ambiental competente, a construção de uma nova rampa para acesso à praia, em substituição à antiga, destruída pelo avanço natural do mar, e que peritos criminais federais atestaram a existência das edificações ─ mesmo não sendo possível precisar a data exata em que foram erigidas ─, e que sua manutenção no local impediria e dificultaria a regeneração natural da vegetação nativa.
Ao final, o Ministério Público Federal requereu a procedência da demanda, para condenar as partes solidariamente na obrigação de fazer consistente na integral recuperação ambiental da área, mediante a demolição das estruturas construídas (piscina, muros e rampas) em APP e terreno de marinha, identificados pelo Laudo de Perícia Criminal Federal, e ainda, em relação à Requerida, a condenação em obrigação de indenizar pelos supostos prejuízos causados ao meio ambiente.
Os entes públicos réus, citados, apresentaram informações, e sobreveio decisão deste d. Juízo que concedeu medida liminar para determinar ao Oficial do Registro Imobiliário a averbação da ação; ao Município, à Floram e à União, para adotaram medidas afetas ao seu poder de polícia, proibindo a expedição de licenças, autorizações ou alvarás, ou a suspensão da eficácia de licenças, autorizações ou alvarás, relacionados com reformas ou ampliações em imóveis já existentes; e, à Requerida,
“ou a quaisquer outras pessoas que, eventualmente, venham a lhe suceder na titularidade da propriedade, posse ou detenção do imóvel, a imediata paralisação de todas as obras que eventualmente estejam realizando ou custeando, relacionadas com qualquer modificação no local.”
É o escólio necessário.
2. DA PROPOSTA DE ACORDO
A área objeto da demanda refere-se tão somente ao local em que está inserida uma piscina, muros e rampas de acesso à praia, localizadas aos fundos da residência da Requerida, a qual é inscrita na municipalidade, com área total de m² ─ inserido dentro do polígono do imóvel de matrícula registrada no 2º Ofício de Registro de Imóveis de Florianópolis, com área total de m² ─, regularmente cadastrada no RIP, no regime Ocupação.
Ocorre que, a área é consolidada, conforme atestado pelo próprio laudo pericial, não só porque as estruturas foram erigidas ─ por irremediável necessidade ─ no período compreendido entre os anos, mas também, pelo fato de se tratar de loteamento aprovado e incentivado pela municipalidade, servido por serviços públicos essenciais e densamente povoado, de modo que, a demolição para recuperação da área é medida extrema e desproporcional, ferindo de morte o princípio constitucional da segurança jurídica[1], do direito à moradia[2], da propriedade[3] e de sua função social[4]. Nestes casos, o direito ao meio ambiente previsto no art. 225 da Carta Primaveral, maxima venia, merece mitigação.
Pois bem. Após a edição da Lei Federal 12.651/2012, que instituiu o Novo Código Florestal, já em 2016, foi editada a Medida Provisória 756, convertida na Lei Federal 13.465/2017, dispondo sobre a regularização fundiária rural e urbana. Referida norma revogou o Capítulo III da Lei Federal 11.977/2009, que tratava da regularização fundiária de assentamentos urbanos, e trouxe significativas alterações para as políticas públicas voltadas às áreas urbanas, elencando condições aptas a se concluir pela possibilidade de regularização da área objeto da lide.
Ademais, sabe-se que a jurisprudência consolidada do e. Tribunal Federal da 4ª Região enaltece o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade em casos análogos:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO DA EDIFICAÇÃO. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. ZONA URBANA CONSOLIDADA. Devem ser mitigadas as restrições de construção em Áreas de Preservação Permanente, mormente nas hipóteses de zonas urbanas consolidadas e antropizadas, tendo sido constatado que a total recuperação do meio ambiente ao seu estado natural dependeria de ação conjunta, com a remoção de todas construções instaladas em área de ocupação histórica, sendo certo que a retirada de uma edificação isoladamente, em atenção ao princípio da proporcionalidade, não surtiria efeitos significantes ao meio ambiente, haja vista que as adjacências do local encontram-se edificadas. (TRF4, AC 5001563-50.2010.4.04.7208, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 09/06/2016).
Cumpre ressaltar que, quando indagados pelo Ministério Público Federal se a área é passível de recuperação (item 10), os experts esclareceram que “é possível recuperar a vegetação protetora de dunas, mas há que se considerar a ocorrência de eventos climáticos extremos, que poderão comprometer esta recuperação.”
Ou seja, não há nenhuma certeza que a adoção de medidas extremas implique em melhorias ao meio ambiente. Além disso, trata-se de área consolidada que a simples retirada das estruturas objeto da lide não surtiram nenhum efeito ao meio ambiente.
Logo, não soa razoável demolir a piscina, muros e rampas, deixando o imóvel à mercê das ressacas ou marés de tempestade, quando não há comprovação de que a demolição das estruturas resultará em efetivo benefício ao meio ambiente.
Neste passo, calham as lúcidas observações do eminente Desembargador Luiz Carlos de Castro Lugon:
Tenho como premissa a supremacia do meio ambiente, mesmo nas situações em que haja a efetiva configuração do fato consumado, de modo que sejam desestimuladas práticas de violações ecológicas contando com o beneplácito fundado na constatação de que “o mal já está feito.”
Porém, ainda que não perca de vista a realçada importância do meio ambiente, com o incentivo de peculiaridades do caso concreto, pode-se amenizar a regra de prevalência, mesmo que esteja em pauta a integridade ambiental de área de preservação permanente.
Assim penso, guiado pela ideia de que benefício algum surtirá em prol do meio ambiente a paralisação da obra, uma vez que a recuperação da restinga, pela intervenção da própria natureza, é inviável naquele trecho.[5]
É incontroverso que a demolição das estruturas, sobretudo dos muros, trará prejuízos à Requerida, porque o avanço do mar e as frequentes ressacas, conforme consta no próprio laudo pericial, causaram a remoção da vegetação de restinga e sua retirada apenas agravará ainda mais a situação. Daí que seja necessária a contenção.
Há indícios nos autos a demonstrar que, efetivamente, a piscina, muros e rampas podem ─ caso sejam de fato irregulares ─ ser regularizadas, pois, cediço que demolir é medida extrema, que somente pode ser adotada nos casos em que a regularização seja considerada impossível, o que não parece ser o caso dos autos, mesmo porque, faltam estudos apropriados, que não podem ser suprimidos por prova pericial solicitada unilateralmente pelo órgão acusador.
Portanto, a proposta de acordo da Requerida, é que os autos sejam suspensos até a regularização das estruturas objeto da lide.
No caso de a proposta de acordo restar inexitosa, passa-se à contestação.
3. DA CONTESTAÇÃO À AÇÃO CIVIL PÚBLICA
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, sob a alegação de que entre os anos de 2007 e 2009, a Requerida teria promovido a implantação de uma piscina e a construção de rampas e muros sobre o cordão de dunas frontais da praia, removendo vegetação de restinga fixadora de dunas, e que em 23.04.2018, promoveu nova construção de rampa para acesso à praia, em substituição a antiga destruída pelo avanço natural do mar.
No entanto, ao contrário do que consta na inicial e documentos acostados, não há evidência de que a rampa tenha sido destruída para uma nova ser construída. Tanto o é, que os Peritos Criminais Federais que estiveram no local e elaboraram laudo pericial, responderam da seguinte forma a um dos questionamentos do Ministério Público Federal:
“3. Qual a data aproximada das degradações ambientais?
Responderam os peritos: A residência foi construída antes de 2002, assim como a supressão de vegetação protetora de dunas dentro do limite do terreno é anterior a esta data.
A piscina foi construída entre 2002 e 2007. Aparentemente, as estruturas protetoras contra as marés de tempestade foram implantadas à medida que os eventos climáticos removiam as dunas e a vegetação subjacente.
Em 2007 já é possível notar que toda a vegetação que existia entre o terreno e a praia havia sido removida, e que foi construído um muro de proteção.
Em 2009 é possível constar a presença dos patamares e do segundo muro, da forma como existem atualmente.” (Evento 33 do IP, Laudo Pericial, p. 14).
Como se vê, de acordo com o laudo pericial, as aludidas estruturas são anteriores ao ano de 2009 e assim está até os dias de hoje. Em nenhum momento o laudo pericial constatou a presença de rampa nova construída no ano de 2018 como sustenta o Ministério Público Federal.
Importante observar, que o Ministério Público Federal sustentou que as estruturas foram erigidas entre 2007 e 2009. Em verdade, o laudo pericial é escorreito em afirmar que a piscina foi implantada entre 2002 e 2007.
