A competência da Justiça Federal para julgar crime ambiental de pesca somente ocorre quando a pesca gerar repercussão em âmbito regional ou nacional.
De largada, tem se que, para que se reconheça a competência da Justiça Federal em crimes ambientais de pesca, é necessário que se verifique a existência efetiva de dano a bens, serviços ou interesse da União, não sendo suficiente para tal fim o fato de o delito ter sido praticado em rio federal.
Se o crime ambiental é praticado em rio federal, considerado bem da União, nos termos do art. 20, inciso III, da Constituição Federal, a competência, em regra, seria da Justiça Federal.
Porém, é de se observar se há ou não ofensa direta e específica a interesse da União, a atrair a competência desta Justiça Federal. Em sendo negativa a resposta, a competência será da Justiça Estadual.
Os crimes ambientais, embora praticados em face de bem comum de grande relevância, que atingem direitos intergeracionais, não atraem, por si só, a competência da União para processamento e julgamento.
É que a mera circunstância de pesca em rio, por si só, não é suficiente para justificar a competência da União, por aplicação do art. 109, inciso IV, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral.
Índice
Competência para julgar crime ambiental de pesca
Sem delongas, compete à Justiça Federal processar e julgar os delitos ambientais envolvendo bens e interesses da União (art. 109, IV, da CF/88), como é o caso dos rios que servem de limites com outros países, que são considerados bens da União (art. 20, III, da CF/88).
Nos casos em que o réu foi flagrado pescando em rio, ainda que em época de defeso e com petrechos proibidos, deve ser fixada a competência da Justiça Estadual, se ausente prova de que houve prejuízo a bens da União.
Isso porque, para atrair a competência da Justiça Federal, é necessário que os danos ambientais produzidos tenham repercutido para além do local em que supostamente praticada a conduta.
Ainda que o crime ambiental tenha ocorrido em rio interestadual, se os danos ambientais decorrentes da prática da pesca possuem apenas dimensão local, restringindo-se ao município da pesca, deve ser aplicada a regra da competência da jurisdição estadual.
O que diz a jurisprudência
Com efeito, a Justiça Federal somente detém competência para julgar crimes ambientais quando praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas federais, a teor do que dispõe o artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal, conforme pacífica jurisprudência:
PROCESSO PENAL. CRIME AMBIENTAL. PESCA PREDATÓRIA EM RIO FEDERAL. DANOS RESTRITOS AO LOCAL DA PESCA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO. COMPETÊNCIA ESTADUAL.
1. Tratando-se de pesca predatória em rio federal (nos termos do art. 20, inciso III, da Constituição Federal), vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça que, para atrair a competência da Justiça Federal, é necessário que os danos ambientais produzidos tenham repercutido para além do local em que supostamente praticada a conduta, gerando reflexos em âmbito regional ou nacional.
2. Hipótese em que a captura ilegal de seis espécimes do Rio Uruguai não representou perigo ou ofensa direta a bem ou interesse da União, sendo mantida a decisão que declinou da competência em favor da Justiça Estadual.
(TRF-4 – RCCR: 50018946120214047106 RS 5001894-61.2021.4.04.7106, Relator: NIVALDO BRUNONI, Data de Julgamento: 03/02/2022, OITAVA TURMA)
A despeito do fato de que constituem bens da União os rios que banham mais de um Estado da Federação, consoante dicção do artigo 20, inciso III, da Constituição Federal, a melhor interpretação a ser adotada nos casos de crime ambiental é a de que a fixação da competência não deve ficar adstrita apenas ao local em que o crime ambiental fora perpetrado.
Ou seja, se o crime ambiental for cometido em rio pertencente à União ou não, mas sim amparada no fato de que efetivamente tenha sido atingindo bem jurídico da União, de suas autarquias ou de empresas públicas.
Muito embora o rio possa ser enquadrado como rio interestadual, certo é que os supostos danos ambientais decorrentes da pesca predatória ficaram adstritos ao Município, fato revelador de que o dano ocorreu de forma isolada, afastando, assim, a competência da Justiça Federal.
Para que fosse possível cogitar na competência da Justiça Federal a pesca predatória deveria ter gerado repercussão em âmbito regional ou nacional, hipótese que se não vislumbrada, atrai a competência da Justiça Estadual.
Conclusão
A preservação do meio ambiente é matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos termos do art. 23, incisos VI e VII, da Constituição Federal.
Contudo, a competência federal para julgamento de crimes ambientais por pesca demanda demonstração de que a ofensa atingiu interesse direto e específico da União, de suas entidades autárquicas ou de empresas públicas federais.
Assim sendo, para atrair a competência da Justiça Federal, o dano decorrente de pesca proibida em rio interestadual deve gerar reflexos em âmbito regional ou nacional, afetando trecho do rio que se alongasse por mais de um Estado da Federação.
Ou seja, para que a Justiça Federal seja competente para julgar crime ambiental de pesca, seria necessário que ficasse demonstrado que a atividade pesqueira ilegal teria o condão de repercutir negativamente sobre parte significativa da população de peixes ao longo do rio, por exemplo, impedindo ou prejudicando seu período de reprodução sazonal.
Se a situação afetou apenas a parte do rio próxima ao município em que a infração foi verificada, então por óbvio os prejuízos não atingiram a esfera de interesses da União para atrair a Justiça Federal.
Para atrair a competência da Justiça Federal é necessário que os danos ambientais produzidos pela prática de pesca predatória em rio interestadual tenham repercutido para além do local em que supostamente praticada.
Também seria possível cogitar do deslocamento da competência para a Justiça Federal se o caso afetasse área especialmente protegida por decreto federal, ou se a conduta perpetrada violasse alguma norma de âmbito nacional.
Portanto, se o crime ambiental não apresenta elementos suficientes para caracterizar o interesse da União no julgamento do feito, ainda que o rio se classifique como bem da União, a competência será da Justiça Estadual.