Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) de Direito da Vara da Comarca de…
Parte impetrante, brasileiro (a), estado civil, profissão, inscrito (a) no RG sob o n… e CPF…, residente e domiciliado (a) na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, endereço eletrônico…, vem, por seus advogados, à presença de Vossa Excelência, impetrar mandado de segurança com pedido liminar contra ato ilegal praticado por Parte impetrada, autoridade vinculada ao Órgão Público, brasileiro (a), estado civil, profissão, inscrito (a) no RG sob o n… e CPF…, residente e domiciliado (a) na Rua…, n…, Bairro…, Cidade/UF, CEP…, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
1. Da síntese dos fatos
No dia, por volta das, o policiamento ambiental compareceu numa chácara cujo endereço corresponde ao Endereço, e lá depararam com um grupo de aproximadamente 50 pessoas que participavam de um churrasco, sendo que no mesmo local foram apanhados galos da espécie Índio Brasileiro, os quais são comumente utilizados para combates denominados rinhas.
Ocorre que a chácara a qual pertence à família de um amigo do impetrante é um local que conta com infraestrutura para sediar festas e sempre foi utilizado para esta finalidade, inclusive, o impetrante já conhecia a chácara de outros eventos e jamais houve rinha de galos ou mesmo a criação desses animais no local. Pelo contrário, a casa conta com churrasqueira, piscina, dormitórios e demais infraestrutura para lazer.
Ressalta-se que de fato no dia da abordagem policial também havia um grupo de pessoas que promoviam brigas de galo no local, sendo que uma parte do imóvel foi visivelmente adaptada para funcionar como rinha.
Contudo, Excelência, com a entrada abrupta do policiamento no local, embora parte dos envolvidos com a rinha evadiram-se escalando o muro da propriedade, o fato é que grande parte dos organizadores foi apanhada e identificada, de modo que os agentes da autoridade coatora obtiveram êxito em identificar e responsabilizar boa parte dos transgressores.
Todavia, a equipe policial se dirigiu indistintamente para todos quanto estivessem na chácara, inclusive o impetrante que não possui galos e ali estava porque foi convidado pelo proprietário para participar de um churrasco, que de fato estava acontecendo no momento da abordagem e comunicou que todos os presentes seriam punidos administrativamente com multa, pois há previsão legal para punição pela simples presença no evento.
O policial responsável pela operação ainda justificou que a multa só seria consolidada após o atendimento ambiental e que caso alguém não estivesse participando da rinha teria oportunidade de apresentar defesa nesse sentido durante o atendimento ambiental.
Cabe salientar que a ocorrência se arrastou durante aquela tarde e que o delegado de polícia Dr. também se deslocou até o local e comunicou que responderiam processo somente os envolvidos com a rinha de galos.
Assim, foi lavrado o Auto de Infração Ambiental n°, sendo imputada ao ora impetrante a Multa Simples no valor de R$ 00.000,00.
Eis o breve relato.
2. Preliminar de mérito
2.1 Da ilegalidade da Resolução 48 da (Secretaria Estadual do Meio Ambiente – SMA-SP.)
O exercício do poder de polícia está regulamentado no ordenamento jurídico e se sujeita ao princípio da legalidade (Art. 37 CF/88) com o escopo de não caracterizar o desequilíbrio na relação existente entre a Administração Pública e os administrados.
Desse modo, não obstante aos foram conferidas prerrogativas constitucionais para legislar, fiscalizar e executar questões que envolvam o meio ambiente, essas competências não foram distribuídas no mesmo patamar para toda atividade desempenhada pelo Nome Membro.
Assim, a Carta Constitucional asseverou que a competência legislativa em matéria ambiental é concorrente, cabendo à legislação federal legislar sobre matéria de interesse geral e aos entes estaduais legislarem de maneira suplementar, de modo que não haverá para estes a liberdade para inovar ou ampliar o conteúdo normativo já regulamentado na esfera federal.
Diferentemente, a competência para a fiscalização ambiental é comum, podendo as três esferas de poder igualmente atuar neste ínterim, inclusive exercer o poder de aplicar multas administrativas, propor medidas para recomposição do dano ambiental causado, entre outras, ressalvada apenas a vedação do bis in idem , de modo que quando houver a atuação simultânea de mais de um órgão de fiscalização, prevaleça aquele competente para o licenciamento ambiental.
Dito isto passa-se análise da ilegalidade da norma utilizada para autuação do impetrante, tanto quanto aos seus aspectos extrínsecos (extrapolação da competência legislativa), quanto aos seus aspectos intrínsecos (inobservância do conteúdo normativo).
A autuação teve por fundamentação legal Resolução expedida pela Secretaria de Nome do Meio Ambiente, cujo texto se transcreve:
Resolução SMA 048 – Art. 29 “caput”:
Praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos, nativos ou exóticos.
Multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) por indivíduo.
§ 1° – Incorre nas mesmas sanções quem:
II – Realiza, promove ou participa, mesmo como expectador, de lutas entre animais da mesma espécie ou de espécie diferente.
