ILUSTRÍSSIMA AUTORIDADE AMBIENTAL FISCALIZADORA DO INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE – IMA DE SANTA CATARINA
RECORRENTE, brasileiro, casado, empresário, inscrito no RG expedido pela SSP/SC e CPF, residente e domiciliado na Rua, CEP, vem, por seu advogado, à presença de Vossa Senhoria, com fundamento no art. 127 do Decreto 6.514/08 e art. 135 da Portaria Conjunta CPMA/IMA 143/19, interpor
RECURSO DE AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL POR DESCUMPRIR TERMO DE EMBARGO
contra decisão administrativa proferida nos autos em epígrafe que não conheceu a defesa prévia apresentada pelo Recorrente, e se não for caso de retratação no prazo de cinco dias (art. 127, § 1º, Decreto 6.514/08), requer seja concedido o efeito suspensivo, pois, presente o justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação (art. 128, § 1º, Decreto 6.514/08), e encaminhado ao órgão superior para julgamento, cujas razões seguem acostadas.
Pede deferimento.
LOCAL E DATA.
ADVOGADO
ILUSTRÍSSIMO PRESIDENTE DO CONSELHO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE CONSEMA – ESTADO DE SANTA CATARINA
Recorrente
Advogado
Processo administrativo ambiental
Auto de infração ambiental
NOTÁVEIS MEMBROS DA CÂMARA RECURSAL DO CONSEMA
ILUSTRE RELATOR (A)
RAZÕES DO RECURSO ADMINISTRATIVO
1. DA TEMPESTIVIDADE
O Recorrente recebeu a notificação que julgou improcedente a defesa prévia apresenta contra o auto de infração ambiental e fixou multa ambiental, notificando-o do prazo de 20 dias contados da ciência do despacho de penalidade para interposição de recurso administrativo ao CONSEMA, de modo que, flagrante a tempestividade do presente do recurso.
2. BREVE SÍNTESE DO AUTO DE INFRAÇÃO AMBIENTAL E DA DECISÃO ADMINISTRATIVA GUERREADA
O Recorrente foi autuado pela Polícia Militar Ambiental de Santa Catarina, lavrando-se o auto de infração ambiental com multa ambiental e termo de embargo, pelo suposto cometimento da seguinte infração ambiental assim sumariamente descrita:
Promover construção de casa em alvenaria dento da APA do Entorno Costeiro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, sem a devida anuência ambiental do órgão competente.
Para a Polícia Militar Ambiental, a norma infringida foi a prevista no art. 91 do Decreto 6.514/08, in verbis:
Art. 91. Causar dano à unidade de conservação:
Posteriormente, uma equipe de fiscalização da Gerência da extinta FATMA (atual IMA) se deslocou ao endereço do Recorrente, ocasião em que teria constatado um suposto descumprimento do termo de embargo aplicado pela Polícia Militar Ambiental, e então, lavrou o auto de infração ambiental que é objeto destes autos com enquadramento no art. 79 do Decreto Federal 6.514/08, assim redigido:
Art. 79. Descumprir embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas:
A descrição sumária da infração foi lançada:
Descumprir ao termo de embargo.
Em decorrência disso, a agente fiscal lavrou novo auto de infração ambiental foi enviado ao Recorrente por carta com aviso de recebimento, e após os trâmites processuais, sobreveio decisão da autoridade ambiental fiscalizadora que manteve a penalidade.
Ocorre que, o auto de infração ambiental lavrado pelos agentes de fiscalização da então FATMA, está eivado de vício na sua origem, de modo que a reforma da decisão de primeira instância é imperativa, conforme passa a demonstrar.
3. PRELIMINARMENTE
3.1. IMÓVEL CONSTRUÍDO HÁ MAIS DE DUAS DÉCADAS DA DATA DA AUTUAÇÃO – VÍCIO INSANÁVEL
Conforme consta nos autos, a Polícia Militar Ambiental lavrou o auto de infração ambiental e termo de embargo por entender que o Recorrente estaria “promovendo construção de casa em alvenaria” dentro da APA do Entorno Costeiro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, e quando alvo de nova fiscalização da extinta FATMA, os agentes de fiscalização entenderem que teria ocorrido descumprimento do aludido termo de embargo e lavraram auto de infração para essa conduta.
