RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – DESMATE IRREGULAR EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL – PARQUE ESTADUAL SERRA RICARDO FRANCO – PESRF – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – EMBARGO DA ÁREA DEGRADADA – IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇOES DE NÃO FAZER: ABSTENÇAO DA PRÁTICA DE ATIVIDADES LESIVAS AO MEIO AMBIENTE – RETIRADA DO REBANHO DO IMÓVEL RURAL – INDISPONIBILIDADE DE BENS – RECOMPOSIÇÃO DA ÁREA DEGRADADA– PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA – NÃO EVIDENCIADA APARÊNCIA DO BOM DIREITO – DELIMITAÇÃO GENÉRICA DA ÁREA DEGRADADA – CONTROVÉRSIA ACERCA DO PERÍODO DO DESMATAMENTO – DESPROPORCIONALIDADE DAS MEDIDAS APLICADAS – CELEBRAÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA – COMPROMISSOS ASSUMIDOS PARA A IMPLANTAÇÃO E REGULARIZAÇÃO DA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO – CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO – IRREGULARIDADE NA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL – DESAPROPRIAÇÃO E INDENIZAÇÃO – INOCORRÊNCIA – ANTROPIZAÇÃO DA ÁREA – MATÉRIAS A SEREM DIRIMIDAS NA AÇÃO PRINCIPAL – PERICULUM IN MORA INVERSO – PREQUESTIONAMENTO – RECURSO PROVIDO EM PARTE.
Não se olvide que a cessação do dano ambiental quanto mais cedo determinada, mas eficaz será.
Todavia, conforme o art. 300 da NCPC, para a concessão da tutela de urgência é necessário que haja prova suficiente a dar respaldo ao julgador na convicção da verossimilhança das alegações da parte autora, bem como que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, o que não se evidencia das alegações ministeriais.
Uma vez ocorrido o dano, o que vige é o princípio da reparação, já que medidas mitigadoras não mais se mostram viáveis, de modo que a reparação do dano ambiental, se não for possível de recuperação, pode ser realizada por outras formas, inclusive por medidas de compensação.
Não se afigura razoável a medida de embargo da atividade rural, bem como a restrição total e generalizada de todo o imóvel, quando desconhecidos o perímetro da Unidade de Conservação em que supostamente estaria inserida a área degradada, além de que há controvérsia quanto ao período e ao processo de antropização na área.
Para a decretação de indisponibilidade de bens e valores na ação civil pública ambiental, imprescindível que haja indício de que o suposto degradador esteja alienando ou dilapidando seu patrimônio, isto porque a indisponibilidade, enquanto medida preventiva de futura reparação, está condicionada à prova da dilapidação patrimonial pelo causador do dano.
A constrição de cunho pecuniário não é a única medida eficaz para a efetiva recuperação de área desflorestada, já que a norma ambiental prevê outras providências visando a compensação do dano ambiental.
Em que pese em se tratando de preservação ambiental, deva prevalecer o interesse público sobre o particular, a desproporcionalidade das medidas inibitórias/reparatórias, determinadas pelo juízo na origem, extrapolam aquelas necessárias a garantir a compensação ambiental, a caracterizar o periculum in mora inverso.
Para fins de prequestionamento dispensável a manifestação expressa dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais tidos por violados, bastando apenas que o Tribunal examine a questão posta. Recurso provido em parte.
(TJ-MT – AI: 10010957520178110000 MT, Relator: EDSON DIAS REIS, Data de Julgamento: 06/11/2019, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 28/11/2019)
RELATÓRIO
Egrégia Câmara:
O Agravante interpõe o presente RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO em face da decisão interlocutória prolatada nos autos da Ação Civil Pública Ambiental promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, que deferiu a medida liminar vindicada para o fim de determinar a indisponibilidade de bens do requerido, ora agravante, no valor de até R$ R$ 8.824.371,99, referente ao valor da compensação ambiental, assim também, decretou o embargo judicial do imóvel rural, ordenando a suspensão de todas as atividades lesivas ao meio ambiente (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações) e a retirada do rebanho do local e, por fim, a obrigação de fazer consistente na recomposição da área degradada, além de outras medidas administrativas.
Nas suas razões recursais relata que o Ministério Público Estadual propôs a mencionada ação civil pública, na qual sustenta que o agravante desmatou, no período de 12.07.98 a 13.09.15, uma área de 73,55 hectares da propriedade rural, que estaria inserida dentro de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, denominada Parque Estadual.
Em abono a sua pretensão sustentou o Parquet, a necessidade de deferimento da tutela provisória diante da possibilidade de o agravante continuar causando danos à Unidade de Conservação e nos prejuízos causados ao meio ambiente.
Informa que a tutela de urgência foi deferida pelo juízo singular que decretou a indisponibilidade dos seus bens, o embargo judicial da área supostamente degradada, a suspensão de todas as atividades econômicas e retirada do rebanho do imóvel, além da imposição de várias obrigações acessórias, tais quais, a apresentação do Programa de Recuperação Ambiental – PRA.
