Caso a Administração Pública se mantenha inerte por determinado período de tempo fixado em lei, ficará impossibilitada de exercer seu poder-dever punitivo em razão da incidência da prescrição, que em termos gerais, é a perda do direito para o exercício de uma pretensão.
Trata-se de um instituto jurídico presente nos mais diversos ramos do direito e é fundamental para que a segurança jurídica, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito sejam resguardados.
Agora imagine a seguinte situação: uma pessoa pratica uma infração ambiental e em seguida é autuada por um órgão federal.
O direito ao contraditório e à ampla defesa é oportunizado e no processo administrativo, após instrução, é proferida decisão definitiva irrecorrível, aplicando-se exclusivamente a pena de multa simples. Qual é o prazo da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita?
Para responder a essa pergunta, deve-se lembrar, numa perspectiva bastante simples, que a prescrição da pretensão punitiva está ligada à atuação do Estado com o objetivo de apurar eventual infração administrativa ambiental e aplicar a penalidade dela decorrente, ou seja, incide tanto para a lavratura do auto de infração e instauração do processo, como no curso dele.
Índice
Quando incide a prescrição no processo administrativo ambiental
De forma bastante breve, no Direito Administrativo Sancionador ambiental há três tipos de prescrição. A primeira se refere à perda do direito da Administração Pública em apurar o fato, ou seja, para lavrar o auto de infração ambiental e instaurar o competente procedimento.
Embora a legislação tenha tratado esse período como “prescrição”, trata-se, na verdade, de decadência, em razão de caracterizar a perda do titular do direito em promover a apuração do fato.
Depois, lavrado o auto de infração e instaurado o procedimento administrativo, está ele sujeito à prescrição da pretensão punitiva que se subdivide em prescrição da pretensão punitiva propriamente dita e prescrição da pretensão punitiva intercorrente.
Enquanto aquela é em regra geral de 5 anos — salvo na hipótese de infração administrativa também configurar crime ambiental —, essa última, a intercorrente, ocorre sempre que o processo ficar paralisado por prazo igual ou superior a 3 anos, pendente de julgamento ou despacho.
Prescrição da sanção de multa no processo administrativo
No caso do processo administrativo federal, ao qual debruça-se o estudo, a resposta à pergunta antes feita está contida no § 2º do artigo 1º, da Lei 9.873/99, segundo o qual, “quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal”.
Em redação similar, o § 3º do artigo 21, do Decreto Federal 6.514/08, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, diz que “quando o fato objeto da infração também constituir crime, a prescrição de que trata o caput reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.”
O que se tem até então, é que o processo administrativo ambiental iniciado a partir da lavratura do auto de infração está sujeito à incidência da prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, em regra de 5 anos — salvo na hipótese de a infração administrativa também constituir crime ambiental, ocasião em que a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal, que, uma vez incidente, acaba por retirar da Administração Pública o poder de impor sanções às condutas indesejadas.
Assim sendo, se o próprio legislador determinou a aplicação dos prazos do Código Penal para cômputo da prescrição sempre que a infração administrativa também configurar crime ambiental, razão não há para entendimento contrário, sobretudo porque a Administração Pública está adstrita ao princípio da legalidade, não podendo fazer interpretação discricionária da Lei.
Prescrição da pena ou sanção de multa ambiental
Como visto, o § 2º do art. 1º da Lei 9.873/99 e § 3º do art. 21 do Decreto 6.514/08 expressamente prevê que quando a infração também constituir crime ambiental, o prazo aplicável será o da Lei Penal, e tendo sido aplicada sanção isolada de multa simples, o prazo prescricional da pena de multa é de 2 (dois) anos, conforme previsto no artigo 114, inciso I, do Código Penal, aplicável aos processos administrativos ambientais não por analogia, mas por expressa previsão legal. Referido dispositivo do Código Penal tem o seguinte teor:
Art. 114 – A prescrição da pena de multa ocorrerá: I – em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada;
De uma análise sistemática do Código Penal, da Lei 9.605/08, Lei Federal 9.873/99 e do Decreto Federal 6.514/08, conclui-se sem grandes esforços que se aplica à pena de multa o inciso I, do artigo 114, do Código Penal, sempre que ela for a única aplicada.
Ora. Se o prazo prescricional aplicável quando a infração administrativa constituir crime ambiental será o da Lei Penal, então, obviamente, o prazo da prescrição quando a sanção de multa for a única aplicada é a do art. 114, inciso I, do Código Penal, prescrevendo, pois, em 2 anos a pretensão punitiva da Administração Pública.
Vale destacar, que até a emissão da decisão administrativa, o prazo prescricional da pretensão punitiva se regula pela regra geral de 5 anos, ou, pelo máximo abstratamente cominado ao crime ambiental correspondente com a infração administrativa, conforme previsto no art. 1º, § 2º da Lei 9.873/99 e art. 21, § 3º, do Decreto 6.514/08.
Desse modo, se a Lei Ambiental prevê outras modalidades sancionatórias para infrações administrativas que também configuram crimes ambientais, que não somente a multa, para fins de cômputo do prazo prescricional abstrato deve ser observada referida regra que remete ao parágrafo único do artigo 109 do Código Penal.
Por outro lado, sendo a pena de multa única aplicada, remete-se ao art. 114, I, do Código Penal, por força da mesma previsão legal (art. 1º, § 2º da Lei 9.873/99 e art. 21, § 3º, do Decreto 6.514/08).
Conclusão
Observando-se o que estabelece o art. 79 da Lei de Crimes Ambientais e as normas acima referidas, que prevê a aplicação subsidiária do Código Penal, e sendo certo que a infração administrativa também configura crime ambiental, homologado o auto de infração à pena isolada e exclusiva de multa, incide subsidiariamente, na falta de previsão específica, o disposto no art. 114, I, do Código Penal, segundo o qual, repita-se, “a prescrição da pena de multa ocorrerá em dois anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada.”
Portanto, se no curso do processo administrativo federal transcorrer mais de 2 anos sem marcos interruptivos da prescrição e a decisão julgadora condenatória fixa tão somente pena de multa simples ao autuado, a punibilidade quanto à infração administrativa ambiental deve ser extinta, pois, inarredável a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, não havendo espaço para atendimento diferente.
A questão, vale lembrar, é de ordem pública, ou seja, o reconhecimento da prescrição deve ser declarado inclusive de ofício, em qualquer fase do processo.