Como se sabe, a inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR é um registro público eletrônico de âmbito nacional obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico.
A inscrição no CAR é o primeiro passo para obtenção da regularidade ambiental do imóvel possibilitando o planejamento ambiental e econômico do uso e ocupação do imóvel rural, além de constituir requisito fundamental para os programas, benefícios e autorizações, tais como:
- Registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis;
- Acesso aos Programas de Regularização Ambiental – PRA;
- Obtenção de crédito agrícola com taxas de juros menores, bem como limites e prazos maiores que o praticado no mercado;
- Contratação do seguro agrícola em condições melhores que as praticadas no mercado;
- Geração de créditos tributários por meio da dedução das Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal;
- Isenção de impostos para os insumos e equipamentos;
- Suspensão de sanções e novas autuações em função de infrações administrativas por supressão irregular de vegetação em áreas de preservação permanente, de Reserva Legal e de uso restrito cometidas até 22.07.2008, e suspensão da punibilidade dos crimes previstos nos arts. 38, 39 e 48 da Lei de crimes ambientais (Lei 9.605/1998) associados a essas áreas;
- Condição para autorização de supressão de floresta ou outras formas de vegetação nativa no imóvel rural;
- Condição para aprovação da localização da Reserva Legal;
- Condição para cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo da Reserva Legal do imóvel;
- Condição para autorização da exploração econômica da Reserva Legal mediante manejo sustentável;
- Condição para constituição de servidão ambiental e Cota de Reserva Ambiental, e acesso aos mecanismos de compensação da Reserva Legal;
- Condição para autorização de intervenção e supressão de vegetação em Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal para atividades de baixo impacto ambiental;
- Condição para autorização da continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até em 22 de julho de 2008 localizadas em Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal.
Como se vê, um imóvel rural inscrito no Cadastro Ambiental Rural – CAR possui diversos benefícios. Contudo, não basta apenas a inscrição, a qual é feita no órgão estadual competente onde localizado o imóvel, sendo necessária a sua aprovação para que surtir efeitos legais e possibilitar o acesso do produtor rural aos benefícios acima elencados.
Ocorre que na maioria dos Estados brasileiros há uma demora excessiva e injustificada na apreciação e decisão do procedimento administrativo para concessão do Cadastro Ambiental Rural – CAR, o que impede os produtores rurais de acessar os benefícios. Essa é a realidade dos produtores rurais do Estado do Mato Grosso.
Índice
O Cadastro Ambiental Rural – CAR no Mato Grosso
Embora poucas pessoas saibam, o Cadastro Ambiental Rural – CAR foi idealizado e implementado pioneiramente pelos Estados de Mato Grosso e do Pará, sendo suas diretrizes utilizadas como fundamento para a criação do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR), pelo Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012).
Embora o Estado do Mato Grosso seja um dos idealizadores, há milhares e milhares de pedidos de aprovação do CAR parados há meses e até anos que impedem os produtores rurais de obter a regularização ambiental de suas propriedades e acessar os benefícios do programa.
Contudo, o próprio Estado do Mato Grosso possui expressa previsão no artigo 32, III do Decreto Estadual 697/2020[1], que regulamenta o procedimento de licenciamento ambiental no âmbito da Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMA, determinando o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para conclusão do procedimento na seara ambiental.
De igual modo, o Decreto Estadual 1.031/2017 (que regulamenta a Lei Complementar 592/2017, no que tange o Programa de Regularização Ambiental, o Sistema Mato-grossense de Cadastro Ambiental – SIMCAR, a inscrição e análise do Cadastro Ambiental Rural) previu prazos de conclusão de processos administrativos de licenciamento ambiental que o Decreto Estadual 697/2020 estabelece. Confira-se:
Art. 32. Serão obedecidos os seguintes prazos pelo órgão ambiental, quando outros não estiverem previstos em lei ou em disposições especiais:
I – 30 (trinta) dias para emissão da Licença Ambiental por Adesão e Compromisso;
II – 60 (sessenta) dias para decisão definitiva acerca do pedido de Licença Ambiental Simplificada;
III – 180 (cento e oitenta dias) para emissão de decisão definitiva acerca do pedido de licenciamento ambiental trifásico, contendo todos os atos de análise;
IV – 240 (duzentos e quarenta dias) para emissão de decisão definitiva acerca do pedido de licenciamento ambiental, quando o processo tiver solicitação de dispensa de elaboração de EIA/RIMA, incluindo todos os atos de análise e manifestação do CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente;
V – 365 (trezentos e sessenta e cinco dias) para emissão de decisão definitiva acerca do pedido de licenciamento ambiental com EIA/RIMA, contendo todos os atos de análise e aprovação, incluindo audiência pública e referendo do CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente;
VI – 60 (sessenta) dias para análise de pedido de revisão de decisão de indeferimento do pedido de licença ou autorização; suspensão ou cancelamento de licença ou outro ato autorizativo, e indeferimento de dispensa de elaboração de EIA/RIMA.
