No dia 24 de maio de 2022, o Decreto Federal 6.514/08, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências, sofreu 136 alterações pelo Decreto 11.080, aí incluída a possibilidade de agravamento da multa ambiental por reincidência.
O agravamento da multa ambiental em dobro ou triplo, de acordo com a nova redação do art. 11 do Decreto 6.514/08, ocorre quando o infrator cometer nova infração no período de 5 anos, que passou a ser contado da decisão administrativa condenatória, e não mais da lavratura do auto de infração ambiental confirmado em julgamento.
Logo, para sofrer o agravamento da multa ambiental por reincidência, o autuado deve ter praticado nova infração 5 anos após a decisão administrativa que o condenou ter se tornado definitiva, imutável, irrecorrível, observado o fato de que tal agravamento somente pode ser realizado em primeira instância.
Assim, se o infrator interpõe recurso administrativo e cometeu nova infração ambiental pela qual foi autuado, esta não poderá ser agravada porque aquela não se tornou definitiva.
Além disso, defendemos que a nova redação do art. 11 do Decreto 6.514/08 para afastar agravamentos já aplicados em primeira instância em processos administrativos que não possuem decisão administrativa.
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(in)Validade do Decreto que prevê agravamento da multa ambiental por reincidência
Após a publicação da Lei Federal 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), foi editado o Decreto Federal 3.179/1999, o qual regulamentou o art. 70 da referida Lei 9.605/98, e descreveu quais seriam as condutas que mereceriam reprimenda por parte da Administração Pública.
Contudo, referido decreto inovou no ordenamento jurídico ao prever novos institutos, tal como o agravamento da multa ambiental em caso de reincidência, que pode ser realizado em dobro (para cometimento de infração genérica) ou triplo (para cometimento de infração específica).
Posteriormente, o Decreto Federal 3.179/99 foi revogado pelo Decreto Federal 6.514/08, mantendo-se a possibilidade de agravamento, com o suposto objetivo de auxiliar, garantir a eficácia e efetividade da aplicação das sanções ambientais por meio de mais severidade da penalidade.
Entretanto, ambos os decretos extrapolaram os limites de sua competência ao inserir disposição sancionatória não prevista previamente pelo Poder Legislativo, notadamente por meio da Lei Federal 9.605/98.
De fato, a Lei Federal 9.605/98, ao dispor a respeito das sanções aplicáveis às infrações administrativas, em nenhum momento previu a modalidade de agravamento, sequer mencionando a possibilidade de que houvesse incremento no valor da multa ambiental em virtude de conduta reincidente.
Assim, se não há na Lei Federal 9.605/98 a possibilidade de agravamento das penalidades tipificadas (tampouco em casos de reincidência), mero Decreto com o fim de regulamentar a aplicação da Lei evidentemente não poderia ir além, tratando-se de normativo ilegal como já explicamos aqui
Não custa lembrar que, de acordo com o princípio da legalidade (positivado pelo art. 5º, inciso II, da Constituição da República), é inaceitável que se criem novas obrigações/sanções/disposições se não em virtude de lei. Infelizmente tais estão aí.
Realmente, a despeito da louvável tentativa de previsão de instrumento de agravamento da sanção ambiental como meio de maximizar a proteção ao meio ambiente, tal modificação do preceito sancionatório, notadamente da alteração dos limites das multas ambientais previstas em lei, não encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio.
Procedimento para agravamento da multa ambiental por reincidência
Seja legal ou ilegal do ponto de vista doutrinário, fato é que obedecido o procedimento e possibilitando ao autuado o direito de se manifestar, a jurisprudência reconhece cabível o agravamento da multa ambiental em dobro ou triplo.
O agravamento da multa ambiental ocorre quando cometida nova infração no período de 5 anos, que, de acordo com recentes alterações no Decreto 6.514/08, passou a ser contado do momento da decisão definitiva, e não mais da data da lavratura do auto de infração ambiental confirmado em julgamento.
No que se refere ao procedimento de agravamento das sanções pecuniárias, o disposto no art. 11 do Decreto Federal 6.514/08 — antes de ser alterado em 24 de maio de 2022 —, previa a possibilidade de agravamento da multa ambiental em razão de reincidência quando a autuação anterior já tiver sido confirmada por decisão administrativa julgadora de primeira instância, verbis:
Art. 11. O cometimento de nova infração ambiental pelo mesmo infrator, no período de cinco anos, contados da lavratura de auto de infração anterior devidamente confirmado no julgamento de que trata o art. 124, implica: (revogado pelo Decreto 11.080, de 2022)
O mencionado art. 124, não há dúvidas, é o de primeira instância, realizado após o oferecimento ou não a defesa. Depois disso, inclusive em sede recursal, o agravamento da penalidade por reincidência não pode ser aplicado, conforme previa o revogado § 3º do art. 11 do mesmo diploma.
