O processo administrativo sancionador ambiental é destinado a apurar ocorrência de infrações por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, assegurando não apenas o devido processo legal, como também o contraditório e ampla defesa.
Inclui-se aí, todos os meios e recursos inerentes à defesa (art. 5º, inciso LIV e LV da Constituição Federal), inclusive, as alegações finais, às quais não foram fixadas por conveniência da Administração, é claro.
No processo administrativo federal as alegações finais estão previstas como regra na Lei 9.784/99 e no Decreto 6.514/08, dispondo que encerrada a instrução, o autuado terá o direito de se manifestar em alegações finais.
Logo, cabe à autoridade julgadora proceder a correta comunicação de tal oportunidade ao interessado, que pode ocorrer por via postal com aviso de recebimento; por notificação eletrônica ou por outro meio válido que assegure a certeza da ciência.
Índice
Alegações finais é um direito do autuado infrator
A apresentação de alegações finais é um direito do autuado que decorre da Constituição Federal, daí porque deve ser corretamente intimado, somente admitindo a intimação por edital (publicação oficial) no caso de estar em lugar incerto, não sabido ou se não for localizado no endereço.
De tamanha importância é intimação do autuado por um meio que assegure a certeza de sua ciência, que desde 1997 o Supremo Tribunal Federal – STF[1] repugna a intimação por edital em processo administrativo sancionador ambiental quando o interessado não é desconhecido, nem está em lugar incerto e não sabido.
Não se olvida que o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório são compatíveis com a intimação por edital, porém e tão somente, quando o interessado estiver em lugar incerto ou não sabido, ser indeterminado ou desconhecido.
Todavia, esta hipótese deve ser devidamente comprovada e demonstrada nos autos do processo administrativo, para somente então viabilizar a intimação do autuado infrator pela excepcional via editalícia.
Intimação por edital no processo administrativo ambiental é excepcional
Com efeito, a notificação editalícia ou por edital, é sempre residual, sendo a ultima ratio, isto é, o último e excepcional recurso para se efetivar a intimação, e seu uso fora desta regra importa em nulidade por inobservância das prescrições legais e garantias constitucionais.
Aliás, no processo administrativo federal, o art. 26, § 5º, da Lei 9.784/99 é categórico ao determinar as intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, as quais, como já mencionado, previstas como regra na Lei 9.784/99 e no Decreto 6.514/08.
Logo, tendo havido a intimação do autuado por edital para apresentar alegações finais, inarredável a nulidade do processo administrativo ambiental sancionador, porque realizada de forma direta e precoce, sem que o autuado estivesse em lugar incerto, não sabido ou não se foi localizado no endereço.
O que diz a jurisprudência sobre a intimação por edital
A jurisprudência tem rechaçado de forma veemente o uso da intimação do autuado por infração ambiental por edital para apresentar alegações finais, sem que sejam esgotadas todas as tentativas de intimá-lo pessoalmente, por carta com aviso de recebimento ou por meio eletrônico, as quais devem estar devidamente certificadas nos autos, para somente então, permitir a adoção da excepcional via editalícia:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO AMBIENTAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO. INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA). COMUNICAÇÃO ACERCA DA HOMOLOGAÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO. NOTIFICAÇÃO POR EDITAL. AMPLA DEFESA. CONTRADITÓRIO. INOBSERVÂNCIA. LEI N. 9.784/1999. SENTENÇA MANTIDA.
1. Em processo administrativo, a intimação do interessado se dará por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado, admitindo-se a intimação por meio de publicação oficial apenas no caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, consoante o disposto na Lei n. 9.784/1999. Precedentes.
2. Na espécie, não restou comprovado que a administração esgotou esforços visando à regular intimação do interessado antes de proceder à intimação editalícia, estando caracterizada a ofensa ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório, e impondo o reconhecimento da nulidade do processo administrativo, a contar da irregularidade constatada.
