No Estado de Minas Gerais, o Decreto Estadual 47.383/2018 prevê que a fiscalização ambiental deve ter natureza orientadora, e na hipótese de constatar alguma irregularidade da qual não tenha decorrido dano ambiental, deve apenas notificar o administrado para providenciar a regularização de sua situação, sob pena de nulidade de eventual auto de infração ambiental lavrado sem essa notificação.
Essa é uma peculiaridade da legislação mineira a qual o advogado ou a advogada que atua no Direito Ambiental precisa estar atento, e para isso, necessário entender a fundo a legislação processual administrativa.
É sempre com base na legislação que são regidos os processos administrativos ambientais, sejam eles fiscalizatórios (com aplicação de multas e medidas como embargo e apreensão) ou de licenciamento/autorizativos, devendo a Administração Pública observar além do devido processo legal, o princípio da legalidade conforme vontade do legislador.
Vale lembrar, antes de continuarmos, que se o processo fiscalizatório for federal (inaugurado por autuação do Ibama ou ICMBio), as regras processuais administrativas serão dispostas em normas federais, sobretudo no Decreto 6.514/2008, não se aplicando o Decreto Estadual 47.383/2018 objeto deste estudo.
Isso porque, há estados e municípios que têm legislação processual específica. É o caso, por exemplo, do estado de Minas Gerais, onde vigora o Decreto Estadual 47.383/2018, com uma redação bastante complexa e ao mesmo tempo interessante.
Referido decreto estadual estabelece normas para licenciamento ambiental, tipifica e classifica infrações às normas de proteção ao meio ambiente e aos recursos hídricos e estabelece procedimentos administrativos de fiscalização e aplicação das penalidades, e nele consta um dispositivo que pode evitar que muitas autuações.
Índice
Fiscalização ambiental deve notificar para regularizar antes de autuar
Assim, o objetivo deste artigo é destacar um interessante dispositivo legal previsto no referido Decreto mineiro. Trata-se do art. 50, que assim estabelece:
Art. 50 – A fiscalização terá sempre natureza orientadora e, desde que não seja verificado dano ambiental, deverá ser aplicada a notificação para regularizar a situação constatada, quando o infrator for:
I – entidade sem fins lucrativos;
II – microempresa ou empresa de pequeno porte;
III – microempreendedor individual;
IV – agricultor familiar;
V – proprietário ou possuidor de imóvel rural de até quatro módulos fiscais;
VI – praticante de pesca amadora;
VII – pessoa física de baixo poder aquisitivo e baixo grau de instrução.
§ 1º Será considerada pessoa natural de baixo poder aquisitivo e baixo grau de instrução, para fins do inciso VII, aquele com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo, ou que possua renda familiar mensal de até três salários mínimos e até ensino médio incompleto, a ser declarado sob as penas legais.
Ou seja, em Minas Gerais, desde que não verificado dano ambiental, deverá ser aplicada prévia notificação (e não imposição de multa) quando o suposto infrator for, por exemplo, microempresa ou empresa de pequeno porte, microempreendedor individual, ou pessoa física de baixo poder aquisitivo e baixo grau de instrução.
Inclusive, na hipótese de a fiscalização emitir auto de infração (com imposição de penalidades como multa, embargo ou apreensão) a um suposto infrator que se enquadre em um dos incisos do art. 50, as penalidades devem ser excluídas após a análise da defesa administrativa apresentada (art. 50, § 2º, Decreto Estadual 47.383/2018).
De fato, ao invés de aplicação direta de penalidades, nestes casos a fiscalização tem de lavrar prévia notificação, com o objetivo primário de regularização da situação (e não de sancionamento administrativo).
Auto de infração é aplicado se não regularizada a atividade após a fiscalização
O Decreto Estadual 47.383/2018 estabelece procedimentos administrativos de fiscalização e aplicação das penalidades em matéria ambiental, e prevê que o infrator deverá ser notificado antes da lavratura do auto de infração ambiental para regularizar a atividade ou empreendimento.
Com efeito, o devido processo legal deve ser respeitado nos processos administrativos, sob pena de nulidade dos atos, uma vez que o prejuízo para o autuado decorre da própria inobservância ao seu direito de defesa, o que inviabiliza a supressão da falha para convalidação dos atos praticados.
Sendo assim, para aferir a validade de um auto de infração ambiental lavrado contra uma pessoa física ou jurídica do Estado de Minas Gerais e que da conduta não resultou um dano ambiental, deve-se identificar se a notificação de que trata o artigo 50 do Decreto Estadual 47.383/2018 foi observado.
Ao contrário, tratando-se de atividade regularizável sem que tenha decorrido dano ambiental, a fiscalização deve agir de forma orientadora e notificar a pessoa física ou jurídica para regularizar a atividade, sob pena de anular o auto de infração ambiental aplicado sem essa prévia notificação.
O ato administrativo, para não padecer de vícios, deve ser perfeito (seguindo todas as etapas previstas para sua formação), válido (em conformidade com a lei) e eficaz (publicação para produção de seus efeitos).
Sendo assim, o suposto infrator deve ser notificado previamente para regularizar, e somente se a notificação não for atendida é que o agente de fiscalização ambiental estará autorizado a lavrar o auto de infração ambiental.
Quando cabe à notificação para regularização
Como visto, o artigo 50 é aplicado quando há a necessidade de notificação para regularização de todas as irregularidades constatadas no ato da fiscalização, sendo o auto de infração ambiental cabível somente se não atendida a notificação.