Sendo assim, na dúvida quanto a exata data, deve ser utilizada aquela mais benéfica ao acusado, ou seja, 2002, em homenagem ao princípio do in dubio pro reo, aplicado não apenas no Direito Penal, mas em todo direito sancionador como o é a ação civil pública.
À propósito, também é dos experts a afirmação de que eventos climáticos adversos, como as ressacas, são comuns na Praia do Morro das Pedras, como denuncia a faixa de vegetação de aproximadamente 17 metros de largura, entre o limite do terreno e a praia, removida daquele local no ano de 2007, conforme Figuras 15 e 16 do item “IV.3 – Estudo multitemporal da área questionadas”, do laudo pericial:
O estudo multitemporal com produtos de sensoriamento remoto visa, dentro do possível, estabelecer o histórico dos eventuais danos ambientais e da ocupação da área questionada.
As imagens das Figuras 12, 15 e 16 foram extraídas do sítio de geoprocessamento da Prefeitura Municipal de Florianópolis, e posteriormente georreferenciadas.
Na ortofoto de 2002 verifica-se que o terreno tinha seus limites estabelecidos e que havia uma vegetação protetora de dunas entre o terreno e o mar (Figura 15). Já naquela data encontrava-se implantada a edificação residencial principal.
Nesta mesma imagem, a Linha de Preamar Máxima de 1831 – LPM passa aproximadamente no início da vegetação (Figura 15). Havia, portanto, uma faixa de vegetação de aproximadamente 17 m de largura entre o limite do terreno e a praia.
O acesso dos moradores à praia devia se dar por uma trilha que se observa no canto sudeste do lote. Já na ortofoto de 2007, a porção remanescente de vegetação está no mesmo alinhamento do terreno questionado (Figura 16), indicando que a vegetação protetora das dunas frontais foi removida daquele local, assim como de toda a extensão da praia.
Uma explicação natural (desvinculada de ações antrópicas) para esta mudança está nos eventos climáticos aos quais a costa de Florianópolis está sujeita. Popularmente conhecida como “ressaca”, a maré de tempestade, segundo o Atlas de Desastres Naturais do Estado de Santa Catarina: Período de 1980 a 2010 (citando CARTES, 1988) é um tipo de inundação costeira causada pela sobre-elevação do nível do mar durante eventos críticos de tempestade, resultante de empilhamento da água oceânica induzido pelo cisalhamento do vento e pela presença de gradientes de pressão atmosférica.
Ainda segundo o autor, apesar de ser a principal forçante, o vento não é o único a determinar a elevação causada por uma maré de tempestade. O nível do mar é controlado pela complexa interação de ventos, pressão atmosférica, ondas, topografia local, como também a velocidade da trajetória, proximidade, duração e intensidade da tempestade na costa.
Essas sobre-elevações excepcionais ocorrem durante tempestades intensas associadas a marés de sizígia (ou marés astronômicas), presentes em condição de lua nova ou cheia, quando a Terra, a lua e o sol estão alinhados, induzindo marés astronômicas mais intensas. Os eventos de maior intensidade são considerados desastres naturais.
O referido Atlas apresenta uma análise espaço-temporal da ocorrência dessas marés de tempestade no período de 1997 a 2010, na qual foram encontrados 46 registros deste tipo de evento, que causaram danos significativos nos municípios da costa catarinense.
O estudo identificou os dez municípios mais afetados, onde se destaca Florianópolis como o primeiro, com frequência muito alta – entre 5 a 6 episódios no período estudado.
Diante do exposto é possível admitir que na praia do Morro das Pedras possa ter havido um evento natural com características de desastre, portanto de forte intensidade e de forma inesperada, que tenha removido a vegetação de restinga protetora das dunas em frente ao local examinado e seu entorno.
Desde aquela data é possível observar um delimitador linear na testada do terreno, compatível com um muro. Não fica claro em que momento os patamares foram construídos, mas à medida que a erosão da praia continuava, houve a necessidade de construção de muros de contenção do terreno e, consequentemente, de rampas de acesso à praia. Verifica-se, ainda, que neste período (entre 2002 e 2007) foi construída a piscina (Figuras 15 e 16).
É incontroverso a existência de rampas e muros na área objeto da lide. Entretanto, além de se afigurar como área consolidada, há de se admitir, que a construção deles somente foi efetivada ante a necessidade de contenção das ressacas.
E que nem se cogite que são eventos normais e que a retirada de sedimentos para renovação dos bancos de areia é necessária, porquanto nas últimas décadas a frequência e intensidade deles tem aumentado significativamente, consequência das mudanças climáticas e do aquecimento global, como alertam especialistas.
Nesse ponto, não soa razoável condenar um particular que em caráter de emergência erigiu um pequeno muro para proteger sua propriedade de eventos climáticos catastróficos. Logo, não há danos ambientais. Inclusive, os experts que elaboraram o laudo pericial responderam da seguinte forma a um dos quesitos formulados pelo Ministério Público Federal:
10. O dano é passível de recuperação?
Sim. É possível recuperar a vegetação protetora de dunas, mas há que se considerar a ocorrência de eventos climáticos extremos, que poderão comprometer esta recuperação.
É dizer que, ainda que a presente demanda seja julgada procedente, não há qualquer garantia de que a vegetação de restinga se regenere no local ─ e aqui não falamos que restinga é igual a APP, como veremos adiante ─ porque certamente será removida pelas ressacas, cada vez mais frequentes, intensas e devastadoras.
Por outro lado, há de se admitir que a manutenção do muro no local impede a remoção das dunas pelas ressacas mais violentas, e consequentemente, propicia melhores condições para a regeneração da vegetação.
Também é importante esclarecer, ao contrário da narrativa ministerial, que em nenhum momento foi realizado “sem autorização do órgão ambiental competente, a construção de uma nova rampa para acesso à praia, em substituição à antiga, destruída pelo avanço natural do mar”.
Referida rampa é de madeira, e foi construída em período anterior a 2009, necessitando de simples e poucos reparos em datas incertas, mas jamais houve a construção de uma rampa nova em substituição à antiga, como asseveraram as testemunhas durante a instrução processual criminal em que figura como acusada a Requerida.
E mesmo que fosse, de forma alguma configuraria nova infração, porque em se tratando de reforma sem ampliação da área construída e, consequentemente, sem aumento da degradação do local já impactado, não há que se falar em “nova incidência” ou “renovação” da infração.
Forçoso reconhecer, portanto, que além de se tratar de área consolidada, nenhuma construção foi realizada na área objeto da lide após o ano de 2009, fato corroborado pelo laudo pericial.
O Ministério Público Federal também alega que “uma das funções das dunas frontais e da sua vegetação fixadora é justamente promover a proteção da costa”. Ocorre que, conforme o próprio laudo pericial, foi a ressaca que removeu parte da vegetação e das dunas, fazendo-se imperativa a construção de muros de contenção para futuras tempestades de maré.
Outrossim, é absolutamente descabida a narrativa ministerial de que a implantação das estruturas (piscina, rampas e muros) e sua manutenção no terreno estariam contribuindo para agravar cada vez mais a situação local, pois, ao não encontrar a barreira natural das dunas para amortecer o impacto, o mar bate nas estruturas de contenção, como num paredão, e retorna, retirando a areia da faixa de praia, e que as intervenções promovidas artificialmente modificariam a dinâmica geral de circulação de sedimentos de toda a praia e das praias vizinhas, podendo provocar danos em outros locais e assim seguir em efeito dominó.
Tal assertiva é genérica e não tem o condão, maxima venia, de possibilitar a procedência do pedido ministerial, mesmo porque, faltam estudos e provas. Entender de maneira diversa, seria remover toda população que reside à beira mar, considerando as severas mudanças climáticas e a elevação do nível do mar.
E que nem se cogite que o problema é de uma pessoa física que pretende proteger sua propriedade privada, mediante construção de um muro de contenção, em suposto detrimento de toda uma população que supostamente perde espaço da faixa de areia, faixa esta, que foi significativamente aumentada quando antes de 2007, conforme laudo pericial, uma devastadora ressaca removeu cerca de 17 metros de costa.
Resta atestado, que há “estruturas”, que antes de “ilegais”, demonstram que, deste lado da contenda, também existe uma população que necessita de prestação jurisdicional e proteção do seu direito.
Não se pode posicionar a Requerida na berlinda de uma questão urbanística que remonta décadas de descaso e omissão do Poder Público de diversas esferas em questões ambientais. Isso sem falar na burocracia.
