Já dissertamos diversas vezes aqui no nosso site sobre prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, que em regra é de 5 anos, exceto se a infração ambiental também constituir crime, ocasião em que os prazos prescricionais terão como base os previstos no artigo 109 do Código Penal.
Especificamente quanto à aplicação do prazo prescricional penal, a Lei estabeleceu um único requisito, objetivo, qual seja, o enquadramento da infração administrativa ambiental também como crime.
Não importa, para fins de aplicação do prazo mais dilatado da legislação penal, que, de fato, o indigitado autor do delito (ambiental e penal) seja, efetivamente, condenado, ou que reúna as condições para tanto.
A exigência da lei diz respeito exclusivamente ao fato delituoso que, por sua gravidade, confere ao Estado um prazo maior ou menor para apuração e aplicação da penalidade.
Índice
Prazo da prescrição da infração administrativa ambiental que também é crime ambiental
O prazo prescricional das infrações ambientais poderá ser maior ou menor do que 05 anos quando a conduta praticada também constituir crime ambiental, caso em que deverá ser observado o artigo 109 do Código Penal, in verbis:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;
II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;
III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;
IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;
V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.
Na prática, verifica-se qual foi a infração ambiental pratica e em seguida se ele também configura crime ambiental para fins de apurar qual é o prazo da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita.
Se a infração também constitui crime ambiental, o prazo da prescrição não será o da regra geral, de 5 anos, mas sim, o previsto no artigo 109 do Código Penal, seja ela inferior ou superior à prescrição quinquenal originária.
Interrupção do prazo prescricional ambiental
O prazo previsto na lei penal quando a infração também constituir crime, ao contrário do que ocorre no Processo Penal, não é ininterrupto, porque a própria lei estabelece alguns eventos capazes de interromper o prazo prescricional.
A disciplina geral sobre a prescrição da pretensão punitiva, pela Administração Pública Federal, está prevista na Lei 9.873 de 1999, havendo disposição específica em relação aos processos administrativos punitivos ambientais no Decreto 6.514 de 2008.
Sobre os marcos interruptivos da prescrição, deve-se observar as normas constantes do artigo 2º da Lei 9.873 de 1999 e do artigo 22 do Decreto 6.514 de 2008.
De qualquer forma, cada vez que o Estado pratica um ato que se enquadra nas modalidades estabelecidas na Lei, o prazo que ele possui para apurar a infração e consolidar a penalidade é interrompido, voltando a correr integralmente, questão com a qual não concordamos.
Prazo prescricional menor do que o de 5 anos
A Lei 9.873/99, que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, preceitua o seguinte:
Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§2o Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
Redação similar contém o artigo 21 do Decreto Federal 6.514/08, o qual estabelece que:
Art. 21. Prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado.
§3o Quando o fato objeto da infração também constituir crime, a prescrição de que trata o caput reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
Acerca disso, cumpre registrar que uma mesma conduta pode se revestir de infração administrativa e penal quando demonstrar um maior grau de censurabilidade social e ambiental, ou seja, quando a conduta for mais grave que demanda intervenção do Direito Penal.
Dessa forma, cotejando o disposto no artigo 1º, § 2º, da Lei 9.873/99 e artigo 21, § 3º do Decreto 6.514/08, com uma interpretação lógica e sistemática, pode-se concluir que a intenção do legislador foi prever penas diferentes quando o resultado implicar numa situação mais ou menos gravosa.
Isso porque não se afigura razoável que o autuado seja prejudicado com um prazo mais longo quando a sua conduta, na realidade, é menos gravosa, que o próprio legislador quis abrandar.
Desta feita, ainda que a utilização do prazo prescricional criminal importar num prazo mais curto de prescrição, não se pode aplicar o prazo previsto no caput do artigo 1º, da Lei 9.873/99, com redação idêntica dada pelo artigo 21, § 3º do Decreto 6.514/08, qual seja, o de 05 (cinco) anos, sob pena de violação do princípio da legalidade.
Juiz pode alterar prazo prescricional do processo administrativo ambiental?
Em regra não. Mas cada Magistrado tem sua própria forma de pensar, autorizado pela Constituição Federal de 1988, talvez por isso as decisões são recorríveis, inclusive com efeito suspensivo, para garantir a máxima de eficácia.
Com efeito, o ordenamento pátrio adota o princípio do livre convencimento motivado do Juiz, que implica dizer que o julgador tem liberdade para decidir o litígio como considerar mais adequado, conforme seu convencimento, mas dentro dos limites impostos pela lei e dando motivação à sua decisão, de acordo com as provas existentes nos autos.
Ocorre que o Juiz, ao nosso ver, não pode decidir contrariamente à Lei, senão acarretaria enorme insegurança jurídica, pois imagine um Juiz de uma Comarca/Subseção julgando determinada matéria de acordo com a Lei, e outro, de forma diametralmente oposta, quando a matéria é idêntica.
