Quando um bem é utilizado para cometer uma infração ambiental, o órgão competente lavra o auto de infração ambiental e o respectivo termo de apreensão, instaurando o processo administrativo para apurar a conduta.
Após a apreensão, os bens ficam sob a guarda do órgão ou entidade responsável pela fiscalização, porém, em situações excepcionais, são depositados com o próprio infrator, o qual passa a ser considerado “fiel depositário”, e com ele permanecem até o julgamento do processo administrativo.
Nesta hipótese, se a decisão julgadora entender pela anulação, cancelamento ou revogação da apreensão, o órgão ou a entidade ambiental responsável pela apreensão restituirá o bem apreendido ao autuado, o qual já se encontra com o autuado.
Por outro lado, se o termo de apreensão é confirmado por ocasião do processo administrativo ambiental, aplicando-se a pena de perdimento, o infrator é notificado para entregar o bem.
Ocorre que na maioria das vezes, o infrator, mesmo notificado, não entrega o bem espontaneamente, e, estando em mora, o órgão ambiental pode ajuizar ação de depósito para compelir o infrator judicialmente, à entrega do bem.
Todavia, muitas ações de depósito são propostas pelos órgãos ambientais após o prazo legal, ou seja, após a incidência da prescrição. Mas qual seria o prazo para que o órgão ajuíze a ação de depósito?
Antes de passar ao prazo prescricional, necessário frisar que a ação de depósito tem o objetivo precípuo à condenação em obrigação de fazer consistente em compelir o réu (infrator) à entrega do bem apreendido durante a fiscalização ambiental na qual foi confiado como fiel depositário.
Índice
Fiel depositário e apreensão de bens
Antes de tratar especificamente sobre o prazo prescricional da ação de entrega dos bens apreendidos, vamos reforçar ao leitor sobre a apreensão de bens, a qual indicada no Decreto Federal 6.514/2008:
Art. 101. Constatada a infração ambiental, o agente autuante, no uso do seu poder de polícia, poderá adotar as seguintes medidas administrativas:
I – apreensão;
Art. 102. Os animais, produtos, subprodutos, instrumentos, petrechos, veículos de qualquer natureza referidos no inciso IV do art. 72 da Lei no 9.605, de 1998, serão objeto da apreensão de que trata o inciso I do art. 101, salvo impossibilidade justificada.
Parágrafo único. A apreensão de produtos, subprodutos, instrumentos, petrechos e veículos de qualquer natureza de que trata o caput independe de sua fabricação ou utilização exclusiva para a prática de atividades ilícitas.
Art. 105. Os bens apreendidos deverão ficar sob a guarda do órgão ou entidade responsável pela fiscalização, podendo, excepcionalmente, ser confiados a fiel depositário, até o julgamento do processo administrativo.
Parágrafo único. Nos casos de anulação, cancelamento ou revogação da apreensão, o órgão ou a entidade ambiental responsável pela apreensão restituirá o bem no estado em que se encontra ou, na impossibilidade de fazê-lo, indenizará o proprietário pelo valor de avaliação consignado no termo de apreensão.
Art. 106. A critério da administração, o depósito de que trata o art. 105 poderá ser confiado:
I – a órgãos e entidades de caráter ambiental, beneficente, científico, cultural, educacional, hospitalar, penal e militar; ou
II – ao próprio autuado, desde que a posse dos bens ou animais não traga risco de utilização em novas infrações.
§ 1º Os órgãos e entidades públicas que se encontrarem sob a condição de depositário serão preferencialmente contemplados no caso da destinação final do bem ser a doação.
§ 2º Os bens confiados em depósito não poderão ser utilizados pelos depositários, salvo o uso lícito de veículos e embarcações pelo próprio autuado.
§ 3º A entidade fiscalizadora poderá celebrar convênios ou acordos com os órgãos e entidades públicas para garantir, após a destinação final, o repasse de verbas de ressarcimento relativas aos custos do depósito.
Abrindo-se um parênteses, vale destacar que apesar da apreensão de bens utilizados na prática de infração ambiental estar prevista na legislação, o Poder Judiciário está legitimado a analisar a legalidade da apreensão, nos termos do princípio da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, inciso XXXV).
Prazo prescricional da ação para entrega de bens apreendidos em infração ambiental
Nos termos do art. 1º do Decreto 20.910/32, “as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todos e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual, ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem”.