Lembre-se que apenas no ano de 2020, Santa Catarina enfrentou severas e catastróficas tempestades, com uma frequência nunca antes visto, e que podem estar ligadas intimamente às mudanças climáticas, as quais, obviamente, não foram causadas pela simples implantação de um pequeno muro de contenção, necessários diante das violentas ressacas, tão pouco pela implantação de uma piscina.
Não há dúvidas de que, na prática, a pretensão ministerial busca atender aos anseios de preservação ao meio ambiente, porém, pende para o clamor comunitário unilateral, posto que, por outro lado, também há quem suplique por ajuda.
Frise-se que a Requerida não pretendeu e jamais pretenderá destruir o meio ambiente, como tenta emplacar a peça inaugural, pelo contrário, teve, dentro das poucas condições financeiras que dispensava à época da aquisição, a oportunidade de adquirir uma área em que já estava edificada, e que hoje vê ruindo, por uma discussão ambiental inimaginável à época de sua aquisição.
Entrementes, se não fosse as ressacas abruptas, os muros não seriam necessários no imóvel devidamente cadastrado na Prefeitura Municipal de Florianópolis e na Superintendência do Patrimônio da União – SPU.
Em que pese a alegação de que tais obras supostamente provocariam dano ao meio ambiente, é fato que o risco maior reside na iminente demolição da edificação da Requerida pelas forças naturais ou alteradas, que caso ocorra espalhará escombros e detritos na faixa de areia, causando risco real para a comunidade.
Em casos assim, há impedimento legal, previsto no art. 19, § 3º, do Decreto 6.514/08, in verbis:
Art. 19. A sanção de demolição de obra poderá ser aplicada pela autoridade ambiental, após o contraditório e ampla defesa, quando:
[…]
3º Não será aplicada a penalidade de demolição quando, mediante laudo técnico, for comprovado que o desfazimento poderá trazer piores impactos ambientais que sua manutenção, caso em que a autoridade ambiental, mediante decisão fundamentada, deverá, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, impor as medidas necessárias à cessação e mitigação do dano ambiental, observada a legislação em vigor.
Como já mencionado em linhas pretéritas, a manutenção do muro, construído em dois patamares conforme revelam as imagens periciais, são imprescindíveis, até porque, se removidos, provocarão irremediável prejuízo à estrutura da residência da Requerida, e indubitavelmente se estenderá aos imóveis vizinhos e até mesmo à rua.
Muros de contenção são necessários e comuns em todas as partes do mundo que sofrem com marés de tempestade.
Ora. Não se apresentam, na peça exordial, elementos suficientes para que as obras realizadas sejam consideradas irregulares, mesmo porque, tratam-se de medidas de urgências, em resposta à um caso excepcional, na exata concepção do art. 3º, VIII, “c” do Código Florestal de 2012:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: […]
VIII – utilidade pública: […]
c) atividades e obras de defesa civil;
Da análise do dispositivo acima, é possível verificar a legalidade da intervenção. Não obstante, o Código Florestal preceitua que as atividades realizadas pela defesa civil são de utilidade pública, nos termos do art. 8º do mesmo diploma legal, in verbis:
Art. 8º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei.
1º A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.
2º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente de que tratam os incisos VI e VII do caput do art. 4º poderá ser autorizada, excepcionalmente, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.
3º É dispensada a autorização do órgão ambiental competente para a execução, em caráter de urgência, de atividades de segurança nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em áreas urbanas.
Portanto, não há que se falar em ausência de autorização do Poder Público ou que tais obras acarretam danos ao meio ambiente, muito menos que há obrigação ao pagamento de indenização, afastando-se integralmente a narrativa ministerial.
Feitos os esclarecimentos iniciais, passa-se às preliminares e ao mérito.
4. PRELIMINARMENTE
4.1. LITISPENDÊNCIA
É importante referir, em preliminar, que a área objeto do presente feito está inserida nos limites do objeto da ação civil pública autuada, que tramitou perante esta r. Vara e atualmente se encontra na 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sob a relatoria do e. Des. Cândido Alfredo da Silva Leal Junior, aguardando respectivo julgamento, cujos efeitos estão suspensos.
Cabe destacar que a pretensão ministerial ao ajuizar referida ACP em desfavor da FLORAM, Município de Florianópolis e União, teve por escopo o seguinte teor: […]
Pois bem. A litispendência decorre do princípio constitucional da segurança jurídica, previsto no art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal, e auxilia o Poder Judiciário a evitar decisões conflitantes, além de assegurar que os indivíduos não sejam demandados mais de uma vez por uma mesma questão, tornando-se assim, elementos da paz social.
No caso em tela, a ação civil pública, proposta pelo Ministério Público Federal em 2016 em desfavor dos entes públicos, possui finalidade idêntica à da presente ação, ou seja, a demolição de edificações erigidas supostamente em condão de dunas, configurando assim, a litispendência nos termos do art. 337, §1º do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar: […]
VI – litispendência; […]
1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. […]
3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso.
Evidente a ocorrência de litispendência, porquanto o Ministério Público Federal propôs nova ação ao mesmo tempo em que outra ação, idêntica, está em curso, e eventual procedência da demanda quando esgotados os recursos, certamente atingirão à Requerida.
À propósito, estando a mesma área descrita nesta ação civil pública abrangida pela r. sentença proferida nos autos, cujos efeitos estão suspensos por força do Pedido de Efeito Suspensivo , a prolação de nova decisão, tendo por objeto imóvel inserido nos limites geográficos da referida demanda, viola a decisão de suspensão determinada pelo E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Assim, está evidenciada a litispendência almejada, devendo a presente ação ser extinta sem julgamento do mérito.
5. DO MÉRITO
5.1. AUSÊNCIA DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE
O Ministério Público Federal sustenta que a Requerida, realizou “sem a autorização dos entes ambientais, a implantação de uma piscina e a construção de rampas e muros sobre o cordão de dunas frontais da praia, com remoção da vegetação de restinga fixadora de dunas, em terreno de marinha e área de preservação permanente (por estar a menos de 300 metros da linha de preamar máxima).”
No entanto, ao contrário da narrativa ministerial, não se trata de área de preservação permanente, porque nem toda área de restinga configura aquele instituto, conforme preceitua o inc. VI, do art. 4º, do Código Florestal (Lei 12.651/2012), in verbis:
Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: […]
VI – as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
O Código Florestal de 1965 (Lei 4.771/65), por sua vez, estabelecia, em seu art. 2º, alínea f, que:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: […]
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
Ou seja, de acordo com a expressa previsão legal, para fins de área de preservação permanente, são consideradas as restingas, as que atuam como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues.
É dizer que, não se deve considerar como área de preservação permanente toda e qualquer espécie de restinga. Entendimento diverso, colocaria praticamente todo o litoral catarinense – quiçá do Brasil, onde há a maior concentração populacional –, como de preservação permanente, de modo que a atual ocupação de qualquer imóvel numa faixa de 300 metros seria irregular.
A propósito, a chamada “vegetação de restinga” é protegida pela Lei Federal 11.428/2006, que trata do Bioma Mata Atlântica:
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes do Bioma Mata Atlântica as seguintes formações florestais nativas e ecossistemas associados, com as respectivas delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, conforme regulamento: Floresta Ombrófila Densa; Floresta Ombrófila Mista, também denominada de Mata de Araucárias; Floresta Ombrófila Aberta; Floresta Estacional Semidecidual; e Floresta Estacional Decidual, bem como os manguezais, as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.
Parágrafo único. Somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário inicial, médio e avançado de regeneração na área de abrangência definida no caput deste artigo terão seu uso e conservação regulados por esta Lei.
E, como exposto nos arts. 20 e seguintes da Lei da Mata Atlântica, são permitidos o corte e a supressão, desde que cumpridos determinados requisitos, diferentemente das áreas de preservação permanente, onde, praticamente, é impossível o exercício de qualquer atividade.
Na sequência, a mesma Lei, que inclui a restinga como formação florestal nativa do “Bioma Mata Atlântica”, explicita a forma de ocupação rural e urbana de tais espaços:
Art. 7º A proteção e a utilização do Bioma Mata Atlântica far-se-ão dentro de condições que assegurem:
I – a manutenção e a recuperação da biodiversidade, vegetação, fauna e regime hídrico do Bioma Mata Atlântica para as presentes e futuras gerações;
II – o estímulo à pesquisa, à difusão de tecnologias de manejo sustentável da vegetação e à formação de uma consciência pública sobre a necessidade de recuperação e manutenção dos ecossistemas;
III – o fomento de atividades públicas e privadas compatíveis com a manutenção do equilíbrio ecológico;
IV – o disciplinamento da ocupação rural e urbana, de forma a harmonizar o crescimento econômico com a manutenção do equilíbrio ecológico.