Desse modo, não observados os prazos estabelecidos no Decreto Estadual 697/2020 quanto a análise do Cadastro Ambiental Rural – CAR no Estado do Mato Grosso, a Administração Pública Estadual estará atuando em desconformidade com os princípios constitucionais da legalidade, eficiência e razoável duração do processo administrativo, hipótese que autoriza o produtor rural a ingressar com as medidas judiciais necessárias para que o seu CAR seja analisado.
Mato Grosso tem 180 dias para analisar o CAR contados da inscrição
No Estado do Mato Grosso há um prazo legal de 180 dias para que a Administração Pública análise o CAR a contar do ato do seu protocolo do requerimento e emita uma decisão conclusiva de deferimento ou indeferimento.
O não cumprimento do prazo de 180 dias, conforme previsto no artigo 32, III do Decreto Estadual 697/2020, configura ato coator ilegal cometido pelo Coordenador da Coordenadoria de Cadastro Ambiental, que a autoridade responsável pela análise do CAR, hipótese que autoriza a impetração de mandado de segurança com pedido liminar para que seja realizada a análise do processo.
A este respeito, em casos de demora excessiva na análise do Cadastro Ambiental Rural – CAR, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso assim se posicionou:
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – REEXAME NECESSÁRIO DA SENTENÇA – MANDADO DE SEGURANÇA – PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – CADASTRO AMBIENTAL RURAL – DEMORA NA APRECIAÇÃO DO REQUERIMENTO – PRAZO – PORTARIA N. 792/2022/SEMA/MT E DECRETO ESTADUAL N. 697/2020 – DIREITO LÍQUIDO E CERTO VIOLADO – SENTENÇA RATIFICADA.
A demora, injustificada, na análise do procedimento administrativo, para apreciação e aprovação do cadastro ambiental rural, fere o direito líquido e certo da parte impetrante e viola o princípio da duração razoável do processo.
As licenças ambientais deverão ser analisadas no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do ato de protocolo do requerimento, até seu deferimento ou indeferimento (Portaria n. 792/2022/SEMA/MT e Decreto Estadual n. 697/2020).
(N.U 1001124-89.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO VIDAL, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 28/08/2023, Publicado no DJE 31/08/2023)
Veja-se que a omissão da Administração Pública Estadual prejudica o proprietário na utilização, fruição e gozo de sua propriedade rural e confronta a legislação em vigor no Estado do Mato Grosso que prevê o prazo de 180 dias para a análise do CAR (art. 32, III, do Decreto Estadual 697/2020), ou seja, a fruição do prazo para a análise do CAR.
Conclusão
Como visto, a morosidade da Administração Pública afronta o artigo 5º, inciso LXXVII, da CF/88, o qual estabelece a garantia de razoável duração do processo administrativo e dos meios que garantam a celeridade da tramitação. Afronta ainda, o artigo 37 da mesma norma que impõe à Administração obediência estrita aos princípios da eficiência e legalidade.
Por certo, tem-se a inatividade do Estado em efetivar a análise do CAR, a qual é necessária a regularização ambiental da propriedade rural, regularização essa que muitas vezes é impedida pela inércia da Administração Pública em concluir a análise do Cadastro Ambiental Rural – CAR, circunstância que caracteriza indiscutível afronta do direito líquido e certo do produtor rural que fez a inscrição do seu imóvel.
Nesse contexto, a demora injustificada por parte da Administração Pública pode ser traduzida em conduta omissiva, ferindo os princípios da eficiência, legalidade e razoável duração do processo, bem como as regras acima indicadas a autorizar a adoção das medidas necessárias, tal como a impetração de mandado de segurança.
Portanto, no caso específico do Estado do Mato Grosso, para obter a análise do CAR após ultrapassados os 180 dias estabelecidos no art. 32, III, do Decreto Estadual 697/2020, o produtor rural pode impetrar um mandado de segurança contra a autoridade coatora e assim exigir que o seu CAR seja analisado.
[1] Art. 32. Serão obedecidos os seguintes prazos pelo órgão ambiental, quando outros não estiverem previstos em lei ou em disposições especiais: III – 180 (cento e oitenta dias) para emissão de decisão definitiva acerca do pedido de licenciamento ambiental trifásico, contendo todos os atos de análise;