No que concerne ao termo inicial da prescrição, em se tratando de ações de depósito ajuizadas para que o depositário apresente ou entregue o bem apreendido, o prazo prescricional somente começa a fluir da data em que houve a recusa em entregá-lo.
Em se tratando de ação de depósito de bem apreendido pela prática de infração ambiental, é inteiramente aplicável a regra constante do Decreto 20.910/1932, no que se refere à contagem do prazo prescritivo, assim como o art. 627 do Código Civil relativamente ao termo inicial do lapso prescricional, segundo o qual o depositário deverá guardar um objeto móvel até que o depositante o reclame:
Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame.
Apesar de a relação estabelecida entre o órgão ambiental e o infrator nomeado na condição de fiel depositário do bem apreendido ser regida pelo Direito Administrativo, aplica-se o disposto no art. 627 do Código Civil para fins de definição do termo inicial para a propositura de ação objetivando a entrega do objeto depositado
Assim, o termo inicial do prazo prescricional deve ser a data em que houve a pretensão resistida na esfera administrativa, qual seja a data da recusa da entrega pelo depositário.
Logo, se após a notificação do depositário para restituir o bem apreendido não houver a entrega do bem, o órgão ambiental está autorizado a ajuizar a ação de depósito, cujo prazo prescricional é de 5 (cinco) anos contados do dia subsequente à mora.
Ou seja, o termo inicial do prazo prescricional da ação de depósito é de 5 anos contado do dia seguinte ao vencimento do prazo constante na notificação para entrega do bem apreendido.
O que diz a jurisprudência sobre o prazo prescricional da ação de depósito
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APREENSÃO DE BENS PELO IBAMA. INFRAÇÃO AMBIENTAL. AÇÃO DE DEPÓSITO. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. DATA DA CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEPOSITÁRIO. NOTIFICAÇÃO DO DEPOSITÁRIO PARA ENTREGA DO BEM. HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA.
1. Trata-se de apelação interposta pelo IBAMA contra sentença que pronunciou a prescrição e extinguiu o processo, com resolução do mérito, na ação ajuizada visando compelir a parte ré a entregar os bens depositados em seu poder ou ao pagamento do seu equivalente em dinheiro, em virtude da prática de infração ambiental.
2. Nas ações que tratam da relação entre o IBAMA e o depositário de bem objeto de infração ambiental, este Tribunal, tendo em vista inexistência de regra específica, vem entendendo ser aplicável o prazo quinquenal previsto no Decreto n. 20.910/32.
3. Este Tribunal também firmou entendimento no sentido de que, no que concerne ao termo inicial da prescrição, em se tratando de ações de depósito ajuizadas para que o depositário apresente o bem apreendido, o prazo prescricional somente começa a fluir da data em que houve a recusa em entregá-lo, que se materializa na data da notificação do depositário para a restituição do bem apreendido ou pagamento do equivalente em dinheiro, o que decorre da interpretação dada ao art. 627 do Código Civil. Precedentes declinados no voto.
4. No caso dos autos, a notificação do depositário para restituir o bem apreendido ou pagar o equivalente em dinheiro ocorreu em 21/06/2004, enquanto a ação de depósito foi ajuizada em 07/03/2014, transcorrendo, portanto, o prazo prescricional de 5 (cinco) anos. 5. Honorários advocatícios recursais fixados, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
6. Apelação desprovida. (AC 0002008-89.2014.4.01.4301, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 – SEXTA TURMA, PJe 08/09/2022).
Conclusão
Conclui-se, que o termo inicial do prazo prescricional de 5 anos deve ser o dia seguinte ao prazo dado na notificação do depositário para a restituição do bem apreendido ou pagamento do equivalente em dinheiro
Isso porque, na ação de depósito é aplicada a prescrição quinquenal a que se refere o Decreto 20.910/1932, pois se trata de sanção aplicada devido à prática de infração ambiental administrativa.
Vale destacar, por fim, que somente em caso de o depositário não possuir mais os bens confiados a sua guarda é que deve consignar o equivalente em dinheiro, porque se o depositário tem o bem e não entrega, ou não o tem, deve indenizar o órgão ambiental pelo valor inicial, devidamente corrigido.
Portanto, o termo inicial da prescrição é a data em que houve a pretensão resistida na esfera administrativa, qual seja a data da recusa da entrega pelo depositário.