EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE FLORIANÓPOLIS – SC
AUTOR, brasileiro, solteiro, empresário, inscrito no RG e CPF, residente e domiciliado na, Florianópolis/SC, CEP, endereço eletrônico, vem, à presença de Vossa Excelência, por seu advogado, propor
em face de ESTADO DE SANTA CATARINA, pessoa jurídica de direito público, por seu Procurador, com endereço profissional na, Florianópolis-SC, CEP, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.
1. DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL
No dia o Batalhão de Polícia Militar Ambiental lavrou auto de infração ambiental em face do Autor, pela suposta infração capitulada no art. 50 do Decreto 6.514/08, com a seguinte redação:
Art. 66. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, atividades, obras ou serviços utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, em desacordo com a licença obtida ou contrariando as normas legais e regulamentos pertinentes:
Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).
Na mesma ocasião, foi lavrado o termo de embargo e arbitrada multa no valor de R$, originando o Processo Administrativo de Infração Ambiental.
1.1. Rito processual administrativo – Nulidade da intimação por edital
O Autor apresentou defesa prévia no dia, e o fiscal foi instado a se manifestar acerca da defesa prévia.
Posteriormente, foi expedida intimação por via postal para que o Autor apresentasse alegações finais. No entanto, a intimação restou inexitosa, porque foi enviada ao endereço errado.
A certidão juntada aos autos do processo administrativo ambiental comprova que constou “MUDOU-SE”. Inexiste nos autos qualquer tentativa de localização ou consulta do novo endereço do Autor.
Diante disso, foi procedida a intimação por edital em, mas o prazo para apresentar alegações finais transcorreu in albis.
No dia, a autoridade ambiental julgou o processo administrativo e homologou o auto de infração ambiental, mantendo a sanção de multa ambiental no valor de R$ e determinando a demolição da edificação, mesmo diante da intimação por edital.
Ocorre que, o processo administrativo relativo ao Auto de Infração Ambiental e Termo de Embargo está eivado de vícios, porquanto a intimação por edital para apresentação de alegações finais viola direitos fundamentais do autuado, razão pela qual requer seja anulado, conforme passa a expor.
2. AUSÊNCIA DE REGULAR INTIMAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE ALEGAÇÕES FINAIS – INTIMAÇÃO POR EDITAL IRREGULAR
É mister esclarecer que da análise perfunctória do processo administrativo, verifica-se a ausência de regular intimação do Autor/Autuado para apresentar alegações finais, porquanto não houve o esgotamento das tentativas de notificá-lo ou intimá-lo pessoalmente ou por via postal.
Isso porque, o art 107 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/2019 determina expressamente a necessidade de intimação do autuado para que apresente alegações finais. Destaca-se:
Art. 107. O autuado será intimado sobre a apresentação de Alegações Finais através de ofício, por via postal registrada, com aviso de recebimento – AR ou mediante intimação pessoal.
Parágrafo único. Considerando-se, ainda, a impossibilidade de intimação pessoal do autuado, após 02 (duas) tentativas devidamente certificadas nos autos de entrega via postal, deverá a ciência ser realizada mediante edital, por meio de publicação no Diário Oficial do Estado – DOE.
Regra do Decreto 6.514/08:
Art. 122. Encerrada a instrução, o autuado terá o direito de manifestar-se em alegações finais, no prazo máximo de dez dias.
Parágrafo único. A autoridade julgadora notificará o autuado por via postal com aviso de recebimento ou por outro meio válido que assegure a certeza de sua ciência, para fins de apresentação de alegações finais.
No plano constitucional, o direito ao contraditório e ampla defesa foi consagrado como um direito fundamental, nos termos do inciso LV do art. 5° da Lei Maior, in verbis:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
O princípio do devido processo legal se erige como um valor caro à democracia e indispensável à própria existência de um Estado de Direito. Demonstrada, destarte, a ocorrência do cerceamento de defesa da Excipiente, com a violação clara aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Ademais, o princípio da legalidade também é garantia constitucional, vinculando à Administração à Lei, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, […].
2.1. Lei Federal 9.784 aplicável ao processo administrativo
Aliás, o próprio Decreto 6.514/08 determina que o processo administrativo será orientado pelo princípio da legalidade:
Art. 95. O processo será orientado pelos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência, bem como pelos critérios mencionados no parágrafo único do art. 2º da Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
Por sua vez, o referido art. 2º da Lei 9.784/99, enfatiza:
Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
I – atuação conforme a lei e o Direito;
II – atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;
III – objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;
IV – atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;
V – divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;
VI – adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;
VII – indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;
IX – adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;
X – garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;
XI – proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;
XII – impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;
XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.
2.2. O que diz a doutrina
Nesse diapasão, o emérito Professor Carvalho Filho [1] ensina:
O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita.
