Contrarrazões ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público contra sentença que julgou improcedente ação civil pública ambiental, com preliminar de violação ao princípio da dialeticidade.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA FEDERAL DE
APELADA, previamente qualificada, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, com fundamento no art. 1.010, § 1º, do Código de Processo Civil, apresentar CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO interposto pelo Ministério Público Federal contra a r. sentença, pelos motivos de fato e de direito aduzidos nas anexas razões, as quais requer sejam recebidas e remetidas ao Egrégio Tribunal ad quem, para o seu regular processamento.
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL
CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO
1. SUMÁRIO DA CONTROVÉRSIA
A ação civil pública foi ajuizada pelo MPF sob a alegação de que o órgão federal competente teria iniciado processo de reavaliação toxicológica de ingredientes ativos que compõem herbicidas regularmente utilizados no Brasil, mas que, até o momento, não teria sido concluída a reavaliação.
Com base nessa constatação, o MPF pleiteia, em um primeiro momento, a suspensão das liberações da comercialização de sementes transgênicas tolerantes a herbicida enquanto não concluída a sua reavaliação, e, ao final, o banimento ou a liberação com restrições, conforme as conclusões técnicas a que chegue o órgão federal competente na reavaliação.
Utilizando-se de documentos que teriam sido obtidos ao longo do Inquérito Civil instaurado para avaliar a necessidade de cancelamento das liberações comerciais de sementes geneticamente modificadas tolerantes a herbicida, o MPF faz longa digressão – com diversas transcrições literais de documentos – sobre o que entende por uso indiscriminado de agrotóxicos no Brasil.
Na visão do MPF, a continuidade da comercialização e do plantio de sementes geneticamente modificadas tolerantes a herbicida, acarretaria no risco à saúde humana e ao meio ambiente, porque alegadamente pressuporia a continuidade de utilização de herbicidas contendo o aludido ingrediente ativo.
Com grande alarde, anunciando um cenário de absoluto caos com a continuidade de utilização de defensivos agrícolas à base de herbicida, o Ministério Público Federal justificou o ajuizamento desta demanda em riscos à saúde humana, associando diversas doenças, inclusive o câncer, à utilização de agrotóxicos.
A petição inicial afirma haver um “círculo vicioso” entre as sementes geneticamente modificadas e a maior utilização dos defensivos agrícolas, sem, contudo, explicar como as sementes modificadas de per se aumentam o consumo dos defensivos agrícolas.
O MPF utiliza argumentos retóricos já muitas vezes requentados, notadamente quanto à pretensa “incerteza científica” supostamente gerada com a aprovação de sementes geneticamente modificadas.
Portanto, a tônica da petição inicial apresentada pelo MPF é, em suma, a de fazer crer que a herbicida é um produto com riscos – o que a rigor nem é objeto da ação, já que nenhum pedido é direcionado ao ingrediente ativo ou aos produtos que o contém – com informações baseadas em material obtido em página na internet com nítido caráter ideológico, contrário à utilização de agrotóxicos, cuja credibilidade é sempre questionada e certamente não pode servir de elemento de prova em processo judicial.
A r. sentença de primeiro grau, tendo em conta todos os estudos e provas juntadas aos autos, decidiu, de maneira acertada, por julgar improcedentes os pedidos formulados pelo MPF, o qual inconformado, apela, mesmo diante do acertado entendimento da r. sentença, a Apelada entende pelo desprovimento do recurso de apelação, conforme restará reiterado adiante.
2. RAZÕES PARA O NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE
Antes de adentrar no mérito, propriamente dito, da demanda, a Apelada ressalta que o recurso de apelação não deve ser sequer conhecido, pois as razões recursais não atacam a fundamentação contida na r. sentença, mas somente reiteram, de forma genérica, alegações infundadas do Parquet.
Com efeito, a apelação é mera repetição do exposto nos embargos de declaração que a antecederam e que restaram rejeitados pelo Juízo Federal a quo. Os fundamentos da r. sentença não foram devidamente rebatidos pelo MPF.