Diz que ocupa e trabalha na pequena propriedade rural na forma agricultura familiar, na produção de leite, não possuindo funcionários, e que a medida constritiva indisponibilizou todos os seus bens, dentre os quais a quantia de R$ 6.865,65 [ seis mil oitocentos e sessenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos] depositados na sua conta corrente indispensável à sua subsistência.
Defende a impossibilidade de deferimento de medida liminar, em razão da ausência dos seus requisitos autorizadores.
Sustenta a caducidade do Decreto Estadual que criou o Parque Serra Ricardo Franco, que foi declarado como de utilidade pública há mais de 19 [dezenove] anos, sem a adoção de qualquer medida para efetiva desapropriação da Unidade de Conservação. Pontua que apenas a criação da referida UC não autoriza o Governo Estadual a expropriação do patrimônio particular.
Assenta que a sua propriedade já possuía área consolidada e antropizada pré-existente ao ano de 2008, cuja exploração agrossilvipastoris desenvolvida é lícita e admitida pelo art. 61-A da Lei nº 12.651/12, porquanto, consolidada, e por isso, qualquer autuação bem como recomposição está prescrita, assim também anistiados os crimes e multas.
Aduz que a indisponibilidade dos bens constitui medida extremamente onerosa, e que segundo a legislação vigente cabe ao proprietário a escolha da forma de regularização da área degradada.
Afiança que o embargo da propriedade e a ordem de retirada de todos os bovinos tornou impossível a exploração econômica do bem, do qual sobrevive através da pecuária de leite, e a permanência no local em que reside. E enfatiza que a medida liminar não pode permanecer sem que haja a prévia indenização.
Pede, então, pelo provimento do recurso para reformar a decisão agravada, a fim de cassar todas as medidas constritivas e restritivas aplicadas.
O almejado efeito suspensivo foi deferido em parte pela relatora originária – Desa. Antônia Siqueira Gonçalves no ID n. 472161, que condicionou o desembargo do imóvel rural à prestação de garantia pelo próprio bem.
Em seguida aportou contraminuta, no ID n. 635209, na qual o agravado reafirma a presença dos requisitos legais da tutela provisória. Diz que segundo Relatório Técnico da SEMA, entre os anos de 1998 e 2015, houve o desmate irregular de 73,55 hectares no interior da área da Fazenda Santo Antônio inserida totalmente nos limites do Parque Estadual Serra Ricardo Franco, o que evidencia a probabilidade do direito, consubstanciada na responsabilidade objetiva de indenizar e reparar os danos ambientais, invocando, para tanto, a aplicação do princípio da precaução e a prevalência do interesse público na preservação do meio ambiente, aliada a possibilidade de dano de difícil ou incerta reparação.
Rechaça, uma a uma, as teses levantadas pelo agravante, quanto à eficácia da Unidade de Conservação, que subsiste ainda que não implantado o plano de manejo ou realizado o processo de desapropriação, porque não são condições de validade e existência da UC.
Pontua a inocorrência de bis in idem, porque apesar da propriedade encontrar-se sobreposta na área da Fazenda Antonieta, não há que se falar em duplicidade de cobrança da reparação dos danos ambientais, vez que vigora na espécie a responsabilidade ilimitada e solidária.
Diz que o agravante entrou na posse da área rural em 1998, que faz parte da Fazenda Antonieta, quando já existia o Parque Estadual, e por isso não há falar-se em prévia e justa indenização.
Afiança a existência de desmate ilegal e a inexistência de área consolidada e defende a necessidade do embargo judicial da área degradada, assim também a suspensão das atividades econômicas no interior da Unidade de Conservação e a indisponibilidade dos bens para assegurar o resultado útil do processo. Pontua a responsabilidade do agravante pelos danos ambientais, por se tratar de obrigação propter rem, e assenta que não se admite a consolidação da área por estar inserida em UC.
Prequestiona vários dispositivos infra legais e constitucionais. Ao final, pugna pelo desprovimento do recurso.
A d. Procuradoria-Geral de Justiça, emitiu parecer da lavra do Dr. Luiz Alberto Esteves Scaloppe, pelo desprovimento do agravo [ID n. 771745].
Em seguida, no ID 911276, aportou petitório do Órgão ministerial, informando a celebração do Termo de Ajustamento de Conduta n. 005/2017 entre o Ministério Público Estadual, o Estado de Mato Grosso, a Procuradoria-Geral do Estado e a Secretaria de Meio Ambiente, nos autos do Processo n. 642-31.2015.8.11.0077, em que se comprometeram em proceder a implantação do Parque Estadual Ricardo Franco, por meio da regularização fundiária, dentre outras medidas garantidoras à proteção ambiental, executar plano de fiscalização ostensiva no interior da Unidade de Conservação, com o cumprimento integral do Decreto Federal nº 6.514/2008.
É o relatório.
VOTO
O caso sub judice, trata-se da questão envolvendo a proteção do “Parque Estadual Serra Ricardo Franco” instituído pelo Decreto Estadual nº 1796 de 04.11.97, e as propriedades privadas que foram atingidas pela demarcação dessa Unidade de Conservação.