Para tanto, necessário que se observe os artigos 51, 52 e 53 do Decreto Estadual 47.383/2018:
Art. 51. As hipóteses previstas nos incisos do art. 50 deverão ser comprovadas no ato da fiscalização, sob pena de lavratura do competente auto de infração, nos termos deste decreto.
§ 1º A notificação para regularização de todas as irregularidades constatadas no ato da fiscalização deverá ser autuada por meio de procedimento administrativo próprio.
§ 2º Em caso de autuação, verificada a ocorrência de uma das hipóteses dos incisos do art. 50, comprovada no prazo de defesa do auto de infração, serão excluídas as penalidades aplicadas, sendo lavrada notificação para regularização da situação pelo agente responsável pela lavratura do auto de infração ou por outro indicado pela autoridade competente.
§ 3º Não será aplicada a notificação quando constatado que o infrator foi autuado anteriormente, tendo as penalidades se tornado definitivas.
§ 4º A notificação de que trata o caput se limita a uma a cada três anos por infrator, contados da data de cientificação do notificado.
Art. 52. O notificado nos termos do art. 50 deverá dar início ao procedimento para regularização ambiental de sua atividade ou regularizar-se, no prazo máximo de trinta dias, contados da cientificação.
§ 1º O funcionamento, a instalação ou operação das atividades, o uso e intervenção dos recursos hídricos, a exploração da flora e as atividades de pesca poderão ser suspensos até sua regularização junto ao órgão ambiental competente.
§ 2º Nas hipóteses de aplicação do art. 50, não caberá a aplicação da penalidade de apreensão de animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na prática da infração.
§ 3º Caberá ao notificado comprovar, junto à unidade administrativa responsável pela elaboração da notificação, o cumprimento do estabelecido pela autoridade notificadora, no prazo máximo de dez dias, contados a partir do fim do prazo estabelecido para cumprir as determinações impostas.
Art. 53. O não atendimento ao disposto no art. 52 importará na lavratura do respectivo auto de infração, pelo responsável pela lavratura da notificação ou por outro indicado pela autoridade competente, com a aplicação das penalidades cabíveis, conforme previsto na legislação ambiental vigente.
§ 1º Não caberá aplicação da penalidade de advertência no caso em que for constatado o descumprimento do previsto no art. 52, hipótese em que será aplicada a penalidade de multa simples.
§ 2º A notificação deverá ser apensada ao processo administrativo do auto de infração lavrado pelo seu descumprimento.
Ao ser constatada uma irregularidade, o fiscal emitirá a notificação para regularização, detalhando as medidas que devem ser tomadas para adequação às normas ambientais.
É importante ressaltar a necessidade de comprovação da regularização no prazo estabelecido, conforme o artigo 52. Caso não haja a regularização no prazo estipulado, o artigo 53 estabelece que será lavrado o auto de infração ambiental, indicando a seriedade do cumprimento dos prazos.
Além disso, o artigo 51 destaca a importância de comprovar as situações previstas no artigo 50 no momento da fiscalização, enfatizando a necessidade de estar preparado para apresentar as devidas comprovações quando necessário.
Conclusão
O artigo 50 do Decreto 47.837/2020 estabelece hipóteses em que serão aplicadas notificações para regularização de infrações ambientais, bem como a exclusão de penalidades quando constatada a ocorrência de determinadas situações.
Dentro do artigo 50, estão definidas as hipóteses em que a notificação para regularização de infrações será aplicada, como no caso de microempreendedor individual, agricultor familiar, praticante de pesca amadora, entre outros perfis específicos.
Além disso, o artigo prevê a comprovação das irregularidades no ato da fiscalização e a lavratura do auto de infração nos termos do decreto.
Assim, considera-se bastante oportuna a legislação mineira, principalmente em relação ao artigo 50 que consagra a natureza também orientadora das ações de fiscalização.
Enfim, um dispositivo legal como o tratado neste artigo pode ser imprescindível para a resolução de um processo administrativo fiscalizatório ambiental.
Por isso, é preciso conhecer mesmo a fundo a legislação ambiental, para que nenhuma possibilidade legal de solução possa passar despercebida.
Portanto, de acordo com o Decreto 47.837/2020, norma estadual aplicável apenas no Estado de Minas Gerais, quando a fiscalização não constatar dano ambiental, ao invés de aplicar multa ou outra sanção, deve notificar a pessoa física ou jurídica para regularizar a situação constatada, desde que não seja verificado dano ambiental.
4 Comentários. Deixe novo
Excelente explanação. Quanto à competência para aplicar a penalidade é necessário que o “servidor” seja concursado, ou ocupantes de cargos em comissão, também, podem ser designados para exercer o pode de policia administrativa ambiental? Confesso, procurei bastante na jurisprudência. Não encontrei nenhuma decisão que pudesse esclarecer a dúvida.
Eu entendo que ocupantes de cargos comissionados só podem exercer funções de chefia e assessoramento, devendo as demais atividades, como por exemplo, lavratura de autos de infração ambiental e aplicação de penalidades, serem exercidas por servidores concursados.
Boa tarde
Essas normas de fiscalização só são adotadas no Estado de Minas Gerais ou pode ser adotadas no Estado da Bahia também?
O Decreto Federal 6.514/08 é a norma federal utilizada por IBAMA e ICMBio para tipificar as infrações administrativas ambientais, e também pode ser utilizada por Estados e Municípios para lavrar autos de infração ambiental, instaurar processos administrativos e aplicações sanções. Todavia, se o Estado ou Município tiver norma própria para fiscalizar e aplicar sanções por infração ambiental, não se aplica o Decreto 6.514/08.