Obviamente, se vedada fosse qualquer espécie de ocupação (rural e urbana) sobre a restinga, não estaria disciplinada em Lei. Ao que se vê, o dispositivo antes transcrito alude à harmonização do crescimento econômico com a manutenção do equilíbrio ecológico, o que traduz precisamente o conceito de “sustentabilidade”.
Entretanto, é a lei que assim quer (art. 2º, f da Lei 4.771/65; art. 3º, XVI, da Lei 12.651/2012; art. 2º da Lei 11.428/2006), cumprindo ao julgador sua concretude enquanto não alterada, caso contrário seria transformar o processo judicial em fonte legiferante.
Frisa-se que, em nenhum momento, se está desprezando os princípios inerentes à tutela ambiental. Entretanto, assim como em todos os ramos do direito, não se pode transformar um princípio em direito absoluto, mas, ao contrário, é necessário permitir o desenvolvimento econômico e social em harmonia com o meio ambiente.
Dessa forma, há de ser reconhecida que não é toda restinga que será considerada área de preservação permanente, mas apenas aquelas que fixarem dunas ou estabilizarem mangues, o que não é o caso dos autos, razão pela qual a improcedência da demanda é de rigor.
5.2. IMPOSSIBILIDADE DE INVALIDAR ATOS ADMINISTRATIVOS
O Ministério Público requereu
“a invalidação de todos os atos administrativos praticados – tais como licenças e autorizações (ambientais ou não) – pela UNIÃO (por exemplo, SPU), pelo MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS e pela FLORAM em proveito de qualquer das edificações ou acessões sub iudice, ou seja, a piscina, os patamares de acesso à praia com rampas e os muros identificados no LAUDO DE PERÍCIA CRIMINAL FEDERAL, no imóvel situado na Praia do Morro das Pedras, Bairro Campeche, em Florianópolis/SC, e, ainda, outras estruturas físicas que eventualmente tenham sido erigidas no local, bem como a proibição, em caráter definitivo, da edificação de qualquer outra ocupação na ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE do imóvel – faixa de restinga fixadora de dunas.”
Ocorre que, não há nos autos qualquer prova robusta a demonstrar ilegalidade na concessão de eventuais autorizações, corolário disso, é presumir-se legítimos e imperativos os atos administrativos. Nessa tessitura, valiosos são os ensinamentos de Marçal Justen Filho[6], que vaticina:
A presunção de legitimidade ao ato administrativo é um instrumento necessário à satisfação dos deveres inerentes à função administrativa. Como há encargos impostos ao Estado e fins que deve realizar, tem ele de dispor de instrumental jurídico compatível. Não seria possível ao Estado cumprir suas funções administrativas se lhe fosse reservada situação jurídica idêntica àquela dos particulares.Se não houvesse a presunção de legitimidade do ato administrativo, o Estado teria de recorrer ao Poder Judiciário para obter provimento jurisdicional comprovando a legitimidade dos seus atos, e somente assim poderia vincular os terceiros.
Vale trazer à baila o conceito de ato administrativo, que segundo o professor Hely Lopes Meirelles[7] traduz-se em:
[…] toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.
Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello[8], é a:
Declaração do Estado (ou de quem lhe faça às vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público) no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei, a título de lhe dar cumprimento, e sujeitos a controle de legitimidade por órgão jurisdicional.
E, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro[9]:
Ato administrativo é “a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.
Por óbvio que tais conceitos abrangem os atos gerais e abstratos, como os regulamentos e instruções, e atos convencionais, como os contratos administrativos, licenças e autorizações.
O ato administrativo deve pautar-se sempre no sistema jurídico vigente, sob pena de poder ser caracterizado como ilegal acaso descumprido o ordenamento.
Entretanto, o regramento normativo pode ou não deixar margem de liberdade de decisão quanto ao aspecto da atuação do Poder Público, razão pela qual os tais atos podem ser classificados em: vinculativos e discricionários.
Em breve síntese, atos vinculativos são aqueles nos quais o regramento atinge os vários aspectos de uma atividade determinada, como o próprio nome já diz, ou seja, a expedição destes atos não comporta espaço para discussões de conveniência se deve ou não ser expedido, basta que os requisitos sejam preenchidos para que haja sua expedição/emissão.
Por outro lado, nos atos classificados como discricionários, o regramento não atinge todos os aspectos da atuação da administração, ou seja, são aqueles que terão sua expedição/emissão condicionada a uma análise e um estudo aprofundado, facultando-se ao Poder Público sua expedição/emissão ou não.
Diante dessas breves considerações, aclarada a questão conceitual, faz-se importante relembrar que o ato administrativo, quanto ao seu conteúdo, pode ser classificado em autorizações, licenças, admissões, permissões, aprovações, homologações, pareceres e vistos. E são de licenças e autorizações (ambientais ou não), que se funda o pedido do Ministério Público Federal.
Pois bem, as licenças e autorizações administrativas, aqui, com enfoque nas ambientais, possuem natureza jurídica de ato administrativo vinculado, como se pode verificar de alguns conceitos trazidos por renomados juristas de nosso ordenamento.
Hely Lopes Meirelles[10]:
Licença administrativa é “o ato administrativo vinculado e definitivo pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividades ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular, como, por exemplo, o exercício de uma profissão, a construção de um edifício em terreno próprio”.
Celso Antônio Bandeira de Mello[11]:
Licença é o ato vinculado, unilateral, pelo qual a Administração faculta a alguém o exercício de uma atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos legais exigidos.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro[12]:
Licença administrativa é “o ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade”. Com isso, diz-se que a licença administrativa é um ato administrativo vinculado, ou seja, sua concessão dependerá do preenchimento de determinados requisitos previstos em lei, de maneira que não se admite a análise por parte da Autoridade Pública da conveniência ou não daquele ato.
E, no caso de licenças ou autorizações ambientais, nada se difere. Possui natureza jurídica de ato administrativo vinculativo, portanto, sua concessão pressupõe validade, ao passo que não há espaço para discussões.
Nessa linha, temos que todo ato administrativo deve ser considerado, a princípio, como realizado de acordo com a Lei e de acordo com a realidade. Tanto é, que o Superior Tribunal de Justiça[13] entende que “ato administrativo goza de presunção de legalidade que, para ser afastada, requer a produção de prova inequívoca […].”
Nas palavras de Cassage, citado por Di Pietro[14]:
A presunção de legitimidade constitui um princípio do ato administrativo que encontra seu fundamento na presunção de validade que acompanha todos os atos estatais, princípio em que se baseia, por sua vez, o dever do administrado de cumprir o ato administrativo.
Não se pode determinar a suspensão ou anulação de eventuais atos administrativos exarados tanto pela municipalidade, quanto pela União, mesmo porque, trata-se de pedido genérico que viola o direito do contraditório e da ampla defesa, ante a inexistência de quaisquer provas que a cabia ao Ministério Público Federal produzir.
Por fim, ressalta-se que as ações da administração pública, quer na esfera municipal, quer na esfera federal, estão dentro dos lindes da legalidade, não merecendo a procedência do pedido ministerial no ponto.
5.3. PEDIDO DE DEMOLIÇÃO – MEDIDA EXTREMA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – DESFAZIMENTO DA OBRA – IMPACTO AMBIENTAL MAIS GRAVOSO DO QUE SUA MANUTENÇÃO – VEDAÇÃO LEGAL
Cediço que a demolição é medida extrema que só pode ser adotada em casos excepcionais, e, sendo assim, há de se reconhecer a possibilidade de regularização ambiental da área, uma vez que se trata de área urbana consolidada, bem como dos reconhecidos danos ambientais que a demolição poderá causar, o que leva ao afastamento da pretensão ministerial em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, e a autorização que preceitua o já citado art. 19, §3º do Decreto Federal 6.514/20082 c/c art. 6º, inc. I a III, e art. 72, VIII, da Lei 9.605/98, in verbis:
Art. 19. A sanção de demolição de obra poderá ser aplicada pela autoridade ambiental, após o contraditório e ampla defesa, quando: […]
3º Não será aplicada a penalidade de demolição quando, mediante laudo técnico, for comprovado que o desfazimento poderá trazer piores impactos ambientais que sua manutenção, caso em que a autoridade ambiental, mediante decisão fundamentada, deverá, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, impor as medidas necessárias à cessação e mitigação do dano ambiental, observada a legislação em vigor.
Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º: […]
VIII – demolição de obra;
Como comprovado por meio de perícia técnica nos presentes autos, a penalidade de demolição não necessariamente resultará em melhorias ao meio ambiente, por conta das ressacas ou marés de tempestade.
Por outro lado, evidentemente, acarretará danos mais sérios ao meio ambiente e à estrutura da residência, comprometendo o equilíbrio ecológico alcançado na região com o passar do tempo, representando, assim, malferimento aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Em casos assim, decidiu a Corte Federal da 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANO. RECUPERAÇÃO AMBIENTAL. PRAD. ÁREA URBANA CONSOLIDADA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. 1. Em se tratando de área urbana consolidada, a determinação de demolição da edificação para o fim de recuperação da área não se reveste de sucesso prático. 2. Além da proteção ao meio ambiente há outros direitos em risco que podem permitir a utilização de áreas já antropizadas e a manutenção das edificações existentes. Desconsiderar a situação ocupacional da região representa postura que não se coaduna com os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade. (TRF4, AC 5022828-90.2014.4.04.7201, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 14/06/2017).
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÃO. DIREITO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO. DESOCUPAÇÃO. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE DANO. 1. O princípio da proporcionalidade aplica-se ao caso, eis que se trata de área urbana consolidada e que a demolição não se apresenta a melhor solução para resolver as irregularidades das construções na localidade. Parece mais apropriada uma regularização que dê conta de harmonizar todas as ocupações com a proteção daquele meio ambiente. 2. Apelações improvidas. (TRF4, AC 5005416-29.2012.4.04.7004, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 24/04/2017)
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO UNIFAMILIAR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO. INVIABILIDADE. ÁREA URBANIZADA E ANTROPIZADA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. O imóvel ocupado pelo réu está inserido integralmente em terrenos da União, em área non aedificandi, distando a menos de 30 metros do curso d’água, consoante limitações do Código Florestal então vigente (Lei 4.771/1965) e também de acordo com o que dispõe a Resolução Conama 303/2002. Entretanto os danos ambientais verificados são decorrentes do processo de ocupação da região como um todo, incluindo o imóvel acerca do qual versam os autos. Trata-se, no caso, de área urbana consolidada, de acordo com a Resolução Conama nº 303/2002, instituída pelo Poder Público e servida com os equipamentos de infra-estrutura urbana descritos na referida legislação. Em se tratando em área há muito urbanizada, é certo que a retirada de uma edificação isolada não surtirá efeitos significantes ao meio ambiente, haja vista que as adjacências do local encontram-se totalmente edificadas, não se justificando a penalidade de demolição. A efetiva recuperação do meio ambiente ao seu estado natural dependeria de ação conjunta, com a remoção de todas as construções, de modo que a demolição exclusiva da residência da parte ré não constituiria medida útil para referido fim, sendo, portanto, desproporcional. Além da proteção ao meio ambiente, há outros direitos em risco, que, no caso concreto, podem permitir a utilização de áreas já antropizadas e a manutenção das edificações existentes. Desconsiderar a situação ocupacional da região representa postura que não se coaduna com os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade. (TRF4, AC 5017644-59.2014.4.04.7200, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 06/07/2017).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMÓVEL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL. Apesar de ter ocorrido a construção de imóvel em área de preservação permanente sem autorização da administração federal, a demolição do mesmo é medida desproporcional, diante da evidente urbanização da área, sendo caso apenas de medida compensatória em favor de projeto de recuperação ambiental. (TRF4, AC 2006.72.04.000452-9, Terceira Turma, Relatora Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 03/02/2011).
Diante desse quadro, a medida de demolição implicaria afronta aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sopesando-se, de um lado, a necessidade de adequação das estruturas objeto da lide com medidas de mitigação e condicionantes a fim de regularizá-las frente ao órgão competente, e, de outro, a desproporcionalidade da medida de demolição no caso concreto, mesmo porque, as estruturas objeto da lide são de fundamental importância no local, razão que afasta a pretensão ministerial.
5.4. DO PEDIDO DE OBRIGAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – DESCABIMENTO – DANO AMBIENTAL NÃO VERIFICADO – MARÉS DE TEMPESTADE
Ao final de sua peça inicial, o Ministério Público Federal também requereu que a Requerida seja condenada
“em obrigação de indenizar, relativa a todos os danos materiais provocados ao Meio Ambiente pelas intervenções ilegais promovidas no local (como, por exemplo, na implantação da piscina e na construção dos patamares de acesso à praia com rampas e muros identificados no laudo de perícia criminal federal…), no imóvel que está na Praia do Morro das Pedras, Bairro Campeche, em Florianópolis/SC, […], e, ainda, outras estruturas físicas que eventualmente tenham sido erigidas no local. A quantificação dos danos causados à APP e aos bens da UNIÃO (eg, TERRAS DE MARINHA) deverá ser arbitrada pelo Juízo.”
Em que pese o brilhantismo das alegações do Parquet Federal, razão não lhe assiste. Isso porque, conforme visto, a pretensão indenizatória está prescrita, e ainda que se entenda diferente, inexistem danos indenizáveis.
Como demonstrado ao longo da contestação, não restou demonstrado qualquer dolo, fraude ou má-fé da Requerida no tocante às estruturas erigidas na área objeto da lide. Lado outro, o próprio laudo pericial atestou que as estruturas precisaram ser erigidas, em período anterior ao ano de 2009, em razão das ressacas ou marés de tempestade que afetam a região. Repise-se:
O referido Atlas apresenta uma análise espaço-temporal da ocorrência dessas marés de tempestade no período de 1997 a 2010, na qual foram encontrados 46 registros deste tipo de evento, que causaram danos significativos nos municípios da costa catarinense.
O estudo identificou os dez municípios mais afetados, onde se destaca Florianópolis como o primeiro, com frequência muito alta – entre 5 a 6 episódios no período estudado.
Diante do exposto é possível admitir que na praia do Morro das Pedras possa ter havido um evento natural com características de desastre, portanto de forte intensidade e de forma inesperada, que tenha removido a vegetação de restinga protetora das dunas em frente ao local examinado e seu entorno.
Desde aquela data é possível observar um delimitador linear na testada do terreno, compatível com um muro. Não fica claro em que momento os patamares foram construídos, mas à medida que a erosão da praia continuava, houve a necessidade de construção de muros de contenção do terreno e, consequentemente, de rampas de acesso à praia. Verifica-se, ainda, que neste período (entre 2002 e 2007) foi construída a piscina (Figuras 15 e 16).
Repise-se também, a resposta dada pelos experts quando indagados pelo Parquet:
10. O dano é passível de recuperação?
Sim. É possível recuperar a vegetação protetora de dunas, mas há que se considerar a ocorrência de eventos climáticos extremos, que poderão comprometer esta recuperação.
Ou seja, ainda que se determine a retirada do muro, não há qualquer evidência de que a área se regenere, mesmo porque, são as ressacas que provocam os maiores danos ao meio ambiente, as quais têm se intensificado por consequência do aquecimento global.
Indubitável que os muros foram implantados por necessidade de preservar a residência da Requerida, e não com a intenção de destruir o meio ambiente, e, portanto, não há dano a ser indenizável, de modo que a improcedência da demanda é de rigor.
5.5. INEXISTÊNCIA DE TERRENOS DE MARINHA – LINHA DA PREAMAR MÉDIA DE 1831 – AQUECIMENTO GLOBAL – ELEVAÇÃO DO NÍVEL DOS OCEANOS – ENCOBRIMENTO DOS TERRENOS DE MARINHA
O Ministério Público Federal sustenta que a Requerida implantou “uma piscina e a construção de rampas e muros sobre o cordão de dunas frontais da praia, com remoção da vegetação de restinga fixadora de dunas, em terreno de marinha e área de preservação permanente (por estar a menos de 300 metros da linha de preamar máxima).”
No entanto, para que uma construção invada os limites compreendidos como terreno de marinha, deve estar situada dentro da área de 33 metros contados da linha da preamar média do ano de 1831, consoante a dicção do art. 13, do Decreto 24.643, de 10 de julho de 1934, que dispõe sobre o Código de Águas:
Art. 13. Constituem terrenos de marinha todos os que, banhados pelas águas do mar ou dos rios navegáveis, vão até 33 metros para a parte da terra, contados desde o ponto a que chega o preamar médio.
