No Escritório Farenzena & Franco Advocacia Ambiental já defendemos dezenas de clientes acusados de destruir ou danificar vegetação secundária do Bioma Mata Atlântica no Estado de Minas Gerais, tanto quanto ao estágio avançado como médio de regeneração, crime esse previsto no artigo 38-A da Lei 9.605/98.
A maior parte das ações penais por esse crime ambiental tem origem na fiscalização ambiental por órgãos administrativos que constatam a infração e em seguida comunicam o Ministério Público que, caso entenda pela ocorrência de crime ambiental, oferece a denúncia.
Contudo, para comprovar a materialidade do crime ambiental do artigo 38-A da Lei 9.605/98, é necessário demonstrar que a destruição ou danificação a quem se repute o autor dos fatos atingiu uma das formações florestais ou ecossistemas definidos pelo dispositivo.
Além disso, é necessário identificar se a vegetação primária ou secundária estava em estágio médio ou avançado de regeneração, tendo em vista que tais circunstâncias são elementares do tipo penal.
Ocorre que, em virtude da complexidade dos conceitos trazidos pelo tipo legal do artigo 38-A da Lei 9.605/98, faz-se necessário consultar profissional com conhecimento técnico específico para identificação dos espécimes encontrados.
E esse profissional também deve atestar as condições da área degradada, sob pena de não ficar demonstrada a materialidade do delito em questão. Logo, se tal constatação só pode ser feita por profissional habilitado, mediante prova pericial, a absolvição é o único caminho que o magistrado deve seguir.
Essa é a principal tese de defesa que efetivamente absolve o acusado de destruir ou danificar vegetação do Bioma Mata Atlântica, claro, aliada a estratégias específicas que devem ser observadas pelo advogado.
Portanto, a falta de laudo pericial para determinar a materialidade do crime ambiental do artigo 38-A da Lei 9.605/98 com a certeza necessária, impõe a absolvição do acusado desde que, sejam adotadas estratégias de defesa para obter a absolvição.
Índice
Crime ambiental do artigo 38-A da Lei 9.605/98 em Minas Gerais
O artigo 38-A da Lei 9.605/98 tipifica a conduta de “destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção”.
Trata-se de norma penal em branco heterogênea, cujo complemento se encontra na Resolução 392 do CONAMA, publicada em 26.06.2007, que define em que consiste a vegetação primária e secundária (ou em regeneração) no Estado de Minas Gerais.
Segundo dispõe o referido dispositivo, considera-se vegetação primária “aquela de máxima expressão local com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos ou ausentes a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e espécies” (artigo 1º, inciso I, Resolução 392/2007 do CONAMA).
Trata-se, grosso modo, dos resquícios de matas nativas do Bioma Mata Atlântica, que sofreram nenhuma ou pouquíssima ação humana, mantendo suas características originais.
Quanto à vegetação secundária, é “aquela resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação primária (artigo 1º, inciso II, Resolução 392/2007 do CONAMA).
Isto é, são aquelas porções de cobertura vegetal de sucessão, ou recuperação, após eventual degradação da mata original. Nesse caso, somente é objeto material da tutela penal a vegetação em estágio avançado e médio de recuperação.
A definição dos estágios de regeneração (inicial, médio e avançado), por sua vez, levam em conta a fisionomia, os estratos predominantes, diâmetro e altura, diversidade e quantidade de epífitas, trepadeiras, características da serapilheira, sub-bosque, diversidade e dominância de espécies, inclusive pela presença de espécies vegetais típicas, dentre outras.
Resolução 392/2007 do CONAMA
Para cada formação florestal nativa e ecossistemas associados, a Resolução 392/2007 do CONAMA arrola as respectivas características, a fim de individualizar o estágio de recuperação da vegetação:
- Floresta Estacional Decidual (artigo 2º, inciso I), contendo espécies arbóreas tais como embaúba, ruão, esporão-de-galo, assapeixe, cambará, camará, samambaião, dentre outras; ou,
- Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Ombrófila Densa e Floresta Ombrófila Mista (artigo 2º, inciso II), cujas espécies indicadoras são aquelas conhecidas como monjolo, angicos, garapa, perobas, guatambus, angelim, jequitibás, pau-d’óleo, canjerana, cedro, embaúbas, jacarandá, jatobá, cotieira, carvalho, embaúba, jaborandi, ipê-branco, araucária, dentre outras.
Na maioria das ações penais pelo crime ambiental do artigo 38-A da Lei 9.605/98, a denúncia é lacônica, limitando-se a mencionar ou repetir o que consta no processo administrativo ambiental, sem a produção de prova pericial.
Em sua maioria, a denúncia apenas imputar ao acusado a conduta de destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica, deixando de especificar as circunstâncias que permitiriam afirmar que a área estava em estágio médio ou avançado de regeneração que, além de serem conceitos legais que não se confundem, deixa de delimitar quais espécies foram atingidas.
Em casos assim, é possível absolver o réu, porque a imprecisão da denúncia decorrente da falta de prévia perícia capaz de atestar as características da cobertura vegetal suprimida, limita-se a repetir os termos do histórico do auto de infração ambiental.
Aliás, na maioria dos casos, o auto de infração ambiental empresa termos atécnicos e não apontam os elementos que permitiriam concluir se tratar de vegetação primária (mata nativa) ou secundária (em regeneração), nem o estágio de regeneração e tampouco identificam as espécies pertencentes ao referido bioma supostamente atingidas, cuja conclusão lógica é absolver o acusado.
Conclusão
Na maioria das ações penais por crime ambiental do artigo 38-A da Lei 9.605/98, a denúncia não é feita com base exclusiva no auto de infração ambiental, demonstrando ser vaga e genérica, sobretudo quanto à menção das espécies atingidas, ou seja, se pertencem ou não ao Bioma Mata Atlântica.
A despeito disso, para a tipificação penal, não basta a constatação de que o local está inserido em área referente ao Bioma Mata Atlântica. O crime em questão se aperfeiçoa somente quando ocorre destruição ou danos à cobertura vegetal resultante dos processos naturais de sucessão (regeneração em estágio médio ou avançado) ou, obviamente, de vegetação primária (original) do precitado bioma.
Assim, se não foi realizada a perícia necessária para esclarecer o tipo de cobertura supostamente destruída ou danificada (se primária, secundária em estágio médio de regeneração ou secundária em estágio avançado de regeneração, o que é elementar essencial do aludido tipo incriminador), a absolvição deve ser o único caminho seguido pelo magistrado.
Ausente a realização de perícia na área afetada, e considerando que muitas vezes a prova testemunhal geram lacunas que não substituem a prova técnica, impossibilitando a identificação técnica da vegetação ali existente, à luz do disposto na Resolução 392/2007 do CONAMA, não há como condenar o pretenso infrator.
Portanto, a incerteza sobre a classificação técnica do tipo de vegetação, para fins penais – mais especificamente para fins do artigo 38-A da Lei 9.605/98 -, ou seja, a correta identificação por profissional técnico se a vegetação atingida é primária ou secundária e qual o seu estágio de regeneração, a absolvição do pretenso infrator é o único caminho a ser seguido pelo magistrado.