Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) de Direito da Vara da Comarca de
Parte recorrente, previamente qualificado nos autos em epígrafe, vem, à presença de Vossa Excelência, por seus advogados, interpor recurso de apelação com fundamento no art. 996 e art. 1009 do Código de Processo Civil, requerendo, após as formalidades legais, a remessa ao juízo ad quem para processamento e julgamento, cuja guia de preparo foi devidamente recolhida e está em anexo, OU, cuja guia de preparo não foi recolhida em razão da gratuidade judiciária.
Termos em que, pede deferimento.
Local, data.
Advogado
Egrégio Tribunal
Ínclitos Desembargadores (as)
Razões do Recurso de Apelação
1. Síntese dos fatos
A apelante foi autuada por “deixar descumprimento de determinações da apelada de comunicar o plantio em até 5 dias à Coordenação”, como fundamento legal específico a suposta violação ao artigo 2º da Lei nº 11.105/2005[1].
A apelante apresentou defesas administrativas contra os referidos Autos de Infração, alegando, em síntese, que as informações ao órgão competente foram prestadas em tempo, e ainda, no caso específico do Auto de Infração, sobre a modificação no local dos experimentos, que houve o pleno atendimento à legislação aplicável e aos Pareceres Técnicos, além da ausência de adequada motivação das autuações e violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade nas autuações impostas.
Com o indeferimento das defesas, foi apresentado recursos administrativo, reiterando as razões de nulidade das autuações, contudo, restaram improvidos.
Com o exaurimento da discussão na esfera administrativa, não houve outra alternativa à Apelante senão o ajuizamento da ação declaratória.
Na petição inicial da ação declaratória de nulidade do auto de infração ambiental, a Apelante demonstrou a improcedência das autuações impostas por alegada comunicação tardia dos plantios de experimentos aprovados.
Apresentada contestação e réplica pela apelada, o Juízo a quo julgou improcedente a ação declaratória de nulidade das autuações.
Com o devido respeito e acatamento, a r. sentença apelada merece ser reformada, conforme passa a expor.
2. As razões para o provimento da apelação – violação aos princípios da tipicidade e da motivação
Não bastasse a absoluta ausência de infração, sob o aspecto formal também há flagrante nulidade na autuação. Os Autos de Infração impostos estão pretensamente fundamentados em suposta violação ao artigo 2º da Lei n° 11.105/2005.
O dispositivo legal invocado, no entanto, não é suficiente para fundamentar a lavratura dos referidos Autos de Infração. Isso porque o artigo 2º da Lei n° 11.105/2005 dispõe genericamente sobre atividades e projetos que envolvam organismos geneticamente modificados, sem tipificar a conduta que teria sido lesiva ao ambiente, violando frontalmente a garantia constitucional à ampla defesa e o princípio da legalidade. Confira-se novamente:
Art. 2º As atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados, relacionados ao ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial ficam restritos ao âmbito de entidades de direito público ou privado, que serão responsáveis pela obediência aos preceitos desta Lei e de sua regulamentação, bem como pelas eventuais consequências ou efeitos advindos de seu descumprimento.
§ 1º Para os fins desta Lei, consideram-se atividades e projetos no âmbito de entidade os conduzidos em instalações próprias ou sob a responsabilidade administrativa, técnica ou científica da entidade.
§ 2º As atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas em atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício ou qualquer outro com pessoas jurídicas.
§ 3º Os interessados em realizar atividade prevista nesta Lei deverão requerer autorização à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, que se manifestará no prazo fixado em regulamento.
§ 4º As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos no caput deste artigo devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em Biossegurança, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes do descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação.
Não se pode admitir a fundamentação genérica utilizada para a imposição da penalidade de multa. E tal elemento essencial da ação anulatória não foi analisado no detalhe pela r. sentença apelada, que se limitou a indicar que estaria configurada a infração porque:
“a cada plantio, para fins de fiscalização e cumprimento das medidas de biossegurança, deveria a autora ter procedido ao envio da informação requisitada, e não ter aguardado o último ato de plantio ocorrido em determinada Estação Experimental”.
No respeitoso entendimento da Apelante, a ausência de adequado fundamento legal para a imposição das autuações, aliada à justificativa genérica adotada pela r. sentença apelada, depõem contra a sentença de improcedência da ação.