Apesar de isso ser incomum (ou até comum, diga-se), na prática, o advogado que atua na área do Direito Ambiental deve estar preparado para recorrer de decisões proferidas por Magistrados, que com todo respeito, pensam diferente do postulado da legalidade.
Exemplo no qual o Magistrado entendeu de forma diferente à Lei
Como exemplo, cita-se julgado da Justiça Federal no qual o Magistrado de primeira instância julgou improcedente ação anulatória de auto de infração ambiental que buscava a prescrição da pretensão punitiva ante a ausência de marcos interruptivos da prescrição.
No caso, a infração administrativa também constituía crime ambiental, sendo a prescrição da pretensão punitiva de 4 anos, porém, o Magistrado entendeu que o prazo prescricional da infração ambiental deveria ser o de 5 anos, em detrimento do artigo 109 do Código Penal.
O fundamento do Magistrado foi a de que o autuado não pode se beneficiar de tratamento mais benéfico do que o que a lei confere às infrações meramente administrativas, sem razão, é claro, mas veja-se:
Quanto a esse ponto, vinha decidindo que o prazo de prescrição, quando a conduta fosse tipificada também como crime, regular-se-ia pelo Código Penal, ainda quando o prazo, nessa hipótese, fosse menor do que cinco anos. Refleti melhor sobre a matéria e altero meu entendimento.
O legislador, ao possibilitar que se aplique o Código Penal nas situações em que o ato praticado for tipificado também como crime, quis, inequivocamente, agravar a posição do réu que, além de infringir normas administrativas de direito ambiental, incorre em conduta criminosa.
Não faz sentido que se interprete de outra forma – e aqui reconheço expressamente o equívoco da interpretação que fiz até o presente momento -, pois não se pode conceber, por uma questão de lógica elementar, que uma conduta mais grave, porque atenta ao mesmo tempo contra duas espécies de normas, as de direito administrativo e as de direito penal, se beneficie de tratamento mais benéfico do que o que a lei confere às infrações meramente administrativas.
O sentido mais condizente com os princípios que orientam a hermenêutica ambiental – especialmente o da prevenção e da precaução – só pode ser o que estabelece o prazo de cinco anos como prazo mínimo de prescrição, que pode, no entanto, ser maior quando a infração, ao configurar crime, superar, adotado o critério de contagem do Código Penal, o limite mínimo (cinco anos) fixado na lei administrativa.
Nos demais casos, em que ao prazo prescricional penal for inferior a cinco anos, aplica-se o prazo utilizado comumente para as infrações administrativas: cinco anos.
Com máximo respeito ao entendimento do ilustre Magistrado, razão não lhe assiste, porque tal entendimento viola o princípio da legalidade expressamente previsto pelo Legislador.
Solução ao caso prático
No caso ante relatado, a infração ambiental praticada também constitui crime ambiental, pelo que o prazo prescricional a ser observado era o previsto na lei penal, por expressa e legal previsão do artigo 1º, § 2º, da Lei 9.873/99 e artigo 21, § 3º do Decreto 6.514/08
Assim, enquadrando-se a infração no tipo penal da Lei 9.605, de 1998, cuja pena máxima é de um ano, a prescrição da pretensão punitiva pela autarquia exequente rege-se pelo prazo de quatro anos, nos termos do art. 109, inciso V, do Código Penal.
Há casos, porém, que a prescrição da pretensão punitiva ocorre em 12 anos, a exemplo das infrações praticadas contra Unidade de Conservação, cuja pena máxima é de cinco anos, o que evidencia o claro intento do legislador em punir condutas na esfera administrativa com pena compatível à esfera penal.
Ora. O que a legislação de regência pretendeu, foi justamente dar às infrações administrativas ambientais penas proporcionais às condutas que também configuram crimes ambientais.
Desse modo, desnecessário e equivocado o entendimento do Magistrado que entendeu aplicar o prazo prescricional da pretensão punitiva de 5 anos quando a infração administrativa comportava apenas 4 anos, conforme previu o legislador, justamente por não ser grave suficiente a ponto de justificar reprimenda maior.
Se o fato objeto da ação punitiva também constitui em tese crime, a lei antes referida prevê expressamente que a prescrição da ação punitiva deve reger-se de acordo com o prazo previsto na lei penal (art. 1º, § 2º).
Portanto, quando a conduta capitulada no auto de infração configurar crime, o prazo de prescrição da pretensão punitiva da Administração Pública será o estabelecido no artigo 109 do Código Penal, de acordo com a pena em abstrato estabelecida para o tipo penal correspondente, independentemente de ter sido ajuizada ação penal ou aberto inquérito policial, tendo em vista que não há previsão legal que faça tal exigência.
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