Ocorre que o auto de infração lavrado pela Polícia Militar Ambiental é nulo e consequentemente todos os atos daí decorrentes também são, incluindo o novo auto lavrado pela FATMA/IMA discutido nestes autos, pelo simples fato de que o Recorrente não promoveu qualquer edificação, conforme demonstram as imagens históricas obtidas no Google Earth Pro que comprovam a existência da edificação desde antes de 09 de janeiro de 2003:
Em verdade, o que ocorreu foi a mera elevação do piso da residência em virtude de que qualquer chuva era apta a causar alagamentos na localidade e consequentemente danos no interior da edificação do Recorrente.
Como se vê, não foi promovida nenhuma construção de casa em alvenaria, mas sim, melhorias que não subsumem à conduta descrita no art. 91 (causar dano à unidade de conservação) utilizado para motivar o auto de infração ambiental lavrado pela Polícia Militar Ambiental, e desse modo, há patente nulidade do auto de infração aqui discutido, isto é, se aquele ato era nulo, os daí decorrentes também serão.
Vale destacar que a conduta descrita pela Polícia Militar Ambiental que ensejou o auto de infração da FATMA/IMA foi comunicada ao Ministério Público de Santa Catarina que ajuizou a competente ação penal, a qual foi instruída com o Laudo Pericial que foi assim repisado pela MM Juíza de Direito que proferiu sentença de absolvição:
Paralelamente, o laudo pericial não foi conclusivo quanto a existência de danos causados pela edificação, pois, limitou-se, a descrever que “o imóvel pericial não se encontrava em topo de morro, encosta com inclinação superior à 45º ou próximo à corpo d’água, tampouco fora constatada supressão vegetal no local”. Relatou, ainda, o perito que a região onde se situava o imóvel “tratava-se de uma área urbana consolidada”, bem como que “no entorno imediato do terreno motivo pericial havia diversas outras residências”.
Denota-se, portanto, que não há especificação no laudo acerca dos reais e efetivos danos ambientais gerados, como a supressão de vegetação e de recursos naturais ou o prejuízo causado à unidade de conservação, o que se faz imprescindível no presente caso, haja vista tratar-se de crime material, bem como porque a unidade de conservação em que se encontra a edificação do réu é classificada como de uso sustentável.
Além disso, a testemunha […] confirmou, em juízo, que a região onde está localizada a residência do réu, antes da aprovação da lei que alterou os limites do Parque, em 2009, já era considerada uma área de ocupações consolidadas, bem como que referida região ia ser desanexada do Parque, segundo estudo da FATMA, e que não teria nenhuma restrição ambiental.
Assim, fica evidente que a área da edificação está antropizada, o que, além de relatado pela testemunha e mencionado pelo perito, é possível de ser observado pelas imagens constantes no laudo pericial. Pelo exposto, não há nos autos a comprovação de possíveis danos ambientais advindos da conduta do réu, o que impossibilita a imposição de um decreto condenatório, mormente porque o dano é elementar do tipo penal imputado ao acusado.
Não se desconhece a independência das esferas administrativa e penal. Ocorre que, a própria sentença, fundamentada em laudo pericial elaborado por perito oficial reconheceu a inexistência de dano ambiental à Unidade de Conservação de Uso Sustentável.
E ainda que se entenda diferente, as imagens históricas comprovam a existência da edificação já no ano de 2003, ou seja, é totalmente equivocada e inverossímil a alegação da Polícia Militar Ambiental de que o Recorrente “promoveu construção de casa em alvenaria” pela qual resultou no presente processo administrativo.
Ora. Em se tratando de reforma sem ampliação da área construída e, consequentemente, sem aumento de suposta degradação do local já impactado, evidente que a conduta não acarreta “nova incidência” ou “renovação” da infração.
Não houve, portanto, infração administrativa ambiental quanto à residência existente, posto que a melhoria realizada se deu exclusivamente sobre área anteriormente construída e assim não há de se falar em descumprimento de termo de embargo eivado de vício, de modo que a reforma da decisão da autoridade fiscalizadora ambiental de primeira instância é medida que se impõe.
4. DO MÉRITO
A Constituição Federal de 1988 assegura em seu art. 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, e ainda:
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Partindo desse princípio, sabe-se que a imposição de multa administrativa possui caráter penalizador, e, afigurando-se como medida rigorosa e privativa de uma liberdade pública constitucionalmente assegurada, exige-se a demonstração cabal da autoria e materialidade, que são pressupostos autorizadores da imposição de sanção.