Isso porque não poderia o apelado simplesmente se reportar aos Pareceres Técnicos expedidos para fundamentar a autuação.
A indicação precisa da infração administrativa é matéria reservada à Lei, conforme dispõe o artigo 5º, II e XXXIX, da Constituição Federal, cuja aplicação não se limita ao direito penal, conforme expressamente previsto no artigo 37 caput da Constituição Federal.
E como se viu, a Lei Federal n° 11.105/2005, em seu artigo 2º, não define as condutas caracterizadoras das infrações ao meio ambiente constantes dos Pareceres Técnicos.
Reiteradas decisões proferidas pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região referendam o entendimento de que a imposição de sanção administrativa depende de previsão expressa da alegada infração:
“DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCON. APLICAÇÃO DE MULTA NO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE DA INFRAÇÃO. O procedimento administrativo pelo qual se impõe multa, no exercício do Poder de Polícia, em decorrência da infringência a norma de defesa do consumidor deve obediência ao princípio da legalidade. É descabida, assim, a aplicação de sanção administrativa à conduta que não está prevista como infração. Recurso ordinário provido”[2].
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIZAÇÃO DE EXPLORAÇÃO VENCIDA HÁ MENOS DE UM MÊS. AUTO DE INFRAÇÃO INCONCLUSIVO. AUTUAÇÃO FUNDAMENTADA NO ART. 46 DA LEI N. 9.605/98. INFRAÇÃO CRIMINAL. IMPOSSIBILIDADE. DECRETO 6.514/08. PRINCPIPIO DA LEGALIDADE. ANULAÇÃO QUE SE IMPÕE. SENTENÇA
MANTIDA. (…) O art. 46 da Lei 9.605/98 tipifica crime contra o meio ambiente e não infração administrativa que pode ser punida pelo IBAMA, cabendo apenas ao juiz criminal, após regular processo penal, impor a penalidade prevista naquele artigo. Precedentes deste Tribunal. A definição de infração e a cominação de penalidades, após a entrada em vigor da Constituição Federal/88, somente pode se dar por meio de lei em sentido formal, razão pela qual o Decreto n. 6.514/08 não pode ser utilizado como fundamento para a aplicação da penalidade imposta ao impetrante. O art. 21 da Lei n. 9.605/98, por não definir infração ou aplicar penalidade não pode ser servir de fundamento para a cobrança de multa pelo IBAMA. Apelação e remessa oficial improvidas. Sentença mantida[3].
Os Autos de Infração são nulos, assim, também porque não foram expedidos em estrita observância aos artigos 2º, caput, e 50, inciso I da Lei nº 9.784/99[4], que regem os processos administrativos no âmbito federal.
De fato, nenhuma das autuações impostas justifica a alegação de intempestividade das cartas apresentadas, pelas quais se comunicou tempestivamente o plantio e a alteração de local de plantio.
E isto era absolutamente necessário, mormente se considerarmos que outras Estações Experimentais, também abrangidas pelas mesmas correspondências, foram fiscalizadas pelo próprio… e não sofreram qualquer autuação.
[1] Art. 2º As atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados, relacionados ao ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial ficam restritos ao âmbito de entidades de direito público ou privado, que serão responsáveis pela obediência aos preceitos desta Lei e de sua regulamentação, bem como pelas eventuais consequências ou efeitos advindos de seu descumprimento. § 1º Para os fins desta Lei, consideram-se atividades e projetos no âmbito de entidade os conduzidos em instalações próprias ou sob a responsabilidade administrativa, técnica ou científica da entidade. § 2º As atividades e projetos de que trata este artigo são vedados a pessoas físicas em atuação autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo empregatício ou qualquer outro com pessoas jurídicas. […] § 4º As organizações públicas e privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, financiadoras ou patrocinadoras de atividades ou de projetos referidos no caput deste artigo devem exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em Biossegurança, emitido pela CTNBio, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais efeitos decorrentes do descumprimento desta Lei ou de sua regulamentação.
[2] STJ. 1ª T. RMS 19.510-GO. Rel. Min Teori Albino. j. 20.6.2006.
[3] TRF1. 8ª Turma. Apelação Cível n. 2004.39.00.008388-3/PA. Rel. Des. Leonel Amorim. J. 31.7.2009.
[4] Art. 2º. “caput”. A administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. “Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I – Neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;”