Quando se menciona dano, está-se a referir a um prejuízo injustamente causado a terceiro, cujo corolário é o dever de indenizar o ofendido pelo ofensor.
Com relação ao dano ambiental, Paulo de Bessa Antunes[1] ensina:
Dano ambiental é dano ao meio ambiente. Meio ambiente é conceito cultural. É a ação do ser humano que vai determinar que deve e o que não deve ser entendido como meio ambiente. O meio ambiente é um bem jurídico autônomo. O bem jurídico meio ambiente é tutelado pelo direito público e pelo direito privado.
O meio ambiente é res communes omnium. Uma coisa comum a todos, que pode ser composta por bens pertencentes ao domínio público ou ao domínio privado. A propriedade do bem jurídico meio ambiente, quando se tratar de coisa apropriável, pode ser pública ou privada. A fruição do bem jurídico meio ambiente é sempre de todos, da sociedade. Igualmente, o dever jurídico de proteger o meio ambiente é de toda a coletividade e pode ser exercido por um cidadão, pelas associações, pelo Ministério Público ou pelo Estado.
A jurisprudência tem se inclinado a reconhecer que a responsabilidade ambiental é fundada na teoria do risco integral.
No entanto, o dano ambiental não é apenas aquele causado ao meio ambiente, pois também o particular pode suportar danos pessoais advindos de, por exemplo, uma contaminação causada pelo despejo de detritos tóxicos de uma indústria.
Índice
A doutrina e o dano ambiental individual
Nesse sentido, a doutrina afirma haver tanto um dano ambiental individual e um dano moral coletivo:
Conforme salientamos alhures, o Direito enxerga o dano ambiental sob dois aspectos distintos: a) dano ambiental coletivo (…) e b) dano ambiental individual ou dano ambiental pessoal, sofrido pelas pessoas e seus bens (…) como ocorre, por exemplo, com a contaminação de um curso de água por carreamento de produto químico nocivo. (…)
No primeiro caso, ou seja, de ação civil pública veiculadora de pretensão reparatória do dano ambiental coletivo (…) se inscreve no rol das ações imprescritíveis. (…) No segundo caso, ou seja, no de dano reflexo ou infligido ao microbem e ambiental, aí sim, estarão definidas as regras de prescrição pelos ditames do Código Civil, pois tem titulares determinados.[2]
O Código Civil não cuida diretamente dos bens ambientais (…) o dano ambiental reparável é aquele sempre atrelado a prejuízos pessoais ou patrimoniais do titular do recurso ambiental afetado (…) e um dano reflexo, também denominado ‘dano em ricochete’, imposto a uma pessoa determinada que é titular do objeto material do dano. (…)
Não há preocupação com a questão ambiental, pois a pessoa é a figura central, ocupando-se a responsabilidade civil de garantir proteção de sua saúde e de sua propriedade.[3]
O que diz a jurisprudência sobre a ação de reparação de dano ambiental
Em sua dimensão coletiva, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que a pretensão de reparação do dano ambiental não é atingida pela prescrição, em função da essencialidade do meio ambiente. Veja-se, nesse sentido:
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – DIREITO AMBIENTAL- AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL – PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE – SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.
[…] Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena.
O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado.
Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano.
O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.
Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer , considera-se imprescritível o direito à reparação.
O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ. […]
Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. (REsp 1120117/AC, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 19/11/2009.
Prazo prescricional para ajuizar ação individual por dano ambiental
Em hipótese de reparação de direitos e interesses individuais, mesmo que causados por danos ambientais – isto é, de um dano ambiental individual –, é aplicável o prazo prescricional previsto no Código Civil, questão sedimentada no REsp 1346489/RS.
Aliás, a depender de como é formulada a pretensão em juízo, o dano ambiental individual se mostra como um verdadeiro direito individual homogêneo, se fundamentado em fato que tenha originado danos a um grande número de pessoas. Nesse sentido:
O dano ambiental pode ser classificado em difuso, coletivo e individual homogêneo este, na verdade, trata-se do dano ambiental particular ou dano por intermédio do meio ambiente ou dano em ricochete, enquadrando-se naquela classificação por razões processuais, aplicando-se as regras do CDC e da LACP.[4]
Destarte, pode-se concluir que o dano ambiental que está sob o manto da imprescritibilidade diz respeito às ações de reparação de danos ao próprio meio ambiente e não aos prejuízos causados individualmente, patrimonial ou extrapatriominal. Quando a busca é o ressarcimento de prejuízo individual causado pelo dano ambiental, a matéria atinente à prescrição é regida pelo Código Civil.
Portanto, a imprescritibilidade relativa aos danos ambientais refere-se tão somente ao dano ambiental coletivo e não ao dano de caráter econômico individual reflexo ao dano ambiental, chamado de dano in ricochete.
A imprescritibilidade no referido tema visa à recomposição do dano ambiental e não econômico individual, de modo que incide a prescrição em caso de dano in ricochete individual advindo do dano ambiental, aplicando-se aí o prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, V, do Código Civil.
[1] Manual de direito ambiental. São Paulo: Atlas, 5ª ed., 2013, p. 151-153.
[2] Édis Milaré. Direito Ambiental. Doutrina – jurisprudência – glossário. 4ª ed. RT, págs. 962/964.
[3] Annelise Monteiro Steigleder. Responsabilidade Civil Ambiental. As dimensões do Dano Ambiental no Direito Brasileiro. Ed. Livraria do Advogado. pág. 66.
[4] GERENT, Juliana. Breve análise jurídica da natureza bifronte do dano ambiental. Processos Coletivos, Porto Alegre, vol. 1, n. 5, 01 out. 2010.
2 Comentários. Deixe novo
Em caso de condenação, em ACP, ao pagamento de indenização pelos danos causados ao meio ambiente, a imprescritibilidade se estende à prescrição intercorrente na fase de cumprimento de sentença?
A princípio, a prescrição intercorrente na fase de cumprimento de sentença seria de ordem processual e, dessa forma, uma vez incidente, deve ser reconhecida a prescrição intercorrente no cumprimento de sentença com a consequente extinção do processo, desde que a paralisação injustificada seja decorrente da prolongada inércia do exequente.