Ação que objetiva a declaratória de nulidade de auto de infração ambiental aplicado por queimadas ou uso de fogo não autorizado, com pedido subsidiário de redução do valor da multa ambiental.
EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE…
AUTORA, vem, à presença de Vossa Excelência, propor AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA em face do RÉU, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas.
1. DOS FATOS – AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL POR QUEIMADAS OU USO DE FOGO NÃO AUTORIZADO
A Autora foi autuada pelo Réu, que aplicou penalidade de multa ambiental em valor exorbitante, por ter ela supostamente se beneficiado de queima não autorizada que atingiu sua propriedade rural.
Sem grandes esforços, percebe-se que a descrição sumária da infração consiste no fato de a Autora ter se beneficiado com o incêndio ou queimada, mas não menciona qual seria tal benefício.
No entanto, conforme alegado em sede de defesa administrativa, o incêndio é de autoria desconhecida e foi imediatamente comunicado às autoridades competentes. A defesa, porém, foi indeferida e a Autora interpôs recurso hierárquico, que também restou improvido.
Ora, ficou provado e mesmo reconhecido, que não houve queimada, mas sim um incêndio de autoria desconhecida que em nada beneficiou a Autora, porém, a penalidade foi mantida pela autoridade de segunda instância, esgotando a esfera administrativa.
Desse modo, a única alternativa à Autora diante de tamanha arbitrariedade, foi o ajuizamento da presente ação anulatória de auto de infração ambiental, que irremediavelmente comporta procedência ante a ausência de qualquer dolo ou culpa da Autora, conforme passa a demonstrar.
2. CARÁTER SUBJETIVO DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL
Prima facie, cumpre destacar o entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça:
Cabe esclarecer que, no Direito brasileiro e de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, proprietário ou administrador da área degradada, é de natureza objetiva, solidária e ilimitada (…).
Todavia, os presentes autos tratam de questão diversa, a saber a natureza da responsabilidade administrativa ambiental, bem como a demonstração de existência ou não de culpa, já que a controvérsia é referente ao cabimento ou não de multa administrativa. – Ministro Herman Benjamin (STJ, REsp nº 1.401.500/PR, j. 16/08/2016, DJe 13/09/2016)
In casu, o Auto de Infração Ambiental se equivoca a imputar à Autora os fatos descritos, o que, por si só, inviabiliza por completo qualquer possibilidade de sua responsabilização administrativa, ante a ausência da prática de uma conduta tipificada como ilícita da Autora e a ausência do nexo de causalidade.
A culpabilidade, pressuposto de responsabilidade administrativa, nada mais é do que a verificação de dolo ou culpa por parte do suposto infrator, caracterizando a ilicitude da conduta.
Isso porque nem toda atividade que se subsume à conduta tipificada como infração ambiental pode ser tida como uma infração, uma vez que podem ter ocorrido ao caso hipóteses de exclusão de culpabilidade/ilicitude, como ocorrido no caso em comento.
A mesma conclusão, como não poderia deixar de ser, se aplica ao caso em tela, em que se discute eventual responsabilidade ambiental administrativa da Autora na hipótese de imposição de sanção de multa simples, uma vez que, não havendo culpabilidade/ilicitude, não há que se falar em imposição de sanção administrativa ambiental.
Reforçando tal entendimento, o legislador elegeu no ordenamento jurídico brasileiro a responsabilidade administrativa ambiental como subjetiva. Isso está claro na Lei Federal 9.605/98, que dispõe sobre crimes e infrações administrativas ambientais, que exige como indispensável a conduta do agente contrária à lei (ação ou omissão), que efetivamente dê causa a um dano.
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções:
II – Multa simples; § 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo.
Ao dispor que a imposição de multa ambiental simples requer comprovação de culpa latu sensu, a qual se caracteriza pela presença de dolo (intenção específica de cometer a infração) ou de culpa stricto sensu (negligência, imperícia ou imprudência), a legislação ambiental infere que a responsabilidade ambiental administrativa é subjetiva. Ou seja, a responsabilidade subjetiva é a regra.
2.1. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DA INFRAÇÃO AMBIENTAL
Importa salientar também que a jurisprudência do C. STJ tem consagrado a tese de que a responsabilidade administrativa é de natureza subjetiva, conforme demonstram os excertos, exemplificativamente, abaixo colacionados:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL. ACIDENTE NO TRANSPORTE DE ÓLEO DIESEL. IMPOSIÇÃO DE MULTA AO PROPRIETÁRIO DA CARGA. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA.
I – A Corte de origem apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando a tese vertida pela parte ora Agravante. Inexistência de omissão.
II – A responsabilidade civil ambiental é objetiva; porém, tratando-se de responsabilidade administrativa ambiental, o terceiro, proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo transportador.
III – Agravo regimental provido. (STJ – 1ª Turma – AgRg no Agravo em Recurso Especial 62.584-RJ – Relator Min. Sérgio Kukina – Julgamento em 18.6.2015).
AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. MULTA APLICADA ADMINISTRATIVAMENTE EM RAZÃO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. EXECUÇÃO FISCAL AJUIZADA EM FACE DO ADQUIRENTE DA PROPRIEDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA. MULTA COMO PENALIDADE ADMINISTRATIVA, DIFERENTE DA OBRIGAÇÃO CIVIL DE REPARAR O DANO. (…) Isso porque a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, como demonstração de seu elemento subjetivo, e com demonstração de nexo causal entre a conduta e o dano. (…)
A responsabilidade civil por dano ambiental é subjetivamente mais abrangente do que as responsabilidades administrativa e penal, não admitindo estas últimas que terceiros respondam a título objetivo por ofensas ambientais praticadas por outrem”. (STJ – 2ª Turma – Recurso Especial 1.251.697-PR – Relator Min. Mauro Campbell Marques – Julgamento em 12.4.2012).
Portanto, de rigor o reconhecimento de que a responsabilidade administrativa é objetiva e não restou demonstrada no caso dos autos.
3. PEDIDO DE REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA AMBIENTAL
Na hipótese de este d. Juízo não entender pela anulação do auto de infração ambiental, requer, no mínimo, a redução do seu valor, pois a sua imposição se mostra exorbitante e representa medida completamente ilegal e desarrazoada. No caso, a multa ambiental aplicada deve ser revista, pois viola flagrantemente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, senão vejamos.
De se perceber, que a Lei Federal 9.784/99 determina à Administração Pública, no inciso VI, do art. 2º, estrita observância à adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Referida norma também obriga a Administração Pública a obedecer os princípios na condução de processos administrativos: legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
E o valor da multa aplicado à Autora é desproporcional, tendo em vista que, como visto, a conduta imputada à Autora não pode ser considerada como gravíssima, além de que não houve efetivamente qualquer benefício com o incêndio, o que por si só conduz a necessidade de redução da multa ambiental.
Vale mencionar que a sanção administrativa deve ser adequada à finalidade do ato. Com efeito, ao penalizar determinado infrator, o Agente deve observar a relação entre a finalidade da sanção e o dano efetivamente praticado. Hely Lopes Meirelles[1] afirma que:
Embora a graduação das sanções administrativas (…) seja discricionária, não é arbitrária, e por isso deve guardar correspondência e proporcionalidade com a infração apurada, no respectivo processo.