Consta que, incluindo a ação originária deste agravo, foram ajuizadas mais de 50 (cinquenta) ações civis públicas pelo Ministério Público, requerendo o embargo de diversas propriedades rurais situadas nos limites do sobredito Parque Estadual, além de outras várias demandas propostas pelos proprietários dessas áreas, questionando as autuações realizadas pelos agentes ambientais da SEMA.
Fato é que, apesar de existirem extensos e numerosos argumentos de fato e de direito nas razões recursais, o limite da cognição e julgamento do agravo de instrumento impõe que sejam circundados apenas os elementos necessários à apreciação do acerto ou desacerto da decisão liminar concedida pelo Juízo de Primeiro Grau, com a cautela de não se adentrar no mérito da demanda afeta ao juízo primevo.
Posto isso, infere-se que na origem o Ministério Público deste Estado instaurou Inquérito Civil visando apurar a responsabilidade civil ambiental do agravante em razão do dano ambiental ocorrido no imóvel rural – Sítio Santo Antônio, que alega estar localizado no interior da Unidade de Conservação de Proteção Integral – Parque Estadual Serra Ricardo Franco.
Segundo o Parquet, o agravante, no período de 12.07.98 a 13.09.15, realizou o desflorestamento de 73,55 hectares do imóvel rural, e além disso, estão utilizando a área em desacordo com as normas que regem as Unidades de Conservação, e sem a prévia autorização do órgão ambiental.
Por tal motivo, ajuizou ação civil pública na qual requereu inúmeras medidas (inibitórias, coercitivas e reparatórias), visando a proteção e a reparação integral do dano ambiental da área inserida no Parque Estadual.
Diante das alegações ministeriais, o juízo monocrático, vislumbrando os requisitos da tutela provisória de urgência, deferiu a medida, cuja substanciosa decisão restou assim fundamentada, in litteris:
[…] Nos presentes autos, diante das peças de informação coligidas pelo parquet, para que se tenha noção da dimensão da destruição ao meio ambiente ocorrida apenas na Fazenda Santo Antônio, corresponde, aproximadamente, a 73 campos de futebol.
A voracidade e velocidade da degradação ambiental, além de criminosa e estarrecedora, vem causando danos que podem ser irreparáveis, isto tudo dentro de uma unidade de conservação ambiental, no caso, o Parque Estadual Serra Ricardo Franco.
[…] Reitere-se que de acordo com o Auto de Infração e Relatório Técnico da SEMA, documentos que instruem a presente ação, foi constatado desmate irregular de área de 73,55 hectares, sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, ocorrido no período de 12/07/1998 a 13/09/2015, no imóvel rural Fazenda Santo Antônio, além do uso e ocupação do solo em desacordo com o Sistema Nacional de Unidade de Conservação (SNUC).
Além do desmate irregular, os requeridos vêm utilizando a área em desacordo com as normas que regem as Unidades de Conservação, vez que há informações sobre a criação de animais na propriedade (atividade de pecuária), sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, o que certamente está causando dano ao Parque Estadual Serra de Ricardo Franco.
Desta forma, vislumbro presentes os requisitos que autorizam a concessão da tutela antecipada na forma do CPC, uma vez que configurado o fummus boni iuris, posto que demostrados fortes indícios de violação às normas protetivas do meio ambiente.
Outrossim, registre-se que o requisito do fundado receio de perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo fundamenta-se no receio de que os requeridos continuem causando danos ao Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, assim como na impossibilidade de efetivação da futura condenação, em razão do risco concreto de insolvência do requerido.
Existe alta probabilidade dos requeridos continuarem a provocar danos incomensuráveis, de difícil ou impossível reparação, haja vista que mesmo diante de várias autuações realizadas pela SEMA, os requeridos persistem em causar danos ao meio ambiente.
[…] Neste diapasão o periculum in mora também encontra fundamento na gravidade dos fatos e nos prejuízos causados ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (direito fundamental difuso indisponível) e pela forte probabilidade de que os representados prosseguirão com os danos ambientais em velocidade e voracidade impressionantes.
Com relação à necessidade de suspensão das atividades lesivas ao meio ambiente […] é forçoso concluir que a não paralisação imediata da atividade agropecuária na Fazenda prosseguirá causando danos irreparáveis ao meio ambiente, sendo imperiosa a adoção de medida de caráter inibitório para buscar cessar a continuidade delitiva.
[…] No que tange ao pleito de suspensão dos financiamentos e incentivos fiscais pleiteados pelo Ministério Público, tal possibilidade encontra amparo no inciso II do art.1444 da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente […]
Em que pese se espere que Poder Público não compactue com danos ambientais, não pairam dúvidas que diante da crise ética que vivencia nosso país, tal situação ocorra mesmo diante de violadores de normas ambientais, logo, se faz necessária o deferimento in limine de tal medida pleiteada pelo parquet .