Este ponto refere-se ao estado do lugar no tempo da execução do art. 51, § 14, da Lei de 15/11/1831.
Igualmente, o Decreto-Lei 9.760, de 5 de setembro de 1946, que dispõe sobre os bens da União, reafirmou a propriedade da União sobre os terrenos de marinha e a referência ao preamar médio de 15 de novembro de 1831.
Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:
os terrenos de marinha e seus acrescidos;
Art. 2º São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831:
Os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés;
Os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.
Além disso, o citado decreto atribuiu ao Serviço do Patrimônio da União a determinação da posição da linha do preamar médio do ano de 1831, levando-se em consideração documentos e plantas relativos ao referido ano ou, na ausência destes, com lastro nos documentos que mais se aproximem do ano base.
Art. 9º É da competência do Serviço do Patrimônio da União (S.P.U.) a determinação da posição das linhas do preamar médio do ano de 1831 e da média das enchentes ordinárias.
Art. 10. A determinação será feita à vista de documentos e plantas de autenticidade irrecusável, relativos àquele ano, ou, quando não obtidos, a época que do mesmo se aproxime.
Para análise e verificação quanto aos procedimentos utilizados pela Secretaria do Patrimônio da União – se estão tecnicamente corretos e em obediência à legislação específica, necessário se faz a produção de prova técnica para estudo dos critérios utilizados pela União para determinar, no local, a posição da Linha de Preamar Média de 1831 (LPM-1831) e dos terrenos de marinha demarcados a partir desta LPM.
Faz-se necessário tal prova pericial em razão da ausência de LPM-1831 homologada, que diante, é apenas somente a LPM-1831 presumida para grande parte do território do Estado de Santa Catarina, inclusive no local objeto da lide.
Para a correta demarcação das áreas de marinha, deve-se utilizar de uma metodologia complexa, que envolve estudos multidisciplinares das áreas de hidrologia, informática, geodésia, topografia e cartografia, além de vistoria local, levantamentos, estudo de relatórios, dados, mapas, plantas, imagens e análise hidrográfica.
Busca-se nesta sede demonstrar a imposição de um rigorismo científico na determinação da Linha de Preamar Médio, para afastar qualquer incorreção técnica ou legal na demarcação, a fim de evitar o reconhecimento judicial do avanço de terras de marinha sobre áreas de domínio particular.
Portanto, o deslinde da causa perpassa, inevitavelmente, pela questão probatória especializada. Assim, para se verificar o alcance, ou não, do imóvel por área de titularidade da União, faz-se imprescindível a produção de prova pericial.
Pois bem. A legislação sobre os terrenos de marinha foi criada pela Ordem Régia de 18 de novembro de 1818, estabelecendo uma faixa territorial nas margens marítimas da costa brasileira de 15 braças craveiras (unidade antiga de medida em que cada braça craveira é equivalente a 2,20 m), contadas para o lado de terra a partir da “borda do mar nas marés de águas vivas”.
Entretanto, foi a partir de 1832 que os problemas sobre as demarcações destas parcelas imobiliárias sugiram, pela mudança do referencial que passou a ser a “linha da preamar média do ano de 1831”, em conformidade com o artigo 4° das Instruções do Ministério da Fazenda, datada de 14 de novembro de 1832.
Desde os tempos mais remotos até os anos atuais os terrenos de marinha e seus acrescidos vêm sendo demarcados pela Secretaria do Patrimônio da União – SPU, órgão do Ministério do Orçamento, Gestão e Planejamento, a partir de uma “linha presumida de preamar média de 1831”, porque aquele órgão do Governo Federal não tinha meios de calcular a LPM/1831 com a precisão e exatidão métrica requerida na caracterização destas parcelas imobiliárias.
Corolário lógico, é que os terrenos de marinha partem da linha da preamar-média de 1831, e não da linha da preamar-média atual, do próximo ano ou de qualquer outro período.
Contudo, é impossível negar o avanço do mar ao longo dos anos em direção ao continente, tomando as áreas de terrenos de marinha. Nessas situações, o terreno de marinha não avança sobre os terrenos alodiais, mas continua onde sempre esteve a contar da linha da preamar-média de 1831. Se o mar avança sobre os terrenos de marinha, o prejuízo é da União, que acaba por perder a área.
Obéde Pereira de Lima[15] apresentou tese de doutorado ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina, intitulada “Localização geodésica da linha da preamar média de 1831 – LPM/1831”, com vistas à demarcação dos terrenos de marinha e seus acrescidos, propondo-se a comprovar a viabilidade técnica de demarcar nos dias de hoje a linha da preamar-média de 1831, valendo-se das técnicas e dos avanços científicos da atualidade, refutando os procedimentos adotados pela Secretaria do Patrimônio da União.
Em aperta síntese, de acordo com a metodologia desenvolvida pelo autor do estudo, deve-se instalar e colocar em operação a estação maregráfica, visando a obtenção de dados amostrados da maré durante período mínimo de um ano, em conjunto com a determinação das coordenadas geodésicas de pelo menos dois pontos extremos, utilizando aparelho de GPS (Global Positioning System) em posicionamento com precisão de 01 ppm, para amarração de controle de levantamento planialtimétrico da linha de costa e dos perfis de praia.
Em seguida, se deve processar os dados levantados, efetuando-se a análise harmônica das marés e a retrovisão da preamar-média para o período de 1831, utilizando o auxílio de computadores.
Então, processados esses dados, basta se valer de técnicas de topografia para precisar a linha da preamar-média de 1831 no terreno em análise e, por consequência, os verdadeiros limites do terreno de marinha.
Obéde Pereira de Lima acrescenta que houve avanço do mar sobre o continente, o que é resultado de fenômenos climáticos, como por exemplo, o aquecimento global, que provoca o degelo de camadas glaciais.
Em razão disso, segue o autor, grande parte dos terrenos de marinha, se contados rigorosamente – como devido – da linha da preamar-média de 1831, já estão encobertos pelo mar, isto é, já não existem.
Daí que a mudança da preamar para o ano de 2000, por exemplo, produz o efeito de fazer ressurgir e de avançar os terrenos de marinha sobre o continente, mais precisamente sobre os terrenos alodiais, pertencentes a terceiros, violando o inciso XXII do art. 5º da Constituição Federal, cujo texto garante o direito de propriedade.
Esse fenômeno não é isolado, e pode ter encoberto a maior parte dos terrenos de marinha, inclusive, na área objeto da lide, sendo imprescindível a realização de perícia para que se verifique a quaestio e se possa dar a melhor solução aos autos, até porque, a competência do Ministério Público Federal para promover a demanda restaria prejudicada.
5.6. PRESCRIÇÃO – PRETENSÃO REPARATÓRIA – PRETENSÃO RESSARCITÓRIA – FATOS OCORRIDOS ENTRE 2002 E 2009 IMPOSSIBILIDADE DE DEMOLIÇÃO
No caso em tela, o Ministério Público Federal requer a recuperação da área em que instalados uma piscina e muros de contenção, que, segundo laudo elaborado por experts da Polícia Federal, datam de 2002 a 2009, caracterizando assim, a prescrição da ação de reparação.
Não se desconhece que o Supremo Tribunal Federal – STF reconheceu a repercussão geral sobre o tema da imprescritibilidade do dano ambiental, que rendeu azo à edição do Tema 999, fixando-se por ocasião do julgamento a seguinte Tese: “é imprescritível a pretensão de reparação civil do dano ambiental”.
Maxima venia, a questão merece melhor análise.
Maria Helena Diniz[16] ensina que o instituto da prescrição pode ser conceituado como a perda da pretensão de exigibilidade atribuída a um direito, em razão da inércia do seu titular, no prazo legal, cujo termo inicial é o da violação do direito. Por pretensão entenda-se o poder de exigir coercitivamente o cumprimento de um dever jurídico (prestação), surgida a partir da violação do direito.
Enquanto a Lei da Ação Civil Pública nada dispõe acerca da prescrição, o art. 189 do Código Civil de 2002 dispõe que violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. Por sua vez, o art. 206, § 3º, inciso V, do mesmo diploma legal, determina prescrever em três anos a pretensão de reparação civil, resguardadas as hipóteses de incidência de causas suspensivas ou interruptivas.
Carlos Roberto Gonçalves[17] lembra que o instituto da prescrição é necessário, para que haja tranquilidade na ordem jurídica, pela consolidação de todos os direitos.
