AÇÃO ANULATÓRIA. AUTO DE INFRAÇÃO. COMERCIALIZAÇÃO DE MADEIRA SEM DOCUMENTO DE ORIGEM FLORESTAL. MULTA RELATIVA AO PERÍODO DE 01/01/2006 A 16/03/2007. DECADÊNCIA. OCORRÊNCIA. MULTA RELATIVA AO PERÍODO DE 17/03/2007 A 31/03/2007. SUBSISTÊNCIA SEM A AGRAVANTE DE REINCIDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÕES IMPROVIDAS.
Apelações interpostas pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA e pela CERÂMICA MARBOSA LTDA – EPP, em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará, que julgou parcialmente o pedido para determinar a suspensão da cobrança da multa referente ao período de 01 de janeiro de 2006 a 16 de março de 2007, tendo por subsistente a cobrança da multa referente ao período de 17 de março a 31 de março de 2007, sem a ocorrência da reincidência. Condenou o IBAMA, nos termos do art. 86, § 1º, do CPC, ao pagamento de honorários sucumbenciais no percentual de 10%, sobre o proveito econômico obtido com a demanda.
Sustenta CERÂMICA MARBOSA que a sentença deve ser reformada, uma vez que, quanto à multa não decaída (período de 17 a 31 de março de 2007), houve ofensa ao devido processo legal e há de ser observado o disposto no art. 72, § 3º, I, da Lei 9.605/1998, segundo o qual “a multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo, advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente”.
Já o IBAMA requer seja conhecido e dado provimento ao apelo para que seja declarado incólume o auto de infração com o afastamento da declaração de decadência da madeira sem cobertura de DOF no período de janeiro de 2006 a março de 2007. Sustenta que a pena deve ser agravada pela ocorrência da reincidência.
A sentença deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos, consoante se depreende a seguir. 1. Relatório Cuida-se de ação ordinária, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por CERAMICA MARBOSA LTDA – EPP contra o INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, objetivando a nulidade da cobrança da multa ambiental consubstanciada no auto de infração de nº 702410/D (processo 02007.000751/2012-33) decorrente do saldo remanescente de lenha sem cobertura do DOF (Documento de Origem Florestal) que certifica a origem legal do produto vegetal. Alega a autora a existência de prescrição com fundamento no art. 21, § 3º, do Decreto 6.514/2008, c/c o art. 46 da lei 9.605/98 e 109, V, do Código Penal. Também questiona o agravamento da pena por entender que a multa aplicada não obedeceu na sua dosimetria os postulados da proporcionalidade. Devidamente citado, o IBAMA apresentou contestação advogando, em síntese, a inocorrência de qualquer tipo de prescrição, e que o procedimento fiscal encontra-se devidamente fundamentado e justificado com base na legislação e nos fatos descritos no processo administrativo. É o que basta relatar. Passo apreciar o pedido. 2. Fundamentos Observa-se que a questão trazida a juízo tem seu início em 1º de agosto de 2008, momento em que houve a aplicação do primeiro auto de infração de nº 479274/D (processo 02007.001767/2008-87), com penalidade de multa no valor de R$ 712.800,00, decorrente de suposta utilização de mata nativa sem comprovação de origem florestal (DOF), referente ao período de janeiro de 2006 a março de 2007. Por sua vez, tal auto de infração foi anulado na esfera administrativa, sob o fundamento de existência de vício insanável, vez que fora comprovado que a lenha em sua maioria possuía a documentação correta. Em razão disso, em 16/03/2012 foi apresentado um novo auto de infração, de nº 702410/D, correspondente ao saldo remanescente de lenha supostamente sem origem declarada. Embora o autor alegue a ocorrência de uma possível prescrição, a lavratura do auto de infração nº 702410/D, em 16/03/2012, fundamentado na não comprovação do DOF relativo à compra de lenha no período de janeiro de 2006 a março de 2007, denota a ocorrência de outro instituto, o da decadência. Nesse contexto, para fins de análise do instituto em questão, é de se observar que o crédito objeto da ação, por sua natureza não tributária, não se sujeita ao Código Tributário Nacional, mas sim à Lei 9.873/1999, que assim dispõe: Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. § 1o Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso. § 2o Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal. Art. 1o-A. Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor. Contudo, a Jurisprudência pátria vem consolidando o entendimento de que o prazo previsto no art. 1º supra é decadencial, enquanto o prazo expresso no art. 1º-A é prescricional. (…) Portanto, constando nos autos a lavratura do auto de infração nº 702410/D, em 16/03/2012, Id. 4058100.1822823, fundamentado na não comprovação do DOF relativo à compra de lenha no período de janeiro de 2006 a março de 2007, torna-se forçoso constatar a ocorrência do instituto da decadência sobre a quase totalidade do título de crédito em questão, ou seja, da lenha adquirida entre 01 de janeiro de 2006 a 16 de março de 2007, uma vez que houve o transcurso de mais de 05 anos entre a infração e a constituição definitiva do crédito. Tratando-se, então, a decadência de uma matéria de ordem pública, esta deve ser reconhecida inclusive de ofício, quando presentes os seus requisitos. No presente caso, considerando que o prazo decadencial não comporta causas suspensivas e nem interruptivas em sua formação, a teor do que disciplina o artigo 207 do Código Civil, remanesce para o demandado apenas o direito de aplicação da multa sobre a lenha sem documentação adquirida entre 17 a 31 de março de 2017.
No que toca à reincidência, o Juízo de origem, na sentença dos embargos de declaração, corretamente apreciou a questão, ao consignar o seguinte: Analisando o Auto de Infração 702410/D, lavrado em 16/03/2012, Id. 4058100.1822823, observa-se que o enquadramento do promovente, incluindo multa por agravamento, deu-se com base no Art. 70, § 1º, da Lei 9.605/1998, c/c Art. 72, II; Art. 47 do Decreto 6.514/2008, c/c Art. 3º. No caso, apesar do posicionamento deste juízo na sentença embargada afirmando que remanesce para o IBAMA apenas o direito de aplicação da multa sobre a lenha sem documentação adquirida entre 17 a 31 de março de 2007, constata-se que não houve o enfrentamento da questão do agravamento de penalidade. Sendo assim, passo à análise. Nos termos do Decreto 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas, tem-se: Art. 11. O cometimento de nova infração ambiental pelo mesmo infrator, no período de cinco anos, contados da lavratura de auto de infração anterior devidamente confirmado no julgamento de que trata o art. 124, implica: I – aplicação da multa em triplo, no caso de cometimento da mesma infração; ou II – aplicação da multa em dobro, no caso de cometimento de infração distinta. § 1o O agravamento será apurado no procedimento da nova infração, do qual se fará constar, por cópia, o auto de infração anterior e o julgamento que o confirmou. § 2o Antes do julgamento da nova infração, a autoridade ambiental deverá verificar a existência de auto de infração anterior confirmado em julgamento, para fins de aplicação do agravamento da nova penalidade. § 3o Após o julgamento da nova infração, não será efetuado o agravamento da penalidade. § 4o Constatada a existência de auto de infração anteriormente confirmado em julgamento, a autoridade ambiental deverá: I – agravar a pena conforme disposto no caput; II – notificar o autuado para que se manifeste sobre o agravamento da penalidade no prazo de dez dias; e III – julgar a nova infração considerando o agravamento da penalidade. § 5º O disposto no § 3o não se aplica para fins de majoração do valor da multa, conforme previsão contida nos arts. 123 e 129. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008). Na hipótese, cotejando a documentação acostada aos autos, observa-se que não houve o cometimento de nova infração pela embargante após a lavratura do Auto de Infração 702410/D, lançado em 16/03/2012, considerado, em parte, valido por este juízo. Portanto, a teor da legislação disposta acima, entendo que o Auto de Infração 479513/D, dispondo acerca de possível agravante por reincidência, por si só, não se sustenta, uma vez que a própria Administração declarou nulo o Auto de Infração 479274/D, que subsidiava a pretensa agravante.