Por derradeiro, o Ministério Público requer a decretação de indisponibilidade de bens da requerida. Conforme cediço, a decretação de indisponibilidade dos bens constitui medida excepcional, cabível nos casos de grande probabilidade de condenação e de acordo com as peculiaridades do caso concreto.
No caso dos autos, visando a garantir a efetividade de futura condenação (reparação integral do dano ambiental), faz-se necessária a constrição cautelar de indisponibilidade de bens, no valor apontado pelo Ministério Público, em sua exordial, de R$ 8.824.371,99, quantia estimada referente aos custos para recuperação da área degradada e apurada por meio do método de Valor de Compensação Ambiental – VCP.
Vislumbrando-se, portanto, em sede de cognição sumária, a plausibilidade da indenização pecuniária para recuperação da área degradada diante de seu impacto ambiental e pelo dano moral difuso, eis que relativo ao período em que a coletividade teve diminuída a fruição do bem jurídico tutelado (meio ambiente ecologicamente equilibrado essencial à qualidade de vida) é de se conceder a medida coercitiva em caráter de tutela antecipada, conforme pleiteado pelo Ministério Público.
Diante dos elementos coligidos, em sede de cognição sumária, entendo presentes os requisitos para a concessão da tutela antecipada, uma vez que o fummus boni iuris, consistente na forte probabilidade de êxito quanto à tutela definitiva e do periculum in mora , com a demonstração de fundado receio de perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Isso porque, o montante apontado para reparação do dano ambiental certamente levará o requerido à insolvência, com fortes riscos de promover a dilapidação patrimonial como forma de se furtar ao cumprimento da decisão judicial, bem como, visa, antes de tudo, a atuação preventiva com o fim de evitar a inefetividade de futura condenação, com o fim de reparação integral do meio ambiente da Unidade de Conservação, é de ser deferida a liminar in totum.
[…] Isso Posto, presentes os requisitos legais para antecipação da tutela cautelar em Ação Civil Pública Ambiental, nos termos do artigo3055, doCPCC, DEFIRO inaudita altera parte a concessão de Medida Liminar, determinando a adoção das seguintes medidas a serem efetivadas:
02 – DECRETO a indisponibilidade de bens do (s) requerido (s), até o valor de R$ 8.824.371,99, Valor de Compensação Ambiental – VCP, com o fim de garantir a efetividade e utilidade do provimento final (efetividade da proteção do meio ambiente), promovendo-se as seguintes medidas, sem prejuízo de outras posteriormente indicadas caso estas se mostrarem insuficientes: […]
3) DECRETO o embargo judicial da área degradada e determino que os requeridos se abstenham de praticar atividades lesivas ao meio ambiente – tutela inibitória), com ordem para que o (s) requerido (s):
3.1) suspendam todas as atividades lesivas ao meio ambiente (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações, etc), que estejam sendo realizadas sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais);
3.2) Providenciem a retirada de todo rebanho existente no imóvel rural Fazenda Santo Antônio (vide Cadastro Ambiental Rural – CAR – doc. anexo), no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais) e apreensão dos animais, devendo informar nos autos o local de destino dos animais, no prazo de 5 (cinco) dias após a retirada destes dos limites do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, bem como apresentar cópia das Guias de Trânsito Animal – GTA.
4) DETERMINO, ab initio, aos requeridos a obrigação de fazer consistente em recompor a área degradada apontada nestes autos, com a apresentação à SEMA/MT, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da intimação da decisão liminar, de Plano de Recuperação de Área Degradada – PRAD […]”
Dessarte, pelo que se depreende, a decisão recorrida decretou o embargo judicial da propriedade do agravante – “Fazenda Santo Antônio” –, bem como lhe impôs obrigações de fazer e não-fazer consubstanciadas na abstenção de praticar atividades lesivas ao meio ambiente [pecuária, agricultura, piscicultura etc.], na retirada do rebanho existente no imóvel rural, determinou a recomposição da área degradada, e ainda decretou a indisponibilidade dos seus bens no valor de até R$ 8.824.371,99, referente à compensação ambiental, para eventual recuperação da área degradada, com a apresentação de Programa de Recuperação de Área Degradada – PRAD, além do óbice para financiamentos junto às instituições de crédito e incentivos fiscais do Poder Público, assim também, determinou a expedição de vários ofícios a órgãos públicos solicitando informações e o registro das medidas restritivas arbitradas e a intimação de organizações não-governamentais ligadas à defesa do meio ambiente [Greenpeace, WWF-Brasil etc.].
Contra referido ato judicial, insurge-se o ora agravante.
Diz que não se encontram presentes os requisitos essenciais para a concessão da tutela de urgência, e que a medidas impostas na decisão agravada são desproporcionais e afrontam o princípio do não confisco.
Além de que paira discussão acerca da caducidade do Decreto Estadual n. 1.796/97, que criou o Parque Serra Ricardo Franco, e pontua que a área da propriedade é antropizada.