Ocorre que a referida Resolução Estadual foi editada para complementar a Lei Federal 9.605/98, que sobre o mesmo tipo assim dispôs:
DA INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
§ 1° São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização , bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6°:
II – multa simples;
§ 3° A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
I – advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;
II – opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.
Veja-se que embora o impetrante seja primário e não tenha sido identificado pelos agentes da autoridade policial como proprietário de galo utilizado para combate, a autoridade coatora impôs a multa no valor de R$ 00.000,00, valor acima da multa mínima de R$ 00.000,00 e sem que lhe fosse sequer aplicada preliminarmente a advertência prevista no inciso I, do referido art. 72 da Legislação Federal.
Dito isto percebe-se que o Nome Membro extrapolou a sua competência para fiscalização ambiental e adentrou indevidamente na competência legislativa 1 , não para o exercê-la de maneira suplementar conforme previsão constitucional, mas para inovar com tipo não criado pelo Poder Legislativo Federal, sendo que além de estender a penalidade de multa para o expectador de rinha, ainda majorou o valor mínimo da multa para R$ 00.000,00.
O Decreto Federal n° 6.514, de 22 de julho de 2008, publicado para regulamentar a Lei Federal 9.605/98, estabeleceu os seguintes parâmetros quanto às infrações sanções administrativas ao meio ambiente:
Art. 9 o O valor da multa de que trata este Decreto será corrigido, periodicamente, com base nos índices estabelecidos na legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinquenta reais) e o máximo de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais).
Art. 29. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais) por indivíduo.
Mais uma vez está comprovada a patente ilegalidade da multa aplicada pela autoridade coatora, eis que por simples resolução estendeu a sanção administrativa para o expectador de ato de maus tratos aos animais e alçou o valor da multa para R$ 00.000,00, ou seja: valor máximo previsto no Decreto Federal que já havia regulamentado a matéria, portanto, neste ínterim esgotado a competência legislativa.
Como é consabido, para aplicação de penalidade de multa acima do valor mínimo previsto é necessária fundamentação idônea, mais ainda no caso presente que o Decreto Federal exige como pressuposto para aplicação da penalidade de multa que o administrado tivesse sido advertido previamente do dano ambiental praticado, o que não houve.
2.2 Da nulidade da autuação por ausência do Atendimento Ambiental
No Nome foi editado o Decreto Estadual na 60.342/14, o qual dispõe sobre o procedimento para imposição de penalidades, no âmbito do Sistema Estadual de Administração da Qualidade Ambiental, Proteção, Controle e Desenvolvimento do Meio Ambiente e Uso Adequado dos Recursos Naturais – SEAQUA.
Eis como está regulamentado o procedimento para imposição de penalidades decorrentes de violação ao meio ambiente no Nome:
Artigo 4° – Constatada a infração, será lavrado o Auto de Infração Ambiental, notificando-se o autuado a comparecer, na data agendada, ao Atendimento
Ambiental que será realizado nos termos dos artigos 7° a 12 deste decreto. O atendimento ambiental está previsto no art. 7° do referido Decreto Estadual 60.342/14, que assim dispõe:
Art. 7° – O Atendimento Ambiental será realizado no prazo de 10 (dez) a 40 (quarenta) dias após a intimação da lavratura do Ato de Infração Ambiental. Parágrafo único – O prazo máximo a que alude o “caput” deste artigo poderá ser prorrogado, motivadamente, por até 20 (vinte) dias, na impossibilidade de seu atendimento pela Administração.
Artigo 8° – No Atendimento Ambiental serão consolidadas as infrações e as penalidades cabíveis, bem como propostas as medidas para a regularização da atividade objeto da autuação, observadas as circunstâncias agravantes e atenuantes a que se referem a Lei federal n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e o Decreto federal n° 6.514, de 22 de julho de 2008, na forma estabelecida em resolução do Secretário do Meio Ambiente.
Parágrafo único – A consolidação das infrações e das penalidades a que alude o “caput” deste artigo ocorrerá de forma motivada, após prévia análise do Auto de Infração Ambiental, e não estará vinculada às sanções aplicadas pelo agente autuante, inclusive no tocante ao valor da multa, que poderá ser reduzido, mantido ou majorado, respeitados os limites legais.
Outrossim, depreende-se do Auto de Infração Ambiental que a intimação do requerente ocorreu no próprio ato, ou seja, em DATA. Contudo, o Atendimento Ambiental foi agendado para o dia DATA.
Ou seja, mesmo se considerado o prazo máximo para o atendimento ambiental (40 dias, prorrogados por mais 20 dias, conforme determina o art. 7a e seu parágrafo único), o prazo total que a autoridade coatora teve para realizar o atendimento ambiental foi de 60 dias.
