Se não houver comprovação de prejuízos financeiros ou à sociedade, inexiste indenização por dano moral coletivo ambiental e dano material ambiental
Em direito ambiental, a responsabilidade é, em regra, objetiva. Ou seja, a responsabilização é possível ainda que não haja culpa, bastando demonstrar o dano e o nexo causal, ainda que o dano seja demonstrado.
Contudo, se não houver nexo causal a ligar o pretenso degradador à obrigação de recompor o meio ambiente, seja porque não tinha o domínio do bem quando se constatou a existência do dano, seja porque não praticou qualquer ato que tenha originado ou contribuído para causar a degradação, a responsabilização civel por dano ambiental fica prejudicada.
Significa dizer que, o nexo causal não se estabelece por mera condição de proprietário de imóvel degradado, sendo inadmissível a distorção do preceito para a responsabilização do atual proprietário, porque não haverá nexo causal entre ser proprietário de imóvel e o dano constatado.
É certo que, por vezes, a obrigação de reparar o dano é propter rem, mas isso sucede quando o proprietário tem, ao menos, participação na conduta danosa.
A situação proposta neste artigo é distinta dos casos que deram ensejo à Súmula 623[1] do Superior Tribunal de Justiça, os quais se fundamentavam em obrigações previstas no Código Florestal, obrigações descritas em norma cogente e pública.
Ou seja, quando a degradação não era conhecida, não foi praticada pelo proprietário e se tornou conhecida por ato praticado por terceiro, o qual sequer tinha o domínio do bem, deve haver flexibilização na regra fixada pelo STJ.
Isso porque, não há como se aplicar a responsabilidade por presunção, mesmo que a condição de proprietário seja suficiente a sustentar, inicialmente, a legitimidade passiva.
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Descabimento da responsabilidade ambiental objetiva e solidária
Conforme as disposições do art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81, recepcionado pelo art. 225, § 3º da Constituição Federal, a responsabilidade ambiental é objetiva e solidária.
Ao Estado, quer diretamente, quer por seus agentes, incumbe a proteção do meio ambiente. Nesse contexto, não pode haver a tutela insuficiente do meio ambiente e, por outro lado, não deve ser consagrada a intervenção excessiva.
É que o dever de agir deve considerar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o dever da reparação integral em equilíbrio com o desenvolvimento sustentável e o direito de propriedade.
Mas, nenhuma visão extremista deve ser adotada. O Estado deve agir sim, mas em consonância com a razoabilidade e proporcionalidade. O causador do dano, por sua vez, tem a obrigação de repará-lo, mas isso se dá em consonância com a legislação vigente.
Não se deve adotar o direito à reparação integral e do meio ambiente ecologicamente equilibrado em desacordo com os demais princípios e com os valores comunitários, sob pena de gerar arbitrariedades.
Nesse sentido ensinam os doutrinadores Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer[2]:
Considerando que os deveres fundamentais implicam, consoante já frisado, limites e restrições aos direitos fundamentais, importa ressaltar, ainda na esfera dos chamados “limites dos limites”, a importância do já referido princípio da proporcionalidade, cujas exigências devem ser observadas (respeitadas as distinções entre a dimensão defensiva e prestacional dos direitos fundamentais).
Nesse cenário, reforçando as considerações já tecidas, os deveres fundamentais, quando de sua concretização legal, devem respeitar, a proporção meio-fim (ou justa medida), tanto o conteúdo essencial do valor que constitui cada direito, liberdade e garantia ou de outros valores constitucionais, quanto afetar esses mesmos valores o menos possível e na medida justa.
Aliás, outro não é o entendimento de Pereira da Silva, ao ponderar que, no domínio do Direito de Ambiente, “vão surgir assim, com grande frequência, fenômenos de ‘colisão de direitos’, tanto ‘entre vários titulares de direitos fundamentais’ como ‘entre direitos fundamentais e bens jurídicos da comunidade e do Estado’.
Os quais deverão ser resolvidos de acordo com um ‘método de concordância prática’, ‘que impõe a ponderação de todos os valores constitucionais aplicáveis, para que não ignore algum deles, para que a Constituição (…) seja preservada na maior medida possível”.
Em outras palavras, pode-se dizer que os deveres fundamentais, na medida que impõem limites aos direitos fundamentais, configuram-se como espécie de antídoto contra eventuais arbitrariedades que o próprio exercício dos direitos fundamentais pode originar quando se colocar em desacordo com os valores comunitários.
Conclusão
Ante a proibição de excesso e a proibição de insuficiência, surgem para o legislador ordinário possibilidades de variação em aberto e somente se houver manifesta insuficiência da proteção é que há inconstitucionalidade.
Contudo, o dano ambiental que impõe o pagamento de indenização por danos morais e materiais coletivos pela perda da fruição do bem ambiental, do bem cultural, não deve olvidar eventos pretéritos, e por isso, é difícil, geralmente, estabelecer um liame objetivo entre o alegado incidente e os danos efetivos.
Essa dificuldade demonstra a complexidade da situação e as consequências devastadoras do ato danoso, enaltecendo a importância de elaborar e implementar mecanismos e instrumentos jurídicos alternativos e eficazes na reparação integral do meio ambiente.
Para que se caracterize o dano moral coletivo nos moldes pleiteados, é necessário ao menos que haja repercussão do ato na comunidade onde se situa o bem ambiental.
Ocorre que, se o dano ocorreu em área urbanizada, os impactos são limitados e, na maioria das vezes, será impossível demonstrar que tal dano ambiental tenha afetado a coletividade a demandar reparação de natureza difusa.
Portanto, ausente comprovação de que houve reflexos do ato na sociedade, incabível a condenação por dano moral coletivo. Quanto ao dano material, seria preciso a comprovação de que houve prejuízo material, financeiro, do que, geralmente, em especial o Ministério Público, não consegue comprovar.