Analisando, pois, o conteúdo coercitivo da decisão agravada, é inevitável reconhecer que razão assiste ao agravante quanto à desproporcionalidade das medidas determinadas pelo Juízo a quo, quer seja em razão da escassez probante na inicial, a delimitar a área e o dano ambiental, aquela, aliás, sequer conhecida, quer seja porque embora haja fundamento jurídico permissivo, a decisão constitui uma soma de medidas que extrapolam aquelas necessárias a garantir a compensação ambiental.
Ora, vejamos.
Consta que em 1997 foi criado pelo Estado de Mato Grosso, o Parque Estadual Serra Ricardo Franco – PESRF, por meio do Decreto Estadual n. 1796, o qual fica localizado no Município de Vila Bela da Santíssima Trindade, delimitado a uma área de 158.620,85 hectares, nos termos do art. 1º do mencionado ato normativo, in verbis.
“Art. 1º Fica criado o Parque Estadual Serra Ricardo Franco, abrangendo terras do Município de Vila Bela da Santíssima Trindade com área de 158.620,85 hectares (cento e cinqüenta e oito mil, seiscentos e vinte hectares e oitenta e cinco ares) […]”
Transcorridas quase duas décadas da criação dessa Unidade de Conservação de Proteção Integral, o poder público estadual não implementou qualquer medida de modo a transferir para si a área declarada de utilidade pública, assim também para preservar esse espaço territorial, aliás sequer conhece a delimitação geográfica e as áreas particulares que estão inseridas dentro do perímetro da supracitada Unidade de Conservação.
Em razão desse fato, o Ministério Público estadual acionou judicialmente o Estado de Mato Grosso, por meio da Ação Civil Pública n. 642-31.2015.811.0003, com a finalidade de que fossem adotadas as medidas necessárias à efetivação da Unidade de Conservação, na qual foi deferida medida liminar com a imposição de obrigações de fazer, a partir de quando o ente estatal implementou um plano de fiscalização de monitoramento dos imóveis rurais localizados na região, notificando-os e aplicando-lhes sanções ao fundamento da prática de ilícitos ambientais.
O agravante tem a posse do imóvel rural nominado Fazenda Santo Antônio que o Ministério Público alegou estar inserido dentro do perímetro do Parque Estadual Serra Ricardo Franco.
No entanto, conforme o mapa de localização, em que pese sobredito Decreto n. 1796/97, prescreva que o PESRF está delimitado a uma área de 158.620,85 hectares, a demarcação dos limites do Parque Estadual ainda não está definida, já que não fora elaborado o georreferenciamento da Unidade de Conservação de Proteção Integral, para o qual apenas recentemente fora contratada empresa especializada, ou seja, resta evidente que a precisa delimitação geográfica do perímetro da UC ainda não está demarcada.
Outrossim, também é controversa a extensão da área desmatada, bem como a época do desmate. O Ministério Público, amparado na presunção de veracidade e fé pública dos atos administrativos (no caso o auto de infração), sustenta que se trata de uma área de 73,55 hectares, e que o período do desmate foi de 12/07/1998 a 13/09/2015.
Por sua vez, o agravante pontua que a propriedade já possuía área consolidada e antropizada anterior à 2008, cuja exploração é admitida pelo art. 61-A do Novel Código Ambiental.
Importante ressaltar que este período do desmate, arguido pelo Ministério Público, é praticamente o mesmo apontado em outras ações propostas, que, aliás, teve o caráter de generalidade reproduzido na decisão recorrida, que impôs as mesmas medidas a todos os proprietários e/ou possuidores das áreas afetadas pela criação da Unidade de Conservação de Proteção Integral, sem se ater à particularidade de cada imóvel, tampouco em considerar a conduta dos produtores rurais na sua individualidade e a real situação ambiental da área.
Quanto à ineficácia do Decreto que criou a Unidade de Conservação, a inexistência de desapropriação da área afetada e indenização decorrente, embora o esgotamento da discussão seja afeto ao mérito da ação principal, é pertinente dizer que o ato expropriatório por si só não produz qualquer efeito sobre o direito de propriedade do expropriado, assim também não pode impedi-lo de usar, gozar, explorar, dispor do bem enquanto não efetivada concretamente a desapropriação.
Nesse sentido leciona abalizada doutrina, vejamos:
“[…] Os efeitos da declaração expropriatória não se confundem com os da desapropriação em si mesma. A declaração de necessidade ou utilidade pública ou de interesse social é apenas o ato-condição que precede a efetivação da transferência do bem para o domínio do expropriante. Só se considera iniciada a desapropriação com o acordo administrativo ou com a citação para a ação judicial, acompanhada da oferta do preço provisoriamente estipulado para o depósito. Até então a declaração expropriatória não tem qualquer efeito sobre o direito de propriedade do expropriado, nem pode impedir a normal utilização do bem ou sua disponibilidade, lícito é ao particular explorar o bem ou nele construir mesmo após a declaração expropriatória, enquanto o expropriante não realizar concretamente a desapropriação, sendo ilegal a denegação de alvará de construção: o impedimento do pleno uso do bem diante da simples declaração de utilidade pública importa restrição inconstitucional ao direito de propriedade, assim como o apossamento sem indenização equivale ao confisco.” (Meirelles. Lopes Hely. Direito Administrativo Brasileiro. 39ª edição. 2013. Pag. 686/687).