Registre-se que, para aplicação de qualquer penalidade, faz-se necessário que seja a administrada notificada da infração, a fim de poder apresentar sua defesa administrativa, tal como se deu em relação à autora, seja em relação ao auto de infração 479274, tanto que culminou anulada com base na defesa da autora, seja em relação ao auto de infração 702410, em substituição ao anterior. Não houve nos processos administrativos violação ao contraditório e à ampla defesa, tendo, em ambos, sido notificada da infração e tido a oportunidade de se defender.
Apelações improvidas. (TRF-5 – Ap: 08141020620164058100, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO, Data de Julgamento: 16/11/2021, 2ª TURMA)
VOTO
Cuida-se de ação ordinária, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por CERAMICA MARBOSA LTDA – EPP contra o INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, objetivando a nulidade da cobrança da multa ambiental consubstanciada no auto de infração de nº 702410/D (processo 02007.000751/2012-33) decorrente do saldo remanescente de lenha sem cobertura do DOF (Documento de Origem Florestal) que certifica a origem legal do produto vegetal.
Alega a autora a existência de prescrição com fundamento no art. 21, § 3º, do Decreto 6.514/2008, c/c o art. 46 da lei 9.605/98 e 109, V, do Código Penal. Também questiona o agravamento da pena por entender que a multa aplicada não obedeceu na sua dosimetria os postulados da proporcionalidade.
Devidamente citado, o IBAMA apresentou contestação advogando, em síntese, a inocorrência de qualquer tipo de prescrição, e que o procedimento fiscal encontra-se devidamente fundamentado e justificado com base na legislação e nos fatos descritos no processo administrativo.
É o que basta relatar. Passo apreciar o pedido.
- Fundamentos
Observa-se que a questão trazida a juízo tem seu início em 1º de agosto de 2008, momento em que houve a aplicação do primeiro auto de infração de nº 479274/D (processo 02007.001767/2008-87), com penalidade de multa no valor de R$ 712.800,00, decorrente de suposta utilização de mata nativa sem comprovação de origem florestal (DOF), referente ao período de janeiro de 2006 a março de 2007.
Por sua vez, tal auto de infração foi anulado na esfera administrativa, sob o fundamento de existência de vício insanável, vez que fora comprovado que a lenha em sua maioria possuía a documentação correta. Em razão disso, em 16/03/2012 foi apresentado um novo auto de infração, de nº 702410/D, correspondente ao saldo remanescente de lenha supostamente sem origem declarada.
Embora o autor alegue a ocorrência de uma possível prescrição, a lavratura do auto de infração nº 702410/D, em 16/03/2012, fundamentado na não comprovação do DOF relativo à compra de lenha no período de janeiro de 2006 a março de 2007, denota a ocorrência de outro instituto, o da decadência.
Nesse contexto, para fins de análise do instituto em questão, é de se observar que o crédito objeto da ação, por sua natureza não tributária, não se sujeita ao Código Tributário Nacional, mas sim à Lei 9.873/1999, que assim dispõe:
Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.
§2º Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.
Art. 1º- A. Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor.
Contudo, a Jurisprudência pátria vem consolidando o entendimento de que o prazo previsto no art. 1º supra é decadencial, enquanto o prazo expresso no art. 1º-A é prescricional. (…)
Portanto, constando nos autos a lavratura do auto de infração nº 702410/D, em 16/03/2012, Id. 4058100.1822823, fundamentado na não comprovação do DOF relativo à compra de lenha no período de janeiro de 2006 a março de 2007, torna-se forçoso constatar a ocorrência do instituto da decadência sobre a quase totalidade do título de crédito em questão, ou seja, da lenha adquirida entre 01 de janeiro de 2006 a 16 de março de 2007, uma vez que houve o transcurso de mais de 05 anos entre a infração e a constituição definitiva do crédito.