Desse modo, caso o auto de infração ambiental fosse julgado procedente, a data de sua lavratura seria o termo inicial para o cômputo de eventual reincidência e agravamento da multa ambiental.
Assim, tendo o infrator cometido nova infração ambiental no período de 5 anos contados da data da lavratura do auto de infração ambiental e desde que tenha sido julgado e confirmado em primeira instância, bastava fazer prova de tal condição no novo processo administrativo para que a multa ambiental fosse majorada em dobro ou triplo para justificar a reincidência.
Isso leva à conclusão que a intenção do legislador foi a maximização da proteção do meio ambiente ao prever a simples data da lavratura do auto de infração ambiental confirmado em julgamento de primeira instância como condição para o agravamento da sanção administrativa.
Alteração no procedimento de agravamento de multa por reincidência
A nova redação do art. 11, dada pelo Decreto 11.080, de 2022, alterou a data utilizada para fins de agravamento, a qual passou da data da lavratura do auto de infração ambiental para a data em que a decisão administrativa condenatória se torne definitiva:
Art. 11. O cometimento de nova infração ambiental pelo mesmo infrator, no período de cinco anos, contado da data em que a decisão administrativa que o tenha condenado por infração anterior tenha se tornado definitiva, implicará:
I – aplicação da multa em triplo, no caso de cometimento da mesma infração; ou
II – aplicação da multa em dobro, no caso de cometimento de infração distinta.
Nos termos do § 1º do dispositivo em questão dispõe que “o agravamento será apurado no procedimento da nova infração, do qual se fará constar certidão com as informações sobre o auto de infração anterior e o julgamento definitivo que o confirmou”.
Por seu turno o § 2º dispõe que “constatada a existência de decisão condenatória irrecorrível por infração anterior, o autuado será notificado para se manifestar, no prazo de dez dias, sobre a possibilidade de agravamento da penalidade”.
Interpretação dada ao artigo 11 do Decreto 6.514/08
A interpretação do caput do art. 11 e dos parágrafos 1º e 2º não demanda grandes esforços de hermenêutica jurídica, pois somente poderá ser utilizada para fins de agravamento da multa ambiental por reincidência, a decisão administrativa que tenha se tornando definitiva, ou seja, irrecorrível, assim considerada quando a esfera administrativa é esgotada.
Significa dizer que, interposto o recurso, a decisão de primeira instância não se tornou definitiva, e, portanto, mesmo que esta confirme o auto de infração ambiental, não poderá ser utilizada para fins de agravamento por reincidência no novo processo administrativo até que seja julgado o recurso, sendo, porém, vedado o agravamento em segunda instância administrativa, conforme dispõe o § 4º do art. 11 em estudo.
Antes da alteração do art. 11 do Decreto 6.514/08, ao julgar o auto de infração ambiental, bastava que a autoridade de primeira instância verificasse a existência de anterior auto de infração confirmado em julgamento para fins de agravamento da multa ambiental por reincidência em dobro ou triplo, enquanto a nova redação do referido dispositivo somente autoriza a aplicação do agravamento quando a esfera administrativa estiver esgotada.
Talvez não tenha sido essa intenção do executivo, mas, considerando que o agravamento em segunda instância administrativa é vedado, somente serão objeto de agravamento os novos autos de infração cuja decisão tenha se tornado definitiva (irrecorrível), bastando que o infrator interponha recurso para prolongar o esgotamento da esfera administrativa.
Exemplo prático de agravamento da multa
Suponha-se que o infrator seja autuado 10 vezes entre maio de 2022 e dezembro de 2023, por cometer sucessivas infrações ambientais, sejam elas genéricas ou específicas, instaurando-se os competentes processos administrativos.
Imagine, agora, que em todos esses processos o autuado apresentou sua defesa, a qual será objeto de julgamento em primeira instância, e quando indeferida, interpõe recursos contra todas as decisões julgadoras que confirmaram o auto de infração, obstando assim, a existência de decisão definitiva em todos eles.
Antes da alteração do art. 11 do Decreto 6.514/08, utilizando-se o exemplo acima, bastava que o primeiro dos 10 autos de infração ambiental fosse julgado em primeira instância para que todos os outros 9 autos tivessem a multa ambiental agravada por reincidência.
Agora, porém, somente poderá ser utilizada para fins de agravamento as infrações ambientais praticadas em data posterior à existência de decisão definitiva.