Dessa forma, o Estado não pode ultrapassar as regulares fases do procedimento expropriatório e impor ao particular o ônus pela sua inércia, notadamente aplicando-lhe medidas severas que acarretem danos irreversíveis, impossibilitando o pleno uso do bem, o qual, ao que se afigura, não possui qualquer limitação, ao menos enquanto não efetivada concretamente a regularização fundiária da área, que, aliás, é um dos compromissos assumidos pelo Estado de Mato Grosso no Termo de Ajustamento de Conduta n. 005/2017, firmado com o Ministério Público no trâmite das ações civis [Cláusulas 3ª e 11ª – Id 911282].
Digo isso porque a medida de embargo da atividade rural, bem como a retirada de todo o rebanho da propriedade, no exíguo prazo de 60 (sessenta) dias, é, sem dúvida, extrema e prematura, porquanto não só limita a utilização normal do bem, mas também inviabiliza a própria manutenção das atividades econômicas deste, comprometendo a função social da propriedade, a subsistência de inúmeras famílias que dali retiram seu sustento, incorrendo, assim, no periculum in mora inverso, na forma do § 3º do art. 300 do CPC/15, o que é totalmente vedado.
Assim, não se está aqui retirando do poder público o dever pela preservação e proteção dos espaços territoriais especialmente protegidos, mas ponderando a sua atuação à vista das peculiaridades do caso, pois a despeito de reconhecer a pertinência e importância da proteção ambiental, não pode agir manu militari, desproporcionalmente, impondo obrigações desarrazoadas, transferindo a responsabilidade pela sua omissão ao longo dos anos para o particular, até porque, discute-se a legalidade da criação da própria Unidade de Conservação, além da caducidade do decreto expropriatório, cuja ineficácia, se reconhecida, fulminaria, por completo, as autuações dos agentes ambientais.
Não se olvida, ademais, que a cessação do dano ambiental quanto antes determinada, mais eficaz se mostrará. Também não se nega que o periculum in mora é sempre evidente quando se trata de proteção ao meio ambiente à luz dos princípios da prevenção e da precaução, e da norma constitucional.
Porém, para a concessão da tutela de urgência não basta o perigo na demora. Os requisitos, conforme é sabido, devem coexistir concomitantemente e, na hipótese, não fora demonstrada, de plano, a aparência de razão das alegações iniciais do órgão ministerial a justificar a indisponibilidade e restrição generalizada.
Não se apresenta plausível, em princípio, a determinação de expedição de ofícios aos estabelecimentos bancários, frigoríficos, a fim de coibir qualquer benefício financeiro e fiscal ao agravante, mesmo após ter determinado o bloqueio de valores milionários e o embargo da propriedade rural.
A proibição de obter recursos de instituições financeiras, na maioria das vezes, indispensável à sobrevivência da propriedade rural.
Por outro lado, para a decretação de indisponibilidade de bens e valores, imprescindível que haja indício de que o demandado esteja alienando ou dilapidando seu patrimônio, isto porque a indisponibilidade enquanto medida preventiva de futura reparação, está condicionada à prova da dilapidação patrimonial pelo causador do dano, o que não restou comprovado no caso, ao menos neste momento processual.
Nesse sentido, colaciono precedente desta Câmara em caso análogo.
“AMBIENTAL – RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – DESMATE IRREGULAR EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL – PARQUE ESTADUAL SERRA RICARDO FRANCO – PESRF – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – EMBARGO DA ÁREA DEGRADADA – RECOMPOSIÇÃO DA ÁREA AFETADA – PLANO DE RECUPERAÇÃO DE ÁREA DEGRADADA – SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES LESIVAS AO MEIO AMBIENTE – INDISPONIBILIDADE DE BENS – EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS A ÓRGÃOS PÚBLICOS – INTIMAÇÃO DE ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE – PEDIDO DE REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA TUTELA PROVISÓRIA – DELIMITAÇÃO GENÉRICA DA ÁREA DEGRADADA – CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO – IRREGULARIDADE NA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL – AUSÊNCIA DO PLANO DE MANEJO E DESAPROPRIAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE DESMATAMENTO ILEGAL – CARÊNCIA DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NO DECISUM MONOCRÁTICO – RELEVÂNCIA DAS ALEGAÇÕES – PERICULUM IN MORA INVERSO – RECURSO PROVIDO EM PARTE.
A tutela de urgência reclama mais que o perigo da demora, porquanto requer a coexistência da plausibilidade do direito, ou seja, a aparência de razão das alegações iniciais.
Se afigura extrema a medida de embargo da atividade rural, quando desconhecidos os limites da Unidade de Conservação em que supostamente estaria inerida a área embargada.
