Existem teses defensivas que estão relacionadas ao auto de infração ambiental e outras teses de defesa que estão relacionadas ao processo administrativo ambiental em si, ou seja, que devem ser alegadas de forma distinta.
Enquanto aquelas visam identificar vícios em razão do cumprimento ou não dos requisitos do ato administrativo quando da lavratura do auto infração, estas observam o cumprimento das etapas estabelecidas em lei para o procedimento de apuração e o respeito aos princípios administrativos e constitucionais.
Assim, são exemplos de teses que atacam a validade do auto de infração as que se referem a incompetência do agente autuante, a desvio de finalidade, a inobservância das formalidades, a inexistência de motivo ou causa e a ilegalidade do objeto ou conteúdo.
E, ainda, as que se referem a vícios relacionados ao auto de infração apontando que ele fora lavrado com ausência de indicação do dispositivo violado, sem a identificação da base cálculo usada na imposição da multa e sem a descrição clara e objetiva da conduta infracional.
De outro norte, as teses que atacam a higidez do processo administrativo são as que se relacionam, especialmente, com a violação dos princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da motivação e da razoável duração do processo.
Índice
Exemplos de ilegalidades que resultam na anulação do auto de infração
São exemplos as teses de ilegalidade na imposição de sanção com base em portaria, decreto ou resolução, de ausência de motivação da decisão sancionadora e de aplicação de multa acima do mínimo legal sem justificativa e de prescrição.
Além disso, também há teses relativas à irregularidade na notificação por edital sem o esgotamento das outras vias, de ausência de intimação para alegações finais, de ausência de informação quanto ao prazo recursal quando da intimação da decisão julgadora, de descrição genérica da suposta conduta infracional, entre outras.
Essa diferenciação faz-se necessária porque as teses que atacam o auto de infração, em sua maioria, representam vícios insanáveis e acarretam a nulidade do auto de infração, extinguindo por completo o processo administrativo que foi instaurado a partir dele.
Por outro lado, as teses que atacam o processo administrativo normalmente se apresentam como vícios sanáveis e que ensejam a anulação parcial do feito, apenas a partir do ato considerado inválido, permitindo a retomada de seu curso a fim de que a Administração realize novo julgamento naquela esfera e constitua regularmente o crédito.
Desta feita, tendo-se em mente que cada tese vai conduzir a uma consequência jurídica, o procurador pode traçar melhor a sua estratégia, visando a alegação de todas as teses, inclusive as subsidiárias, para se chegar ao resultado almejado.
Análise para identificar as teses de defesa contra auto de infração e processo administrativo ambiental
Diante das especificidades que envolvem cada caso e da grande quantidade de teses defensivas que podem ser alegadas, é imprescindível a realização de uma análise acurada e minuciosa da autuação e do processo administrativo.
Demais disso, é extremamente relevante a análise conjunta de todos os processos administrativos de uma mesma parte autuada, visto que isso permite ao advogado ter uma visão global do caso e, inclusive, identificar algumas teses que somente são visíveis sob uma ótica macro.
É o caso, por exemplo, da tese referente a aplicação do princípio da consunção/absorção que pode ser alegada quando dois ou mais autos de infração ambiental são lavrados para o mesmo infrator, tendo como objeto a mesma conduta infracional e bens jurídicos tutelados diversos, porém uma infração é meio necessário ou fase normal de preparação ou de execução da outra infração.
Portanto, é cabível a aplicação do princípio da consunção para que somente uma das condutas seja apurada e, eventualmente, punida.
No mesmo sentido, é a tese referente a vedação do non bis in idem, que busca impedir a dupla punição com base no mesmo fato gerador, pois é comum avistar dois autos de infração lavrados pelo mesmo fato infracional, embora com datas diferentes, ou mesmo lavrados por entes diferentes.
Ainda, em algumas teses de cerceamento de defesa, é possível identificar a violação ao princípio do contraditório e ampla defesa devido à realização de intimação por edital, sem o esgotamento das outras vias, na medida em que o órgão ambiental não tentou a intimação via postal em novo endereço fornecido pelo autuado em processo administrativo apenso.
Deste modo, vislumbra-se a importância de uma análise global e pormenorizada de cada caso para que possa ser traçada a melhor estratégia de defesa e, assim, potencializar os resultados.
Ônus e produção de provas
O auto de infração ambiental é um ato administrativo que goza de presunção de veracidade e legitimidade, gerando uma inversão do ônus da prova, sendo necessário que o administrado comprove cabalmente a situação fática que lhe permita desconstituir o auto de infração.
Ocorre que, em muitos casos, a produção de provas pelo autuado é bastante difícil ou até impossível, e exigir dele a comprovação de que não praticou a infração acaba por se transformar em prova diabólica.
No que tange ao ônus da prova, o Código de Processo Civil (aplicável ao processo administrativo) adotou um critério mais flexível, denominado pela doutrina de distribuição dinâmica, que permite ao Juiz — ou no caso, à autoridade administrativa ambiental —, na busca pela verdade real, distribuir o ônus da prova de maneira diversa da regra ordinária.
Através da distribuição dinâmica do ônus da prova, autoriza-se à autoridade ambiental atribuir a responsabilidade pela produção da prova ao próprio órgão ambiental que, sabidamente, tem todo o aparato necessário e as melhores condições de produzi-la.
Aliás, o órgão ambiental se encontra em posição privilegiada em relação à parte autuada, por deter estrutura e conhecimentos técnicos específicos sobre os fatos discutidos nos autos e que são relevantes para o deslinde da causa. É o que dispõe o art. 373, § 1º, do CPC:
Art. 373. § 1º. Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
Ônus da prova deve ser do órgão ambiental de fiscalização
No caso do processo administrativo ambiental, o órgão ambiental é plenamente capacitado para demonstrar que o autuado praticou a conduta descrita no auto de infração ambiental, ônus do qual deve se desincumbir, haja vista a impossibilidade de demonstração de fato negativo pela parte autuada.
As regras atinentes à inversão do ônus da prova prevista no artigo 373 do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) são plenamente aplicáveis ao processo administrativo ambiental por força do art. 15 do mesmo diploma, que prevê expressamente a possibilidade de aplicação subsidiária e supletiva das suas normas aos processos administrativos, dispositivo que foi declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal – STF ao julgar a ADI 5492.
Assim, como as normas e regulamentos do processo administrativo ambiental são omissas quanto à possibilidade inversão do ônus da prova, aplica-se o disposto no artigo 373 do Código de Processo Civil, evitando transferir ao autuado a produção de uma prova diabólica, impossível ou extremamente difícil de ser produzida.
Conclusão
Além disso, o órgão ambiental tem estrutura adequada, com recursos humanos dotados de conhecimento específico e equipamento técnico suficiente a demonstrar a prática da infração, ou seja, tem maior facilidade de obtenção da prova.
Assim, pode a autoridade ambiental atribuir o ônus da prova de modo diverso, caso em que deverá determinar ao próprio órgão ambiental a oportunidade de se desincumbir do ônus de comprovar que a parte autuada efetivamente praticou a conduta ilícita, e não se limitar apenas a lavratura do auto de infração ambiental, que tem natureza de peça acusatória.
Portanto, cabe ao julgador determinar a inversão do ônus da prova nos casos em que a parte autuada não possuir condições de produzir as provas necessárias para comprovar que não praticou a infração, ao contrário do órgão ambiental, que possui todo o aparato estatal e, por óbvio, tem melhores condições de suportar o ônus probatório.