Nos casos de aplicação de multa ambiental, a autoridade julgadora deve fundamentar as razões do arbitramento e manutenção do valor da multa ambiental com base em critérios previamente estabelecidos no artigo 6º da Lei Federal 9.605/08, conhecida imprecisamente como a Lei de Crimes Ambientais:
Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
Por sua vez, o artigo 4º do Decreto 6.514/08 que regulamenta a Lei Federal 9.605/98, reforça a obrigatoriedade de a autoridade julgadora, quando da aplicação de multa ambiental, observar os seguintes critérios para dosimetria da pena de multa ambiental:
Art. 4º O agente autuante, ao lavrar o auto de infração, indicará as sanções estabelecidas neste Decreto, observando:
I – gravidade dos fatos, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – antecedentes do infrator, quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e
III – situação econômica do infrator.
Observação importante se extrai do § 1º do art. 4º do Decreto 6.514/08, segundo o qual, o órgão ambiental fiscalizador deve estabelecer, para aplicação do inciso I, a forma objetiva critérios complementares para o agravamento e atenuação das sanções administrativas.
Índice
Circunstância atenuantes
Conforme visto, tanto a Lei Federal 9.605/98 como o Decreto 6.514/08 impõe à autoridade julgadora a observância de critérios para dosimetria do valor da multa ambiental, e ainda, quanto a aplicação das atenuantes para fins de determinar o correto o valor da multa ambiental a ser imposto ao infrator.
Apesar de também existirem as circunstâncias que agravam a multa, vamos tratar aqui, apenas das atenuantes que devem ser observadas pelas autoridades julgadoras, que no caso do IBAMA e ICMBio, estão previstas no artigo 89 da Instrução Normativa Conjunta MMA/IBAMA/ICMBIO n. 1, de 12 de abril de 2021:
Art. 89. São circunstâncias atenuantes:
I – baixo grau de instrução ou escolaridade do autuado;
II – arrependimento eficaz do autuado, manifestado pela espontânea reparação do dano, limitação significativa da degradação ambiental causada ou apresentação de denúncia espontânea;
III – comunicação prévia pelo autuado do perigo iminente de degradação ambiental; e
IV – colaboração com a fiscalização.
Parágrafo único. Caracteriza colaboração com a fiscalização ambiental:
a) o não oferecimento de resistência e o livre acesso às dependências, instalações ou locais de ocorrência da infração;
b) a apresentação de documentos ou informações no prazo estabelecido.
Art. 90. Indicada a existência de circunstâncias atenuantes, a autoridade julgadora competente deverá reduzir justificadamente o valor da multa, segundo os seguintes critérios:
I – até 10% (dez por cento), nas hipóteses dos incisos III e IV do art. 89;
II – até 25% (vinte e cinco por cento), na hipótese do inciso I do art. 89; e
III – até 50% (cinquenta por cento), na hipótese do inciso II do art. 89.
§1º Indicada a existência de mais de uma circunstância atenuante, será aplicada aquela de maior percentual de redução.
§2º A redução decorrente da verificação da existência de circunstâncias atenuantes não poderá ser inferior:
I – ao valor mínimo cominado para a infração, quando a multa for aberta; e
II – ao valor mínimo unitário cominado para a infração, quando a multa for determinada com base em unidade de medida.
Sendo assim, importante ao autuado ou seu advogado constituído, comprovar e alegar as circunstâncias que atenuam a pena, as quais devem ser observadas e se cabíveis, aplicadas pela autoridade julgada, não se tratando aqui de discricionariedade da Administração Pública.
Imposição de multa ambiental
A imposição de multa constitui e cria restrições ao patrimônio privado do administrado, com verdadeiro efeito de confisco, e por isso, deve ser imposta com observância estrita aos critérios objetivos elencados na legislação, a fim de atender a razoabilidade e proporcionalidade.
Nesse contexto, vale citar a doutrina de Wellington Pacheco Barros[1], segundo o qual existem dois momentos distintos que envolvem a aplicação da multa no processo administrativo ambiental:
(a) “multa acusação”, que é aquela fixada no auto de infração, peça de abertura do processo administrativo ambiental na qual deve ser imputado um fato e, na circunstância pragmática da penalização ambiental, a indicação da correspondente sanção, no caso, a pena de multa que deverá ser aplicada’.
(b) “multa punição”, que é aquela que sobrevém como momento final do processo administrativo ambiental; é uma decorrência do procedimento de fixação da multa, a qual pode vir a ser mantida, reduzida ou majorada, desde que observado os requisitos legais estabelecidos.
Importante destacar que entre os referidos momentos na aplicação da multa ambiental, desenvolve-se o processo administrativo ambiental, o qual deve assegurar ao administrado que responde à infração ambiental o respeito às garantias ao devido processo legal, asseguradas pela Constituição Federal, tais como o direito ao contraditório e a ampla defesa, motivação das decisões, etc.
