O desmatamento de floresta plantada ou nativa sem autorização do órgão competente, em terras de domínio público, configura a prática do crime ambiental previsto no art. 50-A da Lei 9.605/1998, que assim discorre:
Art. 50-A. Desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio público ou devolutas, sem autorização do órgão competente:
Pena – reclusão, de 02 (dois) a 04 (quatro) anos e multa.
Da leitura do referido tipo penal, extrai-se que o objeto do crime são as florestas, plantadas ou nativas, desde que localizadas em terras de domínio público ou devolutas.
O elemento normativo do tipo floresta designa a formação arbórea densa, de alto porte, que recobre área de terra mais ou menos extensa, sendo essencial que seja constituída por árvores de grande porte, não incluindo a vegetação rasteira.
Por sua vez, de acordo com o § 1º do art. 50-A da referida Lei, “não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do agente ou de sua família”.
Índice
Ação penal originada de auto de infração ambiental
É comum que o infrator após ser autuado por desmatar área do bioma amazônico em terras públicas seja denunciado pelo Ministério Público e vire réu em ação penal pelo crime ambiental previsto no art. 50-A da Lei 9.605/08.
A materialidade e a autoria, nestes casos, geralmente é comprovada pelo auto de infração, relatório de fiscalização, laudo de exame de meio ambiente, imagens de satélite e em alguns casos, pela própria confissão do réu no processo administrativo, na fase policial ou em Juízo.
Entretanto, ainda diante da demonstração de que o réu praticou o crime ambiental de desmatar floresta de domínio público, é possível sua absolvição, sobretudo quando a área é utilizada para seu sustento próprio.
Réu que não tinha outro meio de sustento
Embora muitas culturas não sejam gêneros alimentícios de necessidade básica, os recursos provenientes do plantio acabam por custear as despesas do réu e de sua família, e assim, “não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do agente ou de sua família”.
Assim, considerado todo o contexto socioeconômico, é de se concluir que, somente por meio do desmatamento do bioma amazônico é que o agente poderia garantir renda para o seu sustento. E tal situação é atenuada pela circunstância de que a conduta foi praticada em região de assentamento delimitada pelo INCRA.
Ademais, se o réu não possuía outros meios para evitar o ilícito, muitas vezes por deficiência ou quase ausência de auxílio material e técnico aos produtores rurais assentados, fica demonstrado certo descaso do INCRA, não imputável, obviamente, ao réu, que foi também um dos prejudicados.
Vale destacar, que o fato de o réu possuir Termo de Concessão de Uso da área em que reside não descaracteriza o estado de necessidade do acusado, mormente porque o crime previsto no art. 50-A, nestes casos, é geralmente praticado com vistas a oferecer o sustento pessoal e de sua família.
Logo, é forçoso concluir que é caso de exclusão de inexigibilidade de conduta diversa, seja porque essa região de assentamentos em especial não conta com apoio estatal no sentido de fornecer tecnologia, treinamento ou planejamento adequado para evitar um maior índice de desmatamento, seja porque, por isso mesmo, a cultura de subsistência rudimentar praticada pelos colonos necessita de maior porção de terras degradadas, seja porque o réu não possui outro meio de sobrevivência e sustentar sua família.
A supressão dasautorizada de vegetação florestal é, portanto, exculpável, pela impossibilidade de se desenvolver uma agricultura de subsistência que assegure ao pretenso infrator condições mínimas de sobrevivência.
Conclusão
Há casos em que, embora fiquem demonstradas a autoria e a materialidade delitivas, o acusado pode ser absolvido do crime de desmatamento da Amazônia, decorrente da aplicação da excludente de ilicitude prevista no art. 50, § 1º, da Lei 9.605/98, porquanto, nos termos do referido dispositivo legal, “não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do agente ou de sua família”.
Além disso, a demonstração do elemento subjetivo do tipo é indispensável para a condenação pelo crime previsto no art. 50-A da Lei 9.605/1998.
Por fim, vale destacar que se o desmatamento promovido pelo réu se deu em razão da necessidade de extrair da área o sustento seu e de sua família, tratando-se de ato lícito, por isso que entre o bem jurídico vida e a tutela do meio ambiente, torna-se necessário salvar primeiro aquele que é irrecuperável, ou seja, a vida humana.
Desse modo, mesmo diante da comprovação da materialidade e da autoria, a absolvição do réu pelo tipo penal em análise é cabível se não houver a comprovação do dolo, consistente em degradar o bem jurídico tutelado, no caso, a floresta, sobretudo na hipótese de o desmatamento ter ocorrido com o objetivo de plantar cultura de subsistência.
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Gostei da abordagem sobre o tema. Texto coeso e objetivo sobre a atipicidade do crime ambiental praticado em caso de insubsistência.