Nesse sentido, na hipótese de constarem nos autos elementos que conduzam à dúvida acerca da materialidade e autoria delitiva ─ in casu, se houver dúvida sobre a existência de danos ambientais, ou seja, se houve descumprimento de termo de embargo ─, o cancelamento do auto de infração é medida que se impõe, em observância ao princípio do in dubio pro reo, princípio clássico aplicável não apenas no Direito Penal, mas em todo Poder Estatal de punir, de modo se afastar a tipicidade material da conduta.
Isso porque, o ius puniendi do Estado é único, de modo que, a aplicação dos princípios penais e processuais penais garantistas e limitadores devem ser estendidos também, ao Direito Administrativo Sancionador, porque as infrações administrativas se diferenciam das penais tão somente em relação à autoridade que às aplica.
Desse modo, o Direito Administrativo Sancionador não pode constituir instância mais prejudicial ao administrado, revestido de ilegalidades e arbitrariedades, até porque, assim como no Direito Penal, são necessários elementos seguros que apontem para a existência de norma violada, tais como, tipicidade, lesividade, antijuridicidade e culpabilidade.
De igual forma, também cabe a aplicação do princípio da insignificância no Direito Administrativo Sancionador, a indicar a inaplicação da sanção administrativa quando houver mínima ofensividade da conduta, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica causada, como é caso em questão.
Aliás, o fundamento do princípio da insignificância é a inexpressividade da ofensa ao bem jurídico, ou seja, a tipicidade exige que o bem jurídico protegido pela norma que prevê a infração administrativa, cause efetivo dano. Infrações minimamente ofensivas ao meio ambiente não podem ser consideradas infrações à ordem administrativa, mas sim, meras irregularidades que não autorizam a aplicação de penas.
Não se desconhece a inexistência expressa de previsão legal para aplicação de tais princípios na esfera administrativa. Entretanto, em homenagem aos princípios e direitos do autuado, constitucionalmente assegurados, e até por força do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, é que se impõe estender o princípio do in dubio pro reo ou o da insignificância ao caso concreto, até porque, trata-se de infração administrativa aberta, que exige da autoridade julgadora cautela na aplicação da sanção.
4.1. ERRO NO ENQUADRAMENTO
Não obstante a inafastável prescrição intercorrente, evidencia-se ainda, erro no enquadramento da suposta infração quando da sua lavratura pela Polícia Militar Ambiental, de modo que, todos os atos daí resultantes, como o é o auto de infração lavrado pela FATMA/IMA, são nulos por vício na origem.
Isso porque, quando lavrou o auto de infração, a Polícia Militar Ambiental indicou como norma infringida o art. 91 do Decreto 6.514/08, in verbis:
Art. 91. Causar dano à unidade de conservação:
A descrição sumária da infração restou assim redigida:
Promover construção de casa em alvenaria medindo 5×12=60m², dentro da APA do Entorno Costeiro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, sem a devida anuência ambiental do órgão competente.
Sobre essa conduta, foi lavrado o termo de embargo considerado pela FATMA/IMA como descumprido, ensejando no auto de infração objeto do presente processo administrativo, o qual já dissemos, maxima venia, que é nulo por vício na origem ante a comprovação de que nenhuma construção foi promovida.
Não obstante, tem-se que, se a conduta imputada ao Recorrente foi “promover construção de casa em alvenaria”, e além disso, inexiste laudo de danos efetivos causados a APA do Entorno Costeiro do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, logo, por lógica decorrência dos fatos, a única conduta que poderia ser praticada pelo autuado (se ela que existiu) é a tipificada no art. 74 do Decreto 6.514/08, que dispõe:
Art. 74. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Repise-se que o Laudo Pericial que instruiu a ação penal na qual figurou o Recorrente como Réu, justamente pela conduta descrita no auto de infração da Polícia Militar Ambiental, foi categórico em afirmar que
O imóvel pericial não se encontrava em topo de morro, encosta com inclinação superior à 45º ou próximo à corpo d’água, tampouco fora constatada supressão vegetal no local (fl. 26). […] Tratava-se de uma área urbana consolidada. […] No entorno imediato do terreno motivo pericial havia diversas outras residências. (fl. 24).