Para a decretação de indisponibilidade de bens e valores na ação civil pública ambiental, imprescindível que haja indício de que o suposto degradador esteja alienando ou dilapidando seu patrimônio, isto porque a indisponibilidade, enquanto medida preventiva de futura reparação, está condicionada à prova da dilapidação patrimonial pelo causador do dano.
A constrição de cunho pecuniário não é a única medida eficaz para a efetiva recuperação de área degradada.
A desproporcionalidade das medidas determinadas pelo Juízo a quo, quer seja em face da escassez probante na inicial, a delimitar a área e o dano ambiental, quer seja em virtude da existência de fundamento jurídico permissivo, constitui uma soma de medidas que ultrapassam àquelas necessárias a garantir a compensação ambiental, que corroboram o periculum in mora inverso.
Recurso parcialmente provido. (RAI nº 1003946-24.2016.811.0000, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Rel. Desa. ANTONIA SIQUEIRA GONÇALVES, Julgado em 17/04/2018).
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“AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ESTÂNCIA BAHIA – “MEGA LEILÃO DE BOVINOS” – PREVISÃO DO EVENTO PARA O DIA 19 E ABRIL DO CORRENTE ANO – DECISÃO QUE DETERMINA A SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES DE CONFINAMENTO E HOSPEDAGEM BOVINA – RETIRADA DO REBANHO, NO PRAZO DE 48 HORAS – PROIBIÇÃO DAS ATIVIDADES LEILOEIRAS NOS CURRAIS, BAIAS, ESTÁBULOS E PIQUETES COM DESATIVAÇÃO DESTES – APRESENTAÇÃO DOS ESTUDOS DE PASSIVO AMBIENTAL E RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA DO IMÓVEL – PARA ASSEGURAR RESSARCIMENTO E REPARAÇÃO DOS DANOS: INDISPONIBILIDADE DE BENS DOS REQUERIDOS, BLOQUEIO DOS VEÍCULOS, ARESTO DE AÇÕES E COTAS SOCIAIS QUE COMPÕEM O CAPITAL SOCIAL DAS EMPRESAS E DOS SOCIOS – QUEBRA DO SIGILO FISCAL – VÁRIOS E RELEVANTES OS INTERESSES CONTRAPOSTOS – ATIVIDADE EXERCIDA NO LOCAL HÁ MAIS DE 10 (DEZ) – NEGATIVA DA LICENÇA AMBIENTAL PELA SEMA/MT – TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO ENTRE AS PARTES E JÁ CUMPRIDO PARCIALMENTE – MEDIDAS DEMASIADAMENTE ONEROSAS – INVIABILIZADORAS DA PRÓPRIA MANUTENÇÃO DAS ATIVIDADES – COMPROMETEDORAS DA ECONOMIA LOCAL, EM RAZÃO DO NÚMERO DE PESSOAS ATINGIDAS INDIRETAMENTE PELA DECISÃO JUDICIAL – DECISÃO DESPROPORCIONAL AO DETERMINAR O EMBARGO IMEDIATO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS – NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE PRAZO – POSSIBILIDADE DE ADEQUAÇÃO DE OUTRO LOCAL PARA O DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES DESEMPENHADAS – INDISPONIBILIDADE DE BENS E QUEBRA DO SIGILO FISCAL – AUSÊNCIA DE REQUISITOS AUTORIZADORES – DEMAIS QUESTÕES NÃO ANALISADAS – IMPOSSIBILIDADE DE EXAME – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO.
- “[…] 4. O art. 11 da Lei n. 7.347/85 prevê”o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível”(grifei). 5.”A decretação da indisponibilidade e o sequestro de bens, por ser medida extrema, há de ser devida e juridicamente fundamentada, com apoio nas regras impostas pelo devido processo legal, sob pena de se tornar nula“(AgRg no REsp 433357/RS). […] 7. Agravo de instrumento a que se dá parcial provimento para suspender a decretação da indisponibilidade de bens do agravante. (TRF-1 – AG: 40761 PA 2006.01.00.040761-9, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, Data de Julgamento: 13/09/2010, QUINTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.54 de 24/09/2010)
2.” […] Para a decretação de indisponibilidade de bens e valores de empresa, cuja responsabilidade pela prática irregular de extração de minério é apurada judicialmente, imprescindível que haja indício de que esteja alienando ou dilapidando seu patrimônio, com o intuito exclusivo de frustrar futura execução. A mera possibilidade, em tese, de que a ré se desfaça de seu patrimônio, sem embasamento em dados empíricos, não enseja a adoção da medida restritiva de direito. A ordem de bloqueio de bens e valores possui caráter excepcional, impondo-se, nesse contexto, a demonstração da existência de indícios de que ela agiu ou está agindo, com o objetivo de inviabilizar a execução de eventual sentença condenatória contra ela proferida. Não restando configurada tal hipótese, afigura-se excessiva a medida constritiva. (TRF 4ª Região – AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5005896-33.2013.404.0000/PR – Relatora: des. federal Vivian Josete Pantaleão caminha – data do julgamento: 02/07/2013)” (AI 30620/2014, DESA. MARIA EROTIDES KNEIP BARANJAK, TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Julgado em 28/10/2014, Publicado no DJE 13/03/2015 – Destaquei)
Logo, a mera possibilidade, em tese, de que o agravante dissipe o seu patrimônio, não enseja a constrição patrimonial na extensão em que foi deferida, atingindo todos bens móveis e imóveis e ativos financeiros como forma de resguardar a recuperação do dano ambiental, porquanto a ordem de bloqueio impõe a demonstração de indícios de que a parte tenha praticado atos ou venha agindo no sentido de desfazer dos seus bens com o fim de malograr futura execução de eventual sentença condenatória.