Ou seja, no nosso exemplo, sobrevindo decisão definitiva em qualquer um dos 10 processos somente depois do cometimento da última infração, nenhum deles poderá sofrer agravamento, porque além de ser vedado agravar a multa em sede recursal, o marco inicial da reincidência é a prática de novas infrações a partir da decisão definitiva, e não infrações cometidas em período anterior como era na antiga redação do art. 11 em estudo.
Além disso, importa realçar que a reincidência incide no período de 5 anos entre a data em que a decisão administrativa que o tenha condenado por infração anterior tenha se tornado definitiva e a data em que o agente praticou a nova infração, e não a data da lavratura da autuação, e sendo a nova norma mais benéfica, deve retroagir para afastar agravamentos já realizados em processos administrativos pendentes de decisão definitiva e que portanto, não transitaram em julgado.
O que é decisão definitiva para fins de agravamento
Sobre o conceito de decisão definitiva, vale rememorar a decisão do Recurso Especial Repetitivo 1.115.078/RS (tema 329), que originou a Súmula 467, do Superior Tribunal de Justiça – STJ, segundo a qual:
Prescreve em cinco anos, contados do término do processo administrativo, a pretensão da Administração Pública de promover a execução da multa por infração ambiental.
Com base nisso, extrai-se que julgado o processo administrativo em primeira instância, condenando o infrator autuado, será ele notificado para pagar a multa no prazo de 5 dias, a partir do recebimento da notificação, ou para interpor recurso no prazo de 20 dias (art. 126 do Decreto 6.514/08), e caso não o faça, ao término do prazo recursal (21º dia) ter-se-á uma decisão definitiva, cabível de ser utilizada para fins de agravamento se o infrator cometer nova infração ambiental nos próximos 5 anos dali contados.
Por outro lado, se interposto o recurso, quando este for julgado, o recorrente (infrator) também é notificado do seu improvimento, bem como, do esgotamento da esfera administrativa e para pagamento da multa no prazo assinalado na notificação, de 5 dias, e decorrido este, ter-se-á no 6º dia uma decisão definitiva passível de agravar eventual nova infração nos próximos 5 anos.
Assim, utilizando-se por analogia a Súmula 467 do STJ da qual se extrai qual seria o termo inicial da prescrição da pretensão executória, tem-se que, o infrator é notificado e decorrido o prazo recursal ou o prazo para pagamento da multa depois improvido o recurso, a decisão administrativa se torna definitiva no dia subsequente ao término do prazo e poderá ser utilizada para fins de agravamento da multa por reincidência para novas infrações cometidas nos próximos 5 anos.
Ou seja, para que a decisão se torne definitiva, o autuado deve ser notificado do seu conteúdo para interpor recurso, se houver interesse, ou cumpri-la, se esgotada a esfera administrativa.
Na hipótese de o autuado deixar escoar o prazo recursal, ocorrerá o trânsito em julgado no 21° dia após a sua intimação, já que da decisão proferida pela autoridade julgadora cabe recurso no prazo de vinte dias.
Lado outro, julgado o recurso, a decisão definitiva se dará no 6ªº dia após a notificação do autuado para pagamento da multa, prazo este considerado pelo Superior Tribunal de Justiça como termo inicial da prescrição da pretensão executória, em razão de que somente a partir desse prazo é que o infrator pode ser considerado inadimplente.
Conclusão
Pode-se concluir que para sofrer o agravamento da multa ambiental por reincidência, o autuado deve ter praticado nova infração 5 anos após a decisão administrativa que o condenou ter se tornado definitiva, imutável, irrecorrível.
Além disso, deve-se observar que o agravamento somente pode ser realizado em primeira instância e não abrange qualquer infração cometida antes de existir uma decisão definitiva, equivalente ao trânsito em julgado.
Por fim, entendemos que o art. 11 em análise é mais benéfico ao infrator, caracterizando a reincidência somente quando o agente pratica nova infração, depois de proferida decisão definitiva que o condenou por infração anterior.
Assim, deve retroagir para afastar agravamentos em dobro ou triplo já realizados em julgamentos de auto de infração ambiental em primeira instância e que pendem de decisão definitiva, aplicando-se por analogia o princípio constitucional da retroatividade da lei penal mais benigna (art. 5º, XL, da CR/88), que guarda íntima relação com o Direito Administrativo Sancionador.
Portanto, bem analisada a nova redação do art. 11 do Decreto 6.514/08, tem-se que somente poderá ser agravada por reincidência a nova infração praticada pelo mesmo infrator no período de 5 anos, contados do dia subsequente ao escoamento do prazo estabelecido na notificação da decisão que o tenha condenado por infração anterior, momento o qual se torna ela definitiva, devendo retroagir para afastar agravamentos realizados em processos que pendem de decisão definitiva.