Referida tranquilidade já era apontada por Pontes de Miranda[18] muito antes da vigência da Constituição Federal de 1988, sob o argumento de que os prazos prescricionais servem à paz social e à segurança jurídica. Segundo o renomado doutrinador, a prescrição não destrói direito, tão pouco apaga as pretensões, e sim, atendem à conveniência de que um direito não perdure por demasiado tempo.
Temos, portanto, que a prescrição objetiva preservar a estabilidade social e a segurança jurídica, de modo que não existam relações jurídicas perpétuas, que poderiam obrigar ad eternum outros sujeitos, causando-lhes tormentas constantes ao ponto de serem obrigados indefinidamente à reparação.
No entanto, o legislador também prevê expressamente causas de imprescritibilidade, como a prática do racismo, prevista no art. 5º, inciso XLII; a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional do Estado Democrático elencada no art. 5º, inciso XLIV; a impossibilidade de usucapião de imóvel público nos termos do art. 183, § 3º; e, os direitos sobre terras indígenas, conforme preceitua o art. 231, § 4º, todos da Constituição Federal.
A regra é a prescritibilidade das pretensões, regra esta que comporta exceções, as quais somente a Constituição Federal, explicita ou implicitamente poderia prever, mas quando implícitas, dependem de profunda análise e interpretação, pois ao contrário, estar-se-ia confrontando o próprio texto constitucional, especificamente em relação ao princípio da segurança jurídica.
Ocorre que a prescrição não é uma mera opção do legislador. Ao contrário, está inserida em um grupo de institutos jurídicos que são corolários diretos e obrigatórios do próprio princípio da segurança jurídica, compreendido por Canotilho[19], como um dos grandes pilares do próprio Estado Democrático de Direito, ao lado do princípio da legalidade.
Nesse sentido, Paulo de Bessa Antunes[20] pontua o confronto entre a imprescritibilidade e a segurança jurídica:
O Superior Tribunal de Justiça entendeu que, nos casos individuais, uma vez que o autor esteja cientificado da lesão e do seu autor, contra si começa a fluir o prazo prescricional. Em se tratando das ações coletivas, isto é, das ações civis públicas, não vejo porque a situação deva merecer tratamento diferente.
Em primeiro lugar, há que se considerar que, na forma do art. 5° da Lei 7347/85, existe previsão legal para a legitimidade ativa de toda uma infinidade de autores, legitimidade esta que tem sido ampliada pelos tribunais desde há muito tempo.
Assim, o temor de que o bem jurídico meio ambiente fique desprotegido é, evidentemente, despropositado. Entretanto, não é despropositado o temor de que a manutenção de questões abertas e sem definição legal clara possam desequilibrar relações jurídicas e violar os preceitos de justiça que devem informar à ordem jurídica. […]
O importante da manutenção da possibilidade teórica da ocorrência da prescrição é assegurar que o equilíbrio jurídico não seja quebrado, garantindo a existência do preceito de justiça que, ante a existência da responsabilidade objetiva, sofre uma transmutação significativa.
Romper a barreira prescricional seria, no caso concreto, estabelecer um nível insuportável de falta de isonomia, com graves reflexos para a vida do direito e, reflexamente, para a atividade econômica.
Para o Ministro Mauro Campbell Marques do Superior Tribunal de Justiça, ao proferir voto vista no Recurso Especial 1.120.117, as pretensões de ressarcimento por violação aos direitos fundamentais, tanto na esfera moral como na patrimonial, ainda que em sede coletiva, não poderiam ser cobertas pela imprescritibilidade, pelo simples fato de possuírem natureza sancionadora.
Por isso seria correta a incidência dos prazos legais de prescrição previstos na legislação. É que a Constituição Federal quando declara a imprescritibilidade de ações, sempre o faz de maneira expressa.
Já um dos maiores administrativistas do país, o Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, após defender a imprescritibilidade para os atos de improbidade administrativa durante anos, se convenceu que essa tese era insustentável diante do direito de defesa. Veja o que ensina o emérito doutrinador[21]:
Até a 26ª edição deste Curso admitimos que, por força do § 5º do art. 37, de acordo com o qual os prazos de prescrição para ilícitos causados ao erário serão estabelecidos por lei, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento, estas últimas seriam imprescritíveis. […]
Já não mais aderimos a tal desabrida intelecção. Convencemo-nos de sua errônea ao ouvir a exposição feita no Congresso Mineiro de Direito Administrativo, em maio de 2009, pelo jovem e brilhante professor Emerson Gabardo, o qual aportou um argumento, ao nosso ver irrespondível, em desfavor da imprescritibilidade, a saber: o de que com ela restaria consagrada a minimização ou eliminação prática do direito de defesa daquele a quem se houvesse increpado dano ao erário, pois ninguém guarda documentação que lhe seria necessária além de um prazo razoável, de regra não demasiadamente longo. De fato, o Poder Público pode manter em seus arquivos, por período de tempo longuíssimo, elementos prestantes para brandir suas increpações contra terceiros, mas o mesmo não sucede com estes, que terminariam inermes perante arguições desfavoráveis que se lhes fizessem.
Não é crível que a Constituição possa abonar resultados tão radicalmente adversos aos princípios que adota no que concerne ao direito de defesa. Dessarte, se a isto se agrega que quando quis estabelecer a imprescritibilidade a Constituição o fez expressamente como no art. 5º, incs. LII e LXIV (crimes de racismo e ação armada contra a ordem constitucional) e sempre em matéria penal que, bem por isto, não se eterniza, pois não ultrapassa uma vida ainda mais se robustece a tese adversa a imprescritibilidade.
Está-se diante de um conflito entre princípios constitucionais. Se de um lado a prescrição está ligada intimamente à segurança jurídica, ao direito do contraditório e ampla defesa, à razoabilidade e proporcionalidade, do outro, há o interesse e compromisso em preservar o meio ambiente, para as presentes e futuras gerações.
É claro que o meio ambiente é essencial à vida e que todos têm o dever de preservá-lo. No entanto, a Lei 6.938/81 que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei 7.347/85 que dispõe sobre a Ação Civil Pública, a Lei 4.717/65 que regula a Ação Popular, a Lei 9.605/98 que trata dos Crimes Ambientais e o Decreto 6.514/08 que regulamenta a Lei de Crime Ambientais, por exemplo, já dispõem de meios importantes para garantir a proteção do meio ambiente, dispensando o reconhecimento da imprescritibilidade das ações de reparação.
Ora. Não cabe ao aplicador da norma e muito menos ao legislador, eternizar a hipótese da reparação civil por danos provocados ao meio ambiente, visto que o dano decorre principalmente da inércia e omissão do próprio Poder Público, o qual tem o dever legal da fiscalização.
Impor a tese da imprescritibilidade, significaria buscar através do Poder Judiciário, a criação de um cenário para que em um futuro breve, gerações muito antigas possam ser responsabilizadas por danos supostamente provocados ao meio ambiente.
Outrossim, o fundamento da prescrição não é a convalidação de eventuais atos ilícitos ou a liberação do sujeito passivo do direito subjetivo. De outro modo, visa garantir a estabilidade das relações jurídicas, a segurança jurídica e, em última análise, a própria manutenção do Estado Democrático de Direito, a fim de que não se perpetuem situações de sujeição jurídica, em que o fator tempo só faz degradar, desfigurar, deturpar quaisquer tentativas de busca da verdade.
Por tais razões, se mostra razoável reconhecer a prescrição da pretensão ministerial de demolição e recuperação da área objeto da lide, ou, alternativamente, reconhecer a prescrição tão somente ao pagamento de indenização, porque esta última, não há dúvidas, prescreve, aplicando-se, portanto, o prazo trienal, nos termos do art. 206, § 3º, inciso V do Código Civil, ou outro previsto na norma civilista, sob pena de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, da segurança jurídica, da propriedade e de sua função social e do direito à moradia, constitucionalmente assegurados.
6. ALIENAÇÃO DOS TERRENOS DE MARINHA – LEI Nº 13.240/15 – POSSIBILIDADE – REGULARIZAÇÃO – EXTINÇÃO DO FEITO
A questão dos autos versa sobre edificação em terrenos de marinha, que caso assim sejam considerados por prova pericial, então são bens de propriedade da União, por força do art. 20, VII, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 20. São bens da União: […]
VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos;
Ocorre que, os terrenos de marinha, na dicção do art. 23 da Lei 9.636, de 15 de maio de 1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, podem ser alienados, senão vejamos:
Art. 23. A alienação de bens imóveis da União dependerá de autorização, mediante ato do Presidente da República, e será sempre precedida de parecer da SPU quanto à sua oportunidade e conveniência.