Ademais, é certo que a reparação não necessariamente deve ser realizada em pecúnia, posto que a constrição de cunho pecuniário não é a única medida eficaz para a efetiva recuperação de área degradada, como, aliás, repito, reconheceu o próprio autor da ação, ao contrapor o presente instrumento.
Assim sendo, uma vez ocorrido o dano, o que vige é o princípio da reparação, já que medidas mitigadoras não mais se mostram viáveis, de modo que, a reparação do dano ambiental, se não for possível de recuperação, pode ser realizada por outras formas, inclusive por medidas de compensação ambiental, pela prática de manejo, celebração de TAC, apresentação de Programa de Regularização Ambiental – PRA, bem como o uso sustentável da área acaso possível, dentre outras previstas, até mesmo, in casu, a possibilidade de desconto do quantum decorrente de eventual desapropriação, o que, sinala-se, constou do Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre o Parquet e o Estado de Mato Grosso [cláusula 11ª – Id 911282].
Dessa forma, não se vislumbra, no caso, a necessidade de embargar a integralidade da propriedade e tornar indisponíveis todos os bens móveis e imóveis, ativos financeiros do agravante, como forma de garantir a restauração do meio ambiente natural supostamente degradado na Fazenda Santo Antônio, na hipótese de condenação do demandado, porque a própria propriedade rural possui valor econômico capaz de garantir o pagamento das despesas da recuperação do meio ambiente, além disso como repiso, há outras medidas legais para a reparação do dano ambiental.
De fato, a cessação do dano ambiental quanto mais cedo determinada, mas eficaz será. Todavia, a tutela de urgência reclama mais que o perigo da demora, uma vez que esta requer a coexistência da plausibilidade do direito, o que, não se evidencia, extreme de dúvida, das alegações ministeriais.
Em contrapartida, as argumentações e provas carreadas pelo agravante agasalham e respaldam o provimento do agravo, o que impele, além da razoabilidade, a decidir com equilíbrio pró-ambiente, sem sacrificar desproporcionalmente o particular.
Por derradeiro, aportou aos autos informação ministerial acerca da celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC nº 005/2017 firmado entre o Estado de Mato Grosso, a Procuradoria-Geral do Estado, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e o Ministério Público Estadual comprometidos à obrigação de fazer consistente na implantação, proteção e fiscalização do Parque Estadual Ricardo Franco, por meio da regularização fundiária, dentre outras medidas garantidoras à proteção ambiental.
Referido compromisso só corrobora a omissão estatal na implantação da referida unidade de conservação, e os compromissos assumidos, a partir de então, para a real regularização da área, não interferindo nas medidas que estão em discussão, haja vista que possui efeitos prospectivos e ultimada em autos distintos.
Finalmente, atento aos limites objetivos da decisão recorrida, à mingua de adentrar no mérito da ação principal, os demais pontos questionados pelo agravante, a saber: a caducidade do Decreto 1796/97, os limites territoriais da Unidade de Conservação, são matérias estranhas, não questionadas na origem, ao menos no âmbito deste recurso, a caracterizar supressão de instância.
Por tais fundamentos, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao presente recurso de agravo de instrumento para reformar a decisão recorrida, de modo a afastar a indisponibilidade que recaiu sobre os bens móveis e imóveis do agravante, mantendo-se, contudo, a constrição sobre o imóvel, como garantia processual em caso de eventual condenação por dano ambiental, ou, por outro lado, a liberação da restrição do referido bem, mediante a apresentação de outro imóvel livre e desembaraçado ou outra garantia idônea que alcance o montante da compensação ambiental, a ser avaliada pelo juízo de primeiro grau.
Outrossim, determino o desembargo da área rural, permanecendo, todavia, a proibição de desmatamento e a realização de edificações e obras no imóvel, a par das já existentes, sem autorização do órgão ambiental competente, sob pena do embargo total da propriedade, além da multa já fixada na origem.
Para fins de prequestionamento, dispensável a menção expressa aos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais apontados, bastando apenas que o Tribunal examine as questões postas.
Por fim, ressalta-se que a decisão proferida neste agravo se limita ao objeto do recurso, não se podendo falar e utilizar em outras possíveis demandas que discutam direitos de posse e propriedade que este Tribunal reconheceu, por via deste agravo, referidos direitos ao demandante.
É como voto.