Valor da multa punição
Cumpre observar que para apurar o valor da “multa punição” deve a autoridade minorar o seu valor, respeitados os limites estabelecidos nos artigos infringidos, observando os critérios estabelecidos no art. 6º e, no que couber, o disposto no artigo 14 da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998:
Art. 14. São circunstâncias que atenuam a pena:
I – baixo grau de instrução ou escolaridade do agente;
II – arrependimento do infrator, manifestado pela espontânea reparação do dano, ou limitação significativa da degradação ambiental causada;
III – comunicação prévia pelo agente do perigo iminente de degradação ambiental;
IV – colaboração com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental.
Conforme explica o doutrinador já citado, Wellington Pacheco Barros[2]:
“Aqui, os elementos do art. 6º mencionado são reanalisados agora diante da prova e, assim, a autoridade processante pode, como ocorre no processo penal, majorar, manter ou minorar valor da acusação inicial, respeitando sempre os limites estabelecidos nos artigos infringidos, independentemente que tenha sido ela aplicada, consoante o disposto no mesmo art. 7º do decreto citado [Decreto nº 3.179/1999].
Pressuposto relevante na dosimetria da pena de multa administrativa, é que o legislador manda que sejam analisadas as circunstâncias que, no crime, poderiam atenuar ou agravar a pena, consoante se observa do art. 7º do Decreto nº 3.179/99, que manda aplicar os arts. 14 e 15 da Lei nº 9.605/98.”
Logo, pode-se dizer que a decisão que não minorar a multa ambiental deve ser fundamentada, seguindo o princípio do devido processo legal, ou seja, se deve ou não ser mantido o valor definido no Auto de Infração e Termo (“multa acusação”) fixado pelo Agente Autuante para que, se for o caso, o cidadão ingresse com ação anulatória do ato administrativo com pedido de tutela de urgência já que, a indústria da multa já é algo consabido entre nós cidadãos brasileiros.
Decisão administrativa deve motivar a aplicação da multa ambiental
Destaca-se que a decisão administrativa final a ser proferida pela autoridade julgadora, constitui e cria restrições ao patrimônio privado do administrado ao fixar o valor da “multa punição”, e se ausente qualquer motivação legal para justificar o quantum fixado, está em desacordo com a legislação se tornando nula de pleno direito.
Assim, além dos dispositivos e garantias processuais previstas na Constituição Federal, a motivação do ato administrativo contrariou frontalmente a Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que, ao dispor sobre a motivação das decisões proferidas no âmbito dos processos administrativos federais, expressamente prevê:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;
IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;
VI – decorram de reexame de ofício;
VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;
VIII – importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
§1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente , podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
§2º Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados.
§3º A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito.
O Decreto 6.514/08 regulamentador da Lei dos Crimes e Sanções Administrativas Ambientais trouxe disposição expressa a ser observada no âmbito do processo administrativo ambiental, reafirmando o dever de observância do devido processo legal pelos Órgãos Ambientais, ressaltando a necessidade de fundamentação da decisão que fixa a “multa punição” a ser imposta ao administrado:
Art. 123. A decisão da autoridade julgadora não se vincula às sanções aplicadas pelo agente autuante, ou ao valor da multa, podendo, em decisão motivada, de ofício ou a requerimento do interessado, minorar, manter ou majorar o seu valor, respeitados os limites estabelecidos na legislação ambiental vigente.
Art. 125. A decisão deverá ser motivada, com a indicação dos fatos e fundamentos jurídicos em que se baseia.
Parágrafo único. A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações ou decisões, que, neste caso, serão parte integrante do ato decisório.
Logo, se a aplicação da multa ambiental não decorrer de expressa motivação e fundamentação, de acordo com os critérios que deve ser adotado para fixar a multa e em obediência ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, o ato será nulo, passível, inclusive, de revisão pelo Poder Judiciário.
Conclusão
É cabível a declaração de nulidade da multa ambiental quando arbitrada de forma desproporcional, irrazoável, sem a devida motivação e fundamentação, ou ainda, que contrarie os artigos 6º e 14 da Lei Federal 9.605/08 e artigo 4º do Decreto 6.514/08
Vale lembrar, que o valor da multa deve, sobretudo, ser coerente à situação econômica do autuado, reservando ao administrador público a possibilidade de aplicar outra sanção no exercício de sua competência, desde que compatível com os critérios estabelecidos em lei e com os princípios que regem a Administração Pública.
A proporcionalidade é um dos critérios que deve ser adotado para fixar a multa, sobretudo, por exemplo, quando o infrator tem baixo poder aquisitivo e apresenta elementos capazes de demonstrar que o valor da multa é incompatível com os seus rendimentos e bens.
E mais. Nos casos que constar documentos juntados pelo autuado comprovante que o pagamento do valor da multa ambiental inviabiliza o exercício de sua atividade profissional e econômica, deve ser a decisão julgadora atender os preceitos legais instituídos pelo legislador e executivo para não tornar a multa um verdadeiro confisco do patrimônio do infrator.
[1] BARROS, Welling- ton Pacheco. Direito ambiental sistematizado . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pp. 241-242.
[2] BARROS, Wellington Pacheco. Direito ambiental sistematizado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pp. 242-243.