1º A alienação ocorrerá quando não houver interesse público, econômico ou social em manter o imóvel no domínio da União, nem inconveniência quanto à preservação ambiental e à defesa nacional, no desaparecimento do vínculo de propriedade.
2º A competência para autorizar a alienação poderá ser delegada ao Ministro de Estado da Fazenda, permitida a subdelegação.
Com efeito, a Lei 13.240, de 30 de dezembro de 2015, que dispõe sobre a administração, a alienação, a transferência de gestão de imóveis da União, foi publicada para suprir a lacuna legislativa que impedia a venda dos bens dominicais pertencentes à Administração Federal.
Nesse sentido, é certo afirmar que os terrenos de marinha estão à venda e podem ser adquiridos na forma da Lei 13.465/17 que alterou a Lei 9.636/98, pendente apenas de edição de Portaria pelo Ministro de Estado do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, nos termos do art. 16-C:
Art. 16-C. O Ministro de Estado do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, permitida a delegação, editará portaria com a lista de áreas ou imóveis sujeitos à alienação nos termos do art. 16-A desta Lei. […].
Portanto, caso seja comprovado por perícia que a área objeto da lide é terreno de marinha, então poderá ser adjudicada por preço fixado na portaria ministerial, sanando-se qualquer irregularidade administrativa na ocupação ou edificações.
7. REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA NÃO ATENDIDOS – REVOGAÇÃO DA MEDIDA
O Ministério Público Federal requereu a antecipação dos efeitos da tutela deferido por este. D. Juízo (Evento 14) nos seguintes termos: […]
Ocorre que o requerimento não merecia prosperar, ante a ausência de demonstração dos requisitos autorizadores para concessão da tutela de urgência.
Isso porque, a simples alegação do Ministério Público Federal de que “os documentos dos autos revelam que as construções foram erigidas sem licença ambiental, em terras de marinha e área de preservação permanente. Ao longo dos anos, mais construções irregulares foram sendo erigidas, sempre contando com a ineficiência dos entes públicos, os quais deveriam zelar pelo Patrimônio Público e pelo Meio Ambiente”, maxima venia, não evidenciam qualquer perigo de dano, probabilidade do direito ou risco ao resultado útil ao final do processo, os quais devem ser preenchidos cumulativamente.
Ademais, a narrativa ministerial é genérica, contrariando o próprio laudo pericial que, apesar de atestar as estruturas objetos da lide, informa que não necessariamente a retirada delas implicaria em melhorias ao meio ambiente, em razão das ressacas ou marés de tempestade.
Aliás, os experts consignaram que, apesar de não ser possível estabelecer com exatidão a data das estruturas, seria possível afirmar que foram erigidas entre o período de 2002 a 2009, e não há, ao contrário do que sustenta o Ministério Público Federal, nenhum elemento que corrobore novas estruturas em data posterior a 2009.
Já foi dito que a pretensão da Requerida não é destruir o meio ambiente, mas tão somente, preservar sua propriedade de eventos climáticos catastróficos que têm se agravado com as mudanças climáticas, fruto, segundo especialistas, do aquecimento global.
Por outro lado, a medida liminar concedida insere a edificação da Requerida em risco iminente e irreversível, pois se durante o processo houver ressacas abruptas e sejam necessários reparos nas estruturas que evitam a erosão, nada poderá ser feito, ainda que com autorização do Poder Público, falecendo a edificação de proteção das forças naturais, espalhando escombros e detritos na faixa de areia, causando risco real para a comunidade.
Logo, não existe perigo de dano que fundamentasse o pedido, pois, como cediço, as estruturas estão erigidas há décadas, tão pouco probabilidade de direito, pois a Requerida não realizou nenhuma obra nova, nem pretende realizar, e sendo assim, a medida liminar merece revogação.
8. POSSIBILIDADE DE REGULARIZAÇÃO – SUSPENSÃO DA AÇÃO PÚBLICA
Cediço que as APPs têm a finalidade de evitar a ocupação humana em áreas de alta fragilidade ecológica, como margens de rios, encostas íngremes, topos de morros, áreas marinhas sujeitas a ressacas e outras, e o objetivo de proteger a cobertura vegetal nessas áreas, sua flora e fauna, o solo e os recursos hídricos.
Ocorre que, quando tais áreas já são ocupadas há décadas, não há que se falar em remoção da população, recuperação da área e/ou demolição das edificações. Claro que a regularização de ocupação urbana em APP é um grande desafio a ser enfrentado nas cidades brasileiras, porém, necessário, como no caso em tela.
É certo que as cidades, historicamente, nasceram e tendem a crescer próximo a fontes hídricas, tendo em vista o abastecimento de água, a navegação, o comércio, o lazer e todas as funções que os rios e o mar proporcionam à vida humana.
Não se pode negar a realidade das ocupações já existentes em APP, e por isso, é imperativo solucionar a situação de insegurança em que vive parcela significativa da população urbana.
E a solução já está apontada na Lei 13.465, de 2017, resultante da conversão da Medida Provisória 759, de 2016, que prevê normas gerais e procedimentos aplicáveis à Regularização Fundiária Urbana (Reurb), a saber:
Art. 9º Ficam instituídas no território nacional normas gerais e procedimentos aplicáveis à Regularização Fundiária Urbana (Reurb), a qual abrange medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes.
1º Os poderes públicos formularão e desenvolverão no espaço urbano as políticas de suas competências de acordo com os princípios de sustentabilidade econômica, social e ambiental e ordenação territorial, buscando a ocupação do solo de maneira eficiente, combinando seu uso de forma funcional.
2º A Reurb promovida mediante legitimação fundiária somente poderá ser aplicada para os núcleos urbanos informais comprovadamente existentes, na forma desta Lei, até 22 de dezembro de 2016.
Tal regularização, além de fundiária e urbanística, é, também, ambiental, sendo admitida, inclusive, com relação a ocupações inseridas em áreas de preservação permanente (art. 11, §2º), verbis:
Art. 11 […]
2º Constatada a existência de núcleo urbano informal situado, total ou parcialmente, em área de preservação permanente ou em área de unidade de conservação de uso sustentável ou de proteção de mananciais definidas pela União, Estados ou Municípios, a Reurb observará, também, o disposto nos arts. 64 e 65 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, hipótese na qual se torna obrigatória a elaboração de estudos técnicos, no âmbito da Reurb, que justifiquem as melhorias ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior, inclusive por meio de compensações ambientais, quando for o caso.
In casu, trata-se de área consolidada, que a própria Lei 13.465/17 cuidou de definir nos arts. 36 e 93, elementos para a caracterização e definição da área urbana consolidada, contemplando a situação da área objeto da lide, verbis:
Art. 36. O projeto urbanístico de regularização fundiária deverá conter, no mínimo, indicação: […]
1º Para fins desta Lei, considera-se infraestrutura essencial os seguintes equipamentos:
I – sistema de abastecimento de água potável, coletivo ou individual;
II – sistema de coleta e tratamento do esgotamento sanitário, coletivo ou individual;
III – rede de energia elétrica domiciliar;
IV – soluções de drenagem, quando necessário; e
V – outros equipamentos a serem definidos pelos Municípios em função das necessidades locais e características regionais.
Art. 93. A Lei 9.636, de 15 de maio de 1998, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 16-C. O Ministro de Estado do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, permitida a delegação, editará portaria com a lista de áreas ou imóveis sujeitos à alienação nos termos do art. 16-A desta Lei.
1º Os terrenos de marinha e acrescidos alienados na forma desta Lei: […]
II – deverão estar situados em área urbana consolidada.
2º Para os fins desta Lei, considera-se área urbana consolidada aquela: […]
V – com a presença de, no mínimo, três dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados:
a) drenagem de águas pluviais;
b) esgotamento sanitário;
c) abastecimento de água potável;
d) distribuição de energia elétrica; e
e) limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos.
Adicionalmente, houve alterações à Lei Florestal, justamente nos arts. 64 e 65 supracitados, para compatibilizá-los à Reurb:
Art. 64. Na Reurb-S dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana.
Art. 65. Na Reurb-E dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente não identificadas como áreas de risco, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana.
1º O processo de regularização fundiária de interesse específico deverá incluir estudo técnico que demonstre a melhoria das condições ambientais em relação à situação anterior e ser instruído com os seguintes elementos: […].
Assim, ainda que se considere eventual ocupação em área de preservação permanente situada dentro de área urbana consolidada, e havendo…