Tal postulado, consagrado após séculos de evolução política, tem por origem mais próxima a criação do Estado de Direito, ou seja, do Estado que deve respeitar as próprias leis que edita.
O princípio “implica subordinação completa do administrador à lei. Todos os agentes públicos, desde o que lhe ocupe a cúspide até o mais modesto deles, devem ser instrumentos de fiel e dócil realização das finalidades normativas”. […]
O princípio da legalidade denota exatamente essa relação: só é legítima a atividade do administrador público se estiver condizente com o disposto na lei.
O professor Celso Antônio Bandeira de Mello [2] lembra da subordinação da Administração às leis, principalmente à Constituição:
O princípio da legalidade explicita a subordinação da atividade administrativa à lei e surge como decorrência natural da indisponibilidade do interesse público, noção esta, que, conforme foi visto, informa o caráter da relação de administração.
No Brasil, o art. 5º, inciso II, da Constituição dispõe: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
2.3. Não esgotamento dos meios de intimação
Fato incontroverso, é que não há nos autos do processo administrativo, qualquer tentativa de intimação do Autor/Autuado para apresentar alegações finais, limitando-se, a autoridade administrativa, a determinar a intimação por edital, sem esgotar os meios necessários de localização do autuado.
Logo, não se afigura razoável admitir que, a pretexto da autoridade administrativa, seja estatuído um rito diferente daquele previsto no ordenamento jurídico, suprimindo fase de total relevância, sem macular a garantia constitucional.
Com efeito, em se tratando de processo administrativo para aplicação de multa por danos ambientais e penalidade de demolição, devem ser observados o contraditório e a ampla defesa, oportunizando-se ao autuado a efetiva intimação pessoal ou postal para fins de manifestação quanto à autuação, tanto para o pleno exercício da defesa, como para ciência dos atos administrativos.
É dizer que, a intimação por edital somente pode ocorrer após o esgotamento de todas as tentativas de intimação ou notificação pessoal ou por via postal, o que não ocorreu no processo administrativo ambiental em tela.
Nesse sentido, quando o endereço do autuado for conhecido do órgão ambiental, a intimação para apresentação de alegações finais somente pode ocorrer pela via editalícia, se frustradas todas as tentativas de intimação pessoal ou postal.
E, se o endereço for desconhecido, caberá à autoridade administrativa realizar as devidas consultas e pesquisas para se certificar de que o endereço do autuado não consta nos sistemas.
Isso porque, a intimação editalícia constitui ultima ratio, porquanto induz a um juízo ficto, de presunção, acerca da ciência do interessado, e não de certeza como a intimação pessoal ou postal.
Ressalte-se, que não é possível presumir a intimação do autuado antes de empreender diligências para localizar o autuado.
2.4. Conclusão
A autoridade ambiental tem o dever de cientificar o autuado no seu domicílio, mormente quando esse dado existe no processo administrativo, não podendo tratar esse requisito fundamental como se fosse exigência meramente formal.
Repise-se que, quando emitida a decisão final de primeira instância, a autoridade ambiental se deslocou até o endereço do Autuado/Autor para intimá-lo a pagar a multa e cumprir com a sanção imposta de demolição.
Portanto, requer a anulação do processo administrativo relativo ao Auto de Infração Ambiental e Termo de Embargo, porque a intimação do Autuado/Autor foi realizada por edital sem que tivessem sido esgotadas as tentativas de intimá-lo pessoalmente ou pela via postal.
3. TUTELA DE URGÊNCIA PARA SUSPENDER DEMOLIÇÃO
O que se pretende com o pedido de tutela de urgência é tão somente suspender os efeitos da Decisão Administrativa de Penalidade proferida nos autos do Processo Administrativo de Infração Ambiental, até o julgamento definitivo da presente ação, conforme autoriza o Código de Processo Civil:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
3.1. Preenchimento dos requisitos da tutela antecipada
No caso, a probabilidade do direito resta consubstanciada nos documentos acostados ao processo administrativo, que comprovam a falha na intimação por edital do Autuado/Autor para apresentação de alegações finais, quando o endereço do Autor era plenamente conhecido, e ainda que não fosse, não há nenhuma prova nos autos do processo administrativo de pesquisa de endereço ou tentativa de intimação ou notificação.
Já o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo subsiste no fato de que o descumprimento das obrigações estabelecidas poderá acarretar na aplicação de multa R$ 1.000,00 a R$ 1.000.000,00 por infringência do art. 80 do Decreto 6.514/2008, além da deflagração de ação civil pública para cobrança de indenização e imposição de reparar integralmente o suposto dano ambiental, aplicando a penalidade de demolição, uma medida extrema que somente pode ser adotada em casos excepcionais.