3. Apelação e remessa oficial não providas. (TRF-1 – AC: 00064434520054014100, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA, Data de Julgamento: 22/05/2019, QUINTA TURMA, Data de Publicação: 04/06/2019)
Se o órgão ambiental tiver pleno conhecimento do endereço do autuado, e poderia ter feito a notificação de maneira pessoal, viola as disposições da Lei 9.784/99:
Art. 26. O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação do interessado para ciência de decisão ou a efetivação de diligências.
§4o No caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial.
Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e os atos de outra natureza, de seu interesse.
No mesmo sentido, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região[2] tem decidido nos processos do IBAMA:
AMBIENTAL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTO DE INFRAÇÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA). CIÊNCIA DA DECISÃO DENEGATÓRIA DA DEFESA ADMINISTRATIVA. INTIMAÇÃO EDITALÍCIA. AMPLA DEFESA. CONTRADITÓRIO. INOBSERVÂNCIA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI N. 9.784/1999. SEGURANÇA CONCEDIDA.
I – Hipótese em que a sentença concedeu a segurança pleiteada para reconhecer a nulidade do processo administrativo a partir da ausência de intimação para ciência da decisão denegatória da defesa administrativa, bem como a exigibilidade do crédito decorrente da multa, tornando insubsistentes o respectivo débito inscrito em dívida ativa da União e a inscrição no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal – CADIN, concluindo pela violação aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, visto que não foi assegurado ao impetrante (autuado) o prazo de 20 (vinte) dias, a contar da ciência do indeferimento da defesa, para o infrator apresentar recurso da decisão condenatória à instância superior do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, conforme preconiza o art. 71, inc. III, da Lei 9.605/98.
II – “A intimação por edital é uma forma excepcional de comunicação de atos, constituindo ofensa ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório, a notificação para apresentação de alegações finais no processo administrativo para apuração de infração ambiental, realizada unicamente por meio de edital fixado na sede administrativa do Ibama e publicada no sítio eletrônico da autarquia, nos moldes em que prevê o art. 122 do Decreto n. 6.514/2008, havendo de ser observado, no caso, o disposto na Lei n. 9.784/1999, que, regulamentando o processo administrativo, dispõe que a intimação se dará por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado, admitindo-se a intimação por meio de publicação oficial apenas no caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido.” (ACORDAO 00075887420114013600, DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, TRF1 – SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:30/03/2016 PÁGINA:.)
III – Com fulcro na legislação de regência, tanto a específica ambiental, Lei n. 9.605/98 e seu Decreto regulamentador, n. 6.514/2008, como a Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, todas com base na Lei Maior, é assegurada a ampla defesa do requerido, com previsão expressa para que a intimação seja efetuada de forma que assegure a certeza da ciência do interessado, sendo a via editalícia meio subsidiário. IV – Recurso de apelação do IBAMA e reexame necessário a que se nega provimento.
Veja-se que viola o contraditório e ampla defesa a ausência de notificação pessoal para apresentar alegações finais, quando o órgão ambiental tiver condições de encontrar o autuado para notificá-lo.
Garantia do autuado em apresentar alegações finais no processo ambiental
Se há garantia constitucional à ampla defesa, corolário lógico pensar que se a notificação emitida pela Administração não chega ao conhecimento do administrado intimado para defesa de seus direitos como o é as alegações finais, ou é realizada pela via editalícia antes de esgotadas as tentativas de localizá-lo, então não cumpre, em linha de princípio, a sua função constitucionalmente prevista.
Sempre que o autuado infrator é notificado para apresentação de alegações finais diretamente por via de edital publicado na página virtual do órgão ambiental e afixado no mural de sua sede, haverá nulidade do processo administrativo ambiental.
Portanto, constitui-se ofensa ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório o fato de órgão ambiental realizar a intimação do autuado para apresentar alegações finais pela via excepcional do edital sem que fossem esgotados todos os meios de tentativa de sua localização, quando o seu endereço era conhecido da autoridade administrativa.
[1] RE 157905, Relator: MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 06/08/1997.
[2] TRF-1 – AMS: 00130145120134014100, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 13/04/2018, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 04/05/2018.