Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes, constitui crime ambiental previsto no art. 60 da Lei 9.605/98, com pena de detenção de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Trata-se, pois, de norma penal em branco e por isso, é complementada pela Resolução 237 do CONAMA, que, dentre outros conceitos e regulamentações, dispõe sobre os empreendimentos e atividades sujeitos ao licenciamento ambiental, cuja relação está relacionada no seu Anexo 1, parte integrante da Resolução.
Contudo, para a configuração do crime previsto no art. 60 da Lei 9.605/98 não basta a mera ausência de licença ambiental para a tipificação do delito, sendo necessária de forma concomitante, a comprovação da poluição gerada pela atividade desenvolvida pelo agente.
E mais. Não basta que a atividade exercida esteja simplesmente elencada na referida Resolução para caracterizar o delito, fosse assim, estaríamos chancelando a possibilidade de responsabilização objetiva no campo do direito penal.
Não obstante, temos defendido, pois, se o empreendimento ou atividade é regularizado antes do recebimento da denúncia, com a obtenção da regular licença ambiental, não se vislumbra a existência de dolo do agente, motivo pelo qual não há que se falar em crime ambiental.
É que para a caracterização do crime ambiental previsto no art. 60 da Lei 9.605/98, há necessidade de existência do dolo, não havendo previsão de ilícito penal culposo.
Desse modo, inocorrendo sequer perigo para a Administração, com a obtenção da licença ambiental antes do recebimento da denúncia, não há falar em conduta típica prevista no art. 60 da referida lei. Vamos explicar melhor.
1. Ausência de licença ambiental x crime ambiental
Cediço, o Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, no uso de suas atribuições e competências conferidas pela Lei federal 6.938, de 31 de agosto de 1981, editou a Resolução 237/1997, que dispõe, em seu art. 2º, sobre a necessidade de licenciamento e obtenção de licença ambiental:
Art. 2º – A localização, construção, instalação, ampliação, modificação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão ambiental competente, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis.
A referida resolução também dispõe sobre o conceito de licenciamento ambiental e licença ambiental, e, no Anexo 1 da Resolução, estão previstas as atividades ou empreendimentos sujeitas ao processo de licenciamento ambiental, porém, o fato de ser exigida a licença ambiental não pode gerar a presunção de que a atividade desenvolvida pelo agente seja potencialmente poluidora.
Como se vê, a licença ambiental é concedida após regular processo de licenciamento e sua ausência constitui crime ambiental previsto no art. 60 da Lei 9.605/98, in verbis:
Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes:
Ocorre que, como é de conhecimento, o primeiro substrato do conceito analítico de crime é o fato típico, o qual é composto por conduta, nexo causal, resultado e tipicidade.
Outrossim, nos termos do art. 18, parágrafo único, do Código Penal, “salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”. Ademais, o dolo, para a teoria finalista, consiste na consciência e vontade dirigida ao resultado.
Nesse sentido, se a licença ambiental é obtida e a atividade ou empreendimento regularizado antes do recebimento da denúncia, não se vislumbra a existência de dolo do agente, motivo pelo qual não há que se falar em crime.
Não se pode olvidar que, para a tipificação do delito em questão, exige-se o dolo, o qual temos defendido se tratar de dolo específico, ou seja, o agente deve ter a vontade consciente e livre de praticar o fato descrito na norma punitiva com uma intenção especial, in casu, poluir.
Isto é, o delito previsto no art. 60 se perfectibiliza quando o agente almeja uma finalidade, é o querer praticar a conduta sem a licença ou autorização do órgão ambiental. Contém os elementos objetivos “construir”, “reformar”, “ampliar”, “instalar” ou “fazer funcionar” estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores com o dolo de não obter a competente licença ambiental para tanto.
Ausente demonstração do dolo específico, não há se falar em decreto condenatório, em face do caráter subsidiário do Direito Penal e do princípio da intervenção mínima.
Eventuais irregularidades quanto a ausência de licença ambiental deve ser discutida na esfera administrativa, não caracterizando, porém, o crime, sobretudo quando da obtenção da licença ambiental antes do recebimento da denúncia, fato capaz de elidir a possível instalação de processo criminal.
Vale destacar que, a teor do art. 156 do Código de Processo Penal, incumbe à acusação produzir prova robusta e apta a demonstrar, com certeza, a ocorrência da empreitada criminosa, a autoria e o dolo do agente.
Repise-se, que o Direito Penal deve intervir somente nos casos em que a conduta ocasionar lesão jurídica de gravidade, devendo ser reconhecida a atipicidade material em prejuízos mínimos ou leves.
De se observar, ainda, que se o fato de construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, é permitido mediante concessão de licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, de modo que o agente possui tal instrumento, a conduta é permitida, afastando-se a tipicidade, daí porque se trata de dolo específico.
Por fim, é de se perceber ainda, que a rápida diligência do agente para regularizar a sua atividade ou empreendimento, antes mesmo do recebimento da denúncia, demonstra a ausência de dolo, elemento necessário para caracterizar o crime, e sua falta conduz à atipicidade da conduta.