Logo, não há mais se falar em imposição de penalidade de multa por que o impetrado decaiu do direito em DATA, o que irremediavelmente implica na nulidade do Auto de Infração Ambiental n° , vez que não foi assegurado em tempo hábil a oportunidade para o impetrante exercer a sua defesa em atendimento ambiental previsto no Decreto Estadual 60.342/14.
Assim, em não havendo atendimento ambiental pela desídia da autoridade coatora não há possibilidade de imposição de multa, devendo a ordem ser concedida para anular a autuação e consequente penalidade imposta ao impetrante.

3. Do direito líquido e certo
“O mandado de segurança é, assim, um remédio constitucional, com natureza de ação civil , posto à disposição de titulares de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. (…) o nome de remédios de Direito Constitucional, ou remédios constitucionais, no sentido de meios postos à disposição dos indivíduos e cidadãos para provocar a intervenção das autoridades competentes, visando sanar, corrigir, ilegalidade e abuso de poder em prejuízo de direitos individuais . Alguns desses remédios revelam-se meios de provocar a atividade jurisdicional, e, então, têm natureza de ação: são ações constitucionais” 2
Assim dispõe a Carta Constitucional:
LXIX – conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo , não amparado por habeas corpus ou habeas data , quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;
A Lei 12.016/2009, que regulamentou o procedimento do Mandado de Segurança, praticamente repetiu o texto da Constituição Federal:
Art. 1 o: Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.
Ainda foi estipulado o prazo de 120 dias após a ciência do ato impugnado para que a parte que teve seu direito violado ingresse com a medida (Art. 23), o que foi observado pelo impetrante.
Dito isto, resta patente que o ato da autoridade coatora, ao impor a penalidade de multa simples, aplicando a Resolução 048 da Secretaria de Meio Ambiente do Nome, art. 29, §1° é ilegal porque a referida norma extrapolou a competência legislativa do ente estatal , vez que a Lei Federal 9.605/98, bem como o Decreto Regulamentador n° 6.514, de 22 de julho de 2008 já dispuseram sobre a penalidade administrativa aplicada no caso de dano ambiental, de modo que por ato emanado do Poder Executivo (Secretaria de Nome) a Resolução aplicada inovou criando a penalidade de multa para o mero espectador de rinha de galo, além de não observar a necessidade de prévia advertência como condição para aplicação da penalidade de multa e, ainda, majorou o valor mínimo da multa de R$ 00.000,00 para R$ 00.000,00.
Ademais, ainda que fosse válida a norma estadual, caso inexistente o vício já apontado, veja-se que também pelos próprios aspectos que lhe são intrínsecos a autuação de multa imposta ao impetrado é ilegal por desrespeito ao procedimento delimitado no Decreto Estadual n° 60.342/14, publicado para regulamentar a aplicação de penalidades administrativas decorrentes de violação ao meio ambiente.
Isso porque, o decreto regulamentador dispôs que as infrações ambientais e sanções aplicadas pela autoridade coatora só serão consolidadas após o Atendimento Ambiental.
De outra banda, como a fiscalização e autuação evidentemente se trata de restrição imposta pela administração ao direito do administrado é certo que ela deverá ser exercida num prazo razoável, sob pena da atuação estatal impingir grave desequilíbrio na relação com os indivíduos.
Eis que após a abordagem policial e imposição da penalidade de multa, ocorrida em DATA a autoridade coatora tinha a sua disposição os prazos fixados no artigo 7° do referido Decreto Estadual n° 60.342/14 e não o fez, deixando transcorrer in albis o prazo de natureza decadencial, pois guarda relação direta com o próprio direito de aplicar sanção, então, a declaração de nulidade da penalidade imposta no Auto de Infração Ambiental n°é medida que se impõe, por caracterizar ato contrário à Lei e apto a violar o direito do impetrado.
4. Da liminar
A liminar consiste numa ordem judicial que tem como escopo resguardar direitos alegados pela parte antes da discussão do mérito da causa. Para a concessão de liminar é necessário estar demonstrado o fumus boni iuris e o periculum in mora , ou seja, deve estar claro que a demora na decisão poderá acarretar eventuais danos ao direito pretendido, bem como a presença aparente de uma situação que ainda não foi inteiramente comprovada.
Quanto ao fumus boni iuris está presente tão somente pelos fatos informados e comprovados nos autos e na legislação aplicada ao tema. Eis que o impetrante nem mesmo adentrou no mérito da autuação.
E não o fez por ausência de motivos, vez que conforme descreveu os fatos participava de um churrasco numa chácara alugada para recreação, sem qualquer interesse em assistir combate entre galos.
Outrossim, a ilegalidade da norma estadual aplicada somada a inobservância de prazo para o atendimento ambiental estão devidamente lastreados no ordenamento jurídico.
Já o periculum in mora decorre da consequência que a consolidação da penalidade de multa aplicada, ainda que em desacordo com a legislação, faz carrear para o impetrante. Eis que caso mantida a multa a ausência de pagamento enseja a inscrição do débito indevido na dívida ativa do Nome, e por consequência o ônus de um novo processo judicial.