E a MM Juíza de Direito, ainda mais categoria, sentenciou:
Denota-se, portanto, que não há especificação no laudo acerca dos reais e efetivos danos ambientais gerados, como a supressão de vegetação e de recursos naturais ou o prejuízo causado à unidade de conservação, o que se faz imprescindível no presente caso, haja vista tratar-se de crime material, bem como porque a unidade de conservação em que se encontra a edificação do réu é classificada como de uso sustentável. […] Pelo exposto, não há nos autos a comprovação de possíveis danos ambientais advindos da conduta do réu, o que impossibilita a imposição de um decreto condenatório, mormente porque o dano é elementar do tipo penal imputado ao acusado.
Assim, não há como acolher a manutenção da pretensão punitiva quanto à conduta por suposta infração ao art. 91 do Decreto 6.514/08, na medida que o fato específico que consubstancia a presença da elementar do tipo administrativo, na hipótese de causar dano à unidade de conservação, configura mero exaurimento do ato de erigir obra em área não edificável.
É claro que o que se discute nestes autos, é o auto de infração ambiental por descumprimento de termo de embargo, cujo qual foi originado a partir de outro auto de infração que não fez o adequado enquadramento da infração (se é que ela existiu), isto é, trata-se de ato originário nulo que acarreta na nulidade de todos os atos subsequentes, aí incluído o auto de infração ambiental lavrado pela FATMA/IMA que aplicou vultuosa quantia a título de valor de multa.
Portanto, requer a reforma da decisão da autoridade fiscalizadora ambiental para reconhecer o erro no enquadramento do ato de origem que vicia os atos subsequentes, declarando nulo o auto de infração aqui em revisão.
4.2. ATIPICIDADE DA CONDUTA
Outra constante no caso recorrido, é a tipicidade, conceituada como um dos elementos do fato típico e para que seja reconhecida diante de uma suposta violação às normas ambientais, reclama seus elementos, dos quais destacamos o formal e o material.
A tipicidade formal consiste na subsunção do fato à infração administrativa, ou seja, se a conduta praticada pelo alegado transgressor preenche todos os elementos previstos pela norma que prevê a infração administrativa. Já a tipicidade material, é a valoração da conduta e do resultado, objetivando delimitar as condutas que realmente possuem relevância para o Direito Administrativo Sancionador.
Especificamente à tipicidade material, seria necessário que a conduta perpetrada pela Recorrente fosse juridicamente relevante, a fim de ter lesionado o bem jurídico tutelado, ao passo que, condutas consideradas irrelevantes ou insignificantes, não são capazes de materializar o fato típico, afastando a lesividade e tornando o fato atípico.
No caso, vê-se que o auto de infração homologado pela autoridade julgadora é frágil, pois não possui nenhum dos elementos do tipo apontado pela agente como infringido, o que implica em atipicidade formal.
Com efeito, não há que se falar em infringência à infração ao art. 91 do Decreto 6.514/08, porque a conduta supostamente perpetrada pelo Recorrente não se enquadra no conceito de causar dano à unidade de conservação, caracterizando, portanto, a atipicidade formal.
Por outro lado, de forma hipotética, ainda que se entenda presente a tipicidade formal, ou seja, a perfeita adequação entre a conduta e a infração administrativa do mencionado art. 91, a valoração da conduta e do resultado implica no reconhecimento da tipicidade material, ante a insignificância da lesão ao bem jurídico protegido pela norma.
Repise-se que o próprio Laudo Pericial que instruiu a ação penal na qual figurou o Recorrente como Réu, justamente pela conduta descrita no auto de infração da Polícia Militar Ambiental, foi categórico em afirmar que:
O imóvel pericial não se encontrava em topo de morro, encosta com inclinação superior à 45º ou próximo à corpo d’água, tampouco fora constatada supressão vegetal no local […] Tratava-se de uma área urbana consolidada. […] No entorno imediato do terreno motivo pericial havia diversas outras residências.
E a MM Juíza de Direito, ainda mais categoria, sentenciou:
Denota-se, portanto, que não há especificação no laudo acerca dos reais e efetivos danos ambientais gerados, como a supressão de vegetação e de recursos naturais ou o prejuízo causado à unidade de conservação, o que se faz imprescindível no presente caso, haja vista tratar-se de crime material, bem como porque a unidade de conservação em que se encontra a edificação do réu é classificada como de uso sustentável. […]
Pelo exposto, não há nos autos a comprovação de possíveis danos ambientais advindos da conduta do réu, o que impossibilita a imposição de um decreto condenatório, mormente porque o dano é elementar do tipo penal imputado ao acusado.