EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA
Requerido, comparecendo espontaneamente nos autos, nos termos do art. 239, §1º, do CPC, que lhe move Ministério Público, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, com fundamento no art. 335 do Código de Processo Civil, apresentar CONTESTAÇÃO pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:
1. DOS FATOS
Cuida-se de ação civil pública com pedido liminar proposta pelo Ministério Público, sustentando que os Réus são responsáveis pela construção, em andamento, de um imóvel se projetando à área de preservação ambiental. Argumenta que o imóvel está sendo construído em Área de Preservação Ambiental, não respeitando a área non aedificandi.
Postula a procedência da demanda para condenar os Réus a cumprirem as seguintes obrigações: i) absterem-se de explorar a área de preservação ambiental; ii) demolir e desfazer toda e qualquer construção dentro da área de preservação ambiental; iii) reparar os danos ambientais com o plantio de mudas nativas; iv) promover o desassoreamento do recurso hídrico assoreado; v) paralisar toda e qualquer atividade no local, inclusive fora da faixa non aedificandi; vi) subsidiariamente, pagar quantia a título de indenização pelos danos ambientais.
Ainda, requereu a produção de todas as provas em direito admitidas. O D. Juízo concedeu tutela de urgência determinando a interdição e lacração dos empreendimentos, com a imediata suspensão de toda e qualquer atividade no local, em toda a sua extensão, sob pena de multa diária.
No entanto, a pretensão narrada pelo Autor não merece prosperar, posto que destituída de elementos fáticos e jurídicos, como será demonstrado.
2. PRELIMINARMENTE
Alega-se que um imóvel está sendo construído sobre a área non aedificandi do imóvel, considerada a faixa de 50m (cinquenta metros) do rio. O empreendimento engloba diversas construções necessárias à implantação de infraestrutura no local.
No entanto, a obra em andamento, que se encontra em estágio avançado, está estritamente amparada pelo Alvará de Construção deferido pela Prefeitura do Município e respeitada a distância protegida da APA.
Os Réus cumprem todas as regras da construção civil e ambiental, observando rigorosamente as limitações constitucionais, legais e administrativas impostas, observando rigorosamente o alvará, a declaração de compensação e a autorização para corte de árvores, recolhendo todas as taxas e impostos que lhes são exigidos pela Administração Pública.
A alegada acusação não possui a mínima força para afastar a legítima licença outorgada pelo Município, porque os fatos narrados não condizem com a realidade e ferem o direito de propriedade dos Réus.
Não podemos olvidar que o fato de estar se exigindo a regularização de um imóvel, significa dizer que o Alvará seja irregular, posto que válido e eficaz, tampouco que as demais obras estejam irregulares, uma vez que atendidos todos os aspectos formais e técnicos que autorizam sua construção, de forma que emerge a inexistência de qualquer obrigação legal pendente de cumprimento, máxime quanto às obras civis.
Todas as normas referentes à construção e ao meio ambiente foram observadas e a simples exigência de eventuais adequações da construção de um imóvel não pode ocasionar a paralisação das demais obras do empreendimento, tampouco embasar a acusação de que no local está havendo assoreamento dos recursos hídricos.
Isso porque, nenhuma irregularidade ambiental de tamanha gravidade existe no local. Basta um simples exame da área para que se constate que o rio não foi assoreado ou afetado pela obra.
Para demonstrar a robustez de suas alegações e a boa-fé, os Réus juntam cópias do Alvará de Construção, Matrícula dos Imóveis Declaração de Compensação, Autorização para corte de árvores, contrato de empreitada, bem como imagens fotográficas do local do empreendimento e da construção civil, demonstrando, inclusive, estar localizada em área bem distante da faixa de proteção ambiental.
O prosseguimento das obras civis em nada prejudicará a APA e certamente a medida liminar concedida é desproporcional e atinge áreas da propriedade que nenhuma relação geográfica de proximidade guarda em relação ao rio.
Estas circunstâncias são mais que suficientes para se concluir que não há dados concretos suficientes para amparar a gravosa paralisação do empreendimento em sua total extensão.
Verifica-se que o Autor, a fim de compelir os Réus a promoverem supostos e simples ajustes na construção de apenas um dos empreendimentos, pretende embargar todas as obras no local, ainda que licenciadas pelo poder público; medida açodada que não deve prosperar, porque desproporcional, de caráter penal administrativo e desarrazoada.
Na ocasião, os Réus demonstraram através de robusta documentação a regularidade do empreendimento e, principalmente, a observância das limitações constantes nas áreas de reserva ambiental.
Possivelmente, o parquet não tomou em conta o traçado irregular do curso do rio, cujas curvas e sinuosidade tornam as medições necessárias e essenciais para que se determine eventual avanço da APA, isto não se fez.
Pelo exposto, o pedido formulado pelo Autor revela rigor excessivo e desprovido de suporte fático, recaindo as graves acusações sobre empreendimento autorizado legalmente pelos órgãos da administração municipal, merecendo, por isso, ser julgado improcedente.
Ainda que se admita, por amor ao debate, que ínfima parte de um imóvel tenha avançado minimamente a área de proteção, o que, de todo modo não foi provado, o remédio seria muito menos oneroso que o ministrado até aqui. Na verdade, bastaria cominar a pena pecuniária caso os Réus não desfizessem a obra dita irregular.
Não há nos autos qualquer prova de ter a obra avançado área protegida e menos ainda que tenha causado assoreamento do rio.
Com todas as vênias, se por absurdo algo vier a ser exigido dos Réus, não pode ser mais que o desfazimento parcial do imóvel, caso provado o avanço deste em área protegida.
3. DO DIREITO
Nesse prisma, se valem os Réus da presente via de defesa com o fim precípuo de demonstrar a verdade real dos fatos para assegurar o objeto social de seus negócios, de modo que possam dar continuidade às atividades do empreendimento legalmente autorizadas pela Prefeitura Municipal, porquanto respeitadas o regular uso da propriedade.
O direito fundamental da propriedade está previsto no art. 5º, XXII e 170, II, da Constituição Federal:
Art. 5º (…) XXII – é garantido o direito de propriedade;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existências dignas, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: II – Propriedade privada;
O Código Civil, em seu art. 1.228, tutela ao proprietário o uso, o gozo e a disposição de seu imóvel:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
O empreendimento em questão atende em sua inteireza a função social da propriedade prevista nos arts. 182 e 186, da Constituição Federal e no §1º, do art. 1.228, do Código Civil, preservando a flora, a fauna e o equilíbrio ecológico no local e região:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
§1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.
§2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
§3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.
§4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
- – parcelamento ou edificação compulsórios;
- – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
- – Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
- – aproveitamento racional e adequado;
- – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
- – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
- – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
Desta feita, as atividades desempenhadas pelos Réus no local estão delineadas e se subsumem ao art. 1.299, do Código Civil, porquanto o direito de construir é uma das manifestações conferidas pelo uso da propriedade:
Art. 1.299. O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.