Há, portanto, clara violação ao princípio da dialeticidade, consubstanciado no art. 1.010, inciso II, do CPC, e que consiste no dever imposto ao MPF de o recurso conter, no mínimo, argumentos rebatendo os fundamentos da sentença.
2.1. JURISPRUDÊNCIA SOBRE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE
A parte a quem interessa a reforma da sentença deve refutar expressamente seus argumentos, e não apenas reiterar argumentos sem qualquer nexo com a sentença recorrida, como ocorre neste caso. A jurisprudência reconhece a dialeticidade como uma das condições para o conhecimento do apelo. Nesse sentido, vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. REPETIÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA INICIAL. COMODISMO INACEITÁVEL. PRECEDENTES. Recurso Especial interposto contra v. Acórdão que considerou indispensável que na apelação sejam declinadas as razões pelas quais a sentença seria injusta ou ilegal.
O Código de Processo Civil (arts. 514 e 515) impõe às partes a observância da forma segundo a qual deve se revestir o recurso apelatório. Não é suficiente mera menção a qualquer peça anterior à sentença (petição inicial, contestação ou arrazoados), à guisa de fundamentos com os quais se almeja a reforma do decisório monocrático.
À luz do ordenamento jurídico processual, tal atitude traduz-se em comodismo inaceitável, devendo ser afastado. O apelante deve atacar, especificamente, os fundamentos da sentença que deseja rebater, mesmo que, no decorrer das razões, utilize-se, também, de argumentos já delineados em outras peças anteriores.
No entanto, só os já desvendados anteriormente não são por demais suficientes, sendo necessário o ataque específico à sentença. Procedendo dessa forma, o que o apelante submete ao julgamento do Tribunal é a própria petição inicial, desvirtuando a competência recursal originária do Tribunal. Precedentes das 1ª, 2ª, 5ª e 6ª Turmas desta Corte Superior. Recurso não provido. (…)
Não é suficiente mera menção a qualquer peça anterior à sentença, in casu, à petição inicial, à guisa de fundamentos com os quais se almeja a reforma do decisório monocrático. À luz do ordenamento jurídico processual, tal atitude traduz-se em comodismo inaceitável, devendo ser afastado.
O apelante deve atacar, especificamente, os fundamentos da sentença que deseja rebater, mesmo que, no decorrer das razões, utilize-se, também, de argumentos já delineados em outras peças anteriores. Mas, repita-se, só os já desvendados anteriormente não são por demais suficientes, sendo necessário o ataque específico à sentença. (REsp nº 359.080-PR – Relator Ministro José Delgado – Colenda Primeira Turma do E. STJ – DJ 11.12.2001 – v.u.)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO AGRAVADA. FUNDAMENTOS INATACADOS. SÚMULA 182/STJ. A agravante não impugnou os argumentos da decisão agravada, quais sejam: o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o cálculo mínimo anual por aluno (VMAA) deve ser fixado de acordo com a média mínima nacional, e não a média mínima obtida em determinada unidade da federação, atraindo o teor da Súmula 83/STJ;
a declaração de inconstitucionalidade da Portaria 400/04, do Ministério da Fazenda, além de fundamentar-se em norma infraconstitucional, utiliza, ainda, fundamento constitucional suficiente à sua manutenção e a recorrente não comprovou a interposição do recurso extraordinário, o que torna aplicável ao caso o óbice da Súmula 126/STJ.
Não basta ao recorrente afirmar o desacerto da decisão agravada, mas, pelo princípio da dialeticidade, é indispensável confrontar os argumentos nela desenvolvidos com aqueles que entende corretos. A ausência de efetiva impugnação a todos os fundamentos da decisão agravada obsta o conhecimento do agravo, consoante entendimento consolidado na Súmula 182/STJ. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 1215526/BA – Relator Ministro Castro Meira – C. 2ª Turma do STJ – 15.12.2009 – v.u.)