Tratando-se, então, a decadência de uma matéria de ordem pública, esta deve ser reconhecida inclusive de ofício, quando presentes os seus requisitos.
No presente caso, considerando que o prazo decadencial não comporta causas suspensivas e nem interruptivas em sua formação, a teor do que disciplina o artigo 207 do Código Civil, remanesce para o demandado apenas o direito de aplicação da multa sobre a lenha sem documentação adquirida entre 17 a 31 de março de 2017.
No que toca à reincidência, o Juízo de origem, na sentença dos embargos de declaração, corretamente apreciou a questão, ao consignar o seguinte:
Analisando o Auto de Infração 702410/D, lavrado em 16/03/2012, Id. 4058100.1822823, observa-se que o enquadramento do promovente, incluindo multa por agravamento, deu-se com base no Art. 70, § 1º, da Lei 9.605/1998, c/c Art. 72, II; Art. 47 do Decreto 6.514/2008, c/c Art. 3º.
No caso, apesar do posicionamento deste juízo na sentença embargada afirmando que remanesce para o IBAMA apenas o direito de aplicação da multa sobre a lenha sem documentação adquirida entre 17 a 31 de março de 2007, constata-se que não houve o enfrentamento da questão do agravamento de penalidade. Sendo assim, passo à análise.
Nos termos do Decreto 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas, tem-se:
Art. 11. O cometimento de nova infração ambiental pelo mesmo infrator, no período de cinco anos, contados da lavratura de auto de infração anterior devidamente confirmado no julgamento de que trata o art. 124, implica:
I – aplicação da multa em triplo, no caso de cometimento da mesma infração; ou
II – aplicação da multa em dobro, no caso de cometimento de infração distinta.
§ 1º O agravamento será apurado no procedimento da nova infração, do qual se fará constar, por cópia, o auto de infração anterior e o julgamento que o confirmou.
§ 2º Antes do julgamento da nova infração, a autoridade ambiental deverá verificar a existência de auto de infração anterior confirmado em julgamento, para fins de aplicação do agravamento da nova penalidade.
§ 3º Após o julgamento da nova infração, não será efetuado o agravamento da penalidade.
§ 4º Constatada a existência de auto de infração anteriormente confirmado em julgamento, a autoridade ambiental deverá:
I – agravar a pena conforme disposto no caput;
II – notificar o autuado para que se manifeste sobre o agravamento da penalidade no prazo de dez dias; e
III – julgar a nova infração considerando o agravamento da penalidade.
§ 5º O disposto no § 3onão se aplica para fins de majoração do valor da multa, conforme previsão contida nos arts. 123 e 129.
Na hipótese, cotejando a documentação acostada aos autos, observa-se que não houve o cometimento de nova infração pela embargante após a lavratura do Auto de Infração 702410/D, lançado em 16/03/2012, considerado, em parte, valido por este juízo. Portanto, a teor da legislação disposta acima, entendo que o Auto de Infração 479513/D, dispondo acerca de possível agravante por reincidência, por si só, não se sustenta, uma vez que a própria Administração declarou nulo o Auto de Infração 479274/D, que subsidiava a pretensa agravante.
Registre-se que, para aplicação de qualquer penalidade, faz-se necessário que seja a administrada notificada da infração, a fim de poder apresentar sua defesa administrativa, tal como se deu em relação à autora, seja em relação ao auto de infração 479274, tanto que culminou anulada com base na defesa da autora, seja em relação ao auto de infração 702410, em substituição ao anterior. Não houve nos processos administrativos violação ao contraditório e à ampla defesa, tendo, em ambos, sido notificada da infração e tido a oportunidade de se defender.
